PRINCÍPIOS CONTRATUAIS NA TEORIA CLÁSSICA E NA PÓS-MODERNIDADE

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PRINCÍPIOS CONTRATUAIS NA TEORIA CLÁSSICA E NA PÓS-MODERNIDADE Haroldo Camargo Barbosa∗ RESUMO O artigo tem por objetivo expor como se apresenta, hodiernamente, a aplicação dos princípios contratuais em um momento de socialização do direito contemporâneo. Cuida-se em demonstrar a relativização, pela qual, passam os princípios da teoria clássica, provocando alterações de conceito e aplicação, bem como, a já perceptível presença e necessária aplicação dos princípios tidos por pósmodernos que compõem na sua maioria de cláusulas gerais, levando ao direito obrigacional o sistema aberto de análise específica do caso em concreto prevalecer. Palavras-chave: Princípios contratuais. Relativização. Teoria clássica. Pós-moderno. Cláusulas gerais. ABSTRACT The article has for objective to expose as it comes, in the days today, the application of the contractual beginnings in a moment of socialization of the contemporary right. It takes care in demonstrating the relativization, for the which, they pass the beginnings of the classic theory, provoking concept alterations and application, as well as, the already perceptible presence and necessary application of the beginnings had for post-modern that compose in his majority general clauses, taking to the obligatory right the system open of specific analysis of the case in concrete to prevail. Key words: Contractual beginnings. Relativization. Classic theory. Post-modern. General clauses.



*Discente do Curso de Especialização em Direito Civil e Processo Civil pela UEL. E-mail: [email protected]

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1 INTRODUÇÃO O direito contratual rege-se por diversos princípios, alguns clássicos, tradicionais e outros modernos ou também chamados de sociais. São considerados integrantes da concepção clássica os princípios: da autonomia da vontade, obrigatoriedade dos contratos, relatividade dos efeitos do contrato e do consensualismo. A matéria, porém, não é pacífica na doutrina, entendendo alguns, como o jurista Silvio de Salvo Venosa (2005, p. 411), que o princípio da boa-fé também deve estar inserido neste rol. Depois que o individualismo prosperou no século XVIII, proclamando a liberdade e igualdade política, até o final do século XIX e início do século XX prevalecem os ideais da principiologia clássica, devido à predominância do individualismo, base do Estado liberal, onde se pregava a prevalência da ampla liberdade de contratar. Como expressão da liberdade individual, o contrato, seria incompatível com restrições que se oponham a esta liberdade. No começo do século XX, no entanto, compreendeu-se que, se a ordem jurídica conseguia a prometida igualdade política, não estava assegurando a igualdade econômica. A aplicação do capitalismo desenvolto, o aumento da concorrência, da concentração industrial, a criação das grandes empresas, conduziu a defasagem dos contratantes devido ao desnível econômico. Hoje na sociedade de consumo, a conseqüência é a contratação de massa que reúne um conjunto de indivíduos anônimos, pois cada vez mais o indivíduo contrata com um ente despersonalizado. O fenômeno da massificação traça uma nova realidade, um certo automatismo contratual (exemplo: a predominância dos contratos de adesão), como prefere a doutrina chamar, deixando imperceptível o mecanismo da vontade um dos baluartes do contrato. Nos contratos de massa, o elemento objetivo adquire maior destaque sobre o elemento subjetivo. O exame do contrato neta hipótese aproxima-se do inconsciente coletivo. Dada a incapacidade do Estado em satisfazer as necessidades cada vez mais crescentes da sociedade, isso fez com que deixasse de ser empreendedor para tornar-se regulador da atividade econômica. A intervenção estatal na economia do negócio jurídico contratual, o chamado dirigismo contratual, invoca a supremacia dos interesses coletivos sobre os interesses individuais dos contratantes, conciliando o interesse das partes com os interesses da sociedade.

