karl popper e o problema da demarcação1 - Departamento de

conjecturas ousadas a serem submetidas a testes rigorosos com o intuito de falseá-las ou, eventualmente, de corroborá-las ... expectativas decepcionan...

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CADERNO DE FÍSICA DA UEFS 14 (01): 1602.1-5, 2016

KARL POPPER E O PROBLEMA DA DEMARCAÇÃO1 KARL POPPER AND THE PROBLEM OF DEMARCATION

George Luis Azevedo1, Mario H. Calegari2, Kariston Pereira3, Ivani Teresinha Lawall4, Luiz Clement5 1

Mestrando do curso de Pós-Graduação em Ensino de Ciências, Matemática e Tecnologias – PPGCMT/UDESC/[email protected]

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Mestrando do curso de Pós-Graduação em Ensino de Ciências, Matemática e Tecnologias – PPGCMT/UDESC/[email protected]

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Departamento de Ciência da Computação e do curso de Pós-Graduação em Ensino de Ciências, Matemática e Tecnologias – PPGCMT/UDESC/[email protected]

Professora do Departamento de Física e do curso de Pós-Graduação em Ensino de Ciências, Matemática e Tecnologias – PPGCMT/UDESC/[email protected]

Professor do Departamento de Física e do curso de Pós-Graduação em Ensino de Ciências, Matemática e Tecnologias – PPGCMT/UDESC/[email protected]

Este artigo apresenta as ideias filosóficas de Karl Popper e suas implicações para o ensino de ciências. Analisaremos também alguns aspectos de sua teoria, como falseamento e demarcação entre ciência e pseudociência. Palavras-chave: Demarcação de Ciência; Falseabilidade; Popper. This article presents the philosophical ideas of Karl Popper and its implications for the teaching of science. We will also consider some aspects of his theory, as distortion and demarcation between science and pseudoscience Keywords: Demarcation of Science; Falsification; Popper.

INTRODUÇÃO Popper é reconhecido por possuir uma posição filosófica original e revolucionária sobre ciência. Desenvolveu uma abordagem critica em relação à tendência positivista. Para ele, nosso conhecimento é sempre falível e passível de erro. Desse modo, propõe que a falseabilidade deve ser o principal critério para demarcação entre o que será considerado teorias cientificas e teorias não cientificas ou pseudocientíficas. Para serem consideradas cientificas as teorias devem ser apresentadas como conjecturas ousadas a serem submetidas a testes rigorosos com o intuito de falseá-las ou, eventualmente, de corroborá-las, mas, jamais, de verificá-las ou confirmá-las de modo absoluto. Popper sustenta, então, que o que distingue a racionalidade científica é a atitude crítica, mais preocupada com a busca da verdade do que com a defesa de teorias que possam eventualmente ocultá-la ou dela se afastar. Seu racionalismo crítico, como ficou conhecido o seu pensamento, coloca-se frontalmente contra algumas das principais construções teóricas de seu tempo, sobretudo a Psicanálise de Freud, a Psicologia Individual de Adler e o Marxismo (POPPER, 1972, 1975, 1985, 1987). Com o intuito de destacar alguns aspectos centrais da epistemologia de Popper, procurar-se-á neste artigo descrever brevemente o problema da demarcação – importante para distinção entre ciência e pseudociência. UM POUCO SOBRE POPPER

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Este artigo é resultado de estudos e reflexões iniciadas na disciplina de Epistemologia do Ensino de Ciências e Matemática do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências, Matemática e Tecnologias – PPGCMT/UDESC.

