Publicidade e consumo na infância: Estratégias

Segundo João Manuel Cardoso de Mello, o desenvolvimento capitalista neste ... É preciso salientar que a consolidação de nosso “Capitalismo Tardio” 4 c...

2 downloads 213 Views 718KB Size
Publicidade e consumo na infância: Estratégias publicitárias e resultados econômicos (São Paulo, 1969 a 1978). Deividi de Santana Silva*1

Publicidade e Acumulação Tardia As agências de publicidade ou propaganda2 no Brasil começaram a se desenvolver na década de 1920, contudo, as condições históricas para seu pleno desenvolvimento só foram possíveis na década de 1950, momento em que o modo de produção capitalista brasileiro passou por um “processo de industrialização pesada”. Segundo João Manuel Cardoso de Mello, o desenvolvimento capitalista neste período: “[...] implicou um crescimento acelerado na capacidade produtiva do setor de bens de produção e do setor dos bens duráveis de consumo antes de qualquer expansão previsível dos mercados” (MELLO, 1976: 117) Neste contexto histórico de mercado reduzido, em relação a capacidade produtiva instalada entre nós, a publicidade se tornou fundamental para ampliar as demandas de bens de consumo duráveis. De acordo como Maria Arminda Arruda este fato levou as agências de publicidade há uma nova de organização interna:

[...] é preciso muito mais esforço para convencer a poucos a consumir mais do que induzir muitos a comprar bastante. “Este fato essencial empurra o setor publicitário em direção á organização empresarial, o que, indiscutivelmente aconteceria, *Mestrando pela Universidade, na linha Instituições, Vida Material e Conflito, turma 2015. Tem experiência na área de História, com ênfase na História e Historiografia do consumo, atuando nos principais temas: Publicidade e Consumo na infância no Brasil na década de 1970. Vice coordenador do Grupo de Estudos Sobre o Consumo no Mundo Contemporâneo registrado no Diretório Nacional do CNPq da Universidade Federal de São registro (dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/3468275717655657 ) 2 Há um extenso debate nas ciências humanas sobre o termo publicidade e propaganda. Ora estes conceitos costumam aparecer como sinônimos ou como conceitos incongruentes. Os que costumam trabalhar os termos publicidade e propaganda seguindo uma distinção que se encontra na raiz palavra que existe em língua inglesa/americana nas palavras advertising e propaganda. Seguindo o silogismo, o termo publicidade só aplicaria á publicidade com fim comercial, e, o conceito propaganda só se aplicaria com a finalidade política e ideológica. Contudo, considero que estas definições não podem ser tão estanques, pois correm o sério risco de tornar conceitos históricos em conceitos ahistóricos. Para tanto ao longo do texto utilizarei os termos publicidade e propaganda como sinônimos, pois sigo nos termos dispostos das Normas Padrão que regulam a atividade publicitária em caráter nacional, onde os termos Publicidade e Propaganda foi nos termos do art. 2º do Dec. nº 57.690/66, qualquer forma remunerada de difusão de idéias, mercadorias, produtos ou serviços por parte de um anunciante identificado. Considero que trabalhar nestes termos recuperamos a historicidade dos conceitos que devem ser compreendidos ao longo do tempo e espaço.

com a presença dos grandes oligopólios, mais foi certamente acelerada pela vigência dessas condições”. (ARRUDA, 1978: 114)

3

Contudo, a publicidade ainda não dispunha na década de 1950 e meados da década seguinte, de veículos de comunicação na qual suas mensagens publicitárias pudessem circular de modo massivo, para incentivar que cada vez mais pessoas aderissem ou almejassem uma organização social em que o consumo de bens ou produtos industrializados informasse e/ou incentivassem valores sociais e culturais. Este processo ocorreu em um novo momento de inflexão do modo de produção capitalista brasileiro, promovido no regime militar, em um momento de internacionalização do capital (ORTIZ, 1988: 114), a consolidação deste processo encontrou seu auge na década de 1970. Cabe ressaltar, como não nos deixa esquecer o historiador Fernando Novais: capitalismo não é sinônimo de sistema econômico, o autor ressalta que capitalismo é um sistema econômico, social, político e, sobretudo, ideológico (NOVAIS & FORASTIERI, 2011). Neste momento, o desenvolvimento das agências publicitárias, foi alavancado por meio da base tecnológica fornecida pelo Sistema Nacional de Telecomunicações e a da modernização dos grandes conglomerados de impressos como da Editora Abril e audiovisuais como a Rede Globo de Televisões. Cabe ressaltar, que essas transformações ocorreram em consonância com o crescimento dos centros urbanos3, cujo espaço foi à base do mercador consumidor a ser prospectado pelas agências publicitárias e lugar da afirmação e disputa de novos bens simbólicos da moderna tradição brasileira (ORTIZ, 1998: 114) Desta forma, as mensagens publicitárias se espraiaram podendo assim: agir de forma massiva e intensa para todo um público que, consumidor ou não, terá diante de si uma disseminação de representações e concepções de mundo em que a publicidade se tornou porta voz principal deste processo de modernização brasileira. É preciso salientar que a consolidação de nosso “Capitalismo Tardio”