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Essa concepção de sociabilidade permeia a ótica do Código Civil de 2002, onde o ideal de justiça social, também almejado pela atual dogmática contratual, repele o individualismo exacerbado do Código Civil de 1916. Objetivando consagrar o ideal de justiça social, a dogmática contratual moderna, agrega a aplicação dos princípios contratuais tradicionais os modernos, tais quais: o princípio da supremacia da ordem pública, da revisão dos contratos, boa-fé e da função social do contrato.

2 PRINCÍPIO DA AUTONOMIA DA VONTADE Trata-se do princípio contratual que garante as pessoas liberdade para contratar. Tal liberdade abrange o direito de contratar ou não, escolher a pessoa com quem quer contratar e de estabelecer o conteúdo do contrato. As partes envolvidas no contrato tem ampla faculdade para fixar as regras regentes do mesmo sem a necessidade da interferência do Estado. Configura um poder que tem os contratantes de disciplinar os seus interesses mediante um acordo de vontades. Podem celebrar contratos nominados (típicos), quando optarem por modelos contratuais previstos no ordenamento jurídico, bem como, fazendo combinações criarem um modelo de contrato de acordo com suas necessidades, dando origem a contratos inominados (atípicos). Essa liberdade contratual está prevista no Código Civil no artigo 421 que dispõe: Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato.

Da mesma forma, existe previsão do princípio em questão também no artigo 425 do Código Civil, onde menciona que: Art. 425. É lícitos às partes estipular contratos atípicos, observadas as normas gerais fixadas neste Código.

Todavia, alguns doutrinadores1 atentos a evolução do direito e da sociedade entendem, que o princípio da autonomia da vontade vem sofrendo cada vez mais limitações em seus três aspectos. Primeiro quanto a faculdade de contratar (de contratar se quiser), pois 1

Álvaro Villaça de Azevedo, Carlos Roberto Gonçalves, Caio Mário da Silva Pereira, Silvio de Salvo Venosa, Maria Helena Diniz, Nelson Nery Júnior e outros.

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hoje em razão das necessidades elementares da vida moderna os indivíduos estão sendo obrigados a realizarem com freqüência contratos de todo tipo, como na compra de alimentos, na obtenção de serviços de transportes, educacionais, etc. Mesmo a lei, como bem cita Caio Mario da Silva Pereira (2004, p. 22), traz hoje diversas exceções que por impor a celebração do contrato caracteriza exceção ao aspecto do princípio de que as pessoas contratam apenas se quiserem. Como exemplo, temos o licenciamento de um veículo que é condicionado a realização do seguro obrigatório, a disposição de que o fornecedor não pode recusar atendimento às demandas dos consumidores na disponibilidade do estoque (CDC, art. 39, II), etc. Já quanto a opção de escolher a parte com quem contratar (de contratar com quem quiser), tem sido relativisado, por se identificar as vezes a impossibilidade do exercício de escolha, como nos casos de serviços públicos concedidos sob regime de monopólio e nos contratos submetidos ao Código do Consumidor. Por último, não se faz também absoluta, a faculdade de estabelecer o conteúdo do contrato (contratar sobre o que quiser), esta sofre limitações de determinadas disposições tidas por cláusulas gerais que tratam da função social do contrato, da boa-fé objetiva e, principalmente pelas exigências de supremacia da ordem pública que veda convenções que lhe sejam contrárias, pelos bons costumes e do Código de Defesa do Consumidor. Identifica-se assim, uma atuação intervencionista do Estado no contrato, um dirigismo contratual, que conflita com as noções tradicionais da autonomia da vontade, para dar aos mais fracos uma superioridade jurídica compensando a inferioridade econômica. Conclui a civilista Maria Helena Diniz (2005, p. 35) ao dizer: Assim, o princípio da autonomia da vontade é o poder conferido aos contratantes de estabelecer vínculo obrigacional, desde que se submetam às normas jurídicas e seus fins não contrariem o interesse geral, de tal sorte que a ordem pública e os bons costumes constituem limites à liberdade contratual.

