Fósforo em Pronto Socorro e UTI Dr. José de Felippe Junior

Fósforo em Pronto Socorro e UTI Dr. José de Felippe Junior O fosfato é o sexto elemento mais abundante do corpo e o principal anion do intracelular, s...

345 downloads 433 Views 131KB Size
Fósforo em Pronto Socorro e UTI Dr. José de Felippe Junior

O fosfato é o sexto elemento mais abundante do corpo e o principal anion do intracelular, sendo a sua concentração no citoplasma de 100 mEq/l. O nível sérico de fósforo, da mesma maneira que outros íons de predominância intracelular, não reflete a reserva corporal total do elemento. Dos 50 nutrientes essenciais que as nossas células necessitam, o fósforo é um dos elementos fundamentais porque o armazenamento bioquímico de energia é feito através de compostos de “fosfatos de alta energia”. Um homem normal pesando 70 kg contém 700 a 800 g de fósforo , dos quais 80% estão no esqueleto e o restante nos músculos, fígado, colágeno e demais tecidos . A concentração sérica de fósforo inorgânico no adulto normal varia de 2,7 a 4,5 mg% (0,9 a 1,5 mEq/l ) e na criança , de 4,0 a 7,1 mg% ( 1,3 a 2,3 mEq/l). Mais da metade deste fósforo se encontra na forma ionizada, estando o restante complexado com o cálcio, sódio e magnésio ( 37% ) e com as proteínas plasmáticas (5 a 10%). O fósforo do fluido extracelular contém apenas 1% do fósforo total do organismo. O fosfato sérico pode variar normalmente até 2 mg % por dia por causa do seu movimento para dentro das células (alcalose respiratória ) ou para fora das células ( acidose ) . O fósforo é um importante mineral da crosta terrestre; no solo é encontrado como a parte inorgânica da apatita e na água como ortofosfato. Na água está parcialmente solúvel e disponível para as plantas e microorganismos. O fósforo elementar existe sob duas formas : o vermelho, granulado, não absorvível e não tóxico e o branco ( às vezes amarelo ) , pastoso, absorvível e altamente tóxico que queima espontaneamente ao contato com o ar. O fósforo é usado como inseticida, veneno de rroedores e nos fogos de artifício, cada um deles em uma determinada forma química. Quimicamente o fósforo existe em uma grande variedade de estados oxidativos, indo da valência –3 à +5 ( PH3 à P2O5 ). Em biologia o fósforo possui importantes e múltiplas funções nas reações químicas dos seres vivos. As reações de transferência de fosfato, enzimaticamente catalizadas são numerosas e vitais no metabolismo dos carboidratos, lipídeos e proteinas. Ele atua em todas as células, tecidos e orgãos, porque faz parte das membranas celulares e das organelas na forma de fosfolípides, faz parte do crucial 2-3 difosfoglicerato nas hemácias e finalmente faz parte da principal molécula do organismo, o trifosfato de adenosina, o famoso ATP, moeda de troca de todas as reações bioquímicas, dependentes de energia. A energia livre, proporcionada pelo ATP, aumenta o grau de ordem - informação dos sistemas termodinâmicos abertos : células e proporciona as vias de acesso à saúde. Sem energia não há vida. O fósforo também desempenha papel importante no metabolismo do cálcio e nas reações do equilíbrio ácido-básico. Nos ossos desempenha funções cruciais no desempenho das atividades osteoblástica ( construção óssea ) e osteoclástica ( destruição óssea ). Sais de fósforo são importantes tampões do fluido intracelular e nos rins desempenha importante função na excreção dos ions hidrogênio.