4

cimentou

novas modalidades de dominação social e ideológica que passaram a ser transmitidas, 3

Daniel Roche, historiador francês do consumo, ao estudar o consumo de corte na França no século XVIII foi enfático ao dizer que as transformações do consumo na corte francesa não residem na sociedade de corte, ou seja, na esfera privada, mas nas mudanças na função nas cidades francesas no decorrer do século XVII e nos novos valores em relação ao consumo. Esta conclusão nos serve para entender o desenvolvimento de uma Sociedade de Consumo que se desenvolveu no espaço urbano. C. f. ROCHE, Daniel. Histórias das coisas banais.Nascimento de uma sociedade de consumo séculos XVII e XIX. São Paulo, 2000, p. 46. 4 Utilizo o conceito “Capitalismo Tardio” baseado em João Manuel Cardoso de Mello. Para o autor “Capitalismo Tardio” se refere ao nosso processo de industrialização retardatária trouxe nosso processo de modernização baseado em uma estrutura social em que o consumo de bens industrializado acirraria, ainda mais, os contrastes sociais ao combinar profundo desenvolvimento em nosso sistema capitalista combinando com profundas desigualdades sociais. C.f. MANUEL, João Manuel Cardoso de. Capitalismo Tardio. Cia das Letras. 1976, sobretudo, o terceiro capítulo a industrialização retardatária.

4

também, pela publicidade e cujo a realização material correspondiam as condições de classe e gosto5. Isto não quer dizer, por outro lado, que fatores como: o Estado e seu aparato burocrático; a organização no mundo do trabalho e componentes das tradições culturais perdeu sua importância na produção e reprodução das relações sociais, pelo contrário, muito desses componentes ganharam maior alcance por meio da linguagem publicitária ressignificado assim, o projeto de dominação ideológica da burguesia. As novas formas de configuração social em que a publicidade se tornou porta voz refletem as contradições históricas em nosso capitalismo. Desta forma, os anúncios de mercadológicos aprofundaram preconceitos latentes em nossa sociedade e conservou nosso desenvolvimento combinado e desigual6 por meio de uma esfera pública burguesa7. Foram sob estas bases que a linguagem publicitária trabalhou na tentativa de abrir novos nichos de mercados para bens de consumo que, em muitos casos, era inédito entre nós, inclusive para grande burguesia. Neste sentido, a consolidação de um mercado de massas, haja vista a nossa desigualdade social e os distintos gostos construídos historicamente, a estratégia de segmentação de mercado se tornou um artifício fundamental para o mercado publicitário fazendo com que determinados bens ou serviços se acomodassem com maior sucesso na acumulação de capital. A publicidade investiu pesado na segmentação do mercado para jovens, homens de meia idade, idosos, donas de casa e crianças. A de se dizer que, a segmentação do mercado não significou, de forma alguma, homogeneização do nicho de mercado que pretendia se

5

Não quero com esta afirmação propor estruturas sociais rígidas que impedem que indivíduos de rendas e formas de sociabilidades diferentes consumam o mesmo produto ou bem de consumo. Pois o consumo e a forma de consumir é uma das formas com que os indivíduos lutam por status social e procuram superar sua condição de classe. C. f. BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas, São Paulo. Perspectiva, 2005. Contudo, quero ressaltar que o capital cultural e econômico são os principais determinantes para que determinados indivíduos ou grupos consumam determinados bens ou produtos. 6 Há importantes estudos sobre a formação e as contradições do capitalismo brasileiro. C.f. CARDOSO, Fernando Henrique. “O modelo político brasileiro” in ____. O modelo político brasileiro e outros ensaios. 2ª edição. São Paulo, Difusão Européia do Livro, 1973; ____. e FALETTO, Enzo. Dependência e desenvolvimento na América Latina. 8ªedição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004; FERNANDES, Florestan. “Capitalismo dependente e imperialismo” in ____ Em busca do socialismo. Últimos escritos e outros textos. São Paulo: Xamã, 1995. FERNANDES, Florestan. Sociedade de classes e subdesenvolvimento. Rio de Janeiro: Zahar, 1996. 7

A utilização de esfera pública é feita através das afirmações do historiador inglês JamesThompson. Sobre a constituição de uma esfera pública, o historiador aponta como principal definidor um dos principais nomes da segunda geração da Escola de Frankfurt Jurgen Habermas. Habermas define como cimentos da esfera pública a partir do aparelho do Estado e da ação da imprensa, estes dois motores, em consonância com os sujeitos históricos, seriam os formadores principais de uma esfera pública que incorporava os pressupostos de uma sociedade burguesa. C.f. THOMPSON, James. British Political Culture and the idea of Public Opinion, 18671914. Cambridge: Cambridge University Press, 2013, pp. 7-9.

