Introdução ao Estudo dos Profetas Menores - itacuruca.org.br

povo. É grande a importância do estudo dos profetas pela Igreja para que ela se ... divididos em Profetas Maiores e Profetas Menores. Nesta série de e...

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ESTUDO 01

Introdução ao Estudo dos Profetas Menores Jakler Nichele Nunes Como ler os profetas no século XXI?

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pós a saída dos hebreus do Egito e a tomada de Canaã com Josué   no século XIII a.C., o povo foi reorganizado em tribos, um modelo democrático e comunitário, sob o comando dos juízes. Esta experiência durou cerca de 200 anos. Apesar da experiência comunitária, algumas dificuldades internas e externas colocaram o sistema tribal em crise. Algumas tribos se desenvolveram mais do que outras gerando um desequilíbrio econômico e social em Israel. Além disso, as ameaças de invasão dos povos vizinhos, que eram mais bem equipados para a guerra que os israelitas, levaram o povo a concluir que a existência de um rei, nos moldes das outras nações, seria fundamental para a sobrevivência diante da crise (1Sm 8.5). Saul foi ungido rei com a difícil tarefa de realizar a transição do sistema tribal para monarquia. Como toda transição, foi um período turbulento devido à falta de estrutura resultante do período anterior. Seu governo terminou tragicamente com seu suicídio na batalha de Gilboa (1Sm 10) tentando evitar a vergonha de ser preso pelos filisteus. Durante este período, Samuel, ex-juiz, ficou ao lado do governante como uma espécie de conselheiro passando a assumir o título de profeta [HEB: nabî’], alguém que fala em nome de Deus. Davi foi o rei que o substituiu. Escolhido por Deus, seu governo foi encarado como um modelo monárquico até os tempos de Jesus. Durante o seu tempo Israel experimentou franco desenvolvimento nas esferas administrativa, militar e política chegando à sua máxima expansão territorial e consolidação nacional. Natã e Gade são os conselheiros reais no período. Natã participou dos movimentos iniciais em torno da construção do Templo de Jerusalém e repreendeu Davi por ter cometido adultério com Bete-Seba e por ter mandado matar Urias, seu marido. Gade criticou Davi devido ao recenseamento promovido durante seu reinado que tinha implicitamente o interesse de atualizar a arrecadação de impostos e avaliar a possibilidade de recrutamento para o exército nacional. Depois de muitas disputas entre os pretendentes ao trono de Davi, Salomão, seu filho, chega ao poder. Embora tenha se destacado por sua sabedoria e empreendedorismo, seu governo foi marcado por pesada opressão sobre o povo principalmente no que tangia à arrecadação de impostos para alimentar uma inchada máquina administrativa e a corja de bajuladores reais. Travou muitas alianças com países vizinhos de forma a manter

boas relações políticas. Redividiu as tribos com a finalidade de organizar a cobrança de impostos, mas o resultado acabou sendo um desagradável clima de discórdia entre elas. Alguns chegam a considerar sua política tão cruel e opressora quando a dos faraós do Egito. Durante seu governo, Aías de Siló foi o profeta-conselheiro. Tanto no período de Davi, quanto no de Salomão, as tribos do norte são preteridas em relação às tribos do sul. Com a morte de Salomão, os habitantes do norte esperavam uma política mais favorável da parte de Roboão, seu filho sucessor no trono. Seus conselheiros mais experientes afirmaram unanimemente que os tributos deveriam ser reduzidos. Roboão não deu ouvidos aos mais velhos, preferindo seus jovens amigos que o aconselharam a não “amolecer” diante do povo a fim de que não parecesse fraco. Diante dessas intransigências do novo monarca, as tribos do norte recusaram-se a reconhecer o filho de Salomão como rei e

  significativamente no que diz respeito ao lugar social do profeta. Desde o início, com Samuel, os profetas reais mantinham um distanciamento crítico com relação ao monarca. Depois do aprofundamento desta postura crítica por Aías de Siló, Elias, no tempo do rei Acabe (874 – 850 a.C.), o pior dos reis do Reino do Norte, já nem põe os pés no palácio. Ele convive com os pobres, experimenta com eles a penúria da seca e a solidariedade da acolhida, da partilha e da confiança no poder do Senhor. Elias se identifica com os perseguidos do poder. Sua importância é tão grande que no evento da transfiguração, narrado no Novo Testamento, ao lado de Jesus e Moisés, está Elias representando os profetas. Elias é o símbolo maior dos profetas bíblicos. Eliseu, seu sucessor, confirma e aprofunda a característica do profetismo como um movimento político que nasce dentre os oprimidos pela monarquia. Nossa jornada pelos livros dos Profetas Menores começa aqui. Os profetas de que trataremos farão parte de um movimento chamado movimento profético que nasce com a monarquia em Israel e se distancia da mesma encontrando seu lugar junto ao