Absorção – Distribuição - Excreção Nas condições de aumento das necessidades de fósforo, aumenta a sua absorção: durante o

crescimento da criança, na gravidez e na lactação. O meio ácido do estômago (pH : 2) e da maior parte do intestino delgado (pH:5) desempenha importante papel na solubilidade e biodisponibilidade do fósforo inorgânico, pois, somente são absorvidos os sais solúveis. Quando o pH está elevado, formam-se sais insolúveis de fosfato inorgânico, que são eliminados pelas fezes. Devemos assim estar atentos com os idosos, que em geral apresentam hipocloridria e portanto diminuição da absorção de fosfato, com os pacientes portadores de gastrite crônica que abusam dos antiácidos e com os sais de cálcio. Quando administrados (erroneamente) durante as refeições, o cálcio forma sais insolúveis de fosfato de cálcio que são eliminados pelas fezes. Nos adultos normais, cerca de dois terços do fosfato ingerido é absorvido no intestino , porém , infelizmente grande parte deste fosfato absorvido é excretado na urina. Novamente: se o fosfato é introduzido pelo trato gastrointestinal, o fosfato absorvido é rapidamente excretado. Desta forma necessitamos com urgência, procurar carreadores de fosfato que permitam o balanço positivo deste elemento tão importante. Cremos que este composto já esteja disponível para uso, é um aminoácido fosforado neutro com dois carbonos : fosfoetanolamina , que absorvida no intestino, vai para o fígado e a seguir é distribuída para os tecidos. As moléculas neutras são solúveis nos lipídeos e conseguem atravessar a membrana celular e mais importante a membrana mitocondrial externa. A absorção intestinal do fosfato inorgânico é feita por transporte ativo, dependente de energia. A presença de grandes quantidades de cálcio ou alumínio promove a formação de fosfato insolúvel que é excretado nas fezes. A vitamina D estimula diretamente a absorção intestinal, independentemente dos seus efeitos sobre o cálcio e o fosfato absorvido, vai diretamente para o citoplasma das células da economia. Isto acontece porque a concentração de fosfato no plasma é inversamente relacionado com a atividade da vitamina D; quanto maior for a sua atividade menor é a concentração de fosfato no plasma : o fosfato migra para o intracelular. A redução de fosfato no sangue promove com veemência a presença de maiores quantidades de cálcio no sangue , o que dificulta a deposição de sais de cálcio nos ossos. Pelo contrário, o aumento de fosfato no sangue facilita a deposição óssea do cálcio. Este fato é esquecido pelos médicos ao tratar a osteoporose. Eles somente se lembram do cálcio. Mais de 90% do fosfato plasmático é filtrado nos rins, sendo a maior parte reabsorvido no túbulo proximal por transporte ativo. O hormônio da paratireoide (PTH) e a calcitonina aumentam a excreção urinaria de fosfato, por bloqueio da reabsorção no túbulo proximal. A vit. D3 e seus metabolitos estimulam diretamente a reabsorção tubular de fósforo. Se almejamos um balanço positivo de fósforo devemos manter os níveis de Vit. D normais, pois esta vitamina : aumenta a absorção intestinal de fósforo, aumenta a reabsorção tubular proximal de fósforo e faz o fósforo migrar do fluido extracelular para o fluido intracelular. Nos idosos acontece o balanço negativo do fósforo por várias razões: : hipocloridria, alterações da dieta, disbiose e uso de antiácidos.

Fontes Alimentares Nos países adiantados a ingestão de fósforo é de 1500 mg no homem e 1000 mg na mulher. Em geral os alimentos ricos em proteinas contém altas quantidades de fósforo: carne, peixes, ovos, leite

( 900mg/l ), queijo ( 200 a 800 mg/100 g ) e aves ( 200mg/ 100g ). Em uma dieta normal ocidental, cerca de 65% do fósforo é proveniente do leite, carne, frango, peixe e ovos ; 20% dos cereais e legumes ; 10% das frutas e seus sucos e o restante do café, chá ,refrigerantes, etc. Dietas vegetarianas contém grandes quantidades de fósforo na forma de fitato, entretanto não dispomos da enzima fitase e não conseguimos liberar o fósforo desta dieta. Tanto as leveduras como vários tipos de bactérias contém fitase e assim podem liberar o fósforo no intestino e torna-lo biodisponível. E esta liberação realmente acontece: em primeiro lugar com as leveduras presentes no pão caseiro e em segundo lugar com as bactérias presentes no intestino grosso.