5

atingir. Desta forma, podemos dizer que no caso brasileiro, consumo de massa e segmentação de mercado não são antagônicos, mas sim parte de um mesmo processo interligado. É dentro deste contexto, que os historiadores Olga Brites e Eduardo Silveira Neto nos diz que a publicidade infantil8 começou, de forma cada vez mais intensa, a identificar a criança em seus anúncios como consumidor “autônomo”. Esta modelo publicidade, segundo os autores, se consolidou, entre nós, na década de 1970 em consonância com o nosso desenvolvimento capitalista (BRITES & NUNES, 2012: 89) Cabe ressaltar que embora o mercado publicitário brasileiro direcionado às crianças passou a vê-las como consumidores “autônomos” isto não garantiu que os mesmos estivessem livres, como os adultos, para consumirem ao seu gosto e poder aquisitivo. Embora o mercado publicitário os compreendesse como consumidores “independentes”, as crianças continuaram tutelada pelos adultos, ou seja, os que detinham o poder aquisitivo que propiciava o consumo infantil. É justamente nos anos de 1970 que, a linguagem publicitária que entendia a criança como “autônoma” em suas escolhas começou a se espraiar nos grandes centros urbanos no Brasil. Na cidade de São Paulo temos a Editora Abril como principal precursora desta forma de fazer publicidade infantil que caracteriza o Brasil contemporâneo nos dias de hoje. A Editora Abril se modernizou na década de 1960 e na década de seguinte se tornou o principal conglomerado de impressos do Brasil com atuação importante nas grandes cidades brasileiras e, sobretudo, na cidade de São Paulo, como principal veículo impresso utilizado pelas agências publicitárias para divulgar a modernidade que poderia ser “conquista” por novas relações no espaço publico que invariavelmente envolvia o consumo de bens. As diversas revistas produzidas pela Editora Abril foram de fundamental importância para expansão e segmentação do mercado de bens e produtos industrializados que imprimiram, entre nós, uma estética social cada vez mais americanizada. Maria Celeste Mira realizou importante estudo sobre a segmentação de mercado, utilizado pela Editora Abril, para cooptar cada vez mais consumidores de setores médios e altos da sociedade brasileira. É importante ressaltar, como demonstra a autora, que as publicações das revistas produzidas pela editora em questão operavam para além das questões

8

Não cabe aqui resgatar todo o debate desenvolvido na historiografia sobre o que é infância. Cabe-nos explicitar que a infância é uma construção social ao longo do tempo e espaço. Para conferir o debate sobre a construção histórica da infância ver: ARIÈS. Philippe. História social da infância e da família. Rio de Janeiro, Guanabara, 1981. [Tradução Dora Flaksman]; GÉLIS, Jacques. A individualização da criança. In: ARIÈS, Philippe; CHARTIER, Roger. História da vida privada v. 3. São Paulo: Companhia das Letras, 1992; DELL PRIORI, Mary (orgs) História da infância no Brasil. São Paulo, Companhia das Letras, 2002

6

de poder aquisitivo do consumidor em potencial, elas transitavam nas questões de gostos construídos e ressignificado socialmente (MIRA, 2010). As revistas, ao contrário de veículos como a TV, por necessitarem de investimentos mais específicos em virtude de seu diminuto alcance, em relação à televisão, passaram cada vez mais, a atuarem no fracionamento do mercado em consonância com as necessidades do patrocinador. Se por um lado a investigação histórica de Maria Celeste Mira sobre a divisão de mercado apresentadas-nos magazines da Editora Abril é reveladora sobre a atuação do mercado, por outro lado, a autora não percebeu o importante setor de mercado que na década de 1970 se tornou importante alvo dos patrocinadores: as crianças. Pesquisas empíricas realizadas por mim, em outros momentos de minha vida acadêmica, e agora no mestrado revelaram que revistas infantis como os HQs da Turma da Mônica e da Wall Disney e outras revistas da Editora Abril, destinados ao público adulto, foram de suma importância para que o mercado de bens e serviços alcançassem os consumidores infantis na cidade de São Paulo9. As propagandas realizadas nesses impressos consolidaram uma linguagem publicitária que percebiam as crianças como consumidores “independentes”, ou seja, consumidores capazes de escolherem que bem ou produto poderiam ser consumidos de acordo com suas vontades. Se por um lado foi na década de 1970 que entre nós se consolidou uma linguagem publicitária infantil de forma mediata e imediata tendo como alvo a criança como sujeito “autônomo” e o modelo de sociabilidade impactados pelo consumo com características de uma

americanização, foi nesta mesma década que os debates sobre o uso da publicidade infantil entram, de forma incisiva, para a pauta de discussões de palestras, congressos, colunas de jornais e revistas publicitárias. As discussões realizadas sobre a regulamentação infantil entre publicitários, setores da comunidade cível e setores sociais ligados de forma mais direta ao mercado, em diversas

