O QUE É A PSICOLOGIA TRANSPESSOAL

Agradecer à professora Joanna Darc por ter-me presenteado com uma obra de Psicologia Transpessoal na ocasião em que cursei a ... 1 INTRODUÇÃO ... nova...

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS INSTITUTO DE PSICOLOGIA CAMPUS CORAÇÃO EUCARÍSTICO ORIENTAÇÃO DE MONOGRAFIA II

O QUE É A PSICOLOGIA TRANSPESSOAL

Selene Zaidan Leite

Belo Horizonte 2008

Selene Zaidan Leite

O QUE É A PSICOLOGIA TRANSPESSOAL

Monografia apresentada à disciplina de Orientação de Monografia II, do 10º Período do Curso de Psicologia da Puc Minas BH. Orientadora: Márcia de Mendonça Jorge

Belo Horizonte 2008

AGRADECIMENTOS

Quero expressar minha profunda gratidão a meu marido, meus filhos e minha filha, que sustentaram horas incontáveis de minha ausência para dedicação ao estudo deste trabalho. Quero agradecer à professora Márcia Mendonça Jorge, em especial, que se prontificou para juntas conhecermos a Psicologia Transpessoal, dando suporte e credibilidade a meus esforços. Agradecer à Regina Brostel, médica homeopata, que há quinze anos incentivou-me a fazer o curso de Psicologia. Agradecer à professora Joanna Darc por ter-me presenteado com uma obra de Psicologia Transpessoal na ocasião em que cursei a disciplina que ela ministra atualmente na Puc Minas. Agradecer ao professor Douglas, que me forneceu algumas das referências bibliográficas para esta pesquisa. Agradecer à sábia colega Mary Jane, psicóloga formada pela Puc Minas, no ano de 2007. E, enfim, agradecer a todos os autores que me permitiram conhecer a Psicologia Transpessoal.

“As hipóteses são redes: só quem as lança colhe alguma coisa.” Novalis

RESUMO Através desta pesquisa, comprova-se que esta ciência prima por trabalhar com diferentes níveis de consciência e os concebe como fazendo parte da natureza da mente, porque a emergência desses níveis de consciência atesta fins terapêuticos. Atesta-se que, com o estudo da história dessa nova ciência, há muitas contribuições com a Psicologia, pelo motivo da Psicologia Transpessoal estar inserida dentro de um contexto de mudanças e ampliações do conceito de paradigma holístico da ciência contemporânea. Reconhece-se que a ciência clássica, a ciência do racionalismo científico, circunscreve-se apenas ao estado da consciência de vigília, aquele em que predomina o raciocínio lógico e das sensações físicas, e também do reducionismo. A ciência do paradigma newtonianocartesiano baseia-se por inteiro nesse estado de consciência. A Psicologia Transpessoal não se enquadra nos moldes da ciência clássica, pois que estuda as funções intuitivas, a criatividade, os diversos estados alterados de consciência, onde a realidade vivenciada é a do mundo psíquico e essa, ligada com todos os seres viventes intra, extracorpóreos ou extraterrenos, a região onde ocorre uma variedade de experiências difíceis de serem coordenadas com o plano físico e com as chamadas leis naturais e ligada ao Universo. Daí, a importância desse trabalho no sentido de apresentar a Psicologia Transpessoal à comunidade científica da Puc Minas, abrindo espaço para discussão, troca e crescimento.

Palavras-chave: Psicologia Transpessoal; estados alterados de consciência; Psicologia e Ciência; paradigma holístico.

ABSTRACT Through this research we have been able to prove that this science works with different levels of consciousness and conceives them as part of the mind nature. The emergence of such levels helps therapeutic purposes. We can also attest that the study of Transpersonal Psychology contributes to Psychology as this new science is inserted within a context of changes and enlargements of the holistic paradigm of contemporary science. We acknowledge that classic science, the science of scientific rationalism embraces only consciousness states of vigil in which the logical reasoning and physical sensations prevail as well as reductionism. The Newtonian-Cartesian paradigm science is entirely based on this state of consciousness. Transpersonal Psychology does not fit into the patterns of classic science as it studies the intuitive functions, creativity and altered state of consciousness in which the reality experienced is the one of the psychic world. Such reality is linked with all living beings, intra, extracorporeal or extraterrestrial, the region where a variety of experiences occur which are difficult to be coordinated with the physical plan and the so-called natural laws of the Universe. Hence the importance of this work as a way to introduce Transpersonal Psychology to the scientific community of PUC Minas, opening a space for discussion, exchange and growth.

Key words: Transpersonal Psychology; altered states of consciousness; Psychology and Science; holistic paradigm.

SUMÁRIO Palavras-chave: Psicologia Transpessoal; estados alterados de consciência; Psicologia e..............................5 ABSTRACT.........................................................................................................................................................6 1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................................8 2 BREVE HISTÓRIA SOBRE A CIÊNCIA.....................................................................................................10 4 A PSICOLOGIA TRANSPESSOAL..............................................................................................................47 4.1 SISTEMATIZAÇÃO INTEGRATIVA TRANSPESSOAL...................................................................55 4.1.1 ASPECTOS ESTRUTURAIS OU CORPO TEÓRICO DA PSICOLOGIA TRANSPESSOAL.....55 4.1.2 CONCEITO DE UNIDADE FUNDAMENTAL DO SER OU DE NÃO-FRAGMENTAÇÃO.....55 4.1.3 CONCEITO DE VIDA......................................................................................................................56 4.1.4 CONCEITO DE EGO.......................................................................................................................56 4.1.5 ESTADOS DE CONSCIÊNCIA.......................................................................................................57 4.1.6 CARTOGRAFIA DA CONSCIÊNCIA............................................................................................59 4.2O ASPECTO DINÂMICO FORMADO PELOS EIXOS EXPERENCIAL E EVOLUTIVO DA PSICOLOGIA TRANSPESSOAL.................................................................................................................62 4.3 CLASSIFICAÇÕES DAS TÉCNICAS TRANSPESSOAIS...................................................................63 4.3.1 Intervenção verbal.............................................................................................................................63 4.3.2 Imaginação ativa................................................................................................................................64 4.3.3 Reorganização simbólica...................................................................................................................64 4.3.4 Técnica interativa...............................................................................................................................64 4.3.5 Regressão de memória.......................................................................................................................65 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS..........................................................................................................................67 REFERÊNCIAS ................................................................................................................................................76

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1 INTRODUÇÃO Este trabalho é a realização do desejo pessoal pelo saber. Foram a emoção e o sentimento de prazer que me levaram à investigação e à busca de conhecimento. Meu interesse tornou-se mais aguçado a partir do contato com a primeira obra que li sobre Psicologia Transpessoal: A Psicoterapia Transpessoal, de Vera Saldanha.1 A presente monografia é o resultado da pesquisa bibliográfica efetuada como trabalho de conclusão de curso de graduação em Psicologia. Através dela, torna-se possível levantar as seguintes hipóteses: a) o fato da não inclusão da Psicologia Transpessoal na grade curricular do Curso de Psicologia da Puc Minas será em razão da produção científica se inserir no conjunto de interesses materialistas da sociedade e a Psicologia Transpessoal, ao abarcar aspectos espiritualistas, ultrapassar os paradigmas comumente aceitos e reconhecidos pela ciência? b) Será que no esforço de objetividade, a ciência exclui quaisquer referências à experiência subjetiva, individual ou coletiva da Psicologia Transpessoal? c) Esse ramo da Psicologia estará acompanhando as transformações vividas pela ciência moderna? d) Será que a Psicologia, longe de qualquer viés planfetário de novas teorias, esquiva-se para se proteger de práticas esdrúxulas como a da utilização de drogas psicodélicas ou se acautela por haver poucos pesquisadores nesta nova área? e) Quais serão os motivos pelos quais se conhece tão pouco ou quase na da 4ª Força da Psicologia na Puc Minas? Mas, tentar afirmar essas hipóteses não é o único objetivo desta monografia. Outros objetivos também foram traçados. São eles: conhecer o estudo da consciência na concepção da Psicologia Transpessoal, seus estados superiores ou ampliados e o reconhecimento dos significados das dimensões espirituais da psique, além daqueles estudados na Universidade; conhecer por quais motivos a Psicologia Transpessoal prima por trabalhar com diferentes níveis de consciência e os concebe como parte da natureza da mente humana; identificar os critérios que garantam a cientificidade da Psicologia Transpessoal, reconhecendo seu papel fortalecedor dos sentimentos de espiritualidade, embora não possua vínculos com qualquer religião. Para atingir seus objetivos, este trabalho é dividido em quatro partes: a primeira, consiste de um breve percurso na história da ciência, a segunda parte teve como objetivo o estudo da história da Psicologia enquanto ciência. A terceira parte da pesquisa apresenta a história da 1

SALDANHA. Vera. A psicoterapia transpessoal. Campinas: Editora Komedi, 1997.

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Psicologia Transpessoal, sua epistemologia, objeto, método e aplicação. A última parte trata da análise das hipóteses apresentadas. Além de satisfazer a um desejo pessoal pelo saber, a pesquisa do tema proposto poderá trazer ganhos para terceiros, a começar pela Puc Minas, uma vez que este estudo possibilitará a configuração de uma formação universitária mais completa ao gerar conhecimentos novos. Finalmente, escrever uma monografia não significa tão-somente atender à exigência do curso de Psicologia, mas principalmente buscar novos construtos e produzir conhecimentos a respeito de um tema pouco conhecido, a Psicologia Transpessoal.

