a cobrança da bagagem despachada nas viagens aéreas

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A COBRANÇA DA BAGAGEM DESPACHADA NAS VIAGENS AÉREAS: A QUEM INTERESSA?

Eduardo Fernandez Silva Consultor Legislativo da Área IX Política e Planejamento Econômicos, Desenvolvimento Econômico e Economia Internacional Sandro Silva Gonçalves Consultor Legislativo da Área XIII Desenvolvimento Urbano, Trânsito e Transportes

ESTUDO TÉCNICO SETEMBRO DE 2017

© 2017 Câmara dos Deputados. Todos os direitos reservados. Este trabalho poderá ser reproduzido ou transmitido na íntegra, desde que citados(as) os(as) autores(as). São vedadas a venda, a reprodução parcial e a tradução, sem autorização prévia por escrito da Câmara dos Deputados. Este trabalho é de inteira responsabilidade de seu(sua) autor(a), não representando necessariamente a opinião da Consultoria Legislativa, caracterizando-se, nos termos do art. 13, parágrafo único da Resolução nº 48, de 1993, como produção de cunho pessoal de consultor(a).

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SUMÁRIO

1 - Introdução ..................................................................................................... 4 2 - Uma analogia ................................................................................................ 6 3 - Transformação de costumes ......................................................................... 8 4 - Venda casada ............................................................................................. 11 5 - A justificativa da ANAC ............................................................................... 12 6 - A questão da discriminação de preços ....................................................... 13 7 - Comprar e não obter a propriedade? .......................................................... 15 8 - Evolução dos preços das passagens aéreas no Brasil ............................... 16 9 - Avaliações internacionais ............................................................................ 18 10 - Conclusões ............................................................................................... 22

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1 - INTRODUÇÃO A questão que o presente texto procura responder é quais serão as consequências, para a população brasileira, da recente decisão da Agência Nacional de Aviação Civil – ANAC, ao permitir que as transportadoras aéreas cobrem para que o passageiro despache sua bagagem ou mala. As novas normas protegem o consumidor ou as empresas aéreas? Incentivam a livre concorrência? Quais benefícios terá o consumidor? A Resolução nº 400, de 13 de dezembro de 2016, alterou diversas regras referentes à aviação civil, inclusive liberando as empresas transportadoras aéreas para cobrarem por bagagem1 despachada (arts. 13 a 15). As regras relativas à bagagem foram inicialmente suspensas, por decisão judicial, e, posteriormente, já ao final de abril de 2017, entraram em vigência, novamente, por decisão judicial. Em 1º de junho de 2017, uma das empresas atuantes no mercado deu início a tal cobrança, e as demais seguiram logo depois, exceto uma, que anunciou que não adotaria a prática. As consequências dessa nova norma são multifacetadas, de forma que, em alguns aspectos, elas podem até parecer contraditórias. Além disso, a aplicação da nova regra é ainda recente, e seus efeitos, embora já possam ser sentidos pelos passageiros, ainda não possibilitam uma análise detalhada com base em dados observados. Em síntese, até mesmo para resumir as conclusões deste trabalho, pode-se afirmar que a cobrança por bagagem despachada segue uma tendência internacional e que, nos mercados onde a prática já existe há alguns anos, houve queda de preço para os passageiros que viajam sem bagagem, mas o gasto daqueles que despacharam malas elevou-se. Esse resultado, porém, depende tanto da estrutura do mercado como de ações do regulador. Nesse sentido, pode-se afirmar que, caso haja concorrência por preço entre as transportadoras aéreas, haverá queda do desembolso para passageiros sem bagagem. Quanto às ações do órgão regulador, exigir maior transparência e detalhamento nas demonstrações financeiras das empresas reguladas poderá,

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Neste texto, as expressões “mala” e “bagagem” serão usadas como sinônimos.

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pelo menos, possibilitar análises futuras que revelem, de fato, as consequências da medida aqui debatida. O trabalho está organizado da seguinte forma: após esta introdução, e com o objetivo de facilitar a discussão da questão central deste estudo, explora-se uma analogia com a questão da individualização da medição do consumo de água em edifícios. Em seguida, há comentários sobre as transformações de costumes decorrentes da nova normativa. Na seção posterior, há uma discussão sobre as “vendas casadas”, prática ilegal, mas que era permitida e até regulada desde o tempo do antecessor da ANAC. A justificativa da Agência para alterar as regras vigentes é apresentada na próxima seção, que é seguida por uma breve discussão acerca da prática da discriminação de preços. Que fique claro, desde já, que a discriminação de preços é distinta da cobrança pelo despacho da mala, e que as referências à discriminação de preços têm o propósito de aprofundar a compreensão das questões econômicas envolvidas na mudança de hábitos promovida pela ANAC. A seção que segue discute uma particularidade do mercado de transporte aéreo regular, qual seja, os compradores de passagens aéreas pagam seu preço, mas não se tornam seus proprietários de pleno direito. As duas partes seguintes do trabalho tratam, a primeira, da evolução dos preços das passagens no Brasil, e a segunda, de algumas informações acerca das consequências, noutros mercados, da introdução da cobrança por bagagem despachada. Ao final, as conclusões. Uma questão prévia, porém, deve ser registrada: nem toda a população brasileira viaja de avião. O total de passageiros transportados no Brasil, em 2016, foi de 94,1 milhões, de acordo com o Banco Mundial2. A mesma fonte informa que, nos Estados Unidos da América – EUA, viajaram, por via aérea, naquele ano, 823 milhões de passageiros. Assim, no Brasil, a relação entre a população e aqueles viajantes é de 0,45 passageiro por habitante, enquanto na outra nação, a mesma razão é de 2,52. Registre-se, ainda, que, com a recessão da economia brasileira nos anos recentes, houve queda na proporção de passageiros transportados: antes, a mesma razão era de 0,58. À 2