9

Em minha monografia analiso as publicidades voltadas para o publico infantil de modo mediato e imediato. As publicidades que chamo de modo mediato são aquelas que mesmo voltadas de modo direto para os pequenos eles prevêem o intercambio do adulto para a realização da compra do produto. Uma das frases características deste modelo de se chegar ao consumidor infantil é: “peça para sua mãe comprar”. Os anúncios que defino como imediato são aqueles que no enunciado da propaganda a apenas a criança aparece como alvo, como se apenas o pequeno em questão tivesse o poder aquisitivo e/ou não houvesse a necessidade de um adulto para regular sua escolha. C.f SILVA, Deividi de Santana. Propaganda e Consumo na Infância: Construção da criança como consumidor “autônomo” (década de 1970). Monografia apresentada na Universidade Federal de São Paulo. 2014; ver também ROSSI, Eliane Pompeu. A criança consumidora: a genealogia de um fenômeno contemporâneo 1950-2000. Tese de mestrado apresentada a Universidade Federal de Urbelândia.2007.

7

revistas, colunas de jornais e fóruns publicitários dão o ar e a graça de minha analise realizada no primeiro capítulo de minha tese de mestrado. Que tipo propaganda infantil “Queremos”?

O II Congresso Brasileiro de Propaganda, realizado no Pavilhão da Bienal entre os 23 a 28 de fevereiro de 1969, no Parque do Ibirapuera, capital de São Paulo, entre suas pautas realizou discussões direcionadas à publicidade voltada de forma direta para o público infantil. Entre os publicitários reunidos não era consenso sobre a forma de se fazer anúncios infantis, mas estava claro, em boa parte dos presentes, que o setor necessitava de uma regulamentação e autonomia, principalmente, em virtude da ditadura militar implantada em 1964 e que mostrava ares de que poderia regulamentar a publicidade podendo assim: causar sérios danos ao mercado e o(s) projeto(s) de civilização cuja publicidade havia se tornado porta voz capital. Já no III Congresso Brasileiro de Propaganda, realizado no Palácio das Convenções entre os dias 17 a 20 de abril de 1978, no Parque do Anhembi, se atribuiu ao Conselho Nacional de Autoregulamentarão: CONAR, a atribuição de estabelecer e aplicar normas do Código Brasileiro de Autoregulamentarão. É importante ressaltar que: grande parte dos 50 artigos do Conar discute a regulamentação da publicidade infantil, sobretudo, no que tange o consumo de alimentos industrializados e ensino. A atribuição concedida ao Conar de regulamentar à publicidade, e de modo mais especifico a publicidade infantil, não foi fortuita. Houve uma pressão da própria categoria de profissionais ligados a propaganda e setores da comunidade civil organizada, sobretudo por meio de colunas publicitárias, de debates em organizações publicitárias e outros setores da sociedade para que as publicidades dirigidas aos pequenos passassem por um crivo de fiscalização mais atuante10 Desta forma, a presente apresentação irá mostrar discussões sobre publicidades infantis iniciadas no II Congresso de Propaganda Brasileira, em 1969, sobre publicidade

10

Já existia várias organizações de publicitários que procuravam regulamentar a profissão como: ANP (Agência Nacional de Propaganda), APP (Associação Paulista de Propaganda), ABP (Associação Brasileira de Propaganda), ACP (Associação Carioca de Propaganda) e projetos atuantes como o IVC (Instituto Verificador de Comunicação) atuante desde 1962 e seguido pelas principais agências de propaganda, o código de ética incorporado a lei 4. 680/65 que se tornou decreto de lei 57.690/66. Contudo, grande parte das agências achavam insuficiente essas normas para dar basilar uma atividade crucial para o desenvolvimento da sociedade brasileira.