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Azevedo et all

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Karl Popper nascido em Viena no ano de 1902 e falecido em Londres no ano de 1994, filósofo e epistemológico, pode ser considerado um dos principais pensadores e críticos sobre o processo de construção do conhecimento científico do século XX. Uma de suas principais contribuições foi o livro que escreveu em 1934 denominado ‘Lógica da Descoberta Científica’ e que na década de 1950 escreveu um extenso postscriptum a este livro com orientações diferentes das anteriores. O título de seu livro contém as palavras-chave do seu discurso: o termo ‘lógica’ revela o seu método e o conceito de ‘descoberta’ encerra o que de mais interessante têm os seus escritos, visto terem conciliado o passado com o presente e o futuro numa abordagem original que abriu as fronteiras da filosofia da ciência ao debate. Karl Popper refletiu sobre algumas questões relativas ao conhecimento cientifico. Suas ideias são revolucionárias e são muito importantes para todos os que fazem ou ensinam ciências. Ele debateu suas ideias com grandes pensadores e cientistas do século XX, em especial Einstein e Schroedinger, que também foram seus interlocutores. O PROBLEMA DA DEMARCAÇÃO Neste artigo apresentamos uma ideia do pensamento de Popper e algumas implicações para o ensino de ciências. Em seu livro ‘Conhecimento Objetivo’ Popper nos diz que: O progresso da ciência consiste de experiências, de eliminação de erros, e demais tentativas guiadas pela experiência adquirida no decorrer das tentativas e dos erros anteriores. Nenhuma teoria em particular pode, jamais, ser considerada absolutamente certa: cada teoria pode tornar-se problemática, não importa quão bem corroborada possa parecer agora. Nenhuma teoria cientifica é sacrossanta ou fora de crítica (POPPER, 1975, p. 330).

Para Popper a função da epistemologia da ciência é reconstruir racionalmente “as provas posteriores pelas quais se descobriu que a inspiração era uma descoberta ou veio a ser reconhecida como conhecimento” (POPPER, 1985, p. 32). Ou seja, a epistemologia não deve se preocupar em reconstruir a inspiração do cientista e não é importante para ela em que condições o cientista formulou a teoria; importa, sim, discutir como a teoria é testada. E continua dizendo que: É tarefa do cientista submeter sua teoria a testes sempre novos e que nenhuma teoria deve ser declarada definitiva. Realizam-se os testes tomando a teoria a ser testada e combinando-a com todos os tipos possíveis de condições iniciais, assim como outras teorias, e comparando então com a realidade as predições resultantes. Se isto leva a expectativas decepcionantes, a refutações, então teremos que reconstruir nossa teoria (POPPER, 1975, p. 331).

Para ele a única forma do conhecimento científico avançar seria através do falseamento das teorias. Verificando o falseamento de uma suposição é que conseguimos entrar em contato com a realidade, ainda que seja possível salvar uma teoria da refutação através de hipóteses suplementares; contudo esse não seria o caminho do progresso. Quando uma teoria for falseada, a maneira correta de procedimento, segundo Popper (1975), é o de buscar novas teorias que possibilitem uma nova compreensão dos fatos, pois A ciência não está interessada em teorias que pareçam ter a probabilidade de oferecernos melhor apreensão dos fatos. A ciência não está interessada em ter a ultima palavra, se isso significar o fechamento de nossas mentes ao falseamento das experiências, mas sim em aprender com as nossas experiências; isto é, em aprender com os nossos enganos (POPPER, 1975, p. 331).

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O alvo do cientista não é descobrir uma certeza absoluta, mas descobrir teorias cada vez melhores e capazes de serem submetidas a testes cada vez mais severos e conduzindo-nos, com isto, sempre a novas experiências. Mas isto significa que essas teorias devem ser mostradas falseáveis: é pela verificação de seu falseamento que a ciência progride. Outro problema da filosofia da ciência com que Popper se preocupou é o chamado ‘problema da demarcação’, como o próprio Popper nos diz: Após o colapso do Império Austríaco, a Áustria havia passado por uma revolução: a atmosfera estava carregada de slogans e ideias revolucionárias; circulavam teorias novas e frequentemente extravagantes. Dentre as que me interessavam, a teoria da relatividade de Einstein era sem dúvida a mais importante; outras três eram a teoria da história de Marx, a psicanálise de Freud e a ‘psicologia individual’ de Alfred Adler. [...] durante o verão de 1919, comecei a me sentir cada vez mais insatisfeito com essas três teorias... passei a ter dúvidas sobre seu status científico. Meu problema assumiu, primeiramente, uma forma simples: ‘O que estará de errado com o marxismo, a psicanálise e a psicologia individual? Por que serão tão diferentes da teoria de Newton e especialmente da teoria da relatividade?’ (POPPER, 1972, p. 64).