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2 BREVE HISTÓRIA SOBRE A CIÊNCIA

Como afirma Chauí (2001), o vocábulo ciência, no singular, refere-se a um ideal de conhecimento. Ciências, no plural, refere-se às diferentes maneiras de realização do ideal de cientificidade, segundo os diferentes fatos investigados e os diferentes métodos e tecnologias empregados. Ciência ou Scientia, que em latim significa sabedoria, caracteriza-se pela busca de conhecimento sistemático e seguro dos fenômenos do mundo. Um de seus objetivos básicos é tornar o mundo compreensível, proporcionando ao ser humano meios de exercer controle sobre a natureza. (COTRIM, 2002, p. 239). De acordo com Bachelard (1977), ciência e filosofia falavam a mesma linguagem. Mas, o que é a ciência? Desde os primórdios, o homem se preocupou com o conhecimento. O mito era a forma de conhecimento que o homem primitivo utilizava para compreender o mundo. Essa forma de buscar o conhecimento era baseada na fé e dispensava provas, sendo que somente os iniciados tinham acesso a ele. Dessa forma, por volta de 3.800 a.C., a ciência emerge sob o aspecto do deus Jano, em que sacerdotes caldaicos apresentam uma tradição astronômica através de suas observações que, verificáveis, permitiam-lhes predições corretas dos acontecimentos astronômicos. Os horários fazem-se calendários que regulam a atividade organizada, desde o crescimento das colheitas até as cerimônias religiosas. Era a ciência exata daquele povo. (KOESTLER, 1959, p.4.). Vale saber que Koestler em 1967, criou o termo “hólon” de holos: todo; on: parte, referindo-se a um sistema aberto e auto-regulável que apresenta simultaneamente propriedades autônomas de um todo e dependentes de uma parte. (WEIL, D’AMBROSIO, CREMA, 1993, p. 149). O símbolo para hólon é a divindade romana, Jano, porteiro do céu, dotado de uma qualidade de prudência, com dois rostos voltados em sentido contrário. Jano presidia o primeiro mês do ano, januarius.

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A face voltada para frente representa o futuro, e a outra, para trás, o passado. Olhando em direções opostas, a face do todo é voltada para os níveis subordinados, enquanto a face voltada para o ápice é a de uma parte dependente, característica principal do hólon. À medida que a ciência crescia e os homens começavam a dominar o mundo, essa vontade de dominação converteu-se na força motriz das grandes realizações científicas. A partir da filosofia, sabe-se que a vida é estruturada pela combinação dos quatro elementos fundamentais: água, ar, terra e fogo. Toda a matéria é feita de várias combinações desses quatro elementos. Assim, os filósofos pré-socráticos fazem uma ruptura com o mito e introduzem a filosofia da natureza: na China os taoístas (filósofos naturalistas), na Europa antiga, os estóicos, os epicuristas e os adeptos do atomista Demócrito. Todos os filósofos praticavam filosofia e ciência, inclusive os pitagóricos, platônicos, aristotélicos, cristãos, etc. O sexto século antes de Cristo, o milagroso século de Buda, Confúcio e Lao-Tsé, dos filósofos jônicos e de Pitágoras, foi o século do despertamento do pensamento racional, das explicações naturais e causas racionais. Na escola jônica de filosofia, o pensamento racional ia emergindo do mundo de sonho mitológico onde as explicações naturais e causas racionais se prendiam às causas naturais. Tales de Mileto, Anaximandro, Anaxímenes, Xenófanes e Pitágoras de Samos, todos foram filósofos desse período. A respeito de Pitágoras, Koestler (1989) escreve: Pitágoras foi quem abriu caminho para que a ciência viesse a ser, além de um deleite intelectual, o caminho para o alívio espiritual, para a união mística entre os pensamentos da criatura e o espírito do criador. Na mitologia, Orfeu é uma aparição tardia no cenário grego em data desconhecida, provavelmente muito antes do século VI. Ele é vítima da fúria de Dionísio-Baco, o devastador, deus-bode da fertilidade e do vinho. Os bacantes de Eurípedes, adoradores do deus chifrudo, com o tempo perceberam que os excessos não conduziam à união mística com Deus, nem tampouco à natureza. (KOESTLER, 1989, p. 14). Assim, surge a figura de Orfeu, que é vítima da fúria de Baco, quando, após perder a esposa, decide dar as costas ao sexo: O orfismo é o culto da primeira religião universal no sentido de não ser considerada monopólio tribal ou nacional, e sim aberta para todos os que lhe aceitassem os

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regulamentos. O homem tem o poder de redimir o pecado original, purificar-se da parte má da herança, levando uma vida diversa da terrena e executando certos ritos ascéticos. Desse modo, logra libertar-se da roda do renascimento, seu aprisionamento em sucessivos corpos animais e até vegetais, espécie de túmulos carnais de sua alma imortal e readquirir a perdida condição divina. Praticavam-se ritos órficos de purificação com muitos tabus primitivos, como não comer carne nem feijão, não olhar para o espelho ao lado da luz [...]. (KOESTLER, 1989, p. 14).

Conforme Koestler (1989), Pitágoras foi quem deu ao orfismo um novo significado, marcando a intuição religiosa e a ciência racional, unindo-as no conceito de katharsis. Katharsis que era o conceito central no baquismo, no orfismo, no culto de Apolo de Delos. Havia um anelo de libertação de várias formas de escravatura; de paixões e tensões do corpo e do espírito; da morte e do vazio espiritual que tendia a criar explosões emocionais; do legado dos titãs aos homens e do reacender a divina centelha. Pitágoras substituiu os ritos purificadores da alma de seitas rivais por uma elaborada hierarquia de procedimentos catárticos. Foi ele quem purificou o próprio conceito de purificação. Nesse contexto, em um nível mais elevado, a catarse da alma se realiza pela contemplação da essência de toda a realidade, da harmonia das formas, da dança dos números. (Koestler, 1989, p. 15). É interessante saber que a palavra theoria deriva-se de theorio “olhar, contemplar” (thea: espetáculo, theoris: espectador, assistência). Mas, no uso órfico significava “um estado de fervente contemplação religiosa, no qual o espectador se identifica ao deus sofredor, morre na morte dele e ressurge na sua ressureição”. (KOESTLER, 1989, p. 15). À medida que os pitagóricos canalizavam o fervor religioso em fervor intelectual, o êxtase ritual em êxtase do descobrimento, theoria foi alterando gradativamente o seu sentido para teoria na acepção moderna. Acredita-se que, com o progresso do método científico, as teorias passaram a ser mais objetivas e dignas de fé. Pelo fim do terceiro século antes de Cristo, estava terminado o período da ciência grega. De Platão e Aristóteles para a frente, a ciência natural vai decaindo, e os feitos gregos só irão ser redescobertos um milênio e meio mais tarde na Idade Média. Sócrates, Platão e Aristóteles irão marcar o próximo período em que ciência e filosofia ainda não se distinguiam. Surge a racionalidade, a matemática puramente abstrata e a racionalidade lógica.

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Foi Platão (427-347 a.C.) quem afirmou que o processo de conhecimento se desenvolve por meio da passagem progressiva do mundo das sombras e aparências para o mundo das idéias e essências. Não há intelecto que não seja fora da alma. (PLATÃO, 1996, p. 20). Aristóteles de Estagira, pelo contrário, repisava a importância da experiência, empiria, diante da aperia intuitiva. (KOESTLER, 1989, p. 69). Aristóteles elaborou uma visão científica da realidade, desenvolvendo a lógica para servir de ferramenta do raciocínio. A indução, que é a operação mental que vai do particular para o geral, representa o processo intelectual básico de aquisição do conhecimento. (ARISTÓTELES, 2003, p. 97). Para Chalmers (1993), a ciência começa com a observação, e o processo denominado indução, baseado no raciocínio indutivo, parte do particular para o todo. O observador pode conferir sua verdade pelo uso direto de seus sentidos. Não é permitida a intrusão de nenhum elemento pessoal, subjetivo. A objetividade da ciência indutivista deriva do fato de que tanto a observação como o raciocínio são objetivos. (CHALMERS, 1993, p. 8). É lícito supor que o pensamento europeu do século XVI era controlado por duas forças poderosas, quais sejam, a Igreja Católica, liderada pelo papa, e a antiga filosofia, dominada pelas idéias de Aristóteles. O maior erro de Aristóteles foi pensar que a Terra mantinha uma posição fixa no espaço. Ele acreditava que ela era o ponto central do Universo. Em sua concepção, a Terra não girava nem fazia qualquer espécie de movimento, ao contrário: o Sol, a Lua e todos os planetas conhecidos giravam em torno dela. Percebe-se que essa visão egocêntrica que a humanidade tinha a respeito da existência, o modelo de universo de Aristóteles era muito popular entre os membros da Igreja. Como o homem havia sido feito à semelhança de Deus, seguia-se ser correto que a Terra tomasse o devido lugar como centro do Universo. Conclui-se que os clérigos tornaram-se sucessores dos filósofos da antigüidade. A Igreja Católica passou a determinar todo o clima cultural e o curso de ensino. Em toda a Idade Média, os mosteiros eram considerados os oásis de cultura. Havia deficiência, mas não disputa entre teologia e filosofia, concordando ambas em que a natureza era

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digna de ser conhecida. Não havia a divisão entre o teólogo e o cientista, pois este último ainda não existia. (KOESTLER, 1982, p. 365). A Igreja controlava as pessoas pela proibição completa de se ensinar qualquer coisa que se desviasse da Bíblia. Ela criou a Ordem dos Jesuítas, que trabalhava em questões científicas, ensinando uma versão própria da verdade. A filosofia e a ciência jesuítas nada mais eram do que a repetição daquilo que Aristóteles havia ensinado. (WHITE, 1991, p. 10). Cabe, pois, concluir que as discussões metodológicas dos filósofos medievais seguiam o modelo fixado pelos gregos e estavam estreitamente ligadas ao modo pelo qual Aristóteles tratava do problema da ciência com o método indutivo e dedutivo em suas Segundas Analíticas. (KOYRÉ, 1982, p. 60). Os ensinamentos concretos da ciência aristotélica, elevados a dogmas, paralisaram o estudo da natureza. (KOESTLER, 1982, p. 69). Koestler (1982) afirma que o universo cristão medieval possuía limites rígidos e firmes no espaço, no tempo e no conhecimento. A história do Universo se limitava a trezentas gerações do começo ao fim, e havia limites ao progresso do conhecimento, à ciência, tendo sido todos eles completados demoradamente. A verdade sobre a religião estava revelada nas Escrituras. O edifício do conhecimento estava completo. Se a resposta não se adequava aos fatos, o erro era atribuído aos escribas copiadores do antigo manuscrito. A autoridade dos antigos não se apoiava na idolatria, mas na crença da natureza finita do conhecimento. Daí os limites ao progresso do conhecimento. (KOESTLER, 1982, p. 145). Assinala Koestler (1982) que, por volta de 1600, a ordem dos jesuítas era a ponta de lança intelectual da Igreja. Discutia-se o sistema copernicano livremente, mas era favorável não apresentar as hipóteses dele como verdade, por serem contrárias à corrente de interpretação da escritura, salvo e até que se lhe apresentasse em favor provas definidas. Koestler (1982) marca que nem os filósofos nem os estudiosos tinham motivos para temer a perseguição de suas idéias, desde que evitassem desafiar, direta e explicitamente a autoridade da Igreja. Se soubessem ter o mínimo de discrição na escolha das palavras, era-lhes lícito dizer o que lhes aprouvesse.