8

infantil que continuaram em vários meios11, principalmente na cidade de São Paulo e Rio de Janeiro, cidades em que o nosso “Capitalismo Tardio” encontrou sua forma mais acabada, ao III Congresso de Propaganda Brasileira, em 1978, no qual se criou o CONAR. Muito embora, não serão discutidos nesta apresentação de modo mais detido, deve se pontuar que os debates analisados estão em consonância com as transformações ocorridas na cidade de São Paulo como: crescimento urbano, transformações no parque industrial, novas de vivências públicas impactados por novas formas de consumo. O debate sobre a regulamentação publicitária e a propaganda infantil, de modo mais específico, não foi exclusividade do Brasil, pelo contrário, países onde o modo de produção capitalista já possuía certa maturidade e onde os anúncios de caráter mercadológico foram peças chaves na construção de uma Sociedade de Consumo Moderna, órgãos reguladores da atividade profissional eram atuantes. Este processo se deve a dois fatores fundamentais: a expansão da propaganda como elemento fundamental no processo de acumulação capitalista e o processo de mundialização da cultura ao longo do século XX12. Muito, embora processos como a feitura publicitária e órgãos da regulamentação começaram a ser generalizado ao longo do globo terrestre isto não que dizer que foram iguais. Foram, em alguns casos, parecidos em muitos aspectos, mas nunca iguais. Desta forma, os processos históricos devem ser entendidos ao longo do tempo e espaço. Ou seja, dentro do movimento histórico as quais estão inseridos de acordo com as condições materiais e culturais específicas. Em se tratando de órgãos de regulamentação da publicidade e, em especifico, a propaganda infantil que nos interessa para a presente apresentação, os processos históricos que mais nos influenciaram foram os de origem estadunidense e francesa, muito embora outros órgãos regulamentários como de países como a Alemanha, Suíça, Bélgica tenham sido

11

Há ANP (Agência Nacional de Propaganda), APP (Associação Paulista de Propaganda), ABP (Associação Brasileira de Propaganda), ACP (Associação Carioca de Propaganda). Entre outras associações do gênero, nos anos de 1970, discutiram em seus congressos os modos de fazer publicidade infantil. As discussões variavam de temas como: pesquisas de mercado, formas de fazer o anúncio em si e debates éticos e morais, entre outros temas. Tem sido função do pesquisador deste projeto, junto a Associação Nacional de Memória da Propaganda, organizar estes congressos com a finalidade de ajudar a atual pesquisa e futuras pesquisas de outros pesquisadores, haja em vista a importância do material para se compreender momentos importantes da história contemporânea brasileira. 12 Sem negligenciar a especificidade histórica Renato Ortiz nos diz que o século XX é marcado por um processo de mundialização. Para o autor, no século XX, as cidades ao longo do globo terrestre passam se assemelhar cada vez mais entre si por compartilhar códigos sociais que são muito próprios entre si. Este espaço impessoal, no qual o indivíduo se transforma um usuário, isto é, em alguém capaz de decodificar a intengibilidade funcional a malha que o envolve. O autor nos ressalta que estas construções sociais mundializadas estão impregnadas pelas tradições que a legitimam. C. f ORTIZ, Renato. Mundialização e cultura. Rio de Janeiro. Ed. Brasiliense. 1994

9

citados, mas raramente aprofundados. Farei uma analise, nos próximos parágrafos, de dois artigos que mostram posições dissonantes quanto à regulamentação publicitária infantil e suas possíveis implicações na forma que a propaganda se consolidou entre nós. Na Revista Bloch de Comunicação, o artigo traduzido de Elisabeth Gérin, intitulado Código de Publicidade para Jovens13, nos é muito esclarecedor para entendermos um projeto de publicidade infantil inspirado Federação Francesa de Publicidade destinada a jovens e crianças. Segundo o documento a propaganda deveria ser regulada por um órgão que não fosse composto por apenas publicitários e sim por uma comissão mista. Elogiando a eficácia de uma composição mista de profissionais, a autora escreveu:

[Os] membros da Federação Francesa de Publicidade, psicólogos, educadores, estabeleceram um conjunto de princípios a serem respeitados pelas campanhas publicitárias destinados aos jovens [ao longo do texto a autora parece utilizar jovem e criança como sinônimos ou processos integrados]. Foi assim que nasceu o Código da Publicidade destinada á Infância, cuja eficácia dedo se fez sentir no plano da higiene mental e da proteção da juventude14

Como observamos acima, a propaganda destinada aos mancebos e pequenos deveria ser guiado por uma lógica que não corresponde a fins mercadológicos, mas sim contribuir para “uma integração cívica e social” 15. Gérin conclui seu texto dizendo que: “para o estudo das campanhas de publicidade destinadas á criança, os publicitários não devem hesitar em consultar educadores, psicólogos e pais”. Tal prática de fazer com que a propaganda fosse, acima de tudo, um veículo formativo é contrária a prática principal da publicidade comercial que é “lubrificar” o mercado (LAMBERT, 2000: 125).