Figura 1 - Resumo esquemático da mensagem profética.

desligaram-se política, religiosa e afetivamente da dinastia. Isto acabou desembocando na divisão do Reino de Israel em dois reinos: o Reino do Norte, ou Israel, com capital em Samaria, e o Reino do Sul, geralmente chamado de Judá – sua principal tribo – com capital Jerusalém, que deu continuidade à dinastia davídica. Cada reino experimentou uma sucessão real independente, apresentada nos livros dos Reis. Os livros das Crônicas não fazem referência aos reis do norte, mas apenas aos reis do sul por responsabilizarem os primeiros pela divisão do Reino. Naturalmente, cada reino experimenta de forma diferente a idéia do conselhoprofecia. Contudo, foi no Reino do Norte que a experiência profética avançou

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povo. É grande a importância do estudo dos profetas pela Igreja para que ela se inspire e reconheça seu papel na sociedade do século XXI.

Os Livros enquanto Literatura Os livros dos profetas na Bíblia são divididos em Profetas Maiores e Profetas Menores. Nesta série de estudos nos deteremos apenas aos últimos. O acréscimo “menores” não é pelo seu menor valor, mas simplesmente pelo tamanho do livro. Segundo Faria (2006), no século II a.C. esta distinção já era conhecida. Se contarmos a quantidade, veremos que são doze. Isso fez alguns pensarem que se

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Estudo 01 - Introdução ao Estudo dos Profetas Menores tratava de uma referência implícita às doze tribos de Israel. Tanto os Profetas Maiores, quanto os Profetas Menores apresentam um estilo literário característico da Literatura Profética. Quem já teve a oportunidade de estudar com certa profundidade os profetas bíblicos, pôde perceber que eles são verdadeiros artistas da palavra. Isto significa que ao se colocarem à disposição de Deus, colocavam, sobretudo, sua linguagem. Como ministro da palavra e artista da linguagem, o profeta utiliza linguagem já elaborada, e continua a enriquecendo. Na sua língua, emprega formas tradicionais, gêneros conhecidos, esquemas convencionais; toma empréstimos e faz lembranças; transforma e adapta cânticos tradicionais ou cria outros à imitação deles. São verdadeiros criadores literários no meio da tradição ao ponto de alguns deles chegarem a desenvolver – há mais de vinte e cinco séculos – estilos relativamente pessoais. Os profetas compartilham grande potência criadora de imagens e símbolos poéticos; alguns peculiares da sua cultura, outros enraizados na experiência humana comum da natureza e da vida. Como resultado desta capacidade, os profetas hebreus elaboraram linguagem religiosa inigualada, que serviu como energia expressiva para os autores posteriores: primeiro para os autores que precisaram formular a novidade do Messias Filho de Deus; depois para os escritores cristãos de há dois milênios. Seria pouco dizer que os escritores posteriores empregam a linguagem imaginativa dos profetas bíblicos, pois isso poderia indicar a utilização de um instrumento, como algo que alguém usa e depois abandona à sua vontade. Seria melhor dizer que os escritores posteriores assimilam as imagens proféticas como sementes que farão crescer nova vegetação. Na história da humanidade houve poucas linguagens tão fecundas quanto a linguagem dos profetas bíblicos. Justamente pela profundidade da palavra profética, os profetas tinham influência sobre as mais diversas áreas da estrutura judaica. Eles interferem no culto, atuam na política, têm voz nas questões sociais, intercedem pelo povo e atacam o falso profeta. Como todo estilo literário, a literatura profética possui características próprias. Uma de suas características diz respeito à estrutura da mensagem profética. Schökel e Sicre Diaz (2004) comparam-na a uma rosados-ventos com seus pontos cardeais. Como Norte, teríamos a Norma, a Lei: Algumas vezes repete ou atualiza preceitos da aliança; outras, proclama em nome de Deus nova linha de comportamento

opondo-se ao senso comum. Deus pode dar ordens opostas em ocasiões diferentes (ex: resistir e render-se). Como Sul, teríamos a Sentença, o castigo: Atualiza maldições da aliança e introduz outras novas. Pode aparecer em diversos graus: denúncia de culpa com convite à conversão; acusação formal com proclamação de sentença condenatória; ou, em sentido oposto, intimação da sentença com motivação; simples enunciado do castigo, com a culpa implícita. Como Oeste, teríamos a Observação Histórica: A mensagem como leitura (ou interpretação) dos fatos históricos, sobretudo presentes ou iminentes. A palavra do profeta descobre e comunica o sentido da história como âmbito e meio da revelação divina. Mostra a outra face dos acontecimentos. O profeta se coloca como sentinela da história (Is 21.8; Hc 2.1). Por fim, como leste, ou Este, temos a Esperança, atualizando bênçãos da aliança ou patriarcais. Freqüentemente ultrapassa os limites realistas colocando eventos fantásticos com objetos de desejo. É o momento culminante da profecia; dar palavra e impulso aos anseios melhores e mais profundos de Israel e da humanidade. Os profetas como grandes educadores da esperança, legitimaram-na, abriram para ela canal expressivo e conferiram-lhe segurança. Inicialmente, uma simples esperança no futuro, nova aliança, novo Davi, etc.. Depois, a esperança de um futuro “definitivo” (ou final). Em seguida, o desenvolvimento de uma nova mentalidade que aprende a projetar para esse futuro mensagens originalmente limitadas. Por fim, o surgimento de um novo gênero literário, a escatologia “profética” que influenciou substancialmente a posterior apocalíptica.

Dicas para Estudo Como já dito, os profetas que estudaremos são doze. Pela ordem bíblica: Oséias, Joel, Amós, Obadias, Jonas, Miquéias, Naum, Habacuque, Sofonias, Ageu, Zacarias e Malaquias. Estão localizados logo após os Profetas Maiores (Isaías a Daniel) e fecham o cânon do Antigo Testamento. É provável que tenham existido outros profetas que não deixaram obra escrita, assim como Elias e Eliseu, ou cuja tradição foi menos intensa. Destaca-se a presença de uma profetisa no movimento profético: Hulda (2Rs 22.14) Um fato que dificulta sobremaneira o estudo dos profetas é a não identificação do seu contexto histórico. A ordem dos livros apresentada pela Bíblia não é a ordem cronológica. Além disso, sobre o contexto histórico, temos duas perspectivas: o contexto histórico do cenário e o contexto histórico da composição do livro. No primeiro

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contexto temos o momento em que se passa a história contada no livro. No segundo, temos a história em torno do momento em que se escreve o livro. Isto é importante porque em muitos casos o profeta assunto do livro não é o autor do livro. Também, a data de composição do livro não é, em muitos casos, a data da história contada no livro. Um exemplo disto é o livro de Jonas. Quem conta a história não é o autor e a composição do livro se dá provavelmente, segundo os melhores estudos, muito tempo depois da história narrada. Isto tudo só mostra que podemos estudar o livro de diversas maneiras: a) de modo simplista, seguindo a ordem dos livros apresentada na Bíblia (não recomendado); b) podemos nos inspirar com os personagens em seus cenários; e c) podemos nos inspirar com os autores em seus contextos. Em todos os casos, é fundamental conciliar ao estudo dos livros dos Profetas Menores algum conhecimento sobre a história dos reinos de Israel narrada nos livros das Crônicas e dos Reis e nos livros de Esdras e Neemias. Recomenda-se também a leitura de livros de História para complementação. Nesta série de estudos será adotada como sequência a ordem mais provável de composição dos livros segundo os estudos mais recentes. Esta ordem seria: Amós, Oséias, Miquéias, Sofonias, Naum, Habacuque, Obadias, Ageu, Zacarias, Joel, Jonas e Malaquias. Maiores detalhes serão tratados ao longo da série. Assim sendo, nosso trabalho será duplo: a) reconhecer como os autores do livro aplicaram o texto à sua realidade; e b) reler o texto inspirando-nos no personagem e na experiência do autor atualizando a mensagem para a nossa realidade. Há, basicamente, três momentos críticos na leitura dos profetas sejam menores ou maiores: a) a ameaça da Assíria e a destruição do Reino do Norte; b) a ameaça da Babilônia e a destruição do Reino do Sul e do Templo de Jerusalém; c) o domínio dos Persas, o retorno para Jerusalém e a reconstrução do Templo. Em todos os momentos o povo de Deus experimentou dificuldades e no meio delas surge a voz dos profetas para conduzir o povo nos caminhos de Deus.

Para saber mais ... FARIA, J. F. Profetas e profetisas na Bíblia. São Paulo: Paulinas, 2006. (BÍBLIA EM COMUNIDADE - TEOLOGIAS BÍBLICAS) SCHÖKEL, L. A. & DIAZ, J. L. Profetas I. 2 ed. São Paulo: Paulus, 2004. (GRANDE COMENTÁRIO BÍBLICO) SICRE, J. L. Profetismo em Israel: o profeta, os profetas, a mensagem. 2 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.

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