Disponível em: . Acesso em: 30 ago. 2017.

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essa diferença de escala entre os dois mercados deve-se agregar também uma distinta organização da indústria, pois, enquanto no Brasil operam, basicamente, cinco empresas, nos EUA há cerca de vinte. Também o número de aeronaves operadas lá e cá diferencia os dois mercados. Dada a pequenez do mercado brasileiro, comparado ao dos EUA, é importante também registrar que a decisão da ANAC não afetará todos os consumidores brasileiros. Embora se saiba ser crescente a proporção de brasileiros que usam o avião, não se sabe ao certo qual é, de fato, o percentual da população que usa tal transporte. Como já se disse noutro contexto, o número de CPFs que efetivamente voam não é conhecido. Assim, os impactos da recente decisão da ANAC não afetarão “os consumidores”, de forma geral, mas apenas aquela parcela destes que viaja de avião, com maior ou menor frequência. A propósito, no Brasil, parte significativa das viagens é motivada por negócios, gerando viagens curtas e que não exigem mais do que pequenas malas de mão. Essas diferenças são importantes porque os impactos da medida de liberação da cobrança de bagagens, lá e cá, podem ser muito distintos. Não obstante, uma vez que naquele país essa prática já dura cerca de uma década, alguns exemplos e estudos referentes àquele mercado serão usados neste trabalho. 2 - UMA ANALOGIA Para entender as implicações e possibilidades da mudança autorizada pela ANAC, vale recorrer a uma analogia com outra transformação recente ocorrida em algumas cidades brasileiras: a adoção de medidores de consumo de água em cada unidade de um prédio, e não mais, como costumava ocorrer, um único medidor para todo o edifício. Tal prática tem como justificação o fato de que, havendo um único hidrômetro para medir o consumo da totalidade das unidades, os moradores dividirão a conta entre si, igualmente. Sendo assim, haverá moradores prejudicados, pois consomem relativamente pouco, enquanto aqueles que usam mais água que a média serão “subsidiados”. A 6

individualização dos hidrômetros teria, ainda, o efeito adicional de contribuir para economizar água, pois cada unidade teria os meios de saber de seu consumo e de administrá-lo. De diversas maneiras, a prática de permitir que as companhias aéreas cobrem para transportar bagagens tem fundamento similar à da adoção do medidor de água individualizado. A questão é: isso levará à redução dos desembolsos, por parte dos consumidores? A resposta é: depende das características peculiares do mercado, e as possibilidades decorrentes da adoção de hidrômetros individualizados ajudam a ilustrar algumas dessas implicações. Em um prédio, se muitas unidades consomem pouco, abaixo do nível mínimo estipulado pela fornecedora de água, ou pelo ente regulador, o valor total pago pelo conjunto dos moradores poderá ser maior após a introdução de medidores individuais. Por definição, considerado o total das unidades, o consumo será superior ao consumo mínimo definido; assim, ao se adotar a cobrança com base no consumo individual, caso muitas unidades usem menos que o valor mínimo estipulado, estas pagarão mais do que, de fato, usam e, talvez, mais do que pagavam antes da individualização. Nesta hipótese, a fornecedora de água passará a faturar mais do que na hipótese de medidor único. Dependendo das características da unidade predial, essa elevação da receita pode ocorrer até mesmo no caso de o consumo total, após a individualização, ser reduzido. Caso não exista regra definindo um valor mínimo de cobrança, ou caso o consumo da maioria das unidades seja superior àquele mínimo, então a probabilidade maior é de redução do consumo global e também do valor total desembolsado pelos moradores, pois haverá maior controle dos gastos de água, em nível individual. Essa parece ser, na realidade, a experiência mais comum dos moradores de prédios onde a medição se tornou individualizada. No caso da aviação regular, não existe o consumo mínimo regulado ou pré-definido, e, salvo um impacto adverso e imprevisto decorrente de outras características possíveis do mercado, existe a possibilidade de que os passageiros, considerados como um conjunto, paguem menos pela totalidade 7