O vínculo que se estabelece entre os anúncios

mercadológicos e os interesses econômicos são intrínsecos. Pois, o desenvolvimento da propaganda esta diretamente ligada com a dinâmica de acumulação capitalista. A intervenção de outra categoria social na feitura publicitária era vista com maus olhos pelos publicitários. Desde a década de 1930 quando nossa publicidade passou a ser fortemente influenciada por agências estadunidenses, o discurso imperante entre os profissionais da propaganda eram os arautos da modernidade que, entre nós, se pretendia

13

REVISTA BLOCH DE COMUNICAÇÃO, São Paulo, março de 1972, p. 35 Idem, 35 15 Idem, 36 14

10

instalar. Data deste momento, uma crescente mobilização dos publicitários em regular suas atividades cujo auge foi à criação do CONAR criado em 1978. Se a intervenção de outros setores na atividade daqueles que profissionalmente “fabricam” anúncios já era vista com maus olhos pelos mesmos. Na década de 1970, as intervenções deste gênero passam a ser visto como uma ameaça para atividade publicitária de forma mais incisiva. Muito embora, os anos de 1970 foi o momento em que atividade publicitária encontrou seu auge alavancado pelo “crescimento do parque industrial e do mercado interno de bens materiais, fortalece-se o parque industrial de produção de cultura e o mercado de bens culturais” (ORTIZ, 1988: 115) Não podemos esquecer que estávamos no regime militar onde a censura era algo vigente e que poderia ameaçar as atividades econômicas e culturais que, em certa medida, estavam integradas em nossa sociabilidade moderna. Muito embora, é preciso entender que a censura possuía duas faces: “uma repressiva, outra disciplinadora. A primeira diz não; a outra é mais complexa, afirma e incentiva um tipo de orientação” (ORTIZ, 1988: 115). É sobre esta última que estava assentada a publicidade no regime militar. Contudo, os profissionais envolvidos temiam que a intervenção pudesse trazer prejuízos para atividade. Sobre a preocupação fundamental do publicitário na década de 1970 Ricardo Ramos nos diz: “o publicitário é um profissional que esta interessado em liberdade de imprensa, liberdades individuais e abertura política” 16. Muito embora, a tão sonhada liberdade professada era mais questionada quando forças do próprio Estado autoritário ameaçava seus interesses17. Devemos atentar para a relação entre setores da comunidade civil e o golpe militar. Setores médios e da alta burguesia foram, em certa medida, apoiadores do golpe e regime militar, pois foi por meio do desenvolvimento adotado pelo Estado autoritário que estes setores mais cresceram. Os publicitários eram, em grande medida, signatários do golpe e, inclusive, apoiando a censura da impressa que se opunham de forma drástica ao governo quando esta não ameaçava interesses econômicos. É certo que houve tensão entre publicitários e o regime militar. Contudo, as manifestações divergentes de profissionais da propaganda ao governo militar, não raro, era 16

JORNAL DA TARDE, São Paulo, segunda feira, 17 de abril de 1977. A tensão entre o setor de anúncios mercadológicos e a censura militar nunca se deu no plano estrutural do governo. A conferência do publicitário Mauro Salles na Escola Superior de Guerra é bem sintomática para entender que tipo de liberdade os profissionais do setor estavam interessados: “é de uma imprensa livre economicamente, com sua sobrevivência garantida pela publicidade julgada em bases técnicas, que se deve esperar uma imprensa livre em termos políticos. É certo que estamos todos ainda com problemas da censura. Mas também é certo que os censores são passageiros e a censura não se institucionalizará e não há nenhum sinal de que vamos marchar na direção inversa do progresso”. C.f. SALLES, Mauro. Conferência Superior de Guerra, 04 de setembro de 1974, p. 6. 17

11

em virtude de que o mesmo regime sufocasse o mercado e os projetos de modernidade que grande parte dos publicitários se dizia portadores. Outro conflito que um órgão de regulamentação publicitária nos moldes franceses poderia trazer ao um nicho publicitário que estava voltado para a criança era o caráter de verdade e de racionalidade que segundo o documento a publicidade deveria ter. Em seu artigo II, o documento nos diz: “a publicidade destinada á criança deve empregar argumentos verídicos, precisos acessíveis e despidos de quaisquer segundas intenções” 18. Novamente o projeto de regulamentação dos anúncios infantis nestes moldes franceses apresenta dissonâncias com o modelo de propaganda que se consolidou entre nós, inclusive ao destinado as crianças. Analisando a linguagem publicitária em todos os públicos, Ricardo Ramos nos diz que na segunda metade da década do século passado houve uma “mudança radical na forma e no conteúdo (...) com uma total libertação de cerimônias em sua linguagem e em afastamento paulatino da sistemática argumentação racional para sempre maior apelo ás emoções mais provocadas pelo condicionamento social que as individuais” (RAMOS, 1972: 65) Ou seja, na publicidade comercial, o caráter de “verdade” ou de racionalidade não é uma questão, uma vez que a publicidade comercial moderna se consolida por criar discursar em uma linguagem em que o individuo ou grupo social aparece associado a uma experiência que determinado bem ou serviço de consumo pode proporcionar. A racionalização esta ligado na publicidade no que os profissionais da propaganda costumam chamar de briefing. Onde aparece dados característicos do consumidor como faixa etária, renda, preferências entre outros fatores ligados a otimização da vendas. Já no layout é a publicidade propriamente dita. Se algumas propostas de regulamentação dos anúncios infantis poderiam causar certos prejuízos para as agências de propaganda, inclusive danos financeiros. Outras “vozes” acreditavam que não havia a necessidade de regulamentação da publicidade infantil em relação ás propagandas destinadas aos adultos. É o caso do educador Edelweiss de Paiva Santos, o referido autor inicia seu texto mostrando-se contrário a regulamentação de anúncios publicitários voltados para crianças. Para ele será o processo de educação responsável por incutir nos pequenos desde primórdios da educação o discernimento sobre o que deve ou não ser consumido.

