ESTE REI QUE EU ESCOLHI - PDF Leya

irmãos tocaram à campainha da porta da prima Leocádia. — Estava a ver que chegavam atrasados! — disse ela, do lado de lá da porta, como se dissesse «b...

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ESTE REI QUE EU ESCOLHI 14

Capítulo 1

A prima Leocádia tinha dito: às cinco. E quando a prima Leocádia dizia às cinco, ela queria exactamente dizer às cinco. E não às cinco e dez, ou às cinco menos um quarto. Cinco eram cinco. Para os relógios certos e para a prima Leocádia. — Herdei do meu bisavô inglês este gosto pela pontualidade — dizia muitas vezes a prima Leocádia. Embora na família as pessoas às vezes se interrogassem onde é que a prima Leocádia teria ido descobrir um bisavô inglês. Mas isso era questão em que as pessoas só pensavam de longe a longe, até porque — diziam — com a idade da prima Leocádia, todos tinham direito a escolher um bisavô em qualquer canto do mundo. Se desse bisavô inglês a prima Leocádia tinha herdado o gosto (Fernando, Vasco, e Mafalda diriam «mania»…) da pontualidade, de quem ela herdara o gosto pela fitinha de veludo que sempre trazia ao pescoço, em jeito de colar, isso 7

é que ninguém sabia. E mais uma vez ninguém parecia importar-se muito em sabê-lo. O certo é que a prima Leocádia tinha dito às cinco — e ali estavam eles ainda em casa, com o ponteiro do relógio a aproximar-se perigosamente da hora marcada. — Mas quando é que vocês estão prontos, irmãozinhos da minha alma? — perguntava o Vasco. — Não te sabia tão ansioso por chegares a casa da prima Leocádia… — troçava Mafalda, sem se decidir entre a calças de ganga ou uma saia mais «á senhora», mais como a prima gostava. — Não estou ansioso por chegar a casa da prima, estou é cá com uma fome que nem vejo e já são mais que horas de lanchar. Ela costuma ter lá aquele bolinho de chocolate, carregadinho de natas, que é uma maravilha… — Interesseiro… — resmoneou Fernando, ao mesmo tempo que arrumava os livros que trouxera, na pasta, do liceu. — Olha o santinho! Não me venhas dizer que vais recusar uma fatiazinha de bolo, quando lá chegares! — Recusar, não recuso, mas também não estou assim a pensar nisso como tu. Até parece que passas fome, ou que só comes chocolate quando vais a casa da prima Leocádia. A voz da mãe, no corredor, veio pôr fim à conversa: — E se vocês, em vez de estarem para aí a discutir, se despachassem para chegarem a horas? A prima Leocádia morava em casa muito antiga ao cimo da Rua da Saudade, ali para os lados de Sé. Subia-se a Rua da Madalena, entrava-se pela de Santo António, virava-se à direita no Largo de S. Martinho («quem chamou “largo” a isto, com certeza tinha as medidas avariadas», 8

resmungava sempre Fernando quando lá ia), e diante dele ficava a rua, íngreme e estreita, e ao fundo dela a casa da prima Leocádia, com a sua enorme porta de Madeira e um lampião, ambos mais velhos do que ela. Empurrava-se a porta («é preciso comer um bife», dizia Vasco), e entrava-se num patamar com azulejos nas paredes. Subiam-se dois lances de escadas de degraus velhos que rangiam, e estava-se em casa da prima Leocádia. Aí já tinham vivido os seus pais. Aí ela nascera, crescera, casara, enviuvara, e ficara. Aí se habituara à pontualidade e à fita no pescoço. Aí se habituara também a sentir-se quase noutro país, de cada vez que de lá tinha de sair para visitar algum parente ou amigo — todos eles a morar em prédios altos e iguais, em ruas às vezes sem nome, e onde ninguém se conhecia. No bairro todos conheciam a prima Leocádia. A «Senhora Dona Leocádia», como Ihe chamava o merceeiro, o droguista, o sapateiro, a capelista, o rapaz de leitaria, e o homem da fruta. Que, para a prima Leocádia, eram, respectivamente, o Sr. Costa, o Sr. Manuel, o Sr. Alves, a menina Celeste, o Carlos, e o Sr. Lopes. Todos eles uma espécie de aldeias daquele pequeno país que era o seu. O marido da prima Leocádia tinha sido capitão do exército, e talvez mais a ele que ao tal desconhecido bisavô, ela tivesse ido buscar o gosto da pontualidade. Mas ela era de outra opinião: — Muito antes de conhecer o Ataíde, já eu era assim. Que a prima Leocádia, durante toda a sua vida de casada, sempre tratara o marido pelo apelido. Às vezes o Fernando, o Vasco e a Mafalda queriam recordar-se do nome próprio desse primo que eles já não tinham 9