das passagens adquiridas após a cobrança da nova tarifa. A confirmação, ou não, dessa possibilidade apenas poderá ocorrer após decorridos alguns meses, senão anos, da vigência da nova prática, e se as informações contábeis disponibilizadas pelas empresas aéreas se tornarem mais detalhadas. De todo modo, uma consequência inevitável da medida será a redução, nos voos, do peso da bagagem despachada, em virtude da cobrança – vale assinar que algumas empresas norte-americanas registraram redução de quase 50% no número de bagagens despachadas após a adoção de cobrança. Para a empresa aérea, isso pode representar ganho em economia de combustível, hoje responsável por cerca de 26% do custo operacional, ou em receita advinda do transporte adicional de carga, no lugar de bagagens. Pode, ainda, como tem sido verificado em outros mercados, diminuir manipulação, perdas, roubos e extravios de bagagem, os quais acabam redundando em despesas acessórias para os transportadores. O quanto dessa redução de custo (em adição a eventual aumento da receita por transporte de carga) será aplicado na precificação das passagens é algo a se investigar oportunamente. Hoje,

as

demonstrações

financeiras

das

empresas,

obrigatoriamente entregues à ANAC regularmente e tornadas públicas na internet, além de não serem homogêneas, registram como “outras receitas”, ou nome similar, uma variedade de ingressos auferidos pelas companhias, tais como multa pela alteração do voo, excesso de bagagem, venda de lanches a bordo e todo e qualquer recebimento que não a venda das passagens. Nos EUA, há estudos que, com base nas informações contábeis tornadas públicas, avaliam o peso da cobrança pelo despacho de malas na receita total das empresas, receita esta que se tornou expressiva, como se verá adiante; no Brasil, salvo mudança regulatória futura que venha a tornar explícito e público o detalhamento das “outras receitas”, tais análises podem não ser possíveis. 3 - TRANSFORMAÇÃO DE COSTUMES Há anos, os passageiros das empresas de transporte aéreo acostumaram-se a embarcar sem preocupação com sua bagagem, exceto 8

quando ela excedia 23kg – peso então definido em norma do regulador –, ou se dividia entre diversas unidades. Tal preocupação afetava, principalmente, os passageiros de viagens intercontinentais ou ao menos internacionais, já que, em voos domésticos, tais limites raramente eram alcançados. A Resolução nº 400, de 2016, da ANAC, veio alterar esse costume. Desde a entrada em vigor dessa Resolução, as companhias aéreas passaram a ter autorização para cobrar o despacho de bagagens com mais de 10kg. Até esse limite, o passageiro pode levar consigo, na cabine de voo, uma mala de mão; acima dos 10kg, há que despachar a bagagem e pagar pelo transporte dela, a menos que, na compra do bilhete, o passageiro tenha optado por adquirir uma passagem mais cara, que incluísse o direito de transportar bagagem acima de 10kg. Note-se

que, em voos internacionais, já

existia

regra

semelhante: caso o passageiro voasse em classe econômica, seu limite de bagagem seria inferior ao disponível se viajasse em classe executiva ou primeira classe. A novidade passou a existir apenas nos voos domésticos, com a diferença de que não se trata mais de despachar mais ou menos quantidade de bagagem, gratuitamente, mas de despachá-la gratuitamente ou não. A mudança normativa leva a uma mudança de costumes e comportamentos, e toda alteração de práticas já consolidadas gera desconforto, incerteza, apreensão e outros incômodos; gera também expectativas, tanto positivas quanto negativas. Os efeitos das mudanças, além disso, raramente são idênticos para todas as pessoas ou grupos que participam do processo alterado. Nem sempre todos os impactos dessa mudança de costumes ficam claros antes de ocorrerem, razão pela qual será interessante realizar novas avaliações no futuro, após decorrido um tempo relativamente longo de vigência das novas normas, pois o passar dos anos pode revelar consequências não antecipadas quando da tomada da decisão, ou mesmo ainda invisíveis pouco tempo após a introdução da nova regra. A priori, porém, algumas considerações podem ser feitas. Por serem mais sensíveis a preço, os viajantes a turismo provavelmente tentarão reduzir o peso de sua bagagem despachada, ou evitá-la, para, neste caso, 9