18

REVISTA BLOCH DE COMUNICAÇÃO, São Paulo, 1977.p. 37

12

Ele prossegue seu texto argumentando que uma possível regulamentação publicitária seria menosprezar a inteligência dos pequenos: “Você já curtiu um papo com crianças inteligentes sabe o quanto elas são perspicazes e ‘pegam’ até mais que um adulto que se crê bem avisado” 19. Seu discurso não deve se descolado do tempo de sua produção. Muito embora, o regime exceção incentivou entre nós uma indústria cultural na qual serviu como um dos suportes de sustentação ideológica do regime de governo instalado. Havia entre os profissionais da propaganda e empresas ligadas ao setor de bens e produtos infantis que um possível temor que a regulamentação da linguagem publicitária voltadas para as crianças pudesse causar danos aos seus negócios. Para tanto, o discurso de Paiva Santos estava ancorado em uma suposta pesquisa empírica realizada em uma escola com alunos, a qual o autor não cita o nome, com alunos entre doze e quatorze anos, mas que dava base para suas argumentações contrárias a qualquer intervenção estatal ou dos próprios profissionais da propaganda em regulamentar uma linguagem publicitária voltada para os pequenos. A partir dos próprios discursos dos alunos que realizaram a pesquisa o autor reafirma seu argumento. Em discursos, supostamente consciente das crianças, Paiva Santos tenta convencer seus leitores de que os pequenos eram abeis suficientes para analisarem a propagandas até mesmo melhor do que os adultos. A transcrição de uma fala de algumas crianças é bem sintomática para entender os propósitos do autor: “Meu Deus, por tudo de bom que o senhor nos deu, mas obrigada excelente ideia dos homens que construíram uma coisa que nos atrai e nos ensina, que ela seja para o bem de todos e que só haja propagandas bonitas e boas, mas que o senhor nos proteja daquelas que nos vão fazer mal ( GIANE de Souza – 14 anos 5° l)”20. A frase é bem elucidativa quando se quer entender os argumentos do autor. A menina recorre para a proteção divina quanto às propagandas maléficas as pessoas e ressalta as propagandas “bonitas e boas” e ressalta o engenho das mesmas. Neste sentido, empresas que produzem bens ou serviços de consumo voltado para as crianças estariam e profissionais do setor estariam isentos de sua responsabilidade. Estranhamente as outras dez falas transcritas pelo autor, as crianças mostram ter discernimento sobre propagandas e recorre à proteção divina como proteção de possíveis

19 20

JORNAL O ESTADO DE SÃO PAULO, SÃO PAULO, julho, 1974, p. 30. JORNAL O ESTADO DE SÃO PAULO, SÃO PAULO, julho, 1974, p. 30.

13

males que uma propaganda nociva poderia ter. Desta forma, o autor isenta os responsáveis e colocar a educação como produtora de um censo crítico em relação a propaganda. Usar o argumento da educação e da crença em Deus é característico do próprio discurso do regime militar que, muito embora sua constituição fosse laica, a profissão de fé em discursos políticos, a legitimação da família nuclear católica e a educação eram tidas como pilares de uma sociedade civilizada e moderna, cujos militares diziam prover. Induzir as crianças colocarem tais valores em suas falas era, em certa medida, que estavam postas como ideologia do sistema. Paiva Santos, conclui seu texto justificando o uso do termo “Meu Deus”, em suas palavras: “Em primeiro, porque a tarefa era redigir uma tarefa para meu bom Deus por ocasião do dia das Comunicações e Segundo, porque só o bom Deus dará jeito nisso”21.

Conclusão e novas questões.