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Koestler (1982) ressalta também que a noção de não-limitação ou de infinidade intrínsecos ao sistema copernicano, destinava-se a ocupar o espaço reservado a Deus nos mapas astronômicos medievais e isso incomodou a Igreja. Mas, para Koestler (1982), o primeiro conflito entre a Igreja e a ciência foi o escândalo Galileu, que levou a imagem da divindade a sofrer sutil e gradual alteração, libertando-se da rígida estrutura escolástica e recuando além do dualismo de Platão até a mística inspiração pitagórica de Deus como principal matemático. Foi através da revolução científica do século XVII, iniciada por Galileu, que a história da ciência moderna teve início, sendo um setor independente da filosofia e da religião. Para Galileu, o livro da natureza está escrito na linguagem matemática, sem cujo auxílio é impossível compreender-lhe uma palavra sequer. Mas, o principal matemático de Galileu chamase natureza e não Deus. (KOESTLER, 1982, p. 367). Os séculos XV e XVI foram marcados por importantes mudanças. Com o enfraquecimento da Igreja pelas idéias renascentistas e a Reforma religiosa, as idéias da escolástica, que aproximavam a filosofia da religião, ainda predominavam. Mesmo nas universidades, já havia a crença de que a chave para se poder trilhar o caminho do conhecimento era a razão. A partir do século XVII, promoveu-se um avanço importante: a razão articulava-se a um método. Esse século ficou conhecido pelo século do método. Como conseqüência da Revolução Científica, o filósofo Francis Bacon (1561-1626) foi um dos primeiros a tentar articular o que é o método da ciência moderna. No período em que viveu, na passagem do século XVI para o XVII, Bacon já acumulava conhecimentos e se tornou entusiasta das conquistas científicas. Percebendo as vastas possibilidades do método como novo tipo de conhecimento, Bacon planejou um programa de desenvolvimento da ciência em todos os níveis, denominando-o A Grande Instauração. Seu intento de criar uma instituição governamental que conduzisse o avanço da ciência experimental foi em vão, sendo seu objetivo concretizado somente em 1662, com a fundação da Royal Society por Carlos II. (CHALITA, 2006, p. 224).

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A meta da ciência moderna, para Bacon, é o melhoramento da vida do homem na terra e, essa meta seria alcançada através da coleta de fatos com observação organizada e derivando teorias a partir daí. (CHALMERS, 1993, p. 20). Desde então, a teoria de Bacon tem sido modificada e aperfeiçoada por alguns e desafiada por outros. O século XVII foi o século do racionalismo e da metafísica (discussões metafísicas sobre Deus e o mundo) e racionalista. Como esse século foi composto de grandes matemáticos, estes buscaram aplicar o método matemático como um instrumento da razão, conduzindo-a a um conhecimento verdadeiro e certo. O racionalismo moderno é a doutrina que atribui exclusiva confiança na razão humana. É importante saber que não seria o método matemático em si o usado e sim o procedimento dedutivo da geometria, ou seja, o modo da matemática de encadear as razões ou afirmações segundo uma certa ordem. (CHALITA, 2006, p. 232). Os filósofos desse século passaram a acreditar que o conhecimento do mundo poderia ser alcançado pelo uso exclusivo da razão, pois haveria uma racionalidade, uma explicação, nas coisas correspondentes à racionalidade das pessoas. Conforme Chalita (2006), essa racionalidade se expressaria do modo, lógico, dedutivo, o que caracterizaria a visão específica do racionalismo moderno, que considerava que os sentidos são uma fonte confusa, obscura e provisória da verdade, o que levará a experiência sensível dos sentidos a um segundo plano como fonte de conhecimento. Chalita (2006) afirma que o racionalismo constitui-se como um dos pólos de discussão fundamental na história da filosofia, aquela que trata das origens do conhecimento. O outro pólo dessa discussão é o empirista do grego empeiria, experiência. Por seu racionalismo, René Descartes (1596-1650) é o filósofo que sintetiza o espírito do século XVII, sendo o que mais contribuiu para o paradigma desse século com uma formulação extrema do dualismo absoluto entre mente (res cogitans) e matéria (res extensa), que resultou na crença de que o mundo material pode ser descrito com objetividade, sem referência ao observador humano. Mas, essa objetividade tinha como base a percepção constante de Deus. (GROF, 1988, p.13). [...] Descartes prescreve como recurso para a construção da ciência e também para a sabedoria da vida seguir os imperativos da razão que, a exemplo de sua manifestação,

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opera por intuições e por análises. [...] A dinâmica inerente às séries de termos dispostos racionalmente (como as progressões matemáticas) leva à inevitável explicitação do que está contido no “Se duvido, penso”. Leva ao cogito: “Penso, logo existo” (Cogito ergo sum). (GRANGER, 1983, p. XVI).

Para Descartes, a existência de Deus, a espiritualidade da alma ou a definição da matéria como pura extensão são verdades apreendidas diretamente pelo entendimento humano e cuja certeza não depende nem da observação dos fatos, nem da experiência, nem do cálculo das probabilidades ou valor dos testemunhos. (CHÂTELET, 1974, p. 76). Japiassu (1976) ressalta que o cogito cartesiano inscreveu-se no inconsciente coletivo da filosofia clássica ao possibilitar ao homem conduzir bem sua razão e procurar a verdade nas ciências. Foi Isaac Newton (1642-1727) quem levou a termo a revolução científica iniciada por Galileu: físico, matemático e astrônomo, Newton concebe o mundo como uma grande máquina, cujas partes podem ser conhecidas através da observação e da experimentação. Esse grande mecanismo ou mundo é obra de um Ser inteligente, de um “Regente Universal”, que não podemos conhecer, porque só nos é possível conhecer Deus através de nossos sentidos. Daí ser somente possível afirmar Sua existência, a partir da ordem presente no Universo. (COTRIM, 2002, p. 149).

Isaac Newton (1642-1727) foi quem conferiu a Deus uma dupla função como Criador do mecanismo universal e como seu Supervisor no tocante à manutenção e reparo. (Koestler, p. 367) De acordo com Grof (1988), Newton acreditava que o mundo fosse material por natureza, mas não pensava que sua origem fosse explicada por causas materiais. Deus, a seu ver, foi quem criou inicialmente as partículas materiais, as forças entre elas e as leis que governam seus movimentos. O Universo, uma vez criado, continuaria a funcionar como uma máquina e poderia ser descrito e compreendido como tal. Graças a essa revolução, a expressão “Filosofia Natural”, expressão usada até então para a busca do conhecimento no sentido da conquista da natureza, foi substituída pelo vocábulo “Ciência” ou “Nova Filosofia”. Isso ocorreu porque a revolução tecnológica ocasionada pelos seus descobrimentos não tinha como objetivo a conquista da natureza, mas sua compreensão. (KOESTLER, 1989, p. 13)

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De acordo com Japiassu (1976), é tomada a consciência de que o conhecimento científico não é, propriamente falando, filosófico. Com a revolução científica, a filosofia tendeu a desaparecer nas classificações científicas, assim como as técnicas. Com pequenas variações, a classificação do saber que havia sido mantida até esse século foi simplificada em: tipo de objeto estudado, tipo de método empregado e tipo de resultado obtido. (CHAUÍ, 2001, 260). É importante ressaltar que, sob a influência do paradigma newtoniano-cartesiano, houve uma fragmentação do conhecimento em disciplinas. Disciplina, nesse sentido, é usada como sinônimo de ciência, muito embora o termo disciplina seja mais empregado para designar o ensino de uma ciência, ao passo que ciência designa mais uma atividade de pesquisa. (JAPIASSU, 1975, p. 61). Chauí (2001) afirma que a classificação do saber costuma ser usada até hoje como a classificação sistemática das ciências: ciências matemáticas, ciências naturais, ciências humanas ou sociais, ciências aplicadas. Cada uma das ciências subdivide-se em ramos específicos com nova delimitação de seu objeto de estudo e do método de investigação. Nesse nível de compreensão, a idéia de um legislador divino que rege as leis da natureza e não a Igreja, promoveu um demasiado respeito e autoconfiança à ciência européia. Se o universo foi criado por Deus, então é compreensível e pode ser analisado como uma máquina, para ver como funciona. Ao revelar esse plano, a ciência presta homenagem ao Criador. O paradigma da ciência ocidental foi tomado para explicar a ordem da natureza não por ter sido a única ciência, mas porque foi a mais bem sucedida na combinação de hipóteses matemáticas, seguidas por uma tradição experimentalista. (KNELLER, 2001, p. 20).