Hiperfosfatemia ( fosfato superior a 4,5 mg % ou 1,5 mEq/l ) Na ausência de insuficiência renal , a principal causa da hiperfosfatemia é o hipoparatireoidismo . Merecem atenção especial os politraumatizados ( rabdomiólise traumática) , os queimados , os politransfundidos e os pacientes em choque ( isquemia tissular e acidose ) . A hiperfosfatemia acarreta risco para o paciente em virtude da possibilidade de hipocalcemia aguda ( tetania , convulsão, insuficiência cardíaca refratária ) e calcificação extra-esquelética ( insuficiência renal ) . As causas e os mecanismos de produção do distúrbio estão enumerados no Quadro 1. Quadro 1 : Causas e Mecanismos da Hiperfosfatemia A. Aumento da carga exógena 1. Fosfato I.V. ou V.O . 2. Laxativos ou enemas contendo fosfato : fleet enema 3. Instilação prolongada de leite intragástrico 4. Transfusão de sangue estocado 5. Aumento da absorção ( excesso de Vitamina D ) B. Aumento da carga endógena ( liberação intracelular ) 1. Rabdomiólise aguda traumática e não-traumática ( estatinas ) 2. Queimadura 3. Super dosagem de narcótico 4. Terapêutica com citotóxicos ( leucemia , linfomas ) 5. Isquemia tissular 6. Hemólise 7. Acidose respiratória ou metabólica 8. Hipertermia maligna C. Diminuição da excreção renal 1. Insuficiência renal aguda ou crônica 2. Hipoparatireoidismo 3. Outras endocrinopatias • Hipertireoidismo • Acromegalia • Estado pós-menopausa • Hipogonadismo infantil 4. Calcinose tumoral 5. Hipertermia no câncer ( excesso de necrose tumoral ) O aumento rápido da carga exógena ou endógena de fosfato freqüentemente causa hipocalcemia com tetania ou convulsões , pois somente os aumentos rápidos de fosfato conseguem abaixar o nível sérico de cálcio . A hiperfosfatemia por diminuição da excreção renal , por atuar a longo prazo

( hipofosfatemia crônica ) , provoca calcificação de partes moles , dificilmente produzindo os sinais clássicos de hipocalcemia . Tratamento . A hiperfosfatemia grave e aguda com hipocalcemia sintomática requer tratamento imediato com cálcio intravenoso. Se não houver insuficiência renal, a hiperfosfatemia geralmente se resolverá em 6 a 12 h , se for interrompida a entrada de fosfato na circulação . As medidas que aumentam a excreção urinária de fosfato incluem: probenecid (resposta imprevisível) , acetazolamida ( 15mg/kg cada 3 a 4 h ) , diuréticos , infusão de soro fisiológico e bicarbonato ( risco de piorar a hipocalcemia ). Se houver insuficiência renal , podemos utilizar a diálise peritoneal ou hemodiálise . Outra maneira de diminuir o fosfato sérico é administrar glicose com insulina da mesma forma que no tratamento da hiperpotassemia . Na insuficiência renal crônica e na calcinose tumoral , a hiperfosfatemia crônica pode ser controlada por restrição de fósforo na dieta e hidróxido de alumínio . No hipoparatireoidismo usamos a vitamina D ou seus metabólitos como substituto do PTH . Na hiperfosfatemia por aumento da carga endógena ou exógena , injetamos o cálcio , aumentamos a excreção urinária de fosfato pelos métodos já descritos, injetamos glicose com insulina e de acordo com as necessidades, indicamos diálise .