aproveitar passagens oferecidas a preço próximo do custo marginal3, agora mais baixo em virtude de o transportador não estar obrigado a assumir o ônus da bagagem despachada, antes repassado ao valor do bilhete. Os viajantes a negócio, por seu turno, os quais representam uma demanda pouco sensível a preço, não alterarão comportamentos, despachando bagagem sempre que isso for necessário. Ocorre que, na maior parte das vezes, esse tipo de viagem não exige nada além de bagagem de mão, em face de o passageiro permanecer por pouco tempo no destino. O ganho da empresa aérea, nesse segmento, pode ser pequeno, assim. No caso de viagens internacionais, parece haver perspectiva de ganho relevante para os transportadores, pois a permanência no destino costuma ser maior, exigindo bagagem mais volumosa. Além desse aspecto, a concorrência em diversas rotas para o exterior é pequena, contribuindo para a adoção de taxas de despacho de valor mais elevado. Por fim, deve-se ter em mente que o viajante padrão, indo para o exterior, realiza ação excepcional, pouco comum em seu cotidiano; tem, portanto, menos resistência a gastar uma quantia adicional para concretizar seu sonho. Sobre mudanças de hábito, é relevante lembrar que, até recentemente, no Brasil, era possível simplesmente não embarcar, e isso sem qualquer custo para o passageiro. O no show, como era chamada a prática, representava um evidente custo para as transportadoras, afinal, o passageiro que não aparecia e podia embarcar, sem ônus adicionais, noutro voo subsequente rumo ao mesmo destino, “obrigava” a empresa a deixar livre um assento que poderia ter sido vendido. As transportadoras buscavam compensar essa perda mediante o overbooking, prática que se tornou muito criticada pelos passageiros, pois as empresas vendiam passagens além da capacidade da aeronave, “apostando” que os assentos vendidos a mais seriam compensados por passageiros que não embarcariam. Com a nova política de preços para as passagens aéreas, a partir da liberdade tarifária concedida e da posterior cobrança para se alterar o horário de um voo, a prática do overbooking praticamente desapareceu, ou, ao

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Custo marginal é o acréscimo de custo decorrente da produção de uma unidade adicional de qualquer produto ou serviço.

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menos, desapareceu das manchetes e dos registros de reclamações feitos pelos passageiros. 4 - VENDA CASADA Apesar da tradição, do costume e dos hábitos, o fato é que há passageiros que viajam sem bagagem, ou apenas com mala de mão, e outros que viajam com muita bagagem. Alguns levam consigo malas com peso acima de 10kg, que apenas podem ser transportadas no porão do avião e que, portanto, precisam ser despachadas. Assim, podem ser considerados serviços diferentes, por um lado, vender uma passagem para o transporte de um passageiro e, por outro lado, vender uma passagem para transportar um passageiro com bagagem acima de 10kg. Se esses são serviços distintos, exigir que todo passageiro necessariamente pague para levar bagagem, mesmo aqueles que não levarão malas, pode ser considerada uma forma de “venda casada”: para todo e qualquer passageiro, vende-se tanto o transporte da pessoa quanto da sua bagagem, embora apenas alguns se interessem por despachar malas. Pode-se argumentar, ainda, que as empresas aéreas, com o consentimento da ANAC, e mesmo do antecessor dela, o Departamento de Avião Civil – DAC, extinto em março de 2006, praticavam sistematicamente o que se chama de “agrupamento de produtos”, prática que foi coibida com a nova Resolução. Enquanto no linguajar corrente fala-se em “venda casada”, nas análises sobre estratégias empresariais em mercados não competitivos usa-se, com mais frequência, a expressão “agrupamento de produtos”. É difícil, senão impossível, diferenciar uma da outra. Não há muito tempo, surgiram, no Brasil, hotéis chamados pela expressão em inglês “all inclusive”. São hotéis que oferecem ao hóspede um pacote em que, além da hospedagem tradicionalmente oferecida na maioria das unidades hoteleiras – cama, banho e café da manhã –, estão incluídos no preço almoço, jantar e tudo o que o hóspede possa beber ou gozar, como vinhos, sauna, massagens e outros serviços. Também são relativamente recentes, no Brasil, os hotéis que oferecem a cama e o banho, mas não o café da manhã, que 11

deve ser adquirido separadamente. Em um mercado altamente segmentado, como o hoteleiro, há ainda hotéis que oferecem quartos compartilhados. Em síntese, mesmo serviços que a tradição sugere serem “únicos”, na realidade, podem, muitas vezes, ser desagregados e separados em serviços menores e complementares. De maneira similar, há, no Brasil e em muitos outros países, restaurantes que apenas vendem o chamado “menu completo”. Seria possível acusar tais restaurantes de praticar a ilegal “venda casada”? O mais comum, Brasil afora, é que nos restaurantes, a entrada, o prato principal e a sobremesa tenham, cada qual, o seu preço, sendo o cliente livre para comer apenas o prato que escolher. A questão daquilo que é, ou não, venda casada, vê-se, não tem seus limites claramente definidos. Rigorosamente, o Código de Defesa do Consumidor – CDC, em seu art. 39, inciso I, define e condena o que é chamado de “venda casada”, ao dizer ser vedado ao fornecedor de produtos ou serviços “condicionar o fornecimento de um produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos”. No Brasil, outras leis reforçaram esse entendimento. Será possível argumentar que nem os hotéis “all inclusive” nem os restaurantes de “menu completo” praticam a “venda casada”? Não obstante a lei, a prática tem se expandido... Aceita a compreensão de que o transporte do passageiro é um serviço distinto do transporte da sua bagagem, então a conclusão torna-se clara e se pode entender que a Resolução nº 400, da ANAC, de fato, veio coibir uma prática que, embora generalizada e mesmo incorporada aos costumes, podia ser considerada ilegal, a depender da interpretação do operador do direito. 5 - A JUSTIFICATIVA DA ANAC Ao explicar a sua motivação para alterar a norma então vigente e adotar a Resolução nº 400, de 2016, a ANAC utilizou os seguintes argumentos: 