Segundo Koestler (1989), o fator transcendental não estava incluso no universo mecânico: A teologia e a física separaram-se por se enfadarem uma da outra e nada mais terem que dizer-se. Separada do que antes se chamava filosofia da natureza que hoje recebe o nome de ciência exata, a teologia continuou o seu rumo especializado, doutrinário. A era do comando beneditino, franciscano, tomista e jesuíta, em questões de pesquisa, havia passado. (KOESTLER, 1989, p.365).

À outra parte divorciada, a ciência, com a separação dos caminhos, beneficiou-se por completo. Livre do lastro místico, pôde se desenvolver de forma estrondosa.

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Vale saber que tanto para Newton quanto para Descartes, o conceito de Deus era elemento essencial em suas filosofias e visão de mundo. Já no século XVIII, há uma tendência epistemológica e empirista. Tendência epistemológica no sentido de investigação sobre como as idéias se formam na mente humana e como as pessoas podem obter conhecimento verdadeiros das coisas Chalita (2006) descreve que as preocupações dos pensadores do século XVIII eram diferentes daqueles do início da era moderna. Eles se afastaram das discussões metafísicas e buscaram aplicar a nova metodologia emprestadas das ciências da natureza em outros campos de investigação como a moral, a política e a estética. Esses pensadores denominaram a própria época de Século das Luzes, e o movimento intelectual do qual faziam parte, de Iluminismo ou Ilustração. Havia a pretensão de se iluminar as trevas da ignorância, tendo por instrumento a luz natural a todos os homens, ou seja, a razão. De acordo com Japiassu (1976), com o advento da ciência moderna há o início de uma nova antropologia complexa que faz a associação de uma visão objetiva do homem como ser deste mundo terrestre, ser de natureza material e física, e de uma visão subjetiva da relação do homem com o conjunto da natureza e consigo mesmo. Designava-se por antropologia o conjunto das ciências humanas até o século XIX. Antropologia tem suas raízes do grego. Antro significa homem e logus, razão, pensamento. A antropologia vai oscilar entre um conhecimento organicista e materialista do ser corporal e biológico do homem, e um saber espiritualista da vida psíquica, intelectual e moral da “alma” humana, ligando os dois de modo mais ou mesmo bastardo no plano da objetividade. Ela se divide em antropologia social e física. (JAPIASSU, 1976, p. 30). O outro pólo da estrutura do pensamento no desenvolvimento da ciência moderna do século XVII foi o empirismo, que significa a valorização dos sentidos como fonte primordial, defendendo que o processo de conhecimento depende de experiência sensível. Os empiristas criticavam idéias filosóficas baseadas em conceitos abstratos, intangíveis como os metafísicos. Isso promoveu grande avanço em muitos campos do conhecimento, instaurando definitivamente as bases da ciência moderna.

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Foi a Inglaterra o berço do empirismo moderno. Entre seus principais representantes estão Bacon, Thomas Hobbes, Johan Looke, George Berkeley e David Hume. (COTRIM, 2002, p. 161). Sob o ponto de vista de Reale e Antiseri (2005), é na base do positivismo que a ciência moderna se desenvolve. Segundo Abbagnano (2007), o positivismo é a romantização da ciência, sua devoção como único guia da vida individual e social do homem, único conhecimento, única moral, única religião possível. Esse termo foi empregado pela primeira vez por Saint-Simon, para designar o método exato das ciências e sua extensão para a filosofia. O positivismo foi adotado por Auguste Comte para a sua filosofia e passou a designar uma grande corrente filosófica que, na segunda metade do século XIX, teve numerosíssimas e variadas manifestações em todos os países do mundo ocidental. (ABBAGNAMO, 2007, p. 376). O positivismo de Comte possuía idéias do Iluminismo, ou seja, através de um conhecimento progressivo do mundo, conseguir-se-ia ordená-lo de acordo com a vontade. Esse pensamento reivindica o primado da ciência: o único método de conhecimento é o das ciências naturais, que não somente vale para o estudo da natureza, mas também para o estudo da sociedade, que é fruto qualificado do programa filosófico positivista. A era do positivismo foi perpassada por otimismo geral e também considerada como parte integrante da mentalidade romântica por alguns estudiosos, pois a positividade da ciência leva a mentalidade positivista a combater as concepções idealistas e espiritualistas da realidade, concepções que os positivistas rotulavam como metafísicas, embora mais tarde tenham caído em metafísicas igualmente dogmáticas. (REALE e ANTISERI, 2005, p. 288).

De acordo com Chalita (2006), na década de 1890, também na França, surgiu um importante ramo dissidente do positivismo de Comte, denominado sociologismo. Émile Durkheim foi seu expoente. É importante assinalar que com o positivismo social de Durkheim, a sociedade representa uma entidade genérica superior aos indivíduos, e o sociologismo consistia numa doutrina positivista voltada para o âmbito social que buscava compreender os mecanismo que orientaram os homens a viver em sociedade. (CHALITA, 2006, p. 361). Abbagnamo (2007) afirma que o positivismo presidiu à primeira participação ativa da ciência moderna na organização social e constitui até hoje uma das alternativas fundamentais em

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termos de conceito filosófico, mesmo depois de deixadas as ilusões totalitárias do positivismo, expressas na pretensão de absorver na ciência qualquer manifestação humana. Pelo estudo da história, nota-se que a ascensão do positivismo ocorreu numa época concomitante ao advento da física quântica e da teoria da relatividade de Einstein que não se conciliavam entre si. (CHALMERS, 1983, p. 21). Para agravar o cenário da ciência no século XIX, Charles Darwin (1809-1882) com sua teoria evolutiva das espécies biológicas, pôs em crise a idéia de homem que predominava há séculos: a espécie humana está sujeita aos mesmos processos de evolução da dos animais. (REALE E ANTISERI, 2005, p.333). Sua obra: A Origem das espécies, em 1859, introduziu um novo paradigma evolutivo na ciência desse século. A partir da destruição da idéia de Cosmo,

surgindo a idéia de Universo infinito e

geométrico ou matematização da ciência, as leis do Céu e as leis da Terra se fundem. (KOYRÉ 1982, p. 154). Com esse fato, o otimismo em relação às ciências naturais dominou a Idade Moderna, estendendo-se às chamadas ciências humanas que, nascidas no século XIX, procuraram atingir um patamar de cientificidade próximo ao da física, considerada então como modelo de ciência. De acordo com Japiassu (1976), o destino das ciências humanas estava vinculado ao destino da filosofia. Eram consideradas como ramos da antropologia filosófica. Devido sobretudo à predominância do positivismo, a antropologia filosófica vê-se numa situação idêntica à da filosofia da natureza no século XVII: seu objeto, o homem, é anexado pelas ciências experimentais. A física no século XIX levou ao apogeu a imagem mecanicista do universo para depois criar, antes do fim do mesmo século, os dados e pressupostos que levarão essa imagem a uma crise irreversível. (REALE e ANTISERI, 2005, p. 333). De acordo com Chalita (2006), durante as primeiras décadas do século XX, surgiu um movimento de reação ao positivismo em diversos países da Europa, denominado Espiritualismo. Esse movimento pretendia reacender o debate sobre as questões éticas e metafísicas suprimidas pela doutrina positiva. A corrente espiritualista afirma que somente por meio da consciência pode-se extrair os dados da investigação filosófica ou científica, rejeitando o materialismo da época. Esses

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dados seriam compostos não só pela reflexão interior do indivíduo, mas também por seus sentimentos, ideais, morais e religiosos. Henri Bergson (1859-1941) foi o filósofo de maior destaque desse movimento ao valorizar a intuição como forma de captar o pleno sentido da realidade. (CHALITA, 2006, p. 362).

Mas, o positivismo ainda teria desdobramentos no século XX, principalmente como resposta aos avanços científicos. O desenvolvimento das pesquisas sobre eletrodinâmica fizeram surgir contradições que abalaram a concepção determinista do universo físico e, ao final do século XIX, levaram ao início da física quântica, com a formulação do princípio da incerteza. Desde o início do século XX, a física passou por profundas e radicais mudanças, transcendendo a visão de mundo mecanicista e todas as premissas básicas do paradigma newtoniano-cartesiano. Max Karl Ernst Ludwig Planck (1858-1947), físico teórico alemão, criador da teoria quântica, que, juntamente com a teoria geral da Relatividade de Albert Einstein, forma os fundamentos da física do século XX. Por sua realização, Planck recebeu o prêmio Nobel de Física, em 1918. (BARSA, 1995, p. 97) Foi no início do século XX que Planck apresentou à Sociedade Alemã de Física sua nova teoria que iria operar completa revolução na física. Essa teoria afirma que a energia é algo descontínuo, isto é, seu crescimento se faz por acréscimos constantes. (BARSA, 1995, p. 97). O ano de 1905 foi o ano de Albert Einstein (1879-1955). Em pouco tempo, ele completou sua tese de PhD, publicou dois artigos científicos (o esboço de sua Teoria da Relatividade Especial, que trata do tempo na vastidão do espaço) e escreveu outros dois artigos que também foram muito bem recebidos pela comunidade científica da época. (MACDONALD, 1992, p. 23). Nesse mesmo ano, Einstein aplicou a hipótese quântica ao efeito fotoelétrico, obtendo uma explicação ao efeito fotoelétrico. Admitindo que cada elétron é liberado por um quantum de luz, denominando-o fóton, a que está ligada uma energia proporcional à respectiva freqüência. (BARSA, 1995, p. 98). Macdonald (1992) assevera que a teoria de Einstein lançou luz à ciência, chegando a uma lei geral capaz de substituir a explicação de Newton para a maioria dos problemas mais importantes da física. Em 1907, Einstein prosseguindo em suas descobertas, publicou um dos primeiros artigos sobre o assunto que foi a maior descoberta da Física do século XX: a Teoria Quântica.