3 PRINCÍPIO DA SUPREMACIA DA ORDEM PÚBLICA Esse princípio pós-moderno, diz respeito ao dever de se observar primeiro o interesse da sociedade em uma eventual colisão com o interesse individual. Busca-se um equilíbrio nas relações contratuais já que a liberdade de contratar provocava desequilíbrios com a exploração econômica dos mais fracos.

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Assim, a liberdade de contratar não é ilimitada, porque uma de suas restrições de caráter geral é constituída pela ordem pública e os bons costumes. O direito positivo através de normas que integram a disciplina dos contratos dita certos comportamentos que vão suprir o pronunciamento dos interessados deixando estes sem a liberdade de derrogá-los por pactos privados. O contrato não é mais visto apenas no sentido individualista de utilidade para os contratantes, mas sim é visto agora pelo prisma social de utilidade para a coletividade. Isso realça o conteúdo social do novo Código. O atual Código Civil, além do já disposto no artigo 17 da Lei de Introdução, traz essa idéia no parágrafo único do artigo 2.035, vejamos: Art. 2.035, parágrafo único. Nenhuma convenção prevalecerá se contrariar preceitos de ordem pública, tais como os estabelecidos por este Código para assegurar a função social da propriedade e dos contratos.

É certo que, a noção de ordem pública como de bons costumes oferece dificuldade de conceituação precisa. Preleciona, no entanto, Silvio Rodrigues (2003, p 16) que, “a idéia de ordem pública é constituída por aquele conjunto de interesse jurídicos e morais que incumbe á sociedade preservar. Por conseguinte, os princípios de ordem pública não podem ser alterados por convenção entre os particulares”. A doutrina considera de ordem pública, dentre outras, as normas que instituem a organização da família (casamento, filiação, separação, adoção, etc), as que estabelecem ordem de vocação hereditária e a sucessão testamentária, como também, as leis sobre o estado e capacidade das pessoas, etc. Bons costumes seria o cultivo ao respeito a pessoa humana, observância da moralidade social. Matéria sujeita a variação de país para país, de um lugar para outro e de épocas. 4 PRINCÍPIO DO CONSENSUALISMO Por este princípio para o aperfeiçoamento do contrato basta pura e simplesmente o acordo de vontades, o consentimento. Afastando-se assim, do apego ao formalismo e ao simbolismo para se considerar formado o contrato.

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Seguindo uma modera concepção, no direito brasileiro prevalece como regra a forma livre para a realização dos contratos, ou seja, cabe as partes escolher se preferem celebrar o contrato por escrito público, particular ou verbalmente, salvo nos casos que a lei impõe determinada forma (escrita pública ou particular) para dar maior segurança e seriedade ao negócio, como por exemplo, a compra e venda de automóveis, de imóveis, etc. É certo que este pensamento vai de encontro ao que determina o artigo 107 do Código Civil, quando determina que, a validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, desde que a lei não exija expressamente. Portanto, o consensualismo é a regra, enquanto o formalismo exceção. Alguns poucos negócios são reais, porque somente se aperfeiçoam com a entrega da coisa, subseqüentemente ao acordo de vontades, por exemplo, o contrato de depósito. 5 PRINCÍPIO DA RELATIVIDADE DOS EFEITOS DO CONTRATO Entende-se que, os efeitos do contrato só se produzem exclusivamente entre as partes, isto é, entre aqueles que manifestaram a sua vontade, não aproveitando nem prejudicando terceiros. Considerando a distinção entre os efeitos internos e externos do contrato podemos dizer que os efeitos internos do contrato somente afetaria aos partícipes do negócio, pois não pode uma relação contratual impor direitos e obrigações a terceiros. Fundado na doutrina de que o contrato é tangível, palpável, nesse sentido as exceções ao princípio poderiam se manifestar, nos considerados efeitos externos, percebido por outras pessoas que dele não participam. Há obrigações que de forma reflexa estendem seus efeitos a terceiros inegavelmente, como por exemplo, na estipulação em favor de terceiro (CC, arts. 436 a 438), a situação de ser herdeiro universal de um contratante (CC, art. 1.792), convenções coletivas de trabalho e o fideicomisso constituído por ato inter vivos. A fim de tornar compreensível, Orlando Gomes (1999, p. 24) ensina que: A existência de um contrato é um fato que não pode ser indiferente a outras pessoas, às quais se torna oponível. Os efeitos internos, isto é, os direitos e obrigações dos contratantes, a eles se limitam, reduzem-se, circunscrevem-se. Em regra, não é possível criar, mediante contrato, direitos e obrigações para outrem. Sua eficácia interna é relativa; seu campo de aplicação comporta, somente, as partes.