O transporte de bagagem é o segundo item que mais recebeu demandas na ANAC nos últimos três anos, não

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só por passageiros, mas também por membros do Ministério Público e do Congresso Nacional; 

Proteger os passageiros que se encontram em situação de vulnerabilidade;



Alinhar a legislação da aviação civil aos tratados internacionais e às práticas de mercado;



A prática internacional é não haver regulação estatal para disciplinar a franquia de bagagem. Dado que a franquia de bagagem é precificada no valor da tarifa, ela não necessariamente constitui um benefício ao passageiro, mas um custo que independe da sua utilização;



O transportador aéreo poderá́

oferecer, nos voos

internacionais (exceto para América do Sul e América Central), tarifas com franquia de bagagem reduzida aos passageiros que se proponham a viajar com menor quantidade de bagagem. Tal dispositivo aumenta a racionalidade econômica do transporte aéreo, permitindo que passageiros que transportem menor quantidade de bagagem possam pagar tarifas menores do que os que transportem a quantia total da franquia, aumentando a gama de serviços ofertados. Os dois primeiros itens da justificação da ANAC carecem de maiores explicações. Afinal, não ficam claros quais os motivos das reclamações sobre bagagens, nem por que razão permitir a cobrança da mala despachada reduziria as queixas dos passageiros. A conexão entre o segundo motivo – proteger passageiros em situação de vulnerabilidade – e a permissão para a cobrança aqui comentada não foi explicitada, e não é fácil entender qual seria. Não obstante, as demais razões são, em si, bastante fortes e claras. 6 - A QUESTÃO DA DISCRIMINAÇÃO DE PREÇOS A discriminação de preços é um processo mediante o qual empresas vendem, seja em momentos distintos, seja em mercados diferentes, o 13

mesmo produto por preços diferentes. Atualmente, é de conhecimento geral que os preços das passagens aéreas se tornam mais caros à medida que se aproxima a data do voo, o que torna possível que viajem, na mesma aeronave, para o mesmo destino e horário, pessoas que pagaram preços muito díspares pelos seus assentos. Como e por qual razão isso ocorre? Gonçalves (2017) mostra que: Em face de a Lei nº 11.182, de 2005, estabelecer que o regime tarifário a vigorar no transporte aéreo é o da liberdade tarifária, cada empresa pode cobrar preços diferenciados não apenas por seus voos entre um mesmo par de cidades, em um mesmo dia, mas também por assentos em um mesmo voo. A tal prática de criar categorias de tarifas para ingresso em uma mesma aeronave dá-se o nome de discriminação de preço, parte importante da estratégia de yield management, ou gerenciamento de receita. Qual o sentido econômico dessa prática? Ela é fruto do desejo racional do empresário de extrair a melhor oferta dos consumidores por cada unidade adicional de sua mercadoria (os assentos, no caso da aviação). Isso o impele, necessariamente, a tentativas de impor preços variados tão próximos quanto possível, cada um deles, do valor atribuído ao produto por cada comprador em particular ou, mais realisticamente, por cada segmento de consumidores. Estabelecendo preços diferentes para duas mercadorias (assentos) que pareçam homogêneas aos olhos dos consumidores, o empresário, enfim, busca elevar sua receita total, dado o estoque disponível dessas mercadorias. Vou a uma explicação mais prática: como o transportador avalia que a preços elevados apenas uma parcela dos assentos da aeronave será preenchida, ele precisa oferecer assentos a preços mais baixos, tomando o cuidado, contudo, de evitar que os assentos comercializados a preços mais baixos sejam revendidos mais adiante a preços mais elevados, pelos próprios compradores – a chamada arbitragem.

Como se vê, a prática permite que mais passagens sejam vendidas, pois atende a segmentos diversos do mercado: num, pessoas que apenas pagariam certo preço, digamos, baixo, pela viagem; noutro, pessoas que necessitam viajar e, dessa forma, estão dispostas a pagar preços mais elevados. A soma das passagens adquiridas pelos passageiros dos dois segmentos possibilita receita maior ao transportador aéreo. Voltando à questão da cobrança pelo despacho de bagagem, é necessário, primeiro, deixar claro que essa prática não se confunde com a discriminação de preços. Pelo contrário, trata-se da prática de “desagrupar 14