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Diferentemente da teoria da relatividade, a Mecânica Quântica descreve como se comportam as menores unidades da matéria que se conhecem – o quantum e as partículas subatômicas, como elétrons, prótons e outras. Mas, o entendimento da Mecânica Quântica também envolve o uso de uma teoria conhecida como Princípio da Incerteza de Heisenberg, segundo a qual é impossível medir-se, simultaneamente e com precisão absoluta, a velocidade com que uma partícula (de luz ou energia) está se movendo e o ponto exato em que se encontra no espaço. (MACDONALD, 1992, 44).

A teoria dos quanta fornece a Niels Bohr (1885-1962) os fundamentos teóricos para interpretar o problema da estrutura do átomo e de hidrogênio. Bohr

propõe

o

termo

complementaridade

derivado

da

física

quântica.

A

complementaridade é a solução do paradoxo partícula-onda. Possui a virtude da inclusividade e evita a polarização extremista: isto ou aquilo dá lugar a isto e aquilo. Mas, foi Werner Karl Heisenberg (1901-1976), um dos fundadores da física quântica, com o princípio da incerteza, que estabeleceu a impossibilidade de determinar com precisão a velocidade e localização do elétron. (COTRIM, 2002, p. 246). Capra (1982) relata que uma das principais lições que os físicos tiveram que aprender no século XX foi o fato de que todos os conceitos e teorias usados para descrever a natureza são limitados. Heisenberg afirmou, conforme Capra (1982), que toda palavra e todo conceito, por mais claros que possam parecer, têm apenas uma limitada gama de aplicabilidade, e as teorias científicas não estarão nunca aptas a fornecer uma descrição completa e definitiva da realidade. É importante saber que, de acordo com Machdonald (1992), Einstein mostrava-se muito interessado na Teoria Quântica, mas não simpatizava, particularmente, com o elemento sorte subentendido no Princípio da Incerteza. “Deus não joga dados”, dizia ele. Para Capra (1982), enquanto a nova física se desenvolvia no século XX, a visão de mundo cartesiana e os princípios da física newtoniana mantinham sua forte influência sobre o pensamento científico ocidental, e ainda hoje muitos cientistas aderem ao paradigma mecanicista. De acordo com Stewart (1997), grande parte da história foi dominada pela matemática linear em que os efeitos são proporcionais às causas e o todo literalmente é equivalente à soma das partes. Stewart (1997) também afirma que a maior parte da ciência tradicional se baseia na filosofia do reducionismo, segundo a qual um sistema é compreendido pelo detalhamento da

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estrutura que o constitui e pelo estudo de como cada componente influencia os demais. (STEWART apud LIVRO DO ANO, 1997, p. 123). Diante de tais fatos, muitas certezas foram abaladas, e foi a filosofia da ciência que se debruçou sobre os novos questionamentos e novas reavaliações dos critérios de verdade e da validade dos métodos e teorias científicas. Um grupo de cientistas marcou a filosofia científica, isto é, a filosofia ligada à ciência e que pretendia dar conta dela no chamado Círculo de Viena. Com a tomada do poder por Hitler, esse mesmo Círculo teve seu fim na metade de 1930. O princípio fundamental do neopositivismo, que é a filosofia do Círculo de Viena, é o de verificação, segundo o qual têm sentido apenas as proposições que podem empiricamente ser verificadas [...]. (REALE e ANTISERI, 2005, p. 113). De acordo com Abbagnamo (2007), pelo nome de positivismo lógico ou empirismo lógico, indica-se a orientação instaurada pelo Círculo de Viena e depois seguida e desenvolvida por outros pensadores, especialmente na América do Norte e na Inglaterra. É importante ressaltar que o positivismo lógico foi uma forma extrema do empirismo. (CHALMERS, 1993, p. 20). Como característica dessa corrente tem-se a redução da filosofia à análise da linguagem sendo entendida como linguagem científica ou linguagem comum. (ABBAGNAMO, 2007, p. 381). Essas duas tendências têm em comum um arsenal negativo e polêmico, qual seja, a negação de qualquer metafísica, que elas compartilham com todo o empirismo moderno e que justificam com a tese de que todos os enunciados metafísicos são desprovidos de sentido, porque não verificáveis empiricamente. Como conseqüência desse princípio de verificação, nasce a antimetafísica dos neopositivistas vienenses, ou seja, as afirmações metafísicas junto com as religiosas são simplesmente não sentidos, justamente pela razão de não serem verificáveis. (REALE e ANTISERI, 2005, p. 113). Em 1934, Karl Raimund Popper (1902-1994) em Viena e Gaston Bachelard (1884-1962) na França tinham ambos publicado obras que continham refutações conclusivas ao positivismo lógico, mas foram quase totalmente negligenciadas, recebendo a atenção que mereciam apenas em épocas recentes. (CHALMERS, 1993, p. 21).

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Popper admite em sua autobiografia que fora responsável pela morte do neopositivismo. Ele deu uma interpretação diferente daquelas de alguns membros do Círculo de Viena a respeito dos fundamentos empíricos da ciência. (REALE e ANTISERI, 2005, p. 141). Para Popper, a ciência deveria progredir pela proposta de conjecturas audaciosas, altamente falsificáveis, como tentativas de resolver problemas, seguindo-se tentativas impiedosas de falsificar as novas propostas. (CHALMERS, 1983, p. 83). O empreendimento da ciência consiste na proposição de hipóteses altamente falsificáveis, seguidas de tentativas deliberadas e tenazes de falsificá-las. As falsificações, isto é, os fracassos das teorias em passar por testes de observação e experimento, foram retratadas como sendo de importância chave porque, segundo Popper, essa é a maneira pela qual pode-se aprender com os erros, e porque ao se descobrir que a conjectura é falsa poder-se-á aprender muito sobre a verdade, podendo chegar-se mais perto dela. (POPPER, 1975, p. 231). A base empírica da ciência objetiva nada tem, portanto de “absoluto”. A ciência repousa em pedra firme. A estrutura de suas teorias levanta-se, por assim dizer, num pântano. Semelha-se a um edifício construído sobre pilares. Os pilares são enterrados no pântano, mas não em qualquer base natural ou dada. Se deixarmos de enterrar mais profundamente esses pilares, não o fazemos por termos alcançado terreno firme. Simplesmente nos detemos quando achamos que os pilares estão suficientemente assentados para sustentar a estrutura – pelo menos por algum tempo. (POPPER, 1975, p. 119).

Gaston Bachelard (1884-1962) também foi outro filósofo no campo da ciência a destacar a importância do estudo da história da ciência como instrumento de análise do racionalismo. Bachelard foi quem falou em rupturas epistemológicas causadas por obstáculos epistemológicos. Para Bachelard (1977), quando se procuram as condições psicológicas do progresso da ciência, chega-se logo a essa convicção de que é em termos de obstáculos que se torna preciso apresentar o problema do conhecimento científico. Os obstáculos sugerem rupturas. Toda cultura científica deve começar por uma catarse intelectual e afetiva. Resta depois a tarefa mais difícil: pôr a cultura científica em estado de mobilização permanente, substituir o saber firmado e estático por um conhecimento aberto e dinâmico, argumentar todas as variáveis experimentais, dar à razão razões de evoluir. (BACHELARD, 1977, p. 151).

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De acordo com Reale e Antiseri (2006), Paul Feyeranbend (1924-1994) foi quem reagiu à percepção de que as teorias científicas não podem ser conclusivamente provadas ou desaprovadas. Feyeranbend fez a crítica mais radical da metodologia científica e suas práticas correntes formulada até então. Em sua obra Against Method: Outline of an Anarchistic Theory of Knowledge (1978), Feyeranbend argumentou que a ciência não é nem pode ser governada por um sistema de princípios firmes, imutáveis e absolutos. (GROF, 1987, p. 10). O anarquismo epistemológico de Feyerabend consiste na tese de que a idéia de um método que contenha princípios estáticos, imutáveis e absolutamente obrigatórios como guia para a atividade científica se defronta com dificuldades consideráveis quando é posta diante dos resultados da pesquisa histórica. (REALE e ANTISERI, 2006, p. 168). Reale e Antiseri (2006) relatam que foi Imre Lakatos (1922-1974), aluno de Popper, quem desenvolveu uma descrição de ciência como tentativa de melhorar o falsificacionismo popperiano e superar as objeções a ele. Para Lakatos, a ciência é, foi e deveria ser uma competição entre programas rivais de pesquisa, lançando sua concepção que caracteriza o falsificacionismo metodológico sofisticado. Este se distingue do falsificacionismo dogmático e do metodológico ingênuo. A saber que o falsificacionismo dogmático consiste na idéia de que a ciência se desenvolve por meio de conjecturas ousadas e falsificações infalíveis, e o falsificacionismo metodológico ingênuo corrige o erro dos falsificacionistas dogmáticos, sustentando que a base empírica da ciência não é infalível, como não são incontrovertíveis as hipóteses auxiliares. (REALE e ANTISERI, 2006, p. 166).

Thomas Kuhn (1922-1996), historiador americano da física, que voltou sua atenção para a história da ciência, percebeu que os relatos tradicionais da ciência, fosse indutivista ou falsificacionista, não suportam uma comparação com o testemunho histórico. (CHALMERS, 1993, p. 123). Grof (1987) explica que cada período da história das idéias e métodos científicos é reconhecido como um passo lógico de uma aproximação cada vez mais apurada de uma descrição do universo, como sendo a última verdade a respeito dele. No entanto, uma análise detalhada da história e filosofia da ciência revela que esta é uma imagem distorcida e romântica do curso atual dos acontecimentos.