Hipofosfatemia ( fosfato inferior a 2,7 mg % ou 0,9 mEq/l ) A deficiência crônica de fósforo em animais provoca perda de apetite, inchaço nas articulações, ossos frágeis e um marcante aumento da susceptibilidade a infecções. Os animais com deficit de fósforo, diminuem o consumo de alimentos e reduzem a massa óssea. Em 1968, Lotz e colaboradores, se instalam na história realizando o estudo clássico sobre os efeitos da deficiência de fósforo em seres humanos, aplicando em adultos normais, uma dieta pobre em fósforo. Os sintomas apareceram apenas com a deficiência severa de fósforo no plasma ( 1mg% ) : anorexia, fraqueza, debilidade e dor óssea. Foi necessária a ingestão de antiácidos quelantes de fósforo para atingir os níveis de 1 mg% . A deficiência de fósforo se acompanha de aumento da excreção urinária de cálcio, magnésio e potássio. A hipofosfatemia não é uma entidade rara , sendo encontrada em grande variedade de moléstias . A hipofosfatemia severa é mais freqüentemente observada em alcoólatras crônicos , na fase de recuperação da cetoacidose diabética , na alimentação parenteral prolongada , nos desnutridos no período de realimentação , nas doenças degenerativas da idade e no envelhecimento. Estudo feito na Austrália em hospital geral mostrou que 2 % dos pacientes internados e 1 % dos ambulatoriais apresentavam este distúrbio. A hipofosfatemia produz bloqueio da glicolise anaeróbica ( via de Embden-Meyerhof ) com a conseqüente diminuição da síntese de ATP nos vários tecidos do corpo e de 2-3 DPG( 2-3 difosfoglicerato) nas hemácias. O 2-3 DPG é sintetizado na hemácia e a sua função é diminuir a afinidade da hemoglobina pelo oxigênio ao nível tissular, isto é, a sua presença melhora a oxigenação tissular . As causas e os mecanismos de produção da hipofosfatemia estão enumerados no Quadro 2 . Dignas de destaque são as causas de hipofosfatemia severa ( fosfato menor que 1 mg % ) que na maioria das vezes são iatrogênicas e facilmente preveníveis (Quadro 3 ) . Quadro 2 : Causas e Mecanismos da Hipofosfatemia

A. Redistribuição do fosfato para o compartimento intracelular 1. Administração de glicose 2. Hiperalimentação parenteral ou enteral 3. Insulina 4. Alcalose respiratória 5. Alcalose metabólica ( pouco efeito ) 6. Cetoacidose tratada 7. Queimadura severa ( fase anabólica ) 8. Esteróides anabólicos 9. Adrenalina , glucagon ( efeito hiperglicemiante ) B. Perda renal de fosfato 1. Cetoacidose não-tratada 2. Hipopotassemia 3. Hipomagnesemia 4. Diuréticos 5. Corticosteróide 6. Déficit ou resistência à vitamina D 7. Queimadura severa ( fase diurética ) 8. Expansão aguda do volume extracelular 9. Alcalose metabólica 10.Acidose crônica 11.Defeito tubular 12.Hiperparatireoidismo C. Diminuição da absorção intestinal ou aumento da perda de fosfato pelo tubo digestivo 1. Antiácidos queladores de fosfato: hidróxido de alumínio ou magnésio etc . 2. Vômito e diarréia 3. Drenagem por sonda nasogástrica 4. Síndrome de má absorção 5. Déficit ou resistência à vitamina D D. Outras 1. Alcoolismo 2. Desnutrição, realimentação com carboidrato 3. Septicemia por Gram-negativo e Gram-positivo 4. Hemodiálise crônica 5. Ringer-lactato e bicarbonato de sódio 6. Retorno de hipotermia profunda 7. Gota aguda 8. Intoxicação por salicilato 9. Moléstia e Síndrome de Cushing Quadro 3 : Causas Mais Freqüentes de Hipofosfatemia Severa: Fosfato Inferior a 1 mg% 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7.

Alcoolismo agudo tratado Cetoacidose diabética tratada Hiperalimentação parenteral ou enteral Administração prolongada de antiácidos queladores de fosfato Síndrome de recuperação nutricional Fase de recuperação diurética do queimado grave Alcalose respiratória severa