produtos” antes vendidos conjuntamente ou, para utilizar expressão de uso mais generalizado, antes comercializados mediante “venda casada”. Afinal, como se argumentou acima, pode-se perfeitamente entender que são dois serviços distintos o transporte do passageiro e o transporte de sua mala. No entanto, a menção à discriminação de preços, parece-nos, ajuda a compreender a dinâmica que se aplica também à cobrança da mala despachada. 7 - COMPRAR E NÃO OBTER A PROPRIEDADE? As passagens aéreas constituem um caso particular de mercadoria, e não apenas no Brasil. Usualmente, quando se compra um produto ou serviço, o comprador passa a ser o seu proprietário e dele pode dispor conforme queira, inclusive vendendo-o a terceiros, com lucro ou prejuízo. A passagem aérea é uma exceção! Se o consumidor adquire uma caneta, um automóvel, ou mesmo um jantar ou uma consulta médica, se lhe for conveniente, ele pode ceder ou vender tal produto ou serviço no momento seguinte à compra, inclusive com ganho ou perda financeira. No caso de produtos, a qualquer momento poderá ocorrer tal repasse, inclusive diferenciando o “produto novo” do “produto usado”; no caso dos serviços, o comprador apenas poderá repassá-los a terceiros antes de os ter utilizado, pois todos os serviços são efêmeros e desvanecem após ofertados. Um assento em avião não pode mais ser vendido, e sequer existe, após o voo concluído! Nesse aspecto, a passagem aérea é exatamente igual à passagem de ônibus. Esta, porém, pode ser alterada, ou simplesmente devolvida, sem qualquer ônus para o passageiro, até poucas horas antes da partida prevista. Pode, inclusive, ser transferida de uma pessoa a outra, procedimento que, para ser concluído, exige tão-somente a presença de ambos em balcão da transportadora. No Brasil, a passagem aérea apenas pode ser trocada até 24 horas após adquirida. É essa vantagem das passagens aéreas – vantagem, desde o ponto de vista das empresas transportadoras; desvantagem, desde o ponto de vista do consumidor ou passageiro – que permite às linhas aéreas praticar a 15

discriminação de preços, nome técnico da prática mediante a qual há preços diferentes para o mesmo assento, a depender da antecedência com que se adquire a passagem. É exatamente essa impossibilidade de o comprador repassar sua passagem que torna impossível a prática da arbitragem e possível a prática da discriminação de preços. A propósito, a arbitragem é o mecanismo pelo qual alguém adquire um produto num mercado ou num momento em que ele é mais barato para revendê-lo noutro mercado ou posteriormente, em que tal produto se torna mais caro. Aquele que pratica arbitragem tem papel econômico relevante em diversos aspectos e corre um risco, pois pode acontecer de sua previsão de preços futuros mais elevados não se realizar. É preciso, no entanto, destacar o efeito econômico de eventual permissão para a criação de um mercado secundário de venda de passagens, mediante a possibilidade de transferência de bilhete de uma pessoa a outra: ao contrário do mercado de transporte rodoviário de passageiros, no mercado aéreo, há uma quantidade grande de passageiros que adquire bilhete de valor elevado, às vésperas da viagem. Essa receita é apropriada pelo transportador e serve para contrabalançar os preços baixos que são praticados para atrair a demanda mais sensível. Se um mercado secundário se formar, e a receita da venda desses bilhetes for distribuída entre vendedores avulsos e transportador, este tenderá a elevar o preço médio das passagens, para manter inalterada a receita. 8 - EVOLUÇÃO DOS PREÇOS DAS PASSAGENS AÉREAS NO BRASIL Não obstante a prática da discriminação de preços – e, em parte, até mesmo devido a ela –, os preços das passagens aéreas, no Brasil, apresentaram queda nos últimos anos. Relatório da ANAC mostra a evolução dos preços das passagens aéreas, desde 2007 até 2016. No gráfico, fica claro que houve queda nos valores médios comercializados.

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Importante ainda observar que os preços acima retratados não incluem as taxas pagas pelos passageiros que necessitam remarcar seus bilhetes. Assim, caso um passageiro tenha adquirido sua passagem por R$ 100,00 e, devido à necessidade de alterar a data do voo, acabou por pagar multa e ainda arcar com a diferença de tarifa, prevalece, na informação que alimenta a estatística, o valor de R$ 100,00. Indagada por telefone em 4 de setembro de 2017, a Gerência de Acompanhamento de Mercado da ANAC informou que a Agência não dispõe de informações sobre a proporção de passageiros que efetuam a remarcação das passagens, nem sobre o valor das multas, nem tampouco sobre a evolução temporal da proporção de passageiros que despacha a mala. Assim, embora o gráfico mostre uma redução no preço médio das passagens, não se pode afirmar, com certeza, que tenha havido redução no desembolso médio dos passageiros. Novamente, há necessidade de maior detalhamento nas informações contábeis tornadas públicas. Embora a ANAC não disponha da informação atualizada regularmente sobre passageiros com e sem bagagem, sabe-se que, em 2014, 35% dos passageiros não despacharam bagagem. Essa informação provém da pesquisa “O Brasil que Voa”, conduzida pela então Secretaria de Aviação Civil. Nessa pesquisa, foram entrevistados 150.000 passageiros, em 65 aeroportos. A 17

