ESTADO E POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS: REFLEXÕES SOBRE

ESTADO E POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS: REFLEXÕES SOBRE AS PRÁTICAS NEOLIBERAIS Autora: Luciene Maria de Souza Doutoranda em Educação – UFU...

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ESTADO E POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS: REFLEXÕES SOBRE  AS PRÁTICAS NEOLIBERAIS 

Autora: Luciene Maria de Souza  Doutoranda em Educação – UFU  [email protected]  Co­autor: Prof. Dr.Carlos Alberto Lucena­ UFU  [email protected] 

Este  texto  é  resultado  de  estudos  sobre  Estado  e  Políticas  Públicas  Educacionais  no  contexto  da  reestruturação  produtiva  do  capital.  Esta  análise  possui  entre  outros desafios  o  intuito de destacar  alguns  argumentos  em torno do  caráter que  assume o projeto neoliberal diante do contexto de crise do capitalismo monopolista em  relação  à  reforma  do  Estado  e  suas  influências  no  campo  das  políticas  públicas  educacionais.  Tendo  como  pressuposto  teórico  metodológico  os  princípios  do  materialismo  histórico  dialético  problematizamos  a  Reforma  do  Estado  que  ocorreu  a  partir  de  um  projeto  neoliberal  de  mundo  pautados  em  idéias  mercadológicas  que  salientam  a  importância  da  liberdade  individual  e  a  necessidade  de  restrição  das  intervenções  do  Estado  nas  políticas  públicas  educacionais.  Dessa  forma,  consideramos  pertinente  a  discussão  no  sentido  de  problematizar  como  as  práticas  neoliberais  têm  influenciado  essas categorias nos últimos anos. Abordamos primeiramente o contexto histórico e os  principais  expoentes  do  neoliberalismo  e  em  seguida  apresentamos  os  reflexos  dessas  práticas nas políticas públicas educacionais. 

Um balanço do Estado Neoliber al 

O  denominado  neoliberalismo  reinventa  o  liberalismo  clássico,  porém  com  uma  nova  roupagem  dada  às  diferenças  do  momento  histórico  em  que  é  retomado.  Segundo  Azevedo  (1997),  as  raízes  da  corrente  neoliberal  encontram­se  na  teoria  do  Estado formulada a partir do século XVII, expressando o ideário do liberalismo clássico  então emergente. O pensamento liberal  surgiu  numa época de profundas modificações

2  político  –  econômicas  ocorridas  na  Europa  durante  o  século  XVII  e  XVIII,  as  quais  consolidaram­se  com  os  acontecimentos  de  1789,  na  França,  trazendo  uma  série  de  reflexões teóricas a respeito do papel do Estado.  O  Estado  liberal  apresenta­se  como  representante  do  público  e  guardião  da  propriedade privada. Segundo Locke (1991), o Estado surge para proteger e garantir os  direitos naturais como à vida, a liberdade e a propriedade. Para Locke  O Estado de natureza tem uma lei de natureza para governá­lo, que a  todos  obriga;  e a razão,  que é  essa lei,  ensina  a todos os  homens  que  tão­só  a  consultem,  sendo  todos  iguais  e  independentes,  que  nenhum  deles deve prejudicar a outrem na vida, na saúde, na liberdade ou nas  posses. (LOCKE, 1991, p.218). 

Dessa  forma,  o  liberalismo  concebe  o  homem  como  naturalmente  livre.  Para  Locke  cada  um  é  proprietário  de  si  mesmo  e de  suas  capacidades.  Nesse  sentido,  ele  afirma,  Embora a terra e todas as criaturas inferiores sejam comuns a todos os  homens,  cada  homem tem uma propriedade  em sua própria pessoa;  a  esta ninguém tem qualquer direito senão ele mesmo. O trabalho do seu  corpo  e  a  obra  das  suas  mãos  pode  dizer­se,  são  propriamente  dele.  Seja o que for que ele retire do estado que a natureza lhe forneceu e no  qual o deixou,  fica­lhe misturado ao próprio trabalho, juntando­se­lhe  algo que lhe pertence, e, por isso mesmo, tornando­o propriedade dele.  (LOCKE, 1991, p.227). 

Assim,  o  trabalho  dá  início  ao  direito  de  propriedade.  Para  o  referido  autor,  mesmo quem não possui bens é proprietário de sua vida, de seu corpo e de seu trabalho.  De acordo com Locke, cabe ao Estado o papel de guardião dos interesses públicos. Sua  função é tão somente responder pelo provimento de alguns bens essenciais, a exemplo  da educação, da defesa e da aplicação das leis.  Na  mesma  perspectiva,  Adam  Smith  (1983)  em  sua  obra  “A  riqueza  das  nações”,  preconiza  que  os  indivíduos  são  livres  para  buscar  a  realização  do  seu  bem  estar social através da  livre oferta e procura do mercado. Para Smith, o mercado seria  regulado por uma “mão invisível” naturalmente justa que controlaria paixões e desejos  individuais,  lançando  a base para  a  construção do bem  comum.  O  autor  condena  toda  forma de  intervenção do Estado  na  economia,  admitindo  a  sua  intervenção  em  apenas  três situações: na defesa do território, na garantia da propriedade privada e na execução  de obras públicas.

3  Desse  modo,  Vieira  (1992),  afirma  que  o  pensamento  liberal  consagra  as  liberdades individuais, a liberdade de empresa, a liberdade de contrato, sob a égide do  racionalismo, do individualismo e do não­intervencionismo estatal na esfera econômica  e social. O liberalismo consagra a liberdade de mercado responsável pela lei da oferta e  da  procura.  O  “sujeito  mercado”  imune  das  paixões  e  dos  interesses  humanos  deve  governar  a  sociedade,  definindo  as  relações  nela  existentes  e  suas  condições  de  desenvolvimento.  Nesse sentido, para Azevedo (1997), a teoria liberal foi sendo paulatinamente  modificada e adaptada, à medida que o avanço do capitalismo delineava a estrutura de  classes com maior nitidez, trazendo­a para o centro da cena econômica e política.  Desse modo, para Anderson (1995), o neoliberalismo nasceu logo depois da II  Guerra  Mundial,  na  região  da  Europa  e  da  América  do  Norte  onde  imperava  o  capitalismo.  Foi  uma  reação  teórica  veemente  contra  o  Estado  intervencionista  e  de  bem­estar. Desse modo, o ideário neoliberal ganhou força a partir de 1973, com a crise  do petróleo, que gerou baixas taxas de crescimento com altas taxas de inflação. Nesse  período de recessão econômica as idéias neoliberais começaram a ganhar espaço.  Dessa forma, Antunes (2002) salienta que a base material do projeto político e  ideológico  neoliberal  é  o  processo  de  reestruturação  produtiva  do  capital.  O  capital  como resposta à sua crise, iniciou um processo de reorganização de si mesmo e de seu  sistema  ideológico  e  político  de  dominação,  cujos  contornos  mais  evidentes  foram  o  advento  do  neoliberalismo  que  adotou  políticas  como  privatização  do  Estado,  a  desregulamentação dos direitos do trabalho e a desmontagem do setor produtivo estatal.  As  conseqüências  dessas  mudanças  foi  um  intenso  processo  de  reestruturação  da  produção e do trabalho, com o propósito de recuperação do capital. Como bem afirma  Lucena (2004), as respostas do capitalismo monopolista à crise da década de 1970 estão  trazendo profundas  mudanças  ao  ser  social  que  vive  do trabalho. A  exclusão  social,  a  pobreza,  a  violência  e  o  alto  índice  de  desemprego  estrutural  afetam  a  classe  trabalhadora levando à sua fragmentação e precarização num cenário de reestruturação  produtiva do capital.  Dessa maneira, um dos representantes da doutrina neoliberal mais conhecido é  Friedrick  Hayek  (1977),  segundo  ele  as  raízes  da  crise  do  sistema  capitalista  estavam  localizados  no  poder  excessivo  dos  sindicatos  e  movimentos  operários  que  reivindicavam salários maiores e gastos sociais pelo estado.Assim a doutrina neoliberal  pregava um estado forte em sua capacidade de romper com os sindicatos, mas fraco em

4  todos os gastos sociais e nas  intervenções econômicas.  Hayek  no livro “O caminho da  servidão”  é  um  defensor  apaixonado  contra  qualquer  limitação  dos  mecanismos  de  mercado por parte do Estado, para ele, uma ameaça fatal não só à liberdade econômica  como também à política. A obra desse autor transforma­se numa espécie de “bíblia da  doutrina  neoliberal”  a  ser  seguida  por  todos  os  países  que  priorizam  uma  verdadeira  liberdade  econômica.  Na  visão  de  Hayek  qualquer  intromissão  do  Estado  torna­se  perniciosa  e,  nessa  medida,  irracional;  ela  afetaria  a  liberdade  individual  e  dessa  maneira estaríamos todos caminhando novamente para a tão temida servidão.  Segundo  Anderson  (1995),  o  propósito  de  Hayek  e  seus  companheiros  neoliberais  eram  combater  o  Keynesianismo  e  o  solidarismo  reinantes  e  preparar  as  bases de um outro tipo de capitalismo. Eles combatiam qualquer regulação do mercado  por  parte  do  Estado  e  afirmavam  que  o  Estado  de  bem­estar  destruía  a  liberdade  dos  cidadãos e vitalidade da concorrência e argumentavam que a desigualdade era um valor  positivo, pois disso necessitavam as sociedades ocidentais.  Na  mesma  perspectiva  de  Hayek,  Milton  Friedman  (1984)  defendia  que  a  preservação  da  liberdade  é  a  principal  razão  para  a  limitação  e  descentralização  do  poder do Estado. “A principal função deve ser a de proteger nossa liberdade contra os  inimigos  externos  e  contra  nossos  próprios  compatriotas,  preservar  a  lei  e  a  ordem;  reforçar os contratos privados e promover mercados competitivos”. (1984, p.12).  Para  Friedman  (1984),  a  organização  econômica  desempenha  um  papel  fundamental  na  preservação  de  uma  sociedade  livre  ao  afirmar  que  a  liberdade  econômica é parte da liberdade entendida em sentindo mais amplo e, portanto, um fim  em si própria. Para ilustrar o poder da “mão invisível” do mercado, presente na obra do  autor, observe a citação abaixo:  O consumidor é protegido  da  coerção do  vendedor  devido a presença  de outros vendedores com que pode negociar. O vendedor é protegido  da coerção do consumidor devido à existência de outros consumidores  a  quem  pode  vender.  O  empregado  é  protegido  da  coerção  do  empregador  devido  aos  outros  empregadores  para  quem  pode  trabalhar, e assim por diante. E o mercado faz isto, impessoalmente, e  sem nenhuma autoridade centralizada. (FRIEDMAN, 1984, p.23). 

Segundo  Friedman  (1984),  a  existência  de  um  mercado  livre  não  elimina,  a  necessidade do Estado. Pelo contrário, o Estado é essencial para determinar as “regras  do  jogo”  e  um  árbitro  para  interpretar  e  pôr  em  vigor  as  regras  estabelecidas.  Nesse  sentido, o papel do Estado deve se limitar as seguintes funções,



Um  governo  que  mantenha  a  lei  e  a  ordem;  defina  os  direitos  de  propriedades;  sirva  de  meio  para  a  modificação  dos  direitos  de  propriedade  e  de  outras  regras  do  jogo  econômico;  julgue  disputas  sobre  a  interpretação  das  regras;  reforce  contratos;  promova  a  competição;  forneça  uma  estrutura  monetária;  envolva­se  em  atividades  para  evitar  monopólio  técnico  e  evite  os  efeitos  laterais  considerados  como  suficientemente  importantes  para  justificar  a  intervenção do governo; suplemente a caridade privada e a família na  proteção  do  irresponsável,  quer  se  trate  de  um  insano  ou  de  uma  criança;  um  tal  governo  teria,  evidentemente,  importantes  funções  a  desempenhar. (FRIEDMAN, 1984, p.39). 

Dessa maneira, esses são, pois, os papéis básicos do governo numa sociedade  livre,  prover  os  meios  para  modificar  as  regras,  regular  as  diferenças  sobre  seu  significado, e garantir o cumprimento das regras por aqueles que, de outra forma, não se  submeteriam a elas. O que o mercado faz é reduzir sensivelmente o número de questões  que devem ser decididas por meios políticos  e, por isso, minimizar a extensão em que o  governo tem que participar diretamente do jogo.  Para  Anderson  (1995),  os  principais  reflexos  da  implantação  de  práticas  neoliberais  são  a  deflação,  a  desmontagem  de  serviços  públicos,  as  privatizações  de  empresas, o crescimento de capital corrupto e polarização social, seguidas da ampliação  das desigualdades sociais. O autor ressalta de forma muito pertinente que nos aspectos  citados  acima  o  neoliberalismo  obteve  um  êxito  além  do  esperado  pelos  seus  idealizadores,  mas  no  que  concerne  à  reanimação  do  capitalismo  avançado  mundial,  restaurando  taxas  altas  de  crescimento  estáveis,  com  existiam  antes  da  crise  dos  anos  70,  o  quadro  se  mostrou  decepcionante.  “Entre  os  anos  70  e  80  não  houve  nenhuma  mudança  na  taxa  de  crescimento,  muita  baixa  nos  países  da  OCDE.  Dos  ritmos  apresentados durante  o  longo  auge,  nos  anos  50 e  60, restam  somente  uma  lembrança  distante. (ANDERSON, 1995, p.15).  Segundo Anderson  (1995), qualquer balanço  atual  do  neoliberalismo  só pode  ser  provisório,  pois,  este  é  um  movimento  que  está  em  curso  na  história.  Economicamente  o  neoliberalismo  fracassou;  no  entanto,  como  doutrina  ideológica  nunca se conheceu no capitalismo algo tão forte e hegemônico que dominasse mentes e  corações  de  todo  o  mundo.  Nessa  perspectiva,  Paulani  (2005,  p.127),  corrobora  ao  afirmar que “no plano político e no plano das idéias, porém o neoliberalismo alcançou  hoje  um  êxito  num  grau  insuspeitado,  com  o  qual  seus  fundadores  provavelmente  jamais  sonharam”.  A  autora  ainda  ressalta  uma  das  características  marcantes  do

6  neoliberalismo  que  é  a  idéia  de  que  não  há  alternativas  para  seus  princípios,  nos  apresentando  como  sendo  a  única  e  melhor  alternativa  racional.  Quanto  mais  a  sociedade  entender  esse  projeto  como  algo  sem  saída,  mais  hegemônico  ele  se  torna,  apontando  que  o  resta  é  adaptar­se  a  ele.  Como  bem  afirma  Paulani  (2005,  p.129),  “nesse  momento,  as  condições  materiais  em  que  se  desenvolve  o  capitalismo  possibilitam  que  esse  ideário  mostre­se,  sem  disfarce,  como  o  discurso  nu  e  cru  do  capital”.  Nesse sentido, o neoliberalismo é concomitantemente original e repetitivo, uma  vez que cria uma nova forma de dominação e reproduz formas anteriores. Desse modo,  o neoliberalismo reinventa o liberalismo clássico, introduzindo novos conceitos, porém  mais conservador. Assim, podemos compreender o neoliberalismo como um ambicioso  projeto  de  reformas  no  plano  econômico,  político,  cultural  e  ideológico  de  nossas  sociedades em que uma série de políticas orienta para uma drástica reforma do sistema  escolar nacional na contemporaneidade.  Dessa  forma,  o  neoliberalismo  constitui  um  projeto  hegemônico,  isto  é,  uma  alternativa  dominante  à  crise  do  capitalismo  contemporâneo,  uma  nova  forma  de  organização  socioeconômica,  com  um  novo  papel  para  o  Estado  diante  das  políticas  públicas educacionais. 

Reflexos das práticas neoliberais no campo educacional 

Uma  das  grandes  operações  estratégicas  das  práticas  neoliberais  consiste  em  transferir  a  educação  da  esfera  pública  para  a  esfera  do  mercado.  Entretanto,  como  projeto econômico, o neoliberalismo se inscreve na  lógica de continuidades e rupturas  que caracterizam as formas históricas de dominação nas sociedades capitalistas.  Destarte,  com  a  hegemonia  da  doutrina  neoliberal,  temos  uma  proposta  de  reforma do próprio Estado que busca reduzir seu papel intervencionista na economia e  nos setores sociais para se tornar um estado gestor que carrega em si a racionalidade das  empresas capitalistas.  A reforma do Estado induzido  pelo projeto neoliberal provocou significativas  mudanças  na  educação.  Segundo  Gentili  (1996,  p.17)  na  perspectiva  neoliberal  os  sistemas  educacionais  enfrentam,  hoje,  uma  profunda  crise  de  eficiência,  eficácia  e  produtividade.  Em  outras  palavras,  a  redefinição  do  papel  do  Estado  em  grande  parte

7  tem  por  influência,  mais  ou  menos direta, dos  processos de  globalização  cultural  e  de  transnacionalização do capitalismo.  Para  o  neoliberalismo  há  uma  crise  gerencial,  é  preciso  melhorar a qualidade  dos  serviços  educacionais.Podemos  então  observar  que  há  uma  forte  transferência  de  termos  empresariais  como  qualidade  total,  eficácia  e  eficiência  para  o  campo  educacional. Para Gentili (1998), o discurso educacional do neoliberalismo representa­  se  a  partir  de  uma  reformulação  dos  enfoques  economicistas  do  “capital  humano”.  A  teoria  do  capital  humano  colocou  em  uma  só  direção  a  relação  entre  educação  e  desenvolvimento  econômico  no  contexto  histórico  de  um  capitalismo  que  objetiva  a  apropriação dos conhecimentos para aumentar a capacidade de trabalho para o capital,  isto é, um capital como fator de produção em busca de crescimento econômico. Enfim,  as  perspectivas  neoliberais  mantêm  essa  ênfase  economicista,  utilizando  a  educação  para um bom desempenho do mercado e de sua expansão do crescimento econômico.  Nesse  sentido,  a  educação  é  concebida  apenas  como  uma  instituição  que  qualifica pessoas para a ação na esfera econômica, sendo esta ação restrita ao mercado  de  trabalho.  Desse  modo,  os  trabalhadores  buscam  na  sua  qualificação  saídas  para  ingressarem nesse mercado de trabalho cada vez mais competitivo e são estimulados a  procurar  a  educação  como  forma  de  valorizar  sua  empregabilidade.  A  categoria  empregabilidade  é  aqui  entendida  como  a  capacitação  da  mão  de  obra  de  se  manter  empregada.  O princípio  que  está em  volta  deste  conceito  é  de  que o  desemprego  tem  como causa a baixa empregabilidade da mão de obra, ou seja, sua desqualificação em  face  das  exigências  do  mercado  de  trabalho.Assim,  transfere­se  do  social  para  o  individual  a  responsabilidade  pela  inserção  profissional  dos  indivíduos.  A  empregabilidade  está  ligada  aos  conhecimentos,  habilidades  e  esforço  individual  de  adequação.No entanto, sabemos que a solução dos problemas do desemprego não pode  ser  buscada  unicamente  na  educação,  pois,  o  que  está  ocorrendo  com  o  mundo  do  trabalho é produto da forma como está estruturada a nossa sociedade capitalista.  Diante  disso,  a  educação  na  lógica  do  capital  tem  o  objetivo  de  inserir  os  indivíduos no do mercado de trabalho por meio do desenvolvimento de competências e  habilidades.  A  partir  disso,  categorias  como  qualidade,  competência  e  até  mesmo  a  noção de cidadania tem seus sentidos resignificados no contexto neoliberal presente na  lógica da sociedade produtora de mercadorias.  Assim,  o  imperativo  que  o  discurso  neoliberal  institui,  deslocando  o  eixo  da  lógica do  Estado para  a  lógica  do  mercado,  sustenta  as  teses  de um Estado  mínimo  e

8  coloca a própria sociedade civil mergulhada na concorrência do poder econômico, de tal  forma  que  a  aparente  ausência  do  Estado  coloca  a  todos  numa  disputa  individualista  pela  sobrevivência.  O  Estado  minimizado  para  as  políticas  sociais  e  obviamente  não  para  os  interesses  do  capital,  repassa  aos  usuários  os  custos  das  políticas  sociais.  Conforme Oliveira: 

No  decorrer  dos  anos  1990,  o  debate  sobre  educação  e  desenvolvimento  esteve  pautado  pela  exigência  de  responder  ao  padrão  de  qualificação  emergente  no  contexto  de  reestruturação  produtiva e de globalização da economia, ocupando lugar de destaque  nas políticas educacionais. (OLIVEIRA, 2001, p.105). 

Sendo assim, o conceito de cidadania sob a lógica do capital é marcado por um  acentuado  individualismo,  uma  exacerbada  competitividade,  sendo  que  o  cidadão  é  visto  como  cliente  na  concepção  do  estado.  Segundo  Pimenta  (1998,  p.183)  é  importante  valorizar  o  cidadão  como  principal  consumidor  dos  serviços  públicos  e  adotar  pesquisas  de  satisfação  de  usuários  como  parâmetros  para  avaliação  de  desempenho  no  setor  público.  Assim  o  cidadão  torna­se  cliente  e  consumidor  dos  serviços prestados pelo Estado.  Para  Pimenta  (1998),  a  reforma  administrativa  brasileira  engloba  uma  concentração  em  desburocratização,  descentralização,  transparência,  avaliação  de  resultados e profissionalismo, mas com ótimas perspectivas em ética, competitividade e  enfoque no cidadão.  Esse novo Estado deve ter indicadores objetivos e mensuráveis de  gestão, dando maior ênfase ao resultado do que no processo.  Desse  modo,  palavras  como  competitividade,  êxito,  produtividade,  aparecem  como conceitos­chave e  critérios de qualidade na lógica  neoliberal e se constituem  no  novo  senso  comum  dominante  no  que  se  refere  à  concepção  de  educação.  Para  os  neoliberais  a  educação  enfrenta  uma  crise  de  qualidade,  derivada  da  improdutividade  que  caracteriza  as  práticas  pedagógicas,  e  da  gestão  administrativa  na  grande  maioria  dos estabelecimentos escolares.  Dessa  maneira,  refletindo  sobre  as políticas educacionais,  é  possível  perceber  seus  avanços  e  recuos,  suas  continuidades  e  descontinuidades,  que  submetem  a  educação  ao  poder  auto­regulador  do  Estado,  hoje  fortemente  atrelado  aos  interesses  econômicos dos organismos internacionais, principais defensores do projeto neoliberal.  Nesse sentido, de acordo com Rummert (2000), apreender as propostas educacionais e

9  suas características inseridas na lógica neoliberal, é abordar um processo dinâmico, que  se  constrói  na  dialética  entre  continuidades  e  rupturas,  entre  inovações  e  tradições.  Assim,  compreender  a  dialeticidade  presente  nesse  processo  é  ver  possibilidades  de  confronto e resistência, tendo em vista, que a história não acabou, mas está repleta de  possibilidades de mudanças e transformações.  Nessas  circunstâncias,  diante  das  transformações  ocorridas  no  campo  educacional  provocadas  pelo  neoliberalismo  e  a  reestruturação  produtiva  do  capital,  cabe  discutirmos  as políticas  escolares  atreladas  aos  interesses  do  capital  e  a  idéia  de  educação  formal  como  negócio  e  não  como bem  social.  Dessa  forma,  alguns  desafios  são  postos,  sendo  necessário  questionarmos  o  papel  da  educação  dentro  da  lógica  neoliberal.  A  educação  visa  apenas  legitimar  os  interesses  do  mercado de  trabalho  ou  ela é uma instituição que qualifica pessoas, possibilitando o acesso destas não somente à  ciência e a tecnologia, mas uma verdadeira qualidade de vida. 

Considerações Finais 

Dessa  maneira, sem  nenhuma pretensão  de  esgotar o debate, o presente  texto  teve  a  intenção  de  problematizar  as  práticas  neoliberais  no  que  tange  as  políticas  públicas educacionais. Desse modo, refletir  sobre os limites e desafios da educação na  sociedade  contemporânea  apresenta­se  necessário  e  urgente  diante  do  discurso  hegemônico  do  capital.  Por  isso,  torna­se  importante  como  bem  afirmou  Alves  (2006,  p.54),  “apreendermos  metamorfoses  estruturais  que  estão  ocorrendo  na  base  sócio­  produtiva  do  sistema,  buscando  identificar,  na  miséria  do  presente,  as  riquezas  de  possibilidades para o desenvolvimento para além do capital”.  Dessa  forma,  numa perspectiva marxiana,  é  que Mészáros  (2005)  aponta  que  uma educação para além do capital deve, portanto, andar de mãos dadas com a luta por  uma  transformação  radical  do  atual  modelo  econômico  e  político  hegemônico.  Assim,  romper  a  forma  como  a  educação  está  estruturada  em  nossa  sociedade  torna­se  imprescindível  para  alcançarmos  uma  transformação  social  do  quadro  atual.  Portanto,  romper  com  a  lógica  do  capital  no  âmbito  da  educação  é  absolutamente  inconcebível  sem  uma  mudança  radical  da  forma  como  está  estruturada  a  sociedade.    Por  isso,  a  importância  de  elaborarmos  críticas  radicais  à  forma  como  a  educação  é  percebida  na  sociedade  capitalista.  Para  o  capital  a  educação  é  apenas  uma  mercadoria  que  deve  atender às necessidades de acumulação da sua lógica. Mas como bem afirma Mészáros

10  (2005), a educação não é uma mercadoria que tem como objetivo somente acrescentar a  força  de  trabalho  para  se  subsumir  aos  interesses  do  capital.  Por  isso,  é  necessário  romper com a lógica sociometabólica do sistema capitalista se quisermos contemplar a  criação de uma alternativa educacional significativamente diferente.  Portanto,  toda  esta  discussão  faz­se  necessária  para  compreendermos  como  a  reforma do  Estado que ocorreu  a partir de um projeto político  e  ideológico  neoliberal  ocasionou  inúmeras  transformações  no  que  diz  respeito  às  políticas  públicas  educacionais nos últimos anos. 

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