COMA E MORTE ENCEFÁLICA Regina Maria França Fernandes FACULDADE DE MEDICINA DE RIBEIRÃO PRETO - USP Departamento de Neurociências e Ciências do Comportamento
O COMA é um estado patológico provocado por alteração da fisiologia encefálica que leva a:
comprometimento ou perda da vigilância comprometimento ou perda das respostas
aos estímulos e do contato com o ambiente comprometimento ou perda da capacidade
de elaboração do pensamento e de compreensão dos mundos externo e interno
COMA: um tipo de encefalopatia que cursa com comprometimento grave da vigilância
ENCÉFALO
COMA CONSCIÊNCIA
QUANTIDADE
Aspectos QUANTITATIVOS da Consciência: perda do alerta ou despertar Sonolência
Torpor
Coma
QUALIDADE
Aspectos QUALITATIVOS da Consciência: conteúdo e curso do pensamento, compreensão do ambiente interno e externo
ESTRUTURAS RESPONSÁVEIS PELA MANUTENÇÃO DA CONSCIÊNCIA
QUALIDADE DE CONSCIÊNCIA - COGNIÇÃO
CÓRTEX CEREBRAL
S
S
E SRAA
N S
TÁLAMO
SRAA
N
VIGÍLIA
S
Ó
Ó
R
I O
E
ESTÍMULOS AFERENTES
SRAA: substância reticular ativadora ascendente
TRONCO ENCEFLÁLICO
MEDULA ESPINHAL
R ESTÍMULOS I AFERENTES O
COMA As lesões encefálicas, para provocarem coma, dependem de sua localização, tamanho e natureza
Encefalite
Lado Direito
Hérnia de Uncus à Esquerda
COMA
Etiologia
D
E
Hematoma Subdural Traumático à Esquerda com desvio da linha média
Contusão Cerebral Hemorrágica (explosão temporal) por TCE
COMA As lesões encefálicas, para provocarem coma, dependem de sua localização, tamanho e natureza
Tumor Cerebelar (Coma ±)
Tumor Cerebral: Glioblastoma Multiforme (Coma +) Tumor Cerebral Subcortical no Hemisfério Direito (Coma -)
COMA • Quais são as estruturas encefálicas cujo comprometimento pode levar ao Coma? • Quais são as lesões ou disfunções (etiologia) que podem provocar Coma? • Como reconhecer que um paciente está em Coma?
• Diagnóstico da Morte Encefálica
ESTRUTURAS ENVOLVIDAS NA GÊNESE DO COMA
Supra-tentorial
Infra-tentorial
ENCÉFALO
ETIOLOGIA DO COMA
Não-Estrutural - metabólico, drogas, toxinas, infecções, outros Estrutural - Simétrico e Assimétrico - Supra ou infra-tentorial
ETIOLOGIA DO COMA EXEMPLOS DE COMA NÃO-ESTRUTURAL Coma Metabólico
Hipóxia, Hipercarbia; Hipernatremia, Hiponatremia, Hipoglicemia; Coma Hiperglicêmico Não-Cetótico, Cetoacidose Diabética Acidose Lática; Hipercalcemia, Hipermagnesemia; Hipertermia, Hipotermia Encefalopatia Hepática, Uremia, Encefalopatia Dialítica; Encefalopatia de Wernicke, Porfiria, Aminoacidemia, Crise Addisoniana.
ETIOLOGIA DO COMA EXEMPLOS DE COMA NÃO-ESTRUTURAL
Toxinas : Chumbo, Tálio, Cogumelos, Cianidro, Metanol, Etileno-glicol, Monóxido de Carbono
Drogas : Álcool, Sedativos, Barbitúricos, Outros hipnóticos, Tranqüilizantes, Salisilato, Opióides, Anticolinérgicos, Anfetaminas, Lítio, Feniciclidina, IMAO
ETIOLOGIA DO COMA EXEMPLOS DE NÃO-ESTRUTURAL Infecções : Meningite/Meningoencefalite Bacteriana ou Viral, Encefalomielite Pós-Infecciosa, Sífilis terciária, Sepsis, Febre Tifóide, Malária cerebral, Tuberculose do SNC, etc... Outras Etiologias : Estado Pós-Crise Epiléptica, Isquemia Miocárdica Difusa (Infarto, ICC, Arritmia),
Hipotensão Arterial, Encefalopatia Hipertensiva, Hipotireoidismo, etc...