média de passageiros brasileiros que despacham bagagem varia entre o mínimo de 23,8%, no Norte, a 39,7%, no Sudeste.4 Com base nesses números, não seria correto concluir que a regra de pagar para despachar a mala afetaria negativamente 65% dos passageiros em viagem pelas rotas domésticas brasileiras. Isso por várias razões, sendo uma das mais importantes a expectativa de que o preço médio das passagens poderá cair, beneficiando, principalmente, o passageiro que voa sem bagagem. 9 - AVALIAÇÕES INTERNACIONAIS Há anos, a cobrança da mala despachada foi introduzida noutros mercados, como nos EUA e na Europa. A expectativa teórica era que: A teoria predizia que a tarifa média de uma empresa aérea deveria cair quando ela introduz uma taxa por bagagem, mas forte confirmação à primeira previsão. [...] parece que o preço cheio sobe para o passageiro a lazer médio por pelo menos metade da taxa de bagagem. [...] os que não despacham bagagem, entre os passageiros a lazer, se beneficiam de uma tarifa mais baixa. Brueckner et al., (2014).

Um impacto aparentemente inesperado, ocorrido após a Ryanair implementar, de maneira rígida, a sua política de apenas uma mala, em 2009, foi uma queda no faturamento das lojas situadas nos aeroportos onde aquela empresa tem participação expressiva. O fato se deve, supostamente, a que os passageiros, sem certeza com relação à política da empresa aérea quanto à bagagem, tornaram-se receosos de fazer compras antes de embarcar, uma vez que incertos quanto ao custo adicional que tais aquisições implicariam. (Bush & Storey, 2013). A prática de se cobrar por uma mala despachada, ou pela segunda mala despachada, teve início nos EUA, em 2007, ou, segundo outras fontes, em 2005 (NYT April 6, 2010). A justificativa utilizada pela Spirit Airlines, a primeira empresa a adotar a medida, era que isso reduziria seus custos e possibilitaria uma receita adicional de US$ 100.000.000,00 (cem milhões de dólares). Rapidamente, quase todas as outras empresas aéreas norte4

Brasil que Voa, disponível em . Acesso em: 4 set. 2017.

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americanas adotaram a mesma política. Uma das que não seguiu a nova tendência foi a Southwest Airlines. Pelo contrário, a empresa tentou ampliar sua participação no mercado por meio de uma campanha publicitária que destacava, exatamente, que nela “as malas viajavam gratuitamente”. A empresa considera bem-sucedida sua campanha publicitária, o que significa que ela acredita que a receita adicional decorrente do maior número de passageiros mais do que compensa a perda de receita ocasionada por não cobrar pela mala despachada, assim como os custos adicionais ocasionados pelo aumento do consumo de combustível decorrente do maior peso da aeronave carregada de malas, além dos demais custos associados, tais como a manipulação das bagagens desde o check in até o check out, etc. Há que se registrar que o “sucesso” da Southwest é possível para uma empresa que busca se diferenciar, mas pode não ser verdadeiro para o conjunto da indústria. Para ser válida para todas as empresas, juntas, seria necessário que o preço mais baixo da viagem – isto é, que o desembolso total efetuado pelo passageiro – caísse suficientemente para motivar um crescimento tal da quantidade de passageiros que viesse a compensar a receita menor gerada por cada passageiro, ao não pagar pela bagagem despachada. A receita gerada pela cobrança da mala despachada, naquele país, elevou-se de 0,27% da receita operacional para 0,62% em 2007, alcançando 1,94% em 2010. No primeiro semestre de 2012, o volume arrecadado com a nova política de preços alcançou US$ 1,7 bilhão! (Nicolae et al., 2013). Nicolae et al. analisam principalmente questões operacionais, e suas conclusões mostram que a nova prática gerou pouco impacto sobre os atrasos5, com alguma diferença entre empresas ditas low cost e as tradicionais. Afirmam que as receitas originadas com a cobrança pela mala despachada alcançaram mais de US$ 2 bilhões nos nove primeiros meses de 2009. Essa receita não inclui outro fator favorável às empresas aéreas: com a cobrança,

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Há pessoas que argumentam que o maior número e tamanho das malas levadas dentro da cabine ocasionaram demora adicional no embarque e no desembarque, devido à dificuldade de acomodação e recuperação delas.

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menos passageiros despacham malas e isso abre espaço, nos porões das aeronaves, para o transporte de carga, cobrado a preços mais elevados do que a bagagem. Krum (2015) argumenta que as companhias aéreas, nos EUA, faturaram US$ 38 bilhões em 2014, a partir das taxas “complementares”. Essas são taxas cobradas para transportar bagagens de tamanho extra, sobrepeso, compras de última hora, prioridade para embarque, entre outras, e não se referem apenas ao custo adicional de despachar a mala. No