Em suma, procurei tratar aqui de algumas discussões que estão sendo elencadas no primeiro capítulo de minha tese de mestrado. As fontes analisadas em certa medida nesta apresentação devem ser lidas de acordo com outros movimentos históricos que são fundamentais para entender a articulação de um mercado publicitário para o publico infantil: A maturidade de nosso “Capitalismo Tardio”; o regime militar e a ameaça de censura para os veículos de comunicação ligados ao regime; uma sociedade de bens de consumo tidos como da modernidade capitalista; os debates sobre a regulamentação publicitária; a feitura das cidades para este novo modelo de modernidade, em particular a cidade de São Paulo recorte físico da pesquisa. Contudo, devo ressaltar que outras fontes estão sendo consultadas a partir de questões que a problemática da pesquisa possa trazer. Para tanto, estou analisando outros documentos com a finalidade de responder algumas questões que a pesquisa em desenvolvimento têm me suscitado: Até que ponto este debate sobre a regulamentação da publicidade infantil implicou, ou não, a forma como os profissionais da propaganda produziam anúncios? Os dados sobre as pesquisas de mercado como o IBOPE22, compulsados pelas agências de publicidade para conquistar mercado alterou a forma de se fazer publicidade para este nicho de mercado e se é possível observar discussões como aqui expostas neste tipo de material? 21 22

JORNAL O ESTADO DE SÃO PAULO, SÃO PAULO, julho, 1974, p. 30. Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística

14

BIBLIOGRAFIA

FONTES IMPRESSAS. PROPAGANDA & MARKINTING. JORNAL DA TARDE, SÃO PAULO JORNAL O ESTADO DE SÃO PAULO REVISTA BLOCH DE COMUNICAÇÃO

OBRAS CITADAS

ARIÈS. Philippe. História social da infância e da família. Rio de Janeiro, Guanabara, 1981. [Tradução Dora Flaksman]. ARRUDA, Maria Arminda do Nascimento. A embalagem do Sistema: A publicidade no Capitalismo Brasileiro. São Paulo. Livraria Duas Cidades, 1978. BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas, São Paulo. Perspectiva, 2005. BRITES, Olga, NUNES, Eduardo Silveira Netto. Infâncias e propagandas em revistas: anos de 1920-1950. Revista tempos modernos. Vol.16, 1° semestre, pp.87-118. São Paulo. PUC SP. 2012. CARDOSO, Fernando Henrique. “O modelo político brasileiro” in ____. O modelo político brasileiro e outros ensaios. 2ª edição. São Paulo, Difusão Européia do Livro, 1973. DELL PRIORI, Mary (orgs) História da infância no Brasil. São Paulo, Companhia das Letras, 2002. ____. e FALETTO, Enzo. Dependência e desenvolvimento na América Latina. 8ªedição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004. FERNANDES, Florestan. “Capitalismo dependente e imperialismo” in ____ Em busca do socialismo. Últimos escritos e outros textos. São Paulo: Xamã, 1995. FERNANDES, Florestan. Sociedade de classes e subdesenvolvimento. Rio de Janeiro: Zahar, 1996. GÉLIS, Jacques. A individualização da criança. In: ARIÈS, Philippe; CHARTIER, Roger. História da vida privada v. 3. São Paulo: Companhia das Letras, 1992. THOMPSON, James. British Political Culture and the idea of Public Opinion, 1867-1914. Cambridge: Cambridge University Press, 2013.

15

MANUEL, João Manuel Cardoso de. Capitalismo Tardio. Cia das Letras. 1976. MIRA, Celeste Maria. O leitor e as bancas de revistas: O caso da Editora Abril. Tese de dourado em Ciências Sociais apresentada na Unicamp. 2010. NOVAIS, Fernando Antônio e Silva, Forastieri da. (organização e introdução) Nova História em perspectiva (vol. I). Cosac Naify. 2011. ORTIZ, Renato. A moderna tradição brasileira: Cultura brasileira e Indústria Cultural. Rio de Janeiro Ed. Brasiliense. 1988. ORTIZ, Renato. Mundialização e cultura. Rio de Janeiro. Ed. Brasiliense. 1994. RAMOS, Ricardo. Do reclame a comunicação. In. Anuário Brasileiro de propaganda, 1970/1971. ROSSI, Eliane Pompeu. A criança consumidora: a genealogia de um fenômeno contemporâneo 1950-2000. Tese de mestrado em história apresentada a Universidade Federal de Urbelândia.2007. ROCHE, Daniel. Histórias das coisas banais. Nascimento de uma sociedade de consumo séculos XVII e XIX. São Paulo, 2000. LAMBERT, M. B. M. A. O novo papel do profissional da informação na sociedade da informação. Ciência da Informação, Brasília, v. 35, n. 3, p. 125-135, set/nov. 2000. SALLES, Mauro. Conferência Superior de Guerra, 04 de setembro de 1974 SILVA, Deividi de Santana. Propaganda e Consumo na Infância: Construção da criança como cosumidor “autônomo” (década de 1970). Monografia apresentada na Universidade Federal de São Paulo. 2014.