A administração de glicose libera insulina , a qual promove o transporte de glicose e fósforo para o músculo esquelético e fígado , produzindo queda do fosfato sérico . Nas pessoas normais esta queda raramente ultrapassa 0,5 mg % , entretanto , ela é maior nos desnutridos e hepatopatas . A

administração de frutose é acompanhada por hipofosfatemia mais pronunciada . No pós-operatório é freqüente o aparecimento de hipofosfatemia , principalmente no segundo dia , sendo uma das razões a administração de glicose nos líquidos de hidratação . Na alcalose respiratória severa , o fosfato sérico diminui rapidamente e de maneira acentuada ( quedas de até 2,5 mg % ) . A hiperventilação alveolar provoca rápido movimento do CO 2 para fora do compartimento intracelular , eleva o pH intracelular e ativa a glicólise, aumentando a formação de compostos fosforilados . A fonte de fósforo para estes compostos vem do fosfato sérico e assim , a fosfatemia cai rapidamente Na alcalose metabólica , apesar de ocorrer perda renal de fosfato , a hipofosfatemia é moderada ( quedas de até 0,5 mg % ) , pois o bicarbonato é pouco difusível e produz apenas leve aumento do pH intracelular e também somente leve aumento da glicólise . Na acidose aguda temos a saída do fosfato das células com hiperfosfatemia e conseqüente hiperfosfatúria . A hiperfosfatúria provoca hipofosfatemia na acidose prolongada . A expansão de volume aumenta o filtrado glomerular e portanto aumenta a excreção de fosfato na urina; ao mesmo tempo, a diluição do cálcio ionizado, provocada pela expansão de volume, estimula a produção de PTH aumentando a fosfatúria. Na cetoacidose diabética , 90% dos pacientes apresentam hipofosfatemia em 6 a 12h após o início da terapêutica habitual, sendo em 10% dos casos considerada severa. Nestas condições as causas da hipofosfatemia são: redistribuição compartimental (hiperglicemia, insulina) e fosfatúria (poliúria, glicosúria, cetonúria, acidose). No alcoolismo, a hipofosfatemia também é muito comum. Estes pacientes apresentam diminuição das reservas de fósforo (desnutrição), perda de fosfato pelo tubo digestivo (vômito, diarréia), perda renal de fósforo ( ação direta do álcool sobre o túbulo, cetonúria ) e redistribuição compartimental ( glicose intravenosa, realimentação, alcalose respiratória ). Todos esses fatores tornam comum a ocorrência de hipofosfatemia no alcoolismo agudo tratado. Precisamos estar atentos para não diagnosticarmos delirium tremens diante de um quadro neurológico produzido pela hipofosfatemia. No doente internado, a hipofosfatemia costuma aparecer nas primeiras 24h na cetoacidose diabética, segundo ao quarto dia no alcoolismo e a partir do 10º dia na hiperalimentação. Digna de nota é a grande freqüência da hipofosfatemia nas septicemias, principalmente por Gramnegativos, salientando-se que a diminuição do fósforo sérico provoca diminuição da atividade quimiotática, fagocitária e bactericida dos leucócitos. Estas alterações são reversíveis em dias com a reposição do fosfato. Manifestações Clínicas O sinais e sintomas aparecem principalmente quando a concentração sérica do fosfato cai abaixo de 1mg%, sendo a maioria deles causados pela depleção de ATP ou por hipóxia tissular produzida pela diminuição da concentração do 2-3 DPG na hemácia (aumento da afinidade da hemoglobina pelo oxigênio). O paciente apresenta sensação de mal-estar geral com, astenia, anorexia, náuseas e vômitos. É freqüente o aparecimento de quadro compatível com encefalopatia metabólica, caracterizado por irritabilidade, confusão mental, obnubilação, convulsão e coma. O quadro é parecido com o delirium tremens, porém faltam as características alucinações visuais . Existem muitos casos de coma metabólico inexplicáveis, cujo diagnóstico vem à tona com a dosagem do fósforo sérico. O tratamento com o elemento em falta reverte prontamente o estado de coma. Os sinais e os sintomas da hipofosfatemia estão enumerados no Quadro 4. Quadro 4 : Sinais e Sintomas da Hipofosfatemia 1. A . Sistema nervoso central : irritabilidade, perda de memória , diminuição da atenção ,