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Sem prejuízo do exposto, no percorrer de outra linha de pensamento que não chega a mencionar qualquer distinção, chega-se a alusão que o conceito inicialmente dado ao princípio em referência mostra-se coerente ao modelo clássico, que objetivava exclusivamente a satisfação dos interesses individuais e, por isso, só produzia efeitos entre aqueles que haviam celebrado. Destacando, por conseguinte, as conseqüências aplicadas ao princípio em razão do advento e aplicação do novo Código Civil. Compreende-se que, o princípio da relatividade dos efeitos do contrato, foi bastante mitigado pelo reconhecimento das cláusulas gerais, por conter normas de ordem pública que não se destinam a tutelar apenas interesses particulares como também o interesses da coletividade, que deve prevalecer no conflito com aqueles. Assim, leciona Carlos Roberto Gonçalves (2005, p. 27), O Código Civil não concebe mais o contrato apenas como instrumento de satisfação de interesses pessoais dos contratantes, mas lhe reconhece uma função social, como já foi dito (v. Função social do contrato, n. 3, retro) . Tal fato tem como conseqüência, por exemplo, possibilitar que terceiros que não são propriamente partes no contrato possam nele influir, em razão de serem direta ou indiretamente por ele atingidos.

6 PRINCÍPIO DA OBRIGATORIEDADE DOS CONTRATOS Este princípio também é denominado de princípio da intangibilidade ou da força vinculante dos contratos. Retrata o referido princípio a força vinculante das convenções, o que foi ajustado entre as partes. O contrato tem assim verdadeira força de lei entre as partes que dele participam, fazendo assim jus a expressão em latim “pacta sunt servanda” (os pactos devem ser cumpridos). “O princípio da força obrigatória do contrato significa, em essência, a irreversibilidade da palavra empenhada”, assevera Caio Mário da Silva Pereira (2004, p. 14). Até então para a visão concepcionista clássica as únicas exceções a obrigatoriedade pregada por este princípio seria a possibilidade de por ato bilateral voluntário, ambas as partes rescindirem o contrato ou pelo emprego de escusa por caso fortuito ou força maior, inserida no artigo 393 e parágrafo único do Código Civil. No direito moderno, no entanto, a intangibilidade ou imutabilidade do contrato relacionada a impossibilidade de alteração ou revogação do pactuado, passa agora a ser vista