conhecido, e não eram capazes. E mesmo as pessoas a quem eles perguntavam franziam o sobrolho, pensavam, repensavam, e não atinavam com o nome. Ataíde. Mais nada. Às vezes «o meu Ataíde», mas nada mais do que isso. E para os vizinhos era, obviamente, «o senhor capitão». Às vezes a Mafalda sentia um pouco pena dele, recordado apenas pela patente e pelo nome de família. Mas depois pensava que tal não tinha sido obstáculo à dedicação da prima Leocádia. E isso era o importante. Chamasse-se ele António, Pedro, Guilherme, ou simplesmente Ataíde. Batiam as cinco horas no sino da Sé quando os três irmãos tocaram à campainha da porta da prima Leocádia. — Estava a ver que chegavam atrasados! — disse ela, do lado de lá da porta, como se dissesse «boa tarde, estão bonzinhos, façam favor de entrar». — Deram agora mesmo as cinco — respondeu Vasco, como se dissesse «bem, obrigado, e a prima, com vai passando?» Ela fechou a porta com mais de vinte ferrolhos, enquanto ia dizendo: — De gente assim pontual é que eu gosto. — Se calhar o bisavô inglês da prima também era nosso bisavô ou trisavô… — disse Vasco, sempre morto por fazê-la arreliar. Mas desta vez ela pareceu não ouvir. Embora não o confessasse a ninguém, a prima Leocádia já estava a ficar um bocado surda. — Surda… Ouve só o que Ihe convém! — costumava dizer o pai, lá em casa, rindo. E, de resto, quando se está prestes a chegar aos oitenta, ter o ouvido um pouco menos aceso é, decerto, o 10

mínimo de que uma pessoa se pode queixar. E a prima Leocádia só se podia queixar disso. — Aquilo é de viver ao lado da Sé: ficou rija como a pedra — dizia também o pai. Ou talvez fosse — quem sabe — herança de outro qualquer desconhecido bisavô. — Eu não disse, eu não disse, que havia bolinho de chocolate? — bichanou Vasco para os irmãos, esfregando as mãos. — Olhe lá, tu não terás algum bisavô inglês que um dia tenha estoirado de tanta comida? — perguntou Mafalda. Mas Vasco nem Ihe respondeu, ocupado como estava a ajudar a prima Leocádia a cortar as fatias, e a pôlas em pratinhos de loiça. A Mafalda conhecia bem aquela loiça. Sabia que a prima Leocádia a usava apenas quando eles lá iam a casa. E sabia que no fim do lanche, fosse ele bolo de chocolate ou outra coisa qualquer, a prima Leocádia havia de dizer: — Quando eu morrer, este serviço de chá é para a Mafalda. E ela ficava sempre sem saber o que responder, todas as palavras a fugirem-lhe da boca e da ideia. Depois, quando chegava a casa, acabava por se sentir palerma, que diabo, bem podia já ter ensaiado umas palavras para dizer na altura própria, pois a cena repetia-se sempre que a prima Leocádia os convidava para lanchar. Geralmente durante as ferias, pois em tempo de aulas era difícil arranjar tempo, ainda por cima com os horários que eles tinham no liceu, a saíram já perto da noite, ou mesmo pela noite dentro. Por isso, hoje eles estavam ali os três, as férias de Natal há pouco começadas. Bebiam o chá quente nas 11