Brasil,

como

têm

se

comportado

essas

taxas

“complementares”? Essa informação é crucial para uma análise mais acurada das implicações, para os consumidores que viajam de avião, da nova norma que permite preços diferenciados para passageiros com ou sem bagagem. No caso brasileiro, de acordo com informações da GOL Linhas Aéreas, repassadas à ANAC e divulgadas também por ela, as “receitas auxiliares” são assim definidas: “compreendem todas as receitas que são atreladas à prestação de serviço de transporte aéreo, tais como excesso de bagagem, cobranças por remarcações, reembolsos, entre outros. Tais receitas deverão ser avaliadas e deverão ser enquadradas como “distintas” ou “relacionadas ao serviço principal”, sendo reconhecidas no momento em que incorrem.” Na demonstração de resultado da GOL, para o primeiro trimestre de 2017, assim como no comparativo com relação ao mesmo período de 2016, não há informação sobre “receitas auxiliares”. Há, porém, menção a “outras receitas”. Embora seja possível, e até mesmo provável, que as duas terminologias se refiram às mesmas fontes de receitas, isso não é, necessariamente, verdadeiro, razão pela qual há que se ter cuidado com a análise desses dados. No primeiro trimestre de 2017, as “outras receitas” da GOL somaram 7,6% da “receita de passageiros”; no ano anterior, a mesma relação alcançava 6,9%. Na Azul, a relação entre as “outras receitas” e a de “transporte 20

de passageiros” foi, nos mesmos períodos, de 16,3% e de 12,9%. Para o mesmo período, a LATAM não apresentou os dados com os mesmos detalhes das duas citadas anteriormente; sem informações adicionais, torna-se impossível ampliar a comparação. Note-se que as demonstrações de resultados mencionadas se referem a um período em que ainda não havia entrado em vigor a nova norma com relação às bagagens. Para o caso dos EUA, Leff (2015) argumenta que uma das principais razões para a adoção da cobrança de malas é evitar o imposto incidente sobre o valor das passagens, igual a 7,5%. Isso porque, sobre a receita com as malas, não incide tal imposto. O emaranhado fiscal brasileiro torna necessária uma pesquisa específica sobre a questão tributária e o possível efeito dos tributos sobre a decisão das empresas de adotar a cobrança da mala despachada. No Brasil, esse possível benefício às empresas, em detrimento do Tesouro Nacional, ainda não foi avaliado. Muitas das análises – e a maioria se refere ao mercado norteamericano, cuja estrutura é muito mais concorrencial que o mercado brasileiro – afirmam que a motivação básica das empresas aéreas, para introduzir a cobrança por mala despachada, foi a necessidade de faturar mais, num ambiente de custos elevados e oscilantes, em especial com os combustíveis. Em outras palavras, a adoção da prática por quase todas as empresas visou, e teve como resultado, um aumento de receita. Importante verificar, pois, de onde vem essa receita adicional. Os relatórios financeiros das empresas brasileiras não são suficientemente claros e detalhados para que se possa responder com precisão. No Brasil, os argumentos utilizados pelas empresas estiveram em linha com as expectativas teóricas, já mencionadas. Há, no entanto, uma curiosidade: enquanto os órgãos de defesa do consumidor mantiveram-se, no mínimo, reticentes quanto aos impactos da medida, foram as próprias empresas que lutaram para que a Resolução nº 400 entrasse em vigor, argumentando suas vantagens para o consumidor. Esse terá sido, possivelmente, o primeiro caso em que empresas se reúnem para defender medidas em benefício do consumidor, ao contrário do tão citado dito de Adam Smith, no distante ano de

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1776, sobre a probabilidade de conluio em busca de vantagens para si sempre que dois comerciantes entabulam uma conversa! 10 - CONCLUSÕES A adoção da prática de se cobrar para despachar bagagens em aeronaves, no Brasil, é ainda muito recente, o que exige que uma avaliação dos seus impactos sobre o consumidor se baseie mais em inferências do que em análise de resultados já observados. A literatura sobre o tema, assim como estudos disponíveis sobre resultados em outros mercados, sugere que os passageiros que não levam bagagem serão beneficiados com preços menores, e aqueles viajantes que levam malas tenderão a pagar valores mais elevados. Não é certo, porém, que esse último resultado ocorra, pois são muitas as variáveis em jogo. No entanto, as demonstrações financeiras apresentadas pelas companhias aéreas brasileiras à ANAC não tornam disponíveis dados suficientemente detalhados que permitam prever o real efeito da Resolução nº 400, de 2016, sobre as receitas das empresas e sobre as despesas dos seus clientes. Embora não necessariamente os mesmos resultados venham a ocorrer no Brasil, é provável que também aqui os viajantes que não levarem malas paguem preços menores.

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REFERÊNCIAS BRASIL, Secretaria de Aviação Civil, Brasil que Voa. Disponível em: http://www.aviacao.gov.br/obrasilquevoa/pdf/release-O-Brasil-que-voa.pdf. Acesso em 4 set. 2017. BRUECKNER, J.K., LEE, D.N., PICARD, P.M., SINGER, E. Product Unbundling in the Travel Industry: The Economics of Airline Bag Fees. Disponível em: http://www.socsci.uci.edu/~jkbrueck/course%20readings/bag_fee.pdf.

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