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de forma mais atenuada, já que entende-se existir a possibilidade de intervenção judicial modificando o conteúdo de certos contratos para corrigir o seu equilíbrio, ante a desproporcional prestação de uma das partes que a impede de adimplir o contrato. Nota-se, os efeitos da incorporação de forma expressa no novo Código Civil da cláusula “rebus sic stantibus” (CC, arts. 478 a 480). Ainda que a finalidade seja a busca do interesse social com a promoção do equilíbrio contratual, da equivalência das prestações, tal princípio não desaparece no direito atual, porque se faz imprescindível sua decorrente segurança deixada nas relações jurídicas, porquanto, o Código Civil deixa claro as responsabilidade acarretadas pelo descumprimento do contrato (CC, art. 389). Com efeito, o que não se tolera mais é a obrigatoriedade do respeito ao pactuado quando as partes se encontram em patamares diversos e dessa disparidade ocorra proveito injustificado. 7 PRINCÍPIO DA REVISÃO DOS CONTRATOS OU DA ONEROSIDADE EXCESIVA Este princípio vem a ser um contra senso ao princípio da obrigatoriedade, pois permite aos contratantes recorrerem ao judiciário, para obter o desfazimento ou revisão forçada do que foi pactuado e, o que só poderia pelos contratantes ser mudado. Com base neste princípio admite-se, portanto, que a revisão ou resolução contratual seja requerida ao judiciário, quando a situação encontrada no momento da celebração do mesmo já não é a que se faz presente na sua execução. Situações adversas podem bruscamente acabar por onerar excessivamente a obrigação de uma das partes. Reconheceu-se a aplicação da teoria da imprevisão, que admite em alguns contratos a cláusula chamada “rebus sic stantibus” (das coisas como estão, estando assim as coisas). O Código Civil dedicou uma seção, composta por três artigos a respeito da resolução dos contratos por onerosidade excessiva. Vejamos o artigo 478: Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com estrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão a data da citação.

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Aqui em razão do disposto permite-se nos contratos bilaterais a sua resolução, mas a sua revisão pode, todavia ser pleiteada conforme a redação do artigo 317 do mesmo Código. Prescreve por sua vez, o artigo 479 do mesmo diploma: Art. 479. A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar eqüitativamente as condições do contrato.

Este dispositivo, aplicável aos contratos unilaterais, permite que o pedido não resulte necessariamente na resolução do contrato, mas se converta em um reajuste eqüitativo da contraprestação. Estatui ainda o artigo 480 do Código Civil: Art. 480. Se no contrato as obrigações couberem a apenas a uma das partes, poderá ela pleitear que a sua prestação seja reduzida, ou alterado o modo de executá-la, a fim de evitar a onerosidade excessiva.

Diante das disposições do novo Código Civil sobre o tema, o douto doutrinador Álvaro Villaça de Azevedo (2004, p. 31-34) explica, que existem três pressupostos fundamentais, autorizadores da aplicação da cláusula “rebus sic stantibus”, sendo o primeiro a alteração radical no contrato por um motivo imprevisível (álea extraordinária). Observando que há motivos que causam um desequilíbrio contratual, mas são previsíveis, como por exemplo, a inflação. Outro pressuposto seria a existência do enriquecimento ilícito, indevido e injustificável, resultando no prejuízo inesperado e injusto da outra parte. E o terceiro a onerosidade excessiva da obrigação sofrida por um dos contratantes, tornando-se para ele insuportável a execução contratual. O mencionado autor é daqueles que insere em seus ensinamentos que a comutatividade, nos contrato, é princípio essencial de direito, pois exige a equivalência das prestações e o equilíbrio delas. A teoria da imprevisão não se aplica aos contratos aleatórios, porque envolvem um risco, salvo se o fato imprevisível decorrer de fatores estranhos ao risco próprio do contrato. Não há que se falar em onerosidade excessiva em ocorrendo o risco normal do contrato. Lembra Maria Helena Diniz (2005, p. 41) que para caracterização da onerosidade excessiva no caso das relações de consumo, por previsão contida nos artigos 6º, V e 51 da Lei nº 8.078/90 (CDC), não é necessário que tal fato seja extraordinário ou imprevisível. Defende Carlos Roberto Gonçalves (2005, p. 32) que:

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Em realidade, com base nas cláusulas gerais sempre se poderá encontrar fundamento para a revisão ou extinção do contrato em razão de fato superveniente que desvirtue sua finalidade social, agrida as exigências da boa-fé e signifique o enriquecimento indevido para uma das partes, em detrimento da outra.