chávenas às pintinhas vermelhas que pareciam papoilas. E iam trincando as fatias de bolo, «devagarinho que é para renderem mais», dizia o Vasco. E a prima Leocádia contava muitas histórias de quando era nova. E lembrava-se de tudo. Desde «aquele vestido encarnado às bolinhas que a minha mãe me vestiu no dia em que se implantou a República», até «aos saquinhos de alfazema que punha entre as folhas do papel de carta em que escrevia ao meu Ataíde». E eles gostavam de a ouvir. Como hoje. Às vezes a prima Leocádia pára de súbito a conversa e, como se fosse a coisa mais natural do mundo deixar histórias em metade, começa a falar de outras coisas. Ou a fazer perguntas da família, dos estudos, dos amigos. Ou dos filmes a que eles foram. Porque a prima Leocádia sempre gostou de cinema, e quando era nova não faltava a uma fita do Politeama. Mas ainda mais do que cinema, a prima Leocádia gostava de teatro. Esse gosto — honra Ihe seja — fora o seu Ataíde, e nenhum bisavô estrangeiro, que Iho dera. E a prima Leocádia semicerra os olhos de cada vez que recorda «essas noites de estreia no D. Maria, no D. Amélia, no Avenida, no Apolo». Aqui, a prima Leocádia costuma sempre dizer «velho Apolo», como se algum «novo» existisse em seu lugar. E, a seguir aos teatros, vem o rol das suas preferências artísticas, «que hoje já ninguém representa como o Brazão, os Rosas, o Estêvão Amarante ou a Palmira Bastos». E quando está bem-disposta, a prima Leocádia é até capaz de recitar longas tiradas das peças de que mais gostou. Sobretudo das peças históricas, que a prima Leocádia tem a paixão das peças históricas, e da Ceia dos Cardeais, que o Vasco, o Fernando e a Mafalda já quase sabem de cor embora nunca a 12

tenham visto representar. O Vasco costuma mesmo dizer que é a sua peça preferida, porque se passa à volta de uma mesa cheia de comida… — E as tuas colecções, como vão elas? — perguntou a prima ao Fernando, entre dois goles de chá. — Vão bem. Mas agora não tenho tido muito tempo para Ihes pegar. — Não tens tido tempo porque tens colecções de tudo e de nada — refilou o Vasco. — Olhe, prima Leocádia, não há nada que ele não coleccione. São selos, são moedas, são borboletas, são pedras, são saquinhas de açúcar, são bilhetes postais, são conchas, são autocolantes, são caixas de fósforos, eu sei lá que mais. Como é que ele pode ter tempo para isto tudo? Se havia coisa que irritasse o Fernando era tocarem-lhe nas suas colecções. Defendeu-se como pôde: — Não é bem assim. Há muitas colecções que eu já não faço. Acho mesmo que a sério, só colecciono os selos e as moedas, mais nada. — Pois é, e anda sempre com uma moedinha no bolso, para Ihe dar sorte! — atiçou a Mafalda. — Para Ihe dar sorte? Ora, que disparate! Não me digas que és supersticioso?! O meu Ataíde estava sempre a dizer que isso era sinal de pouca esperteza. — Ora toma! — disse baixinho o Vasco, virando-se para o Fernando. Mas já ele respondia: — Não faça caso, prima Leocádia! O Vasco quando come bolo de chocolate fica sempre assim engraçadinho… — Se calhar é mentira, é? — insistiu Vasco. — Não é mentira que trago uma moeda no bolso, mas não é para me dar sorte ou outra tolice no género… 13

