Arantes, Paulo Eduardo. Sentimento da dialética na

Dualismo segundo Jacob Gorender (“O Escravismo Colonial”, ... civil & Modernidade europeia + Laços morais de favor & País colonial (74) Exemplo: Escra...

104 downloads 677 Views 102KB Size
Arantes, Paulo Eduardo. Sentimento da dialética na experiência intelectual brasileira. Dialética e dualidade segundo Antonio Candido e Roberto Schwarz. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.

Sentimento das elites: Localismo & Cosmopolitismo Joaquim Nabuco: Sentimento Brasileiro & Imaginação Europeia (14) A insistência de uma elite burra no escravismo atrasava a entrada do Brasil na modernidade. Drummond (15) “... nascer entre paisagens incultas e sob céus pouco civilizados.” Paulo Emílio (15) “... destituídos de cultura original, nada nos é estrangeiro, pois tudo o é. A penosa construção de nós mesmos se desenvolve na dialética rarefeita entre o não ser e o ser outro.” Mário de Andrade “... imundície de contrastes” – existência sem projeto e preguiça indiferente X progresso e ética do trabalho (23) Gilberto Freyre “modernismo passadista” em que o passado e o presente estão unidos de forma acolhedora (24) Ideal modernista “Sistema mundial de contribuições culturais nacionais singulares.” (19) Schwarz: deslocamento intelectual, teoria literária e dualismo A crítica literária é fácil quando o objeto são as obras europeias, nas quais a realidade que serve de referência já está, ela mesma, impregnada por uma tradição intelectual. O problema das obras brasileiras é que o conceito dessa realidade não está nelas, porque o Brasil não gerou discurso socialmente entranhado sobre si mesmo. A sacada schwarziana é perceber que essa ausência é, ela mesma, traço constitutivo da realidade brasileira retratada. Ela não é um vazio, mas tem um conteúdo: é negação determinada da fluência metropolitana, é o negativo necessário e constitutivo dessa fluência (53-4). Schwarz se dá conta disso, ademais, no momento em que a realidade nacional brasileira esgota o dualismo através da ditadura militar, com sua co-implicação entre o moderno e o arcaico, e, esteticamente, através do Tropicalismo. Dualismo refletido teoricamente Origem intelectual do Dualismo: Ignácio Rangel

(“Dualidade básica brasileira”, 1957): o Latifúndio é internamente FEUDAL e externamente CAPITALISTA. (25) Dualismo segundo Jacob Gorender (“O Escravismo Colonial”, 1978): Nelson Weneck Sodré (Militar desenvolvimentista; PCB): ESCRAVISMO (afeito ao capital) na faixa litorânea dos engenhos + FEUDALISMO na vastidão do interior. (25) Dualismo das teorias funcionalistas da modernização (influência norte-americana) PAÍS MARGINAL (residual, desajustado) + PAÍS INTEGRADO (avançado, funcional) → Coexistência de tempos históricos diferentes → Modernização = Superar defasagem Dualismo PCBista ATRASO: proprietários rurais e camponeses; resistem à mudança PROGRESSO: empresários, classes médias urbanas e trabalhadores “... onde havia reforma no Brasil velho e emperrado, lá estaria a burguesia, plena ou embrionária, como na Abolição, na República, com os Tenentes e com a Semana de 22; já Canudos e assemelhados (‘barbárie’ …) exprimiam a desagregação da ordem tradicional, minada pela modernização da sociedade; e toda vez que um grupo supostamente moderno não se conformava ao seu papel, o fiasco era visto como fruto da sobrevivência dos padrões tradicionais”. (27) Dualismo do CEPAL (28) DIVISÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO + TROCA DESIGUAL Celso Furtado: conceito rigoroso de subdesenvolvimento (“Dialética do desenvolvimento”, 1964) ECONOMIA AGRÍCOLA RETARDATÁRIA + ECONOMIA TIPICAMENTE CAPITALIST → DUALISMO ESTRUTURAL: Duas formas de remuneração do trabalho. Duas tecnologias de níveis diversos. Duas concepções de organização da produção. Dualismo do Florestan Fernandes (30) (“A revolução burguesa no Brasil”, 1975) País se industrializa sem perder cara agrária, se urbaniza sem perder jeito rural Manutenção de base produtiva “tradicional” + Formas “tradicionais” de mando + Formas de poder e ordem legal de país “moderno” → “Dualismo estrutural”