confusão , desorientação , disartria, nistagmo , vertigem , ataxia, ptose palpebral , anisocoria , voz anasalada , crise convulsiva e coma 2. B . Sistema nervoso periférico : parestesia distal e perioral , arreflexia osteotendinosa , paralisia ascendente ( Síndrome de Guillain-Barré ) , tremores, balismo 3. C . Músculo esquelético: fraqueza generalizada, miopatia proximal, mialgia, rabdomiólise , mioglobinúria , aumento do CPK 4. D . Músculo cardíaco : diminuição do volume sistólico , insuficiência cardíca, bloqueio AV , diminuição da fração de ejeção, cardiomiopatia reversível, diminuição da resposta arteriolar aos vasopressores 5. E . Respiração: diminuição da capacidade vital (fraqueza muscular), diminuição da liberação de O 2 pela hemoglobina (déficit 2,3-DPG), insuficiência respiratória aguda, dificuldade do desmame do respirador artificial 6. F. Hematológico: • Hemácia : diminuição da liberação de O 2 (déficit 2,3-DPG), anemia hemolítica ou hemólise (déficit ATP) • Leucócitos: diminuição da atividade quimiotática, fagocitária e bactericida (déficit ATP) • Plaquetas: plaquetopenia, plaquetopatia 7. G . Fígado : deterioração da função hepática em hepatopatia crônica , precipitação do coma hepático 8. H . Gastrintestinal : disfagia, anorexia, náusea, vômito 9. I . Rins : disfunção tubular com perda urinária de : cálcio , magnésio , potássio , fosfato, glicose, bicarbonato e ácido úrico ; 10.J . Equilíbrio ácido-básico : acidose metabólica por perda renal de bicarbonato na hipofosfatemia crônica 11.K .Osso : rigidez das articulações , dor óssea , pseudofratura, osteoporose, osteomalacia 12.L . Endócrino-metabólico : hipoparatireoidismo , resistência à insulina, diminuição do desaparecimento da glicose , intolerância à glicose, acidose láctica Tratamento Como a hipofosfatemia pode ocorrer com reserva corporal total normal ou baixa e a concentração sérica do elemento pode sofrer variações rápidas e importantes por redistribuição compartimental, a reposição do fósforo não pode obedecer a fórmulas rígidas, e a resposta terapêutica necessita de determinações laboratoriais freqüentes. As fosfatemias severas (menor do que 1mg% ou 0,32 mEq/1) devem ser tratadas prontamente e por via intravenosa, principalmente se houver sinais neurológicos. Com o intuito de selecionar uma dose inicial que produza o mínimo de efeitos colaterais, Lentz inicia o tratamento usando 0,08 mEq/Kg (2,5 mg/kg) na hipofosfatemia recente e não complicada e 0,16 mEq/kg (5mg/kg) se for prolongada ou de múltiplas causas. As doses iniciais devem ser 25 a 50% superiores, se o paciente for sintomático e inferiores, se houver hipocalcêmia. Cada dose deve ser administrada intravenosamente durante o período de 6h, o fosfato sérico deve ser obtido prontamente após este período e a dose ajustada de acordo com o estado clínico e o novo valor do fosfato sérico. Para diminuirmos os riscos, não devemos ultrapassar 0,25 mEq/kg (7,5mg/kg) por dose. Alguns autores administram 1 g do elemento fósforo por dia , dependendo da gravidade do caso . Os efeitos colaterais da terapêutica são : hiperfosfatemia com deposição metastática de cálcio , hipocalcemia , hiperpotassemia ( sais contendo potássio ) , desidratação e hipernatremia ( diurese osmótica ) e hipotensão . Na insuficiência renal crônica , o fósforo deve ser administrado com cuidado pelo fato de a hiperfosfatemia acelerar a deterioração da função renal. Os efeitos colaterais são maiores quando se administra dose superior a 1,5g em tempo inferior a 3 h . Não podemos nos esquecer de tratar a hipopotassemia e a hipomagnesemia freqüentemente coexistentes com a hipofosfatemia .