— Então para que é? — perguntou a prima Leocádia, que de algum outro bisavô deveria ter herdado a curiosidade. O Fernando fez-se muito vermelho, levou a mão ao bolso, tirou a moeda, olhou para ela durante muito tempo e disse apenas: — Para nada. Para olhar para ela. Faz me lembrar histórias de reis, de bobos, de mouros, de conquistas, de viagens, de masmorras, de lobisomens…1 — Mas que estás tu para aí a dizer? — interrompeu, intrigada a prima Leocádia. — Vês isso tudo aí nessa moedinha? Ora mostra cá. Um pouco a medo, o Fernando pôs-lhe a moeda, com grandes cautelas, na palma da mão. Foi nesse preciso momento que se ouviu grande algazarra do lado de lá da janela. Eram gritos de homens e mulheres, eram palavras que mal se compreendiam, eram os sinos da Sé a dar horas que não condiziam com as dos relógios. — Santo Deus, mas o que é que está a acontecer? — exclamou a prima Leocádia, abrindo a janela de par em par. Enquanto os três irmãos, olhando uns para os outros, murmuravam a medo: — Lá estamos nós metidos noutra!

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Ver a Espada do Rei Afonso, editado pela Editorial Caminho. 14

Capítulo 2

Mal a prima Leocádia escancarou a janela, logo uma gritaria imensa invadia a casa. O Fernando, o Vasco e a Mafalda abriram os vinte ferrolhos da porta e precipitaram-se pela escada. Não ouviram ranger os degraus e a porta de Madeira pareceu-lhes, de repente, muito leve. Descem a rua cheia já de uma multidão desconhecida, e avistam ao longe um palácio que nunca antes ali estivera. — Aquilo não era o Limoeiro? — pergunta a Mafalda baixinho, sempre com a sua vontade de querer tudo em lugar certo. — Era, mas agora não é — respondeu o Fernando. Mas logo atrás de si uma romaria de gente, estranhamente vestida, corre pelo empedrado e bate em todas as portas, enquanto uma mulher, de braços erguidos, grita Socorro e manda furiosamente tocar os sinos da Sé. — Tocai-os, almas do demónio! Tocai-os, ou nós vos arrebataremos todos de uma vez! — gritava ela. 15

Fernando olha para os irmãos e todos começam a compreender. A rua, de repente, transformou-se. Dela desapareceram o Sr. Manuel, o Sr. Alves, o Sr. Costa, a menina Celeste, o Carlos, e o Sr. Lopes. A Sé continua lá ao fundo, mas tudo o mais é diferente. E as pessoas gritam, e pegam em varapaus, em molhos de lenha e de carqueja, muitos erguendo nas mãos compridas escadas de Madeira como se fosse assaltar alguma casa. Aos gritos de «morra» misturavam-se os gritos de «viva», e não se percebia quem havia de morrer ou de viver, nem porquê. — Será que é o fim do mundo? — ouviu-se uma voz. Os três irmãos viraram-se, e deram de caras com a prima Leocádia, ali mesmo a seu lado, igualmente espantada com tudo o que acontecia na rua. Na sua rua. De repente, os três repararam que se tinham esquecido de prima Leocádia, que a supunham — onde? em que tempo? — bebendo o seu chá e recordando a sua juventude. Mas ela estava ali, de fitinha ao pescoço, sem entender nada. — Desta vez nem a prima escapou! — murmurou Vasco ao ouvido de Fernando. Mas este não pareceu muito preocupado com a sorte da prima. Encolheu os ombros e disse: — Eu só queria saber onde é que nós viemos parar. E a gritaria era cada vez maior e ninguém parecia entender ninguém. À frente da multidão que vinha rua abaixo um homem gritava: — Acudam! Acudam! Acudam que o matam! E logo o mulherio se Ihe juntou, com paus, pedras, e o mais que à mão puderam encontrar. E muitos repetiam em coro: 16