Dualismo do F.H.C. (65-66) (“Capitalismo e escravidão no Brasil meridional”, 1962) Produtores coloniais dependem da expansão do capitalismo comercial → Não eram pré-capitalistas Sistema mercantil mundial → Nossos escravismo não era antigo Não há relações de vassalagem, domínios, servos, etc. Proprietários rurais não exploravam +V, portanto não eram burguesia rural Empresários brasileiros são “sócios menores” do capital internacional, enfrentam sindicatos, participam do capitalismo agrário. Portanto, a burguesia não é progressista. (“Empresário industrial e desenvolvimento econômico”, 1964) (35) Dualismo da Maria Sylvia de Carvalho Franco (“Homens livres na ordem escravocrata”, 1969) UNIDADE DO LATIFÚNDIO COLONIAL: a “produção direta dos meios da vida” e a “produção de mercadorias” são momentos da atividade econômica do latifúndio que “não existem um sem o outro”. Mas “produção e consumo diretos só encontram sua razão de ser na atividade mercantil.” (68) O empreendedor colonial é burguês de nascença (“raça dura, industriosa e frugal”) ← Caracterização weberiana Escravidão como função do capitalismo comercial A “tradição” que engendra a miséria cafeeira é a mesma que serviu aos requisitos “modernos” do lucro O colapso não se deve às “propriedades deletérias universais da escravidão”, mas à sua ligação com a agricultura comercial O teor destrutivo da escravidão é “função do seu aproveitamento ditado pelos cânones capitalistas” “Colônia e metrópole não recobrem modos de produção essencialmente diferentes, mas são situações particulares que se determinam no processo interno de diferenciação do sistema capitalista mundial.” (48) Dualismo → Políticas conservadoras de modernização O dualismo aceita tacitamente a vantagem da industrialização capitalista e seus supostos conteúdos civilizatórios. (49) Os homens livres e o favor

Escravidão bloqueia formação de sociedade de classes → Impede relação mercantil entre proprietários e homens livros → Figura do FAVOR ↔ Associações morais da autoridade + Atividade lucrativa com base no interesse O senhor define natureza dos laços, agindo ora como patriarca, ora como negociante (71) Dualismo em Fernando Novais: “Sistema colonial” (“Portugal e Brasil na crise do antigo sistema colonial”, 1979) A exploração colonial é requisito para a passagem europeia ao capitalismo. “A periferia colonial se apresenta como ponto nevrálgico em que o capitalismo metropolitano revela a sua natureza.” (85) Através da exploração comercial das áreas ultramarinas, promovia-se a ACUMULAÇÃO PRIMITIVA DE CAPITAL. (86) “Enquanto na Europa moderna o desenvolvimento capitalista ‘libertava’ os produtores diretos da servidão medieval e integrava-os como assalariados na nova estrutura de | produção que camuflava a exploração do trabalho, as economias coloniais periféricas, montadas exatamente como alavancas do crescimento do capitalismo e integradas nas suas linhas de força, punham a nu essa mesma exploração na sua crueza mais negra.” (Novais, apud. 86-7) Tráfico negreiro → Escravidão > Escravidão → Tráfico negreiro → Capitalismo introduz a escravidão → Escravidão participa na formação do capital industrial → Desenvolvimento industrial causa crise entre capital e escravidão Dualismo tropicalista “Apego sentimental à profundidade histórica do traço localista que desacredita a pretensa superioridade do padrão cosmopolita.” (33) “Ready-made” que mostra integração entre arcaico e moderno. (38) Polo subdesenvolvido mostra com vantagem a verdade do sistema mundial. (38) A superposição entre arcaico e moderno é vista por um ângulo positivo/afirmativo devido ao seu efeito estético. (39) “O veículo é moderno e o conteúdo é arcaico, mas o passado é nobre e o presente é comercial; por outro lado, o passado é iníquo e o presente é autêntico, etc.” (32) Dualismo esteticamente refletido José de Alencar / Senhora (76) Periferia da trama: prosa balanceada e isenta, com vícios, virtudes e mazelas. Trama principal: reflexões normativas / figurino europeu da vida complexa.

“Intriga romântico-liberal” + “relações locais paternalistas” (76) Machado das heroínas (77-8) Problema da conciliação entre sentimento e interesse → Polir e civilizar o paternalismo Diferença frente ao romance europeu da ascensão social: favor/sentimento/moralidade que abre as portas para o talento.

aqui,

é

o

Elevação / educação / esclarecimento dos senhores através das ideias liberais descontextualizadas. Problema do estatuto das “ideias modernas” / “liberalismo” Discurso autoritário dos anos 1920 (80) “Anglo-saxonismo de fachada” < Tradição personalista autenticamente brasileira Sérgio Buarque de Holanda (81) Enxerto liberal para liquidar raízes ibéricas Florestan Fernandes (81) Liberalismo é ideologia quando empregado pelos interesses patrimonialistas senhoriais Liberalismo é utopia quando exprime movimento da sociedade civil Sociologia USPiana dependentista dá década de 1960 (81-2) Imperialismo educa elites + Mantém oligarquias → Liberalismo circunscrito aos círculos dominantes → Participação política encurtada Schwarz: Absurda liberdade das elites → Valor dúbio do liberalismo Favor / Gente de bem decide se vai ou não se pautar pela norma civilizada → Infração é norma, norma é infração ↔ Vínculo ambíguo com a escravidão numa economia capitalista → Potentados: decisão arbitrária → Fraseologia da sociedade civil & Modernidade europeia + Laços morais de favor & País colonial (74) Exemplo: Escravismo dá lucro → Senhor de escravo era capitalista > Discípulo de Adam Smith: capitalismo & liberdade → “Obscurantismo é realismo e responsabilidade” + Ciência é fantasia moral ← Realidade não obriga à coerência (83-4) Schwarz: Colônia x síntese do Modernismo Colônia é o aborto da síntese: “em lugar da contribuição local à diversidade das culturas, vem à frente a história da má-formação nacional como instância da marcha (…) catastrófica

do capital.” (Schwarz, apud. 19) Colonização: integração ao moderno ATRAVÉS do atraso. (36) Schwarz: Golpe Militar x Sentido positivo da modernização Retorno dos relegados pela modernização à luz do ultra-moderno (à moda tropicalista): “a revanche da província, dos pequenos proprietários, dos ratos de missa, das pudibundas, dos bacharéis em leis etc.” (32) Golpe frustra tentativa de modernização social / tendência, dentro do populismo, que destoava da via conservadora de sempre. (33) Golpe cristaliza conjunção de arcaico e moderno: a economia primário-exportadora passa diretamente para a economia industrial-oligopolítica sem passagem pelo momento competitivo do capitalismo. Desenvolvimento industrial + Dependência Dependência financeira / Técnica → Empresários locais + Multinacionais + Sistema financeiro internacional → Subdesenvolvimento & Movimento internacional do capital → Herança do passado não é entrave ao moderno... (36) → Subdesenvolvimento é “uma formação capitalista plena” (36) Schwarz: Desenvolvimento Desigual e Combinado “... a equanimidade sociológica particular a esse modo de produção [o Capitalismo], o qual realiza a sua finalidade econômica, o lucro, seja através da ruína de formas anteriores de opressão, seja através da reprodução e do agravamento delas.” (Apud. 88) “... a má-formação brasileira, dita atrasada, manifesta a ordem da atualidade a mesmo título que o progresso dos países adiantados.” “A razão de nosso modo de ser dua está nos avanços do capital e não numa compartimentação local idiossincrática.” Ideias < > Pressuposto social → Dimensão cognitiva das ideias é desmanchada + Desmanche / anomalia expõe fratura constitutiva da normalidade moderna (89) Schwarz: Machado & virada no realismo “Falência da forma europeia” está no conteúdo da obra. (91) Primeiros romances: caprichos do proprietário causam estragos → Busca de freio à irresponsabilidade dos ricos. (92) Romances maduros: condutas reprováveis se tornam procedimento narrativo. Subjetividade burguesa consistente é descartada. Enredo em torno de tal personagem não admite conflito rigoroso.

Não há, portanto, progresso na narrativa. Dialética indivíduo-sociedade é impossível. Sobra uma dialética negativa: “a hélice que empurra a narrativa machadiana em direção ao nada.” Teoria Estética de Schwarz Forma é algo que a sociedade tem e que o romance tem. Forma é o que o romance imita na sociedade. O crítico precisa desmembrar, na obra, o momento formal literário do referente dela que está contido nela. Ao fazer isso, surge uma imagem de um (ou do) mundo. Na “Dialética da Malandragem”, Antonio Candido mostra que o mundo que aparece é o da vida dos homens livres e pobres. A forma que mostra/organiza esse mundo, a lei formal do mundo e do romance, é o que Antonio Candido chama de “dialética da ordem e da desordem”. Essa dialética também é a chave para decifrar a especificidade da formação social brasileira. Dialética do Esclarecimento Projeto inacabado: Paulo & interpretação habermasiana da D.E. “... é próprio do Esclarecimento não cumprir o que promete, sem que a promessa de reconciliação seja nada, pelo contrário, ela só se torna ideologia quando se apresenta como promessa historicamente cumprida.” (96) Periferia fala sobre a Dialética do Esclarecimento global “... como a atualidade mundial expunha seus segredos na periferia do capital, que não era | resíduo, mas parte integrante de uma evolução de conjunto, por assim dizer constituíamos uma figura viva daquela mesma Dialética da Ilustração.” (96-7) Volubilidade brascubiana é resultado das luzes e abolição das luzes (Dialética Negativa) “... a volubilidade, na sua vertiginosa troca de posições, exige recursos intelectuais e estilísticos próprios das Luzes.” (97) Progresso → Atraso ≈ Modernidade → Escravidão Machado: “... registro criterioso do progresso como pressuposto do nosso atraso.” (99) “... escravismo e clientelismo não são fixados apenas pelo lado óbvio, do atraso, mas também pelo lado perturbador e mais substantivo de sua afinidade com a tendência

nova.” (Schwarz, apud. 100) Suprassunção negativa do Esclarecimento através da aparência “... separada do seu ímpeto reformador, que aqui não tinha o que fazer, ela se reduzia a um estoque de aparências modernas oferecidas à dissipação de um homem culto.” (98) Machado ≈ Dostoiewski “... a desmoralização das ideias (sobretudo as progressistas) posta em cena por Dostoiewski é consequência da ausência (no romance e no país) dos seus verdadeiros destinatários, os que precisam delas para ver claro sua posição numa sociedade antagônica – sem este horizonte objetivo elas se transformam de fato em fantasmagoria”. (104) PPP’s “... desacordo total entre a limitação dos personagens e a inteligência da escrita.” (105)