ETIOLOGIA DO COMA COMA ESTRUTURAL (supra ou infra-tentorial) • Acidentes Vasculares Encefálicos (isquêmicos e hemorrágicos) • Tumores Encefálicos • Abscessos / Granulomas Encefálicos • Higromas / Coleções Subdurais
• Traumatismo Crânio-encefálico (hematomas, contusões, hemorragias traumáticas) • Etc...
COMA Autores - Ruston da Matta Louback Filho e Igor Clare / site : www.fisioweb.com.br
HOSPITAL CARLOS CHAGAS
COMA EXAME DO PACIENTE EM COMA • PROFUNDIDADE DO COMA : Escala de Glasgow • POSTURAS ESPONTÂNEAS OU PROVOCADAS - Descerebração - Decorticação - Outras: opistótono, pé caído para a lateral • PRESENÇA DE CRISES EPILÉPTICAS • RESPIRAÇÃO (apnéia? Padrão anormal?) • HÁLITO (etílico, cetônico) • SINAIS EXTERNOS OU CUTÂNEOS (de TCE, rash, palidez, cianose, petéquias, edema/anasarca, icterícia...)
COMA ESCALA DE COMA DE GLASGOW I- MELHOR RESPOSTA MOTORA
III- ABERTURA OCULAR
Obedece comandos
6
Espontânea
4
Localiza estímulos
5
Ao chamado
3
Retirada de membros aos estimulos
4
À dor
2
Flexão anormal
3
Ausente
1
Extensão anormal
2
Ausente
1
II- MELHOR RESPOSTA VERBAL Orientado
5
Conversação confusa
4
Palavras inapropriadas
3
Sons incompreensíveis
2
Ausente
1
COMA ESCALA DE COMA DE GLASGOW
II- MELHOR RESPOSTA VERBAL Orientado
5
Conversação confusa
4
Palavras inapropriadas
3
Sons incompreensíveis
2
Ausente
1
COMA ESCALA DE COMA DE GLASGOW
II- MELHOR RESPOSTA VERBAL Orientado
5
Conversação confusa
4
Palavras inapropriadas
3
Sons incompreensíveis
2
Ausente
1
COMA ESCALA DE COMA DE GLASGOW
III- ABERTURA OCULAR Espontânea
4
Ao chamado
3
À dor
2
Ausente
1
Estimulação nociceptiva do paciente em coma
Respostas anormais a estímulos nociceptivos no paciente em coma
decorticação
Flexão anormal
decerebração
Extensão anormal
Plum & Posner`s Diagnosis of Stupor and Coma, 4th edition, 2007
COMA EXAME DO PACIENTE EM COMA • PROFUNDIDADE DO COMA : Escala de Glasgow • POSTURAS ESPONTÂNEAS OU PROVOCADAS - Decorticação - Decerebração - Outras: opistótono, pé caído para a lateral • PRESENÇA DE CRISES EPILÉPTICAS • RESPIRAÇÃO (apnéia? Padrão anormal?) • HÁLITO (etílico, cetônico) • SINAIS EXTERNOS OU CUTÂNEOS (de TCE, rash, palidez, cianose, petéquias, edema/anasarca, icterícia...)
COMA EXAME DO PACIENTE EM COMA • PROFUNDIDADE DO COMA : Escala de Glasgow • POSTURAS ESPONTÂNEAS OU PROVOCADAS - Descerebração - Decorticação - Outras: opistótono, pé caído para a lateral • PRESENÇA DE CRISES EPILÉPTICAS • RESPIRAÇÃO (apnéia? Padrão anormal?) • HÁLITO (etílico, cetônico) • SINAIS EXTERNOS OU CUTÂNEOS (de TCE, rash, palidez, cianose, petéquias, edema/anasarca, icterícia...)
Anormalidades do padrão respiratório no paciente em coma
Cheyne-Stokes
Hiperventilação neurogênica central
Apnêustica
Atáxica
Apnéia
COMA EXAME DO PACIENTE EM COMA
Exame dos nervos cranianos Exame do tono muscular e dos reflexos profundos
Exame de alguns reflexos cutâneos principais (cutâneo-abdominal, cutâneo-plantar, cremastérico) Exame de reflexos primitivos de origem frontal (voracidade, grasping, grooping)
Como examinar os nervos cranianos no paciente em COMA?
NERVO ÓPTICO 1- Via aferente do Reflexo Fotomotor 2- Papiledema ?
3- Hemorragias retinianas 4- Indícios de retinopatia hipertensiva ou diabética
Como examinar os nervos cranianos no paciente em COMA?
NERVO OCULOMOTOR (parte autonômica)
1- Diâmetro das pupilas 2- Via eferente do Reflexo Fotomotor
COMA O EXAME DAS PUPILAS
Isocóricas e Fotorreagentes
Anisocóricas, assimetria ou ausência do Reflexo Fotomotor direto ou cruzado
Médio-fixas (sem reflexos): fase diencéfalomesencefálica da deterioração rostro-caudal
Puntiformes: disfunção pontina
COMA
Nervo Oculomotor
Hérnia de Uncus Temporal ou Aumento de pressão no hemisfério cerebral : compressão do III nervo craniano midríase unilateral
Como examinar os nervos cranianos no paciente em COMA?
Nervos Oculomotor, Troclear e Abducente Avaliação dos Movimentos Oculares verticais e horizontais, obtidos através de 2 reflexos: - Oculocefálico ou Oculovestibular e - Prova Calórica
Abrir os olhos do paciente e mobilizar sua cabeça
Desvio da cabeça para a D olhar conjugado para a E
Desvio da cabeça para a E olhar conjugado para a D
Desvio da cabeça para cima = olhar conjugado para baixo. E vice-versa
Reflexo integrado em todo o tronco encefálico (mesencéfalo, ponte e bulbo) pelo fascículo longitudinal medial
Interação entre o sistema vestibular e os núcleos dos nervos que movimentam os olhos (III, IV e VI) III: Núcleo do Nervo Oculomotor IV: Núcleo do Nervo Troclear VI: Núcleo do Nervo Abducente Fascículo Longitudinal Medial VIII: Núcleos do Nervo Vestibular
XI: Núcleo do Nervo Acessório
Função de Núcleos Vestibulares e sua integração com os movimentos oculares (ponte e mesencéfalo)
COMA Nervo TRIGÊMIO
Reflexo Córneopalpebral Reflexo esternutatório (do espirro) Dor em pontos dolorosos da face
Reflexo masseterino ou mandibular
COMA Nervo FACIAL
Via eferente do Reflexo Córneopalpebral
Simetria facial Mímica de dor à compressão em pontos dolorosos da face Reflexo nasopalpebral ou glabelar Reflexo bucinador
COMA
Nervo VESTÍBULOCOCLEAR
Exame integrado com os nervos da motricidade ocular: - R. Oculocefálico - Prova Calórica Reflexo Cócleopalpebral
COMA Nervos GLOSSOFARÍNGEO E VAGO
Reflexo do Vômito
Reflexo de Tosse
COMA EXAME DO PACIENTE EM COMA Exame dos nervos cranianos Exame da motricidade: movimentação à dor, tono muscular e dos reflexos profundos Exame de alguns reflexos cutâneos principais (cutâneo-abdominal, cutâneo-plantar, cremastérico) Exame de reflexos primitivos frontais (voracidade, grasping, grooping)
Falência total do controle do organismo pelo Sistema Nervoso Encefálico levando à parada cardíaca inexorável em horas, dia ou semanas: o processo de Morte se desencadeia de forma irreversível
MORTE ENCEFÁLICA O termo MORTE CEREBRAL é INCORRETO
Conceito proferido pela primeira vez em 1959, na França, por Mollaret et Goulon Revue Neurologique, 101:3-15, 1959
Ausência de potenciais elétricos no Eletroencefalograma (Silêncio Eletrocerebral) Fishgold and Mathes: Electroencephalography and Clinical Neurophysiology Suppl 11, 1959 Jouvet : Electroencephalography and Clinical Neurophysiology 11:805-808, 1959
MORTE ENCEFÁLICA
Pré-condição mandatória: Dano encefálico de ETIOLOGIA CONHECIDA e IRREVERSÍVEL Exclusões mandatórias: situações potencialmente reversíveis que podem provocar coma profundo e abolir reflexos do tronco encefálico Exame clínico-neurológico definitivo de Morte Encefálica Exame complementar comprobatório da ausência de atividade encefálica (não é exigido em todos os países do mundo)
EXCLUSÕES MANDATÓRIAS Bloqueio Neuro-muscular por doenças (exemplos: Síndrome de Guillain-Barré, Botulismo) ou drogas (derivados do curare, por exemplo) Hipotermia grave (abaixo de 34 graus centígrados) Infecções do Sistema Nervoso Central Distúrbios Metabólicos Graves ou Hidroeletrolíticos, que levem ao aprofundamento do coma, potencialmente reversíveis A síndrome de Locked-in ou do Encarceramento é classicamente citada em livros-texto dentro das exclusões necessárias, porém, trata-se de uma condição que jamais seria erroneamente caracterizada como Morte Encéfálica por um examinador experiente. Vale, contudo, a lembrança para não se confundir JAMAIS tal condição com ausência de reflexos do tronco encefálico observada na Morte Endefálica!
Morte Encefálica Coma de profundidade máxima – Glasgow 3 Ausência de qualquer manifestação indicativa de atividade cortical, subcortical e do tronco encefálico: ausência de crises epilépticas ausência de posturas de decorticação e descerebração perda do controle térmico corporal: hipotermia grave perda do controle hipotalâmico das trocas hidro-salinas pelos rins Ausência de Reflexos do Tronco Encefálico Apnéia persistente – falência completa do Centro Respiratório A persistência de reflexos de integração medular pode ser observada nos casos de Morte Encefálica: patelar, aquiliano, tríplice flexão, bicipital, estilo-radial, reflexo cutâneo-plantar em extensão e cremastérico. Pela perda da influência piramidal, o reflexo cutâneo-abdominal em geral está abolido.
Morte Encefálica TESTE DA APNÉIA 1) Colher gasometria arterial basal, no início da prova (PaO2 e PaCO2) 2) Ventilar o paciente com FiO2 = 100%, por 10 minutos. Diminuir frequência do respirador (PaO2 >200 mmHg; PaCO2 ≥ 40 mmHg) 3) Desconectar o paciente do ventilador 4) Instalar cateter de O2 a 6 l/min, à altura da carina 5) Observar se surge algum movimento respiratório, em tempo de observação de 10 minutos, ou até a PaCO2 atingir 55 mmHg, ou subir a 20%, ou mais do valor basal.
6) Ao final da prova, nova gasometria arterial para comprovar as modificações dos gases sanguíneos pela prova
Morte Encefálica
Esquema modificado de Pallis et al., 1983
Morte Encefálica
Processos essenciais de Morte
Pela parada cardio-
respiratória irreversível Pela Morte Encefálica
I
II
III
Esquema modificado de Pallis et al., 1983
Estado Vegetativo versus Morte Encefálica
COMA
Estado de consciência mínima, antes chamado de Coma Vigil, após estado vegetativo persistente
Pallis et al., 1983
MORTE ENCEFÁLICA _________________________________________________
NO BRASIL
Legalmente formulada a definição de Morte Encefálica como morte do indivíduo, desde 1992 (aplicável acima dos 2 anos de idade) Conceito aplicável a partir de 7 dias de vida, às crianças nascidas a termo, desde 1997
DETERMINAÇÃO DA MORTE ENCEFÁLICA _________________________________________________ 2 exames clínicos completos comprovando o quadro clínico de morte encefálica, realizados por 2 equipes diferentes de profissionais
experientes, após descartados fatores que comprometam tal diagnóstico (hipotermia, drogas sedativas, bloqueio neuro-muscular por doenças diversas)
Intervalo entre o primeiro e segundo exames difere de acordo com a faixa etária do paciente É mandatória a realização de exame complementar comprobatório
O EEG NA MORTE ENCEFÁLICA
Silêncio Eletrocerebral ou Inatividade Elétrica Cerebral
Silêncio Elétrico Cerebral
Silêncio Elétrico Cerebral
Silêncio Elétrico Cerebral
Morte Encefálica EXAMES COMPLEMENTARES 1) Na faixa etária de 7 dias (neonatos de termo) até 1 ano incompleto, o exame complementar obrigatório é o EEG, pois a angiografia de todos os vasos pode dar resultado falso negativo (ou falso positivo de persistência de circulação encefálica, por na anastomose do sistema carotídeo externo com o interno, via díploe). 2) Entre 7 dias e 2 meses incompletos, devem ser feitos 2 EEGs, com intervalos de 48 horas entre eles. 3) Entre 2 meses completos e 1 ano incompleto, devem ser feitos 2 EEGs, com intervalo de 24 horas entre eles. 4) Entre 1 ano completo e 2 anos incompletos, o exame escolhido é facultativo (EEG, angiografia, etc...), mas, se for escolhido o EEG, devem ser feitos 2 exames, com intervalo de 12 horas entre eles.
Obrigada!