— Acudam! Acudam ao Paço que o matam! Junto de Mafalda uma mulher, de mão na anca, gritava a mais não poder: — Todos! Todos ao Paço! Que e feito da força das vossas pernas?! A Mafalda puxou-Ihe por um braço: — Quem é que vai ser morto? A mulher pareceu rebentar de fúria: — Ninguém, que aqui estamos nós para o defender! Enquanto houver braços fortes e honrados nesta cidade, ninguém Ihe toca! E correu rua fora a juntar-se aos outros. — Cada vez entendo menos… — lastimou-se Mafalda. Mas já o Vasco se afastara um pouco deles, e metia conversa com uma jovem vendedora de laranjas. E a multidão não parava de gritar: — Morte à víbora! Morte à traidora! Arraial por Portugal! E de repente, no meio de gritos da multidão, um grito da prima Leocádia: — A minha casa! Que é da minha casa? Que fizeram à minha casa? Ai, que isto é um terramoto, santo Deus! Na verdade, da casa da prima Leocádia nem rasto. Nem a porta da Madeira, nem o lampião se avistava. A rua, íngreme. Estreita e tortuosa, cobria-se de várias outras casas de paredes de taipa e adobe, parecendo quase coladas umas às outras, às vezes mal se podendo passar entre elas. Como se as casas se apertassem para sempre caber mais uma. Mas de entre elas nenhuma era a da prima Leocádia. O Largo de S. Martinho nem se vislumbrava e 17

havia muitas muralhas de pedra escura, e erguia-se um palácio para os lados da Sé. — Não se aflija, prima, que havemos de a encontrar! — sossegava-a o Fernando — Encontrar? Mas uma casa é coisa que se perca assim de um momento para o outro? Uma casa que já era dos meus pais! Pois se ainda nem há cinco minutos lá estávamos os quarto a conversar e a tomar chá! Ai, a minha cabeça, ai, belisquem-me, para ver se não estarei a sonhar! — Não vale pena, prima. Beliscá-la só servia para Ihe fazer nódoas negras, mais nada. Juro que não está a sonhar. E também juro que havemos de voltar à sua casa, ao seu chazinho… — … e ao seu bolo de chocolate — interrompeu Vasco, uma laranja em cada mão. — Mas há qualquer coisa que eu não entendo! Esta era a minha rua e já não é a minha rua, aqui moravam os meus vizinhos, e de repente não conheço nenhuma desta caras que gritam e correm, e parece que querem matar toda gente… — Toda a gente, não. Também não sejamos exagerados — disse Vasco, muito calmamente, como se continuasse na sala a prima Leocádia saboreando o bolo. — Mas tu sabes quem é que esta gente toda quer matar? — perguntou a prima Leocádia, olhos mais espantados do que se, de repente, tivesse encontrado pela frente o seu bisavô inglês perguntando-lhe as horas. — Eu cá sei quem é que esta gente quer salvar da morte! — E quem é? — perguntaram todos à uma. O Vasco começou por se fazer rogado: que pedissem todos por favor, que declarassem três vezes que não havia 18

ninguém mais inteligente do que ele, que de todos os bolos e fruta a comer dali para o futuro Ihe dessem metade, que… Mas o povo não deixou que ele continuasse com as suas graças. A correria continuou, e veio desabar mesmo junto dos três irmãos. Um homem de gibão esfarrapado agarrou-os pelos ombros, gritando: — E vós, estais por quem? Dizei depressa, se não, a minha faca vai certeira às vossa goelas! — Aí o Vasco desistiu de brincadeiras, e gritou por todos, incluindo a prima: — Pelo Mestre, bom homem, todos pelo Mestre! O homem largou-os, adiou a faca para outras goelas, e disse apenas: — Então acudi-lhe, que bem precisa! E largou rua abaixo, depressa se misturando com o demais. — Mestre? Mas qual Mestre? — perguntava a prima Leocádia levando a mão à fitinha de veludo com que o homem quase a esganara. — O último mestre que tive foi na escola, e já deve estar morto há um ror de anos. De resto, ainda estou para saber se esta gente toda se punha assim doida para o salvar em caso de aflição… Só as reguadas que aquela alma do diabo nos pregava em cada mão! Uma vez, só porque eu não sabia o nome do… Mas o Fernando, o Vasco e a Mafalda estavam pouco interessados em ouvir as desgraças escolares da prima Leocádia. — O Mestre de Avis, prima. É o Mestre de Avis que esta gente toda vai salvar, e venha lá juntar-se a eles, se quer ficar na História em sítio honrado! — disse o Fernando. 19