Popper (1987) percebia que os admiradores do marxismo, ao abrir qualquer jornal, encontravam traços e provas em artigos e até em anúncios, provas que constituíam verificações da luta de classes e as encontrava também até naquilo que o jornal não dizia. E um psicanalista, fosse ele freudiano ou adleriano, não importasse o caso que estivesse analisando, diria sem dúvida alguma que suas teorias eram verificadas por observações clinicas, ou seja, as três teorias acabavam explicando tudo em seus campos de pesquisa, o estudo de qualquer uma delas parecia levar a uma verdade absoluta. Para Popper, o fato de uma teoria não poder ser refutada não dá a ela uma vantagem, dá, sim, uma prova de sua fraqueza, pois sua irrefutabilidade não significa que a teoria é uma verdade absoluta, posto que podem existir duas teorias contrárias onde ambas podem ser irrefutáveis. Um exemplo típico, segundo Popper, era a psicanálise: “Um psicanalista, fosse ele freudiano ou adleriano, diria sem dúvida que todos os dias, ou até de hora a hora, estava a ver as suas teorias verificadas por observações clínicas” (POPPER, 1987, p. 180). Como é que podemos distinguir as teorias das ciências empíricas das especulações pseudocientíficas, não cientificas ou metafisicas? Popper (1987) faz essa indagação, pois para os indutivistas, a demarcação entre ciência empírica e pseudociência, não ciência e metafisica era realizada pelo ‘método indutivo’. As teorias científicas eram obtidas a partir dos fatos e podiam por eles serem verificadas. Popper aplicou, como critério de demarcação, a refutabilidade ou testabilidade. As teorias das ciências empíricas podem, em principio, ter condições de serem refutadas pelos fatos; porém, as teorias pseudocientíficas, não cientificas ou metafisicas simplesmente não são testáveis, ou seja, não há fatos que as possamos refutar. “Essa é uma concepção de ciência que considera a abordagem crítica sua característica mais importante. Para avaliar uma teoria o cientista deve indagar se pode ser criticada, se se expõe a críticas de todos os tipos e, em caso afirmativo, se resiste a essas críticas” (POPPER, 1982, p. 284). A chance de uma teoria ter a possibilidade de ser refutada constituía, para Popper, a essência da natureza científica. Assim, uma teoria só pode ser considerada científica quando é testável e passível de ser falseável, ou seja, quando é possível prová-la falsa. Esse conceito ficou conhecido como falseabilidade ou refutabilidade. Segundo ele, o que não é falseável ou refutável não pode ser considerado