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A teoria da ciência de Kuhn foi desenvolvida como uma tentativa de fornecer uma teoria mais corrente com a situação da história tal como ele a via. (CHALMERS, 1993, p. 123). Uma das características chaves de sua teoria é a ênfase dada ao caráter revolucionário do progresso científico, em que uma revolução implica o abandono de uma estrutura teórica e sua substituição por outra, incompatível. A progressão da ciência para Kuhn segue-se: pré-ciência – ciência normal – crise-revolução – nova ciência normal – nova crise. (CHALMERS, 1993, p. 124). Kuhn afirmou em sua obra A Estrutura das Revoluções Científica que não há uma comunidade científica sem um paradigma. (REALE e ANTISERI, 1997, p. 162). Paradigma quer dizer modelo, padrão e exemplos compartilhados. É muito mais que uma teoria, pois, implica uma estrutura que gera teorias. (CREMA, 1989, p. 18). Nos dizeres de Kuhn, as revoluções científicas são episódios de desenvolvimento não cumulativo, nos quais um paradigma mais antigo é total e parcialmente substituído por um novo, incompatível com o anterior. (KUHN, 1978, p. 125). Nessa perspectiva, a passagem de um paradigma a outro é justamente a revolução científica. No entanto, após uma revolução científica, muitas manipulações e medições antigas tornam-se irrelevantes e são substituídas por outras. A ciência pós-revolucionária invariavelmente inclui muitas das mesmas manipulações, realizadas com os mesmos instrumentos e descritas nos mesmos termos empregados por sua predecessora prérevolucionária. (KUHN, 1978, p. 126).

Kuhn diferencia ciência normal de ciência extraordinária. A ciência normal significa uma pesquisa estavelmente fundada sobre um ou mais resultados alcançados pela ciência do passado, aos quais uma comunidade científica particular, por certo período de tempo, reconhece a capacidade de constituir o fundamento de sua práxis anterior. Ela é cumulativa e o cientista normal não procura novidade. (KUHN, 1978, p. 30). A ciência extraordinária surge quando há uma crise de paradigma. O paradigma é submetido a um processo de desfocamento, os dogmas são postos em dúvida e suavizam-se as normas que governam a pesquisa normal. [...] um novo paradigma consegue emergir, e sobre ele se articulará novamente a ciência normal, que por seu turno, depois de um período de tempo talvez bastante longo, levará a novas anomalias, e assim por diante. (REALE e ANTISERI 1997, p. 163).

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Para Kuhn (1978), as transformações de paradigmas da óptica da física do século XX em relação à óptica newtoniana são revoluções científicas, e a transição sucessiva de um paradigma a outro, por meio de uma revolução, é o padrão usual de desenvolvimento da ciência amadurecida. É importante ressaltar que, embora a atividade científica tradicional propicie com sua dinâmica o caminho para sua auto mudança, não é fácil e simples a transição de um paradigma para outro. (CREMA, 1989, p. 20). Ilya Prigogine (1917-2004), prêmio Nobel de química de 1977, foi o cientista que, no fim do século XX trouxe a questão do futuro da ciência. Para ele, o homem assiste ao surgimento de uma ciência que não mais se limita a situações simplificadas, mas o coloca diante da complexidade do mundo real, uma ciência que permite que se viva a criatividade como a expressão singular de um traço fundamental comum a todos os níveis da natureza. É importante introduzir na história da ciência Ian Stewart, que é professor de Matemática no Instituto de Matemática da Universidade de Warwick na Inglaterra e co-autor de The Collapse of Chaos. Stewart afirma que a teoria da complexidade concentra-se em comportamentos simples nos sistemas complexos. Essa teoria desafia o saber convencional e aponta falhas nas teorias tradicionalmente aceitas, que não conseguem demonstrar como proceder para superar essas limitações. (STEWART apud LIVRO DO ANO, 1997). A teoria da complexidade é intrinsecamente interdisciplinar, ou seja, permite a troca de conceitos de uma área científica para a outra. Embora ela objetiva compreender fenômenos complexos, faz da simplicidade uma virtude. Houve a emergência da ciência da complexidade, que é a escola filosófica que vê o mundo como um todo indissociável e propõe uma abordagem multidisciplinar para a construção do conhecimento. Contrapõe à causalidade por abordar os fenômenos como totalidade orgânica. A ciência de hoje não pode mais dar-se o direito de negar a pertinência e o interesse de outros pontos de vista e de recusar compreender os das ciências humanas, da filosofia e da arte. (PRIGOGINE e STENGERS, 1997, p. 41). Em 1926, J. C. Smuts, de acordo com Weil, D’Ambrosio e Crema (1993), mostrava que uma força era responsável pela criação de conjuntos, desde o átomo, até o universo, passando pela célula, a pessoa e a sociedade. Ele chamou essa força de “holismo” e criou a palavra “holístico”. (SMUTS apud RUMO À NOVA TRANSDISCIPLINARIDADE, 1993).

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Considerando o princípio único do holismo, Smuts substitui o conceito de vida pelo de todo, e aponta para o aspecto individual e universal da mente, como um órgão do todo, cuja nova ordem se caracteriza pela liberdade, flexibilidade e criatividade. (CREMA, 1989, p. 61). Crema (1989) ressalta que foi Alfred Adler (1870-1936) quem redescobriu o paradigma holístico sendo influenciado por ele e concebendo que, inerente a todo corpo, há uma batalha para se tornar um todo. Arthur Koestler foi quem desenvolveu o conceito de hólon, que leva em conta a dinâmica do todo e as partes, podendo ser considerado um dos pioneiros da abordagem holística. (KOESTLER apud INTRODUÇÃO À VISÃO HOLÍSTICA, 1989, p. 62). É importante saber que o a expressão “a parte contém o todo” vem das descobertas dos físicos quânticos em termos da conexão de Einstein e do holograma. Wolf e Toben (1982) afirmam que o holograma é uma invenção que utiliza uma propriedade muito sofisticada de todas as ondas, a de possuírem amplitudes e fases. A amplitude de uma onda mede sua intensidade. A fase da onda determina seu relacionamento íntimo com todas as outras ondas. Quando ondas em fase adicionam-se corretamente, elas formam uma onda única, mais intensa. Duas ondas de igual amplitude e em fase criam uma onda cuja intensidade é quatro vezes maior que a de uma só onda. Três ondas em fase criam uma onda única de intensidade nove vezes maior que a de uma das ondas, e assim por diante. Usando ondas de luz, os cientistas puderam registrar em película fotográfica os padrões de interferência produzidos por um objeto quando ele reflete a poderosa energia de um feixe de raios laser. O registro, em chapa fotográfica, do padrão formado quando as ondas refletidas no objeto e as ondas do feixe original se combinam no espaço, denomina-se holograma. Ao se olhar através da chapa de emulsão plana, ver-se-á a imagem como se estivesse a olhar para o próprio objeto através de uma janela. O objeto real não se encontra mais presente, isso é que é surpreendente. (WOLF e TOBEN, 1982, p. 146).

Ainda mais extraordinário é o que ocorre quando se destrói o holograma, quebrando- em pedaços menores, como os de uma vidraça quebrada. Ao se olhar através de qualquer um desses pedaços, novamente a imagem inteira do objeto será vista reconstruída. É uma imagem fraca, mas que reconstitui completamente a figura do objeto. (WOL e TOBEN, 1982, p. 146). A visão holística, conforme Crema (1989), consiste em aceitar as duas verdades como partes da mesma realidade: a verdade relativa da existência do sujeito e do objeto, do conhecedor, do conhecido e do conhecimento, e a verdade absoluta da identidade entre sujeito e objeto. A psicóloga francesa Monique-Thoening, em 1980, postulou a visão holística como um paradigma que surge como resposta à crise global da consciência. Ela afirma que esta transcorre

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nas mais diversas localidades do globo. A visão holística é produto de um saber e o experenciar do novo paradigma holístico. É o surpreende encontro entre ciência e consciência. (THOENING apud INTRODUÇÃO À VISÃO HOLÍSTICA, 1989, p. 15). Dessa forma, surge uma nova racionalidade, um novo paradigma, que tem sido denominado holístico do grego holos: todo, totalidade. (CREMA, 1989, p. 15). Para Weil (1995), o paradigma holístico representa uma revolução científica e epistemológica que emerge como resposta ao fragmentário e reducionista do antigo paradigma. A visão holística tem como objetivo dissolver toda espécie de reducionismo como o científico; somático; religioso; niilista; materialista; racionalista; mecanicista, antropocêntrico etc. Crema (1989) postula que as aplicações da abordagem holística estendem-se a todas as esferas do saber, do atuar humano e da dimensão corpo-mente-espírito. Como observou Japiassu (1975), quanto mais se desenvolvem as disciplinas do conhecimento, diversificando-se, mais elas perdem o contato com a realidade humana. É preciso buscar a totalidade do saber, única que possibilitará a promoção da humanidade. Para Japiassu, (1975), o fenômeno interdisciplinar tem dupla origem, quais sejam, a interna que se caracteriza pelo remanejamento geral do sistema das ciências que acompanha seu progresso e sua organização e, a externa, que tem como característica a mobilização dos saberes convergindo em vista de ação. Crema (1989) afirma que a fase interdisciplinar, movida pela força holística, cria progressivamente o que chamamos de interdisciplinas. Piaget nos faz lembrar através de Weil (1989) que: [...] no estágio das relações interdisciplinares, podemos esperar o aparecimento de um estágio superior que seria transdisciplinar, que não se contentaria em atingir as interações ou reciprocidades entre pesquisas especializadas, mas situaria essas ligações no interior de um sistema total sem fronteiras estáveis entre as disciplinas.” (WEIL, 1989, p. 30).

Edgar Morin (1921-) postula que o desenvolvimento da ciência ocidental, desde o século XVII, não foi somente disciplinar, mas também um desenvolvimento transdiciplinar. Não se pode falar de ciências, mas também, da Ciência, e afirmar que a Ciência jamais seria a ciência se não fosse transdiciplinar. (MORIN apud RUMO À NOVA TRANSDISCIPLINARIDADE, 1989, p. 32).