Nas situações clínicas em que é freqüente o aparecimento da hipofosfatemia (alcoolismo, cetoacidose diabética, realimentação , hiperalimentação, antiácidos ) , devemos prescrever regularmente suplementos do elemento fósforo. Na alimentação parenteral , a adição de 20 a 25 mEq de fosfato de potássio por 1.000 kcal não -proteica é suficiente para manter os níveis séricos do fosfato inorgânico . Na hipofosfatemia moderada ( 1 a 2 mg % ) usamos o fosfato por V.O . ou S.N.G. , 1 a 2 g do elemento fósforo por dia em doses divididas ( 3-4 vezes/dia ). O efeito colateral mais freqüente é diarréia de intensidade moderada . Substâncias disponíveis para uso : Antes de tudo, devemos saber que 1 mEq de fosfato contém 31 mg de fósforo elementar ( 0,032 mEq = 1 mg ). 1. Leite desnatado ou pobre em gordura : 1 g de cálcio e fósforo por litro; 2. Fosfato de potássio ( Braun ): 1 amp. = 10 ml = 20 mEq de fosfato = 625 mg de fósforo elementar 3. Fosfato de sódio 27,6 % : 4 mEq/ml de fosfato .

Referências Bibliográficas I- Livros Têxto 1. Felippe, J Jr. : Pronto Socorro: Fisiopatologia – Diagnóstico – Tratamento. In Capítulo 10, José de Felippe Junior : Distúrbios Hidroeletrolíticos : Na+ , K+ , Ca++ , PO4 e Mg++ ; pag.82-97, 1990 ; Editora Guanabara Koogan, 2 a Ed. – Rio de Janeiro. 2. Goodman and Gilman : The Pharmacological Basis of Therapeutics. In Capítulo 38, Michael J. Peach : Anions : Phosphate, Iodide, Fluoride and Other Anions ; pag.798-800 ; 1975 ; MacMillan Publishing Co, 5 a Ed. – New York 3. Shils, Maurice E. e colaboradores: Modern Nutrition in Health and Disease. In Capítulo 7, Lindsay H Allen and Richard J. Wood; pg.155-163 , 1994 ; 8 a Ed. Philadelphia II- Trabalhos Científicos 1. Craddock, P.R.; Yawata, Y.; VanSanten, L. : Acquired phagocyte dysfunction.N. Engl. J. Med., 290:1403, 1974. 2. Goldfarb, S.& Agus, Z.S.: Distúrbios clínicos do cálcio e do fosfato. In Clinicas Médicas da América do Norte . Simpósio sobre distúrbios hidroeletrolíticos . Ed. Interamericana . Março , 1981. 3. Hessov, Ib; Jensen, N.G.& Rasmussen, A . : Prevention of hypophosphatemia during postoperative routine glucose administration. Acta Chir . Scand ., 146:109, 1980. 4. Keller, U. & Berger , W. : Prevention of hypophosphatemia by phosphate infusion during treatment of diabetic ketoacidosis and hyperosmolar coma . Diabetes , 29:87, 1980. 5. Knochel, J.P.: The pathophysiology and clinical characteristics of severe hypophosphatemia . Arch . Intern. Med. , 137: 203, 1977. 6. Kreisberg, R.A . : Phosphorus deficiency and hypophosphatemia . Hospital Practice , 12: 121, 1977. 7. Lee, J.L. ; Sibbald , W.J.; Holliday, R.L. & Linton, A . L.: Hypophosphatemia associated with coma . Can. Med. Assoc.J., 119(2) : 143,1978. 8. Lentz, R.D.; Brown, D.M. & Kjellstrand, C.M.: Treatment of severe hypophosphatemia. Annals of Internal Medicine, 89:941,1978. 9. Lotz , M., Zisman, E., Bartter, F.C.: N. Engl. J. Med., 278:409-415, 1968.

10.Shelson, G.F. & Grzyb, S.: Phosphate depletion and repletion: relation to parenteral nutrition and oxygen transport. Ann. Surg., 182(6):683, 1975. 11.Vinceneux, P.: Les hypophosphatémies . Sem. Hop.Paris, 56(13):696,1980. 12.Westheimer , F.H.: Science , 235:1173- 1178, 1987.

Comissão Dr. José de Felippe Junior