Processos Inflamatorios Revisado - ufjf.br

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Letícia Coutinho Lopes Moura

Processos Inflamatórios Sumário I. II. III.

Introdução Processos Inflamatórios: Agudos e crônicos Distúrbios inflamatórios 1. Padrões morfológicos 2. Inflamação serosa 3. Inflamação fibrinosa 4. Inflamação supurativa (purulenta) 5. Úlcera IV. Inflamaçãogranulomatosa V. Conclusão I Introdução A sobrevivência de todos os organismos requer a eliminação de antígenos estranhos, tais como patógenos infecciosos e tecidos lesados. Essas funções são mediadas por uma resposta fisiológica imune complexa do hospedeiro, chamada inflamação. A inflamação é uma resposta protetora direcionada para eliminar a causa inicial da lesão, bem como as células dos tecidos necróticos que resultam da injúria original. Embora a inflamação auxilie na remoção das infecções e de outros estímulos nocivos, e inicie o reparo, a reação inflamatória, bemcomo o processo subsequente de reparo,podem, contudo, causar danos consideráveis. Por isso, a lesão pode coexistir com as reações inflamatórias benéficas e normais, e a patologia pode mesmo se tornar a característica dominante se a reação for intensa (infecção acentuada); prolongada (agente causador resiste à erradicação); ou inapropriada (doenças autoimunes ou alérgicas). Várias moléculas e células exercem um papel importante na inflamação, e incluem: proteínas plasmáticas; leucócitos sanguíneos; células das paredes vasculares e células da matriz extracelular do tecido conjuntivo circundante. Processos Inflamatórios: Agudos e crônicos A inflamação pode ser aguda ou crônica. A aguda é de início rápido e de curta duração, caracterizada pela exsudação de líquido e proteínas plasmáticas, além do acúmulo de leucócitos, predominantemente neutrófilos. Já a crônica costuma ser insidiosa, de duração mais longa e é caracterizada pelo influxo de linfócitos e macrófagos com proliferação vascular associada e fibrose (cicatrização). Entretanto, essas formas básicas de inflamação podem se sobrepor, e muitas variáveis modificam seu curso e aspecto histológico. 1

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Quando a inflamação aguda é bem-sucedida na eliminação dos agentes agressores, a reação inflamatória se reduz. Porém, se a resposta falha na remoção desses patógenos invasores, a inflamação pode progredir para a fase crônica. As reações inflamatórias agudas se iniciam após a exposição do organismo a agentes lesivos ou células mortas. Os fagócitos residentes nos tecidos danificados, principalmente leucócitos e proteínas plasmáticas, começam um processo de digerir e remover os tecidos necróticos ou os invasores. Alguns estímulos nocivos estão associados à inflamação aguda, entre eles: 1) infecções; 2) trauma e agentes químicos; 3) necrose tecidual; 4) corpos estranhos; e 5) reações imunológicas. Apesar de esses estímulos induzirem reações com características diferentes, todas as reações inflamatórias possuem os mesmos componentes básicos. Logo após a lesão ou infecção ocorrem alterações nos casos sanguíneosasodilatação e aumento da permeabilidade vascular – que resultam tanto em maior fluxo sanguíneo como em mudanças estruturais, permitindo que as proteínas plasmáticas deixem a circulação. A vasodilatação é induzida por mediadores químicos (aminas vasoativas – histamina e serotonina) e resulta em eritema e estase do fluxo sanguíneo. Vários mediadores estão relacionados com o aumento da permeabilidade vascular, como histamina e cininas. Estes são responsáveis por estimular aberturas entre as células endoteliais; pela lesão endotelial direta ou induzida por leucócitos; e pelo aumento da passagem de líquidos através do endotélio. Então, o aumento da permeabilidade vascular permite a entrada de leucócitos e proteínas plasmáticas nos locais da infecção ou da lesão do tecido; o líquido que extravasa dos vasos sanguíneos resulta em edema. Depois que os leucócitos são ativados e recrutados para o local da lesão, no tecido extravascular ocorre uma sequência de eventos: 1) marginação, aderência frouxa ao endotélio e rolagem ao longo da parede do vaso mediadas por selectina; 2) aderência firme ao endotélio mediada por integrinas; 3) transmigração entre as células endoteliais; e 4) migração para tecidos intersticiais, em direção ao estímulo quimiotático. Inicialmente, os neutrófilos predominam no infiltrado inflamatório, mas depois são substituídos pelos macrófagos. A inflamação pode resultar em manifestações externas, sinais cardinais, como, calor, rubor e tumor, dor e perda de função. A ativação leucocitária resulta na fagocitose de partículas (microrganismos e células mortas); produção de substâncias microbicidas (ERO, NO e enzimas lisossômicas) que

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eliminam os microrganismos. No final ocorre a produção de mediadores, citocinas e metabólitos do ácido araquidônico, que amplificam a reação inflamatória. Os mecanismos que funcionam para eliminar agentes infecciosos e células mortas, função fisiológica da inflamação, podem causar lesões em tecidos normais; são as consequências patológicas da inflamação. Sob várias circunstâncias os leucócitos ativados podem causar danos às células e aos tecidos normais: 1)

Como parte da reação normal de defesa contra microrganismos infecciosos

que são difíceis de erradicar, persistindo no organismo; 2)

Como tentativa normal de remoção dos tecidos danificados e mortos (ex: após

o infarto do miocárdio); a inflamação pode se prolongar e exacerbar as consequências injuriosas; 3)

Quando a resposta inflamatória é impropriamente dirigida contra os tecidos do

hospedeiro (doenças autoimunes); ou em resposta excessiva a uma determinada substância não tóxica (doenças alérgicas). III.Distúrbios inflamatórios A lesão tecidual, dependente de leucócitos, está relacionada com alguns distúrbios inflamatórios agudos e crônicos; seguem alguns exemplos clínicos: Aguda: síndrome de angústia respiratória aguda, rejeição aguda ao transplante e fibrose pulmonar. Crônica: artrite; asma; arterosclerose; rejeição crônica ao transplante; e fibrose pulmonar. Como os leucócitos desempenham um papel importante na defesa do organismo, defesas da função leucocitária (genéticos ou adquiridos) aumentam a suscetibilidade às infecções, que podem ser recorrentes. O resultado da inflamação aguda pode ser a remoção do exsudato, com restauração da estrutura normal do tecido (resolução). Mas, se o agente infeccioso permanecer no organismo, ocorre a progressão para a inflamação crônica. Dependendo da extensão da lesão inicial e da sua continuidade, bem como da capacidade de recuperação dos tecidos danificados, a inflamação crônica pode resultar em cicatrização ou fibrose. Estas ocorrem após destruição tecidual substancial ou quando a inflamação atinge tecidos que não se regeneram.

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A gravidade da resposta inflamatória, sua causa específica e o tecido envolvido podem alterar a morfologia básica da inflamação aguda, produzindo aparências distintas. Os padrões morfológicos da inflamação aguda estão associados a diferentes estímulos e situações clínicas. III. Padrões morfológicos Alguns padrões morfológicos da inflamação aguda encontram-se citados abaixo: 1)

Inflamação serosa:

É caracterizada pelo extravasamento de um fluido aquoso. Dependendo do local da lesão, se origina do soro sanguíneo ou das secreções de célulasmesoteliais que revestem as cavidades peritoneal, pleural e pericárdica. O líquido em uma cavidade serosa é chamado de efusão. Um exemplo de acúmulo de líquido seroso é a bolha cutânea, resultante de uma queimadura ou infecção viral. 2)

Inflamação fibrinosa:

É consequência de lesões mais graves, resultando em maior permeabilidade vascular, permitindo que moléculas grandes (ex: fibrinogênio) atravessem a barreira endotelial. Histologicamente, a fibrina extravascular acumulada aparece como uma rede eosinofílica de filamentos ou, às vezes, coágulo amorfo. Um exsudato fibrinoso é característico de inflamação no revestimento de cavidades corporais, como meninges, pericárdio e pleura. Se a fibrina não for completamente removida por macrófagos, ocorre o crescimento de fibroblastos e vasos sanguíneos, resultando na cicatrização, que pode gerar consequências clínicas significativas. 3)

Inflamação supurativa (purulenta):

É caracterizada pela presença de grandes quantidades de exsudato purulento (pus) consistindo em neutrófilos,células necróticas e líquido de edema. Quando há coleções localizadas de pus formam-se os abscessos, que podem ser causados por organismos purulentos, contidos dentro de um tecido, ou por infecções secundárias de focos necróticos. Os abscessos possuem uma região central de células necróticas, circundada por vasos dilatados e fibroblastos em proliferação. Com o tempo o abscesso torna-se completamente encerrado e é substituído por tecido conjuntivo. 4)

Úlcera:

É um defeito local ou escavação da superfície de um órgão ou tecido. A úlcera é produzida por necrose das células e desprendimento do tecido inflamatório necrótico. Geralmente, ocorre na necrose inflamatória da mucosa da boca; estômago; intestino; trato 4

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genitourinário; tecido necrótico e inflamação subcutânea dos membros inferiores – em pessoas idosas com distúrbios circulatórios que predispõem à necrose extensa. Um exemplo comum é a úlcera péptica do estômago ou duodeno, onde coexiste a inflamação aguda e a crônica. Durante o estágio agudo há infiltração polimorfonuclear intensa e dilatação vascular nas margens do defeito, na superfície do órgão ou tecido. Com a cronicidade, as margens e a base da úlcera desenvolvem cicatrização, com acúmulo de linfócitos, macrófagos e plasmócitos. A inflamação crônica pode suceder à aguda, e é mais prolongada, na qual inflamação ativa, destruiçãotecidual e reparação ocorrem simultaneamente. Ao contrário da inflamação aguda, ela é caracterizada por: 1) infiltração de células mononucleares (macrófagos, linfócitos e plasmócitos); 2) destruição tecidual induzida pelos produtos das células inflamatórias; 3) reparo envolvendo proliferação de novos vasos (angiogênese) e fibrose. A inflamação crônica origina-se nos seguintes contextos: 1) infecções persistentes de microrganismos difíceis de erradicar; 2) doenças inflamatórias imunomediadas (distúrbios de hipersensibilidade); 3) exposição prolongada a agentes potencialmente tóxicos. IV. Inflamaçãogranulomatosa Uma característica distintiva da inflamação crônica é inflamação granulomatosa, caracterizada por agregados de macrófagos ativados que assumem uma aparência epitelioide.Os

granulomas

estão

associados

a

determinados

estados

patológicos

específicos, como: tuberculose; hanseníase; sífilis; sarcoidose; doença da arranhadura de gato e doença de Crohn. Nas preparações histológicas, as células epitelioides nos granulomas exibem um citoplasma granular róseo com limites celulares indistintos. Os granulomas mais antigos podem estar envoltos por fibroblastos e tecido conjuntivo. Frequentemente esses granulomas apresentam células gigantes multinucleadas e podem estar associados a certos microrganismos infecciosos. A combinação de hipóxia e lesão por radical livre leva a uma zona central de necrose no granuloma. Macroscopicamente, essa zona possui uma aparência granular caseosa, chamada de necrose caseosa. Microscopicamente, o material necrótico aparece como restos granulares amorfos. A cura dos granulomas é acompanhada de fibrose, que pode ser bastante extensa. A inflamação pode apresentar manifestações clínicas severas a determinados microrganismos, como influenza; são os efeitos sistêmicos da inflamação, chamada de reação da fase aguda ou síndrome da resposta inflamatória sistêmica. 5

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A resposta da fase aguda consiste em várias alterações clínicas e patológicas: 1) febre, produzida em resposta a substâncias, pirogênios, que estimulam a prostaglandina; estas agem no hipotálamo, o qual produz neurotransmissores – reajustam a temperatura corporal em nível mais alto; 2) níveis plasmáticos elevados de proteínas da fase aguda (proteínas plasmáticas sintetizadas, principalmente, no fígado); 3) leucocitose; e 4) choque séptico; o aumento da quantidade de citocinas circulantes causa coagulação intravascular disseminada, hipoglicemia e choque hipotensivo. Outras manifestações clínicas da resposta da fase aguda incluem: aumento da frequência cardíaca e da pressão arterial; redução da sudorese; tremores; calafrios; anorexia; sonolência; e mal-estar. A inflamação crônica está associada a uma síndrome de desgaste chamada de caquexia, que resulta, principalmente, da supressão do apetite e da mobilização dos estoques de gordura, mediadas pelo TNF (fator de necrose tumoral). Considerando todos esses processos inflamatórios, vale mencionar o seu papel fundamental na respostaà patógenos infecciosos. Muitos micro-organismos utilizam diversas estratégias para conseguir escapar dessa resposta inflamatória e invadir o hospedeiro, causando doenças graves e às vezes letais. Alguns desses micro-organismos que possuem relevância clínica, médica e de saúde pública no contexto nacional, estão citados abaixo: 1.Tuberculose A infecção pelo Mycobacterium tuberculosis tem início com uma reposta imune mediada por células TCD4+. Nessa fase os linfócitos TCD4+ se diferenciam em células Th1 que liberam INF-, estimulando os macrófagos a produzirem mediadores, como óxido nítrico e enzimas lisossomais, para eliminar o bacilo da tuberculose. Mas diversas estratégias são utilizadas pela bactéria para conseguir escapar do sistema imune, interagir e invadir as células do hospedeiro vertebrado, causando lesões e danos teciduais no parênquima pulmonar. Com a evasão do sistema imune e a persistência das bactérias nos tecidos danificados, ocorrem as manifestações de hipersensibilidade do tipo tardia. Nesse momento, frente à ativação de Th1 com liberação de INF- e TNF, há a formação de granulomas no parênquima pulmonar, que é uma característica histológica marcante da tuberculose. Histologicamente ocorre uma infecção inflamatória granulomatosa, com formação de tubérculos caseosos ou não caseosos. Os granulomas estão envoltos por uma margem fibroblástica pontuada por linfócitos e contêm numerosas células gigantes multinucleadas. 2. Leishmânia O parasito, após inoculação no hospedeiro vertebrado, invade macrófagos do sistema fagocítico mononuclear, resultando em uma reação inflamatória crônica. 6

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A leishmania manipula as defesas inatas do hospedeiro para facilitar sua entrada e sobrevivência nos macrófagos. As formas amastigotas produzem glicoconjugados de superfície celular importantes para sua virulência. Estas moléculas facilitam a interação, a invasão e a replicação do protozoário no interior dos macrófagos. Após sua invasão, linfócitos TCD4+ são ativados e se diferenciam no subgrupo parasito-específico Th1, que produzem INF-, estimulando e recrutando os macrófagos para o local da infecção. Por sua vez, os macrófagos liberam mediadores, como algumas espécies reativas de oxigênio, para tentar eliminar o parasito. Mas, a leishmania apresenta diferentes estratégias de evasão do sistema imune do hospedeiro, por exemplo, altera a expressão gênica dos macrófagos, impedindo o desenvolvimento da resposta Th1. A ativação da resposta celular Th2 pelo protozoário pode resultar na sua sobrevivência e persistência, causando lesões teciduais. Isso acontece porque as citocinas de Th2, especialmente IL-4, IL13 e IL10, dificultam a eliminação eficaz do protozoário, devido à inibição da atividade microbicida dos macrófagos. A

leishmaniose

visceral

apresenta

as

seguintes

manifestações:

hepatoesplenomegalia; linfadenopatia; pancitopenia; febre e perda de peso. Em alguns casos o fígado também é afetado, e pode apresentar uma fibrose progressiva. A leishmaniose cutânea é uma doença localizada, relativamente branda. Os pacientes apresentam úlcera(s) na pele. A lesão pode se iniciar com uma pápula circundada por uma induração que se modifica para úlceras rasas. Estas úlceras possuem expansão lenta e contêm bordas elevadas. Ocasionalmente as úlceras podem cicatrizar por involução. A leishmaniose mucocutânea apresenta uma lesão úmida, pode ser ulcerada ou não, desfigurada e localiza-se na região nasofaríngea. Microscopicamente, observa-se um infiltrado misto contendo linfócitos, macrófagos e plamócitos. Essa infecção também pode apresentar cicatrização. Por último, a leishmaniose cutânea difusa é uma forma rara de infecção dérmica. A lesão inicia-se com um nódulo na pele que, aos poucos, se expande para todo o corpo, formando lesões nodulares. Através de microscopia nota-se que esses nódulos possuem um agregado de macrófagos espumosos repletos de leishmanias. Conclusão É importante ressaltar que diferentes patologias associadas à inflamação crônica estão sendo foco de estudos e pesquisa. Recentemente foi publicado que o processo da inflamação é responsável, em parte, pelo aumento da prevalência de doenças cardíacas em pacientes com doença renal crônica. Esses processos pertencem aos fatores de risco no 7

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desenvolvimento de doenças do sistema cardiovascular. Além disso, mediadores inflamatórios importantes participam da patogênese da síndrome coronariana aguda, são proteínas da fase aguda – proteína C reativa; metaloproteinases; interleucinas1 e 6; moléculas de adesão (VCAM – 1; ICAM – 1, selectinas); fator de necrose tumoral – a e fatores de crescimento vascular endotelial. (O coczarek A e cols., 2011). As inflamações aguda e crônica também estão sendo alvo de pesquisas, com a finalidade de buscar novas abordagens terapêuticas para algumas doenças, como propõem pesquisadores em desenhos experimentais com modelos animais in vitro e in-vivo, utilizando um medicamento tradicional, o GCSB-5. Os resultados mostraram que o GCSB-5 reduz o desenvolvimento da inflamação aguda e crônica, e sua propriedade anti-inflamatória pode inibir, em parte, a expressão de INOS e COX-2. Portanto, esses pesquisadores sugerem que o GCSB-5 pode ser aplicado como terapêutica tradicional na regulação da resposta inflamatória (Chung HJ e cols., 2010).

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