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É imperioso diferenciar transdisciplinaridade e holística. A transdisciplinaridade é aquela definida na Declaração de Veneza de 1986, da Organização das Nações Unidas para a educação, a ciência e a cultura - UNESCO: a axiomática comum entre ciência, filosofia, arte e tradição. (CREMA, 1989, p. 34). Como a transdisciplinaridade inclui as tradições espirituais, esse fato leva à visão holística através da abordagem holística, desde que praticada. O termo holístico é ligado a uma força ou a um sistema energético, enquanto a transdisciplinaridade refere-se às disciplinas do conhecimento científico, de acordo com Morin. Levando-se em consideração o estudo da história da ciência, percebe-se que a ciência não é um sistema de enunciados certos ou bem estabelecidos, nem é um sistema que avance continuamente em direção a um estado de finalidade. O velho ideal científico da episteme - do conhecimento absolutamente certo, demonstrável – mostrou não passar de um “um ídolo”. A visão da ciência se trai a si mesma na ânsia de estar correta, pois não é posse do conhecimento, da verdade irrefutável, que faz o homem de ciência – o que o faz é a persistente e arrojada procura da crítica da verdade. (POPPER, 1975, p. 305).

De acordo com Bronowski (1974), a verdade é o estímulo no centro da ciência; é preciso ter o hábito da verdade, não como dogma, mas como processo. A discordância é a marca da liberdade, tal como a originalidade é a marca da independência de espírito. Ninguém pode ser um cientista, se não possuir independência de observação e de pensamento. O Houaiss (2006), dicionário da língua portuguesa, sugere vários significados para o verbo progredir, entre eles estão: fazer novas descobertas, inventar novas técnicas, evoluir, avançar. Para o verbo evoluir, o mesmo dicionário propõe: passar por processo gradual de evolução ou transformação; evolver, evolucionar. Conclui-se que os dois vocábulos se mesclam em sentido, e a história da ciência é um inexaurível campo de pesquisa que evolui e progride sob acepções diversas. O poder é conferido a quem detém o conhecimento científico: os cientistas. Esses podem dedicar-se unicamente ao desenvolvimento das teorias nas diferentes áreas de conhecimento ou a paradigmas que orientam a atividade científica, relacionada ao sistema social vigente, demonstrando que a produção científica insere-se no conjunto de interesses da sociedade.

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Observou-se que o positivismo criou o mito do cientificismo, a idéia de que esse conhecimento é perfeito, e a discussão entre os cientistas e os filósofos da ciência permanece porque não há certezas absolutas em relação à validade de nenhuma teoria científica. E como Ian Stewart

(1997) apropriadamente afirmou: a ciência deve ser ousada,

destruidora de imagens, autosuficiente, mas também, sedutora, fascinante e inovadora.

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3 HISTÓRIA DA PSICOLOGIA

A palavra psique remonta a fontes antigas há vários milênios antes de Cristo. Nessa época, ela em geral significava a força ou o espírito que animava o corpo ou veículo material. (WILBER, 2000, p. 8). O Microsoft Thesaurus conforme Wilber (2000) define psique como “eu”: alma, espírito; subjetividade; eu superior, eu espiritual, espírito. (MICROSOFT THESAURUS apud WILBER , 2000, p. 8). No século XVI, psique foi conjugada a logos, que significa palavra ou estudo, para formar psicologia: o estudo da alma ou do espírito, conforme aparecem nos seres humanos. Não se sabe ao certo quem foi que a usou pela primeira vez. Por volta de 1730, Wolff, na Alemanha, Hartley, na Inglaterra, Bonnet, na França, todos usavam a psicologia com o significado que a New Princeton Review em 1888 a definia: a ciência da psique ou da alma. (WILBER, 2000, p. 8). Nos termos de Foucault (1999), o campo epistemológico que percorre as ciências humanas não foi prescrito previamente, e nenhuma ciência empírica jamais encontrou nos séculos XVII e XVIII alguma coisa como o homem; pois o homem não existia. Conforme Japiassu (1976), as ciências humanas ingressaram na “era da positividade” a partir de Dilthey que as chamou de “ciências do espírito” . Japiassu (1976) cita que para Dilthey, a partir do momento em que as ciências humanas existem como ciências, é inútil discutir sobre seu caráter de cientificidade em nome de uma teoria preconcebida da ciência. Sabe-se que, até o século XIX, o destino das ciências humanas estava vinculado ao destino da filosofia. Inicialmente, as ciências humanas estavam marcadas por uma mentalidade naturalista. O homem era visto como ser vivo regido por leis biológicas. Era visto como ser que fala e que institui uma civilização: a cultura. Em seguida, a antropologia tendeu a considerar o homem, ao mesmo tempo, do ponto de vista da natureza que o precede, que o cerca, que o subentende e, do ponto de vista da ruptura que ele introduz, ultrapassando-a.

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Isso contribuiu para que a filosofia passasse do estudo da consciência humana ao estudo do intercâmbio entre a consciência e o mundo. Devido à predominância do positivismo, o homem foi o objeto anexado pelas ciências experimentais: o homem das ciências biológicas, sociológicas, psicológicas e históricas. E ele não foi capaz de compor todas as fisionomias de homem esboçadas por cada uma das disciplinas. De acordo com Bernard (1974), a psicologia, como ciência, foi rejeitada pelos moldes positivistas de Comte, e o veto deste pesou sobre a história da psicologia desde a metade do século XIX até hoje, disseminando dúvidas sobre sua legitimidade de figurar como ciência ao lado das matemáticas e das ciências da natureza. Para Comte, a psicologia, considerada como metafísica, deve ser eliminada do pensamento humano e a psicologia empírica, recambiada para o seio da psicologia animal. (JAPIASSU, 1976, p. 78). Comte recusava a observação interna ou introspecção, pois, para ele, a pretensa contemplação direta do espírito pela própria pessoa não passa de pura ilusão. A ciência da alma era para ele pura metafísica. Focault (2002) afirma que foram necessárias novas normas impostas pela sociedade industrial aos indivíduos para que, lentamente, no decurso do século XIX, a psicologia se constituísse como ciência. A Revolução Industrial trouxe ameaças que pesaram sobre o equilíbrio social, atingindo a burguesia. Esse fato forçou o aparecimento de uma reflexão do tipo sociológica. Dessa forma, era necessário que o conhecimento do homem despontasse com seu escopo científico. De acordo com Foucault (1999), a necessidade de interrogar o ser homem como fundamento de todas as positividades não podia deixar de produzir um desequilíbrio: o homem tornava-se aquilo que autoriza o questionamento de todo conhecimento do homem. Permanece então o eterno debate entre as ciências que têm a pretensão de fundar as ciências humanas, e estas que, sem cessar, são obrigadas a buscar seu próprio fundamento, a justificação de seu método e a purificação de sua história. Foucault (1999) afirma que, a partir do século XIX, o campo epistemológico se fragmenta ou, antes, explode em direções diferentes.

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Dificilmente se escapa ao prestígio das classificações e das hierarquias lineares à maneira de Comte; mas buscar alinhar todos os saberes modernos a partir das matemáticas é submeter ao ponto de vista único da objetividade do conhecimento a questão da positividade dos saberes, de seu modo de ser, de seu enraizamento nessas condições de possibilidade que lhes dá, na história, a um tempo, seu objeto e sua forma. (FOUCAULT, 1999, p. 477).

Dessa forma, a psicologia científica, para Foucault (1999), nasce e se desenvolve por ocasião das transformações científicas, técnicas, econômicas e políticas da sociedade industrial. Para Japiassu (1976), a psicologia é uma das mais influentes ciências humanas, apresentando-se em diversas escolas. Segundo Schultz e Schultz (1981), no curso da história da psicologia, desenvolveram-se diferentes escolas de pensamento e, cada uma delas desempenhou um papel vital no desenvolvimento da ciência psicológica. O termo escola de pensamento refere-se a um grupo de psicólogos que se associam ideologicamente e, algumas vezes, geograficamente com o líder de um movimento. Geralmente, os membros de uma escola de pensamento compartilham da mesma orientação sistemática e teórica e investigam problemas semelhantes. O surgimento de várias escolas de pensamento, seu posterior declínio e a conseqüente substituição por outras são características marcantes da psicologia. (SCHULTZ e SCHULTZ, 1981, p. 30).

Foi relatado no primeiro capítulo desta monografia, que o historiador americano da física, Thomas Kuhn, salientou que uma das características-chave de sua teoria sobre as revoluções científicas é a ênfase dada ao caráter revolucionário do progresso científico, em que uma revolução implica o abandono de uma estrutura teórica e sua substituição por outra, incompatível. Schultz e Schultz citam Kuhn (1981), dizendo que o estágio do desenvolvimento de uma ciência em que ela ainda se encontra dividida em escolas de pensamento tem sido denominado estágio pré-paradigmático. O estado mais maduro e mais avançado do desenvolvimento de uma ciência é alcançado quando ela já não se caracteriza por escolas de pensamento, isto é, quando a maioria dos membros dessa disciplina chega a um consenso acerca de questões teóricas e metodológicas. Nesse estágio, um paradigma comum define todo o campo, e deixam de haver facções concorrentes. (Kuhn apud SCHULTZ E SCHULTZ, 1981, p. 30)

A psicologia ainda não atingiu o estágio paradigmático, de acordo com Schultz e Schultz (1981), pois, durante os mais de cem anos de sua história, ela tem buscado, acolhido e rejeitado

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diferentes definições, mas nenhum sistema ou ponto de vista individual conseguiu unificar as várias posições. Bernard (1974) cita Canguilhem: a psicologia científica do século XIX originou-se de uma ruptura deliberada com uma filosofia espiritualista, sob a pressão e com o auxílio de uma teoria positivista da ciência. (CANGUILHEM apud Bernard, 1974, p. 20). Para demonstrar tal fato, faz-se necessário saber que a primeira obra de psicologia experimental surgiu em 1860: Elemento de Psicofísica2 de Gustav Theodor Fechner, médico e físico alemão, que consagrou a psicologia como ciência experimental e ciência no sentido estrito, embora isso somente se oficializasse a partir do momento em que ela tornara-se institucional. (BERNARD, 1974, p. 17). Embora origine-se de preocupações filosóficas, esta obra rompia com a tradição da psicologia filosófica, empregando, para o estudo dos fenômenos psíquicos, o mesmo método das ciências da natureza e da vida. Todavia, a consagração da psicologia como ciência foi somente no momento em que ela se institucionalizou pelo lançamento, em 1862, por Wilhelm Wundt (1832/1920), de um ensino cursivo de “A Psicologia do Ponto de Vista das Ciências Naturais”, concretizado pelo lançamento, em 1873, do primeiro tratado de psicologia científica: Elementos de Psicologia Fisiológica

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e pela fundação do primeiro Instituto e Laboratório de psicologia em Leipzig,

Alemanha, em 1879. (BERNARD, 1974). Japiassu (1976) ressalta que coube a Wundt desempenhar um papel decisivo para a constituição da psicologia experimental. Ele foi o primeiro psicólogo na história da psicologia. Em seu ensino cursivo, Wundt também usou pela primeira vez o termo “Psicologia Experimental”.