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científico. A teoria da gravitação universal de Newton é científica, por que além de se enquadrar na definição ao propor equações simples que descrevem os modelos cósmicos gravitacionais, também é possível se fazer previsões acertadas com base nela. E a principal razão foi que as teorias de Newton (leis de Newton do movimento e teoria da gravitação universal) também são falseáveis e as foram, quando Einstein com sua teoria da relatividade demonstrou que a mecânica newtoniana não era válida para velocidades muito altas, próximas à da luz. Einstein provou que a luz era afetada pelos campos gravitacionais e que através de experimentos feitos posteriormente com cronômetros de altíssima precisão, postos em alta velocidade em relação à Terra, apresentavam pequenos atrasos quando comparados a cronômetro idêntico mantido imóvel na superfície. Isso acabou por levar a ciência a uma nova era, na qual o tempo não mais era absoluto. Porém, as teorias de Newton, apesar de falseadas, continuam válidas para a maioria das aplicações cotidianas, quando a influência da velocidade pode ser considerada desprezível para as aplicações práticas. Neste caso, vemos com clareza o quanto a ciência se mostra renovável e que melhora a partir de suas próprias definições. Por outro lado, podemos pegar como exemplo a astrologia, que seguindo as definições e o conceito da falseabilidade de Popper, não pode ser considerada ciência. Não existem experimentos possíveis que possam falsear a teoria no que tange à assertiva de que as posições de determinados corpos celestes afetam a vida de pessoas nascidas em determinado período, e de determinada forma. Com isso, a abrangência das previsões e a falta de um modelo simples e claro que as expliquem, tornam a astrologia de horóscopo não falseável e, portanto, não científica. Com Popper, os limites da ciência se definem claramente, tudo que se denomina ciência deve produzir teorias falseáveis, que serão válidas enquanto não refutadas. De acordo com este modelo, não há como a ciência tratar de assuntos de religião, que têm suas doutrinas ditas como dogmas ou verdades eternas ou mesmo de filosofia, que busca se aproximar de verdades absolutas. Assim, a epistemologia de Popper se aplica a ela mesma, pois quando alguém desenvolver uma definição melhor sobre a teoria científica, e as ideias de Popper forem falseadas, ela sairá de cena para a nova teoria tomar seu lugar na história da ciência. Popper nos mostrou uma ciência que se faz grande na virtude da humildade. CONCLUSÃO Popper após reflexão conclui que é muito fácil obter verificações para quase toda teoria desde que procuremos confirmações, essas confirmações só devem ser consideradas quando vierem de predições arriscadas, esperando um acontecimento incompatível com a teoria e que a refute. Toda teoria científica ‘boa’ é uma proibição, quanto mais uma teoria proíbe, melhor ela é. Uma teoria que não pode ser refutada por um acontecimento concebível não é ciência. A irrefutabilidade não é uma virtude, mas um vício. A evidência confirmadora não deve ser considerada se não resultar de um teste genuíno da teoria e, finalmente, ainda assim, algumas teorias genuinamente ‘testáveis’, que se revelam falsas, continuam a ser sustentadas por admiradores, que introduzem, por exemplo, alguma suposição auxiliar, ou reinterpretam a teoria de tal maneira que ela escapa à refutação. Popper chama a atenção que o método científico não se sustenta na versão apresentada pelos empiristas. Uma nova concepção surge então: a teoria vem antes dos fatos. Os fatos não podem confirmar de modo absoluto: todo conhecimento científico está aberto à crítica. É justamente o aprofundamento do

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exame crítico que torna possível o progresso e a evolução do conhecimento. Essa visão de ciência deve estar clara tanto para os educadores, quanto para educandos, pois assim se torna explícito que a ciência é um produto humano. As leis científicas não são da natureza, mas uma possível interpretação da realidade, com isso o papel do educador não se restringe apenas em apresentar ‘teorias oficiais’, mas também em criticar teorias inadequadas, tendo em vista, que os educandos carregam consigo suas teorias alternativas. O confronto entre a ‘teoria oficial’ e a(s) ‘teoria(s) alternativa(s)’ não deve ser evitado, ele é desejável e necessário para que o educando perceba a vantagem da primeira. O educador também não pode esquecer que o aluno sempre terá a possibilidade de fugir da refutação da sua teoria mediante a introdução de hipóteses suplementares. REFERENCIAS POPPER, K. R. Conhecimento objetivo. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1975. POPPER, K. R. Conjecturas e refutações. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1982. POPPER, K. R. A lógica da pesquisa científica. São Paulo: Editora Cultrix, 1985. POPPER, K. R. O realismo e o objectivo da ciência. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1987.

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