8 PRINCÍPIO DA BOA-FÉ O princípio da boa-fé exige que as partes se comportem de uma forma correta não só durante as tratativas preliminares como também durante a formação, na execução do contrato, na extinção e após esta. A regra da boa-fé é uma cláusula geral para a aplicação do direito obrigacional, bem como, o fim social do contrato e a ordem pública. É uma norma legal aberta, onde cabe ao juiz estabelecer a conduta que deveria ter sido adotada pelo contratante no caso concreto. A respeito preceitua o artigo 422 do Código Civil: Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios da probidade e da boa-fé.

Pela doutrina compreende-se que a probidade mencionada no artigo 422 do Código Civil, acima transcrito, nada mais é senão um dos aspectos objetivos do princípio da boa-fé, isto é, a honestidade de proceder os deveres. A moderna doutrina entende que o referido princípio se divide em princípio da boafé objetiva (ou concepção ética da boa-fé) e da boa-fé subjetiva (ou concepção psicológica da boa-fé). A boa-fé subjetiva diz respeito a um estado de consciência, a ignorância de uma pessoa acerca de um fato modificador, impeditivo ou violador de seu direito. É um aspecto psicológico de crer que sua conduta é a correta, como por exemplo, na posse de boa-fé, as hipóteses de casamento putativo, etc. Isso serve de proteção àqueles que a princípio tem a consciência de estar agindo conforme o direito, apesar de na realidade não estar. O intérprete deve considerar a intenção, o estado psicológico, a íntima convicção do sujeito da relação jurídica para descobrir quando a pessoa agiu de boa ou má-fé, seja no aspecto subjetivo ou no objetivo. Já a boa-fé objetiva é aquela que constitui inovação do Código Civil de 2002 e pode ser definida como uma regra de comportamento, ou seja, o dever das partes em agir conforme certos parâmetros de honestidade e lealdade. É Entendida como sendo uma exigência

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comportamental, onde os contratantes devem agir de acordo com determinados padrões sociais estabelecidos e reconhecidos. O Código Civil além do disposto no artigo 422, nos desperta para a observância da boa-fé objetiva também nos artigos 113 e 187: Art 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração. Art. 187. Comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

“Desse modo, pelo prisma do vigente Código, há três funções nítidas no conceito de boa-fé objetiva: função interpretativa (art. 113); função de controle dos limites do exercício de um direito (187); e função de integração do negócio jurídico (art. 421)”, discorre Silvio de Salvo Venosa (2005, p. 410). A aplicação da regra da boa-fé objetiva pode ocorrer em diversas situações não só para impor ao contratante o cumprimento da obrigação, como serve para exonerá-lo, por exemplo, na situação em que um credor pretende exercitar seu direito de maneira abusiva, de um credor que pretender ignorar o estado de necessidade que aflige seu devedor, ainda que não cause provei nenhum para si. Pode ocorrer, o que a moderna doutrina denomina de violação positiva da obrigação ou do contrato, que é a caracterização de inadimplemento contratual independentemente de culpa em razão da violação dos deveres anexos, como um comportamento contrário a boa-fé objetiva. Portanto, a situação pode ocorrer mesmo quando não exista mora ou inadimplemento absoluto. Nesse sentido, é o enunciado número 24 da I Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal (BRASIL, 2006), a saber: Enunciado n. 24. Em virtude do princípio da boa-fé, positivado no artigo 422 do novo Código Civil, a violação dos deveres anexos constitui espécie de inadimplemento, independentemente de culpa.

Constituem deveres anexos ou secundários (rol não taxativo) os deveres de informação (comunicação das características e circunstâncias do negócio, bem como, do bem jurídico), de proteção (como evitar situações de perigo), de cooperação (prática de atos visando facilitar o cumprimento da obrigação), de lealdade (relação de transparência com

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enunciação da verdade) e de sigilo (a confidênciabilidade entre ambas as partes deve ser respeitada). 9 PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO Efetivamente, a função social é agora considerado princípio aplicado aos contratos, afirmação que se confirma ante a leitura no Código Civil do artigo 421 e do parágrafo único do artigo 2.035, sem correspondentes no Código Civil de 1916. Procurou o novo diploma em afirmação aos seus ideais de socialidade aproximar-se do que já se exigia quando do exercício da propriedade pelo texto constitucional e, assim, semelhantemente ao princípio da função social da propriedade, a liberdade contratual não pode divorciar-se da tida função. O contrato passa ser visto como um dos fatores de alteração da realidade social, como um instrumento de realização do bem comum. Assim sendo, é natural que se atribua ao contrato uma função social, a fim de que ele seja concluído em benefício não só dos contratantes como também do interesse público, representando um dos meios primordiais de desenvolvimento. Segundo Maria Helena Diniz (2005, p. 38), O artigo 421 institui a função social do contrato, revitalizando-o, para atender aos interesses sociais, limitando o arbítrio dos contratantes, para tutelá-os no seio da coletividade, criando condições para o equilíbrio econômico-contratual, facilitando o reajuste das prestações e até mesmo sua resolução.

Para o doutrinador Caio Mário da Silva Pereira (2004, p. 13-14), a função social do contrato serve precipuamente para limitar a autonomia da vontade quando tal autonomia esteja em confronto com o interesse social e este deva prevalecer, ainda que essa limitação possa atingir a própria liberdade de não contratar, como ocorre nas hipóteses de contrato obrigatório. Ainda menciona o civilista que tal princípio em análise desafia a concepção clássica de que os contratantes tudo podem fazer, porque estão no exercício da autonomia da vontade. Essa constatação tem como conseqüência, por exemplo, possibilitar que terceiros não propriamente partes do contrato possam nele influir, em razão de serem direta ou indiretamente por ele atingidos, quando da inserção de cláusulas que venham injustificadamente a prejudicá-los.

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Como se vê, a atribuição de função social ao contrato constitui princípio moderno a ser observado pelo intérprete na aplicação dos contratos. Alia-se aos princípios tradicionais, pois não elimina o princípio da autonomia da vontade, o da relatividade dos efeitos do contrato, nem da obrigatoriedade dos contratos, mas sim atenua ou reduz o alcance destes, quando da aplicação da cláusula geral que é, ao caso em concreto, se existir conflito com os inafastáveis interesses metaindividuais (jurídicos, sociais, econômicos e morais), relevantes para o progresso social, ou o interesse individual relativo à dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III). Humberto Teodoro Júnior (2003, p. 55-56) apresenta alguns exemplos de contratos que no seu entendimento não cumpre com sua função social, não tendo interesse coletivo, não merecendo assim proteção judicial, como, venda de produto ou serviço mediante propaganda enganosa, alienação de bens fraudando credores, ato negocial conducente à concorrência desleal, negócio simulado para prejudicar terceiros, turismo sexual por agência de viagens, etc. 10 CONCLUSÃO O direito percebeu sua carência diante das novas necessidades e preocupações, principalmente sociais, necessidades estas que influenciaram e modificaram sobremaneira a figura clássica e individualista dos contratos e o papel do Estado na economia. A positivação de princípios sociais no Código Civil de 2002 não fez com que os critérios clássicos do direito civil perdessem sua importância, mas apenas que sua análise se faça à luz de valores metajurídicos e princípios jurídicos gerais e, não somente de regras rígidas definidoras de tudo e de todos os casos. No mais, o novo sistema civil implantado, de tipificação aberta, devido as cláusulas gerais, fornece ao juiz um novo instrumento no âmbito contratual predominado o exame do caso em concreto, diferente do pensamento e do ordenamento já passado que privilegiava os princípios da autonomia da vontade e da obrigatoriedade, seguindo uma direção individualista. Cabe ao juiz definindo seu sentido e alcance aplicar as cláusulas gerais (boa-fé, função social e ordem pública), como novos princípios do direito contratual que são, no julgamento das relações obrigacionais.

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