Ao lado de “Elementos da Psicofísica” (1860), de Fechner, o livro é com

freqüência o marco do nascimento literário da nova ciência. A psicologia de Wundt recorreu aos métodos experimentais das ciências naturais, particularmente às técnicas usadas pelos fisiologistas, e a escola de pensamento a que Wundt se situou foi o estruturalismo. O estruturalismo foi a primeira posição sistemática ou escola de pensamento da psicologia, que consiste na análise da consciência em partes separadas com o objetivo de se descobrir a estrutura da consciência. 2 3

Elemente der Psycohophsik Grundzüge der Physiologischen Psychologie

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Conforme Capra (1982), Wundt permaneceu durante quatro décadas a figura mais importante da psicologia científica. O objeto de estudo da psicologia de Wundt era a consciência, cuja concepção inclui muitas partes ou características distintas e pode ser estudada pelo método da análise ou redução. Como a psicologia de Wundt é a ciência da experiência consciente, o método psicológico deve envolver a observação dessa experiência através da introspecção, denominada por ele como percepção interior. O uso da introspecção não foi um método inventado por Wundt, ele remonta a Sócrates. A inovação de Wundt foi a aplicação do controle experimental preciso às condições da introspecção. O emprego da introspecção na psicologia veio da física, onde o método tinha sido utilizado para estudar a luz e o som, e da fisiologia, em que fora aplicado ao estudo dos órgãos dos sentidos. Os estruturalistas estudaram a mente através da introspecção e tentaram analisar a consciência em seus elementos básicos, contribuindo bastante com a psicologia moderna. Vale saber que na atualidade ainda vigora o relato verbal da experiência, a partir da introspecção, como modelo utilizado nas psicoterapias. Outra escola de pensamento da psicologia foi o funcionalismo. A psicologia funcional interessa-se pelo funcionamento da mente ou como ela é usada na adaptação do organismo em seu meio ambiente. Os funcionalistas não se opuseram à introspecção, nem contestaram o estudo experimental da consciência, mas se opuseram à definição de psicologia dos estruturalistas, que excluía qualquer consideração das funções úteis e práticas da mente, as atividades ou operações em curso da consciência. Vale saber que de acordo com Schultz e Schultz (1981), o funcionalismo teve William James (1842-1910) como seu expoente. Ele privilegiava os aspectos funcionais da consciência, buscando compreender o que fazem os homens e o por que o fazem. Para Saldanha (1997), James definiu a psicologia como sendo a descrição e explanação sobre estados de consciência. O mundo usual da consciência de vigília era apenas um dos estados do mundo da consciência. Sob certas condições, esses diferentes estados poderiam unir-se e dali emergirem energias mais elevadas.

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Ele afirmava que a mente possui um manancial de possibilidades inimagináveis e repletos de potencialidades. Estabeleceu, assim, critérios para a constatação das diferentes manifestações da consciência, como experiências místicas e manifestações paranormais. Esse critérios são: a inefabilidade: as palavras são limitadas para descrever a dimensão da experiência; o caráter noético: há uma convicção inabalável do sentido de realidade para o sujeito que teve a experiência; ausência do medo da morte e a mudança posterior de valores para valores mais éticos, voltadas para a evolução de todos os seres. (SALDANHA, 1997, p. 22). James considerou que a psicologia teria como objetivo o estudo da adaptação do homem ao ambiente e enfatizava o pragmatismo. É importante ressaltar que no decorrer do século XIX, muitos psicólogos pensavam como Comte, retendo dele o anátema lançado contra as psicologias metafísicas, travestidas, graças à introspecção, em psicologias pseudo-empíricas. Nesta perspectiva, desenvolveram-se a partir de 1850, os estudos de psicologia experimental. As pesquisas de Weber, Fechner e Helmholtz culminam com Wundt na constituição da psicologia experimental como disciplina realmente independente. A partir de 1860, a psicologia organiza sua aparelhagem e durante alguns decênios não pára de progredir nos moldes positivistas até a época do behaviorismo, embora os psicólogos não compreendessem a significação do “veto positivista”, interditando a constituição de uma psicologia fundada sobre a observação interna. (JAPIASSU, 1976, p. 80) Ribot e Binet foram os autores que caracterizam o período da psicologia pós-comtiana e anterior ao surgimento do behaviorismo propriamente dito. Quanto ao método a ser empregado pela psicologia, Ribot diz que ele consiste na reflexão e na observação interior. Contrariando Comte e fisiologistas da época, Ribot acredita que, em psicologia, nada pode substituir o testemunho da consciência. Embora a reflexão por si só seja incapaz de nos fazer penetrar no espírito do outro, mostrando a necessidade de se fazer um apelo à observação exterior. Por isso, o método da psicologia deverá ser ao mesmo tempo subjetivo e objetivo, sendo aspectos complementares de um mesmo método. (JAPIASSU,1976, p. 83).

Ribot concebe o método de observação do comportamento exterior, interpretado à luz da observação interna e introspectiva do fato mental, que fornece ao psicólogo o princípio e os meios de sua interpretação. Mas, ainda o problema epistemológico da psicologia continua e, Binet tenta resolvê-lo através da mediação da linguagem e de seu papel em psicologia.

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Foi somente depois de Binet que o método psicológico conseguiu ascender a um certo estatuto científico quando este não limita seu estudo ao problema da introspecção, interessandose pela questão da mediação expressiva do próprio fato mental pela questão da linguagem. Com a prática dos relatórios comparados de introspecções individuais ou das respostas aos questionários sistematicamente organizados, Binet tabula o conjunto das tarefas inteligentes que o sujeito executa com maior êxito. O sistema de testes Binet-Simon destinado à avaliação do grau da inteligência e da idade mental dos escolares, continua a ser praticado até hoje. Conforme Capra (1982), é importante recordar que, do mesmo modo que a biologia e a medicina, a psicologia foi moldada pelo paradigma cartesiano. Enquanto organismo material, o corpo é reduzido a uma máquina que não exige explicação do funcionamento biológico e vegetativo do corpo, senão aquilo que serve para fornecer uma explicação do comportamento físico-mecânico do universo. (JAPIASSU, 1976, p. 24). Os psicólogos adotaram, como Descartes, a divisão estrita entre a res cogitan e a res extensa, substância pensante e substância material, o que lhes dificultou extremamente entender como a mente e o corpo interagem mutuamente. Essa divisão fez com que o corpo humano, perecível, fosse estudado por um método diferente, ou seja, pelas ciências naturais. E a alma ou mente, indestrutível, deveria ser estudada por introspecção, ou seja, o exame do próprio estado mental. Os behavioristas concentraram-se exclusivamente no estudo do comportamento, e assim foram levados a ignorar ou negar a existência pura e simples da mente. Para ser ciência, a psicologia behaviorista teve que aceitar pelo menos o princípio do veto positivista à introspecção, a fim de que, em seguida, poder definir um campo de aplicação legítimo para os métodos científicos comprovados. Surge então uma escola psicológica, denominada 1ª força em psicologia por Abraham H. Maslow, o behaviorismo, que se propôs, como objetivo essencial, proscrever toda e qualquer referência à consciência, para ater-se única e exclusivamente ao comportamento exterior observável. Para adquirir o estatuto científico, a psicologia, como qualquer outra ciência, visa exclusivamente fazer uma análise sobre os fatos observáveis.

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Piaget afirma, conforme Japiassu (1976), que foi no confronto entre o introspeccionismo e o behaviorismo que a psicologia científica marca sua linha divisória. (PIAGET apud JAPIASSU, 1976). De acordo com Japiassu (1976), o behaviorismo visa à proscrição absoluta e radical de todo uso da observação interna e de todo apelo direto ou indireto ao conhecimento fornecido por ela. Para o behaviorismo, a observação interna não existe e, essa primeira força em psicologia condena todas as psicologias pseudocientíficas, ou seja, as de Wundt, Ribot e Binet. O behaviorismo surgiu nos Estados Unidos da América, no século XX, com John Broadus Watson (1878-1958), psicólogo norte-americano, que acreditava que analisando determinados comportamentos dos animais seria possível compreender determinados comportamentos humanos. (SCHULTZ E SCHULTZ, 1981, p. 233). Watson utilizou métodos de investigação em seu laboratório como a observação, com e sem o uso de instrumentos; os métodos de teste; o método do relato verbal e o método do reflexo condicionado. Ivan Petrovitch Pavlov (1849-1936), fisiologista russo, famoso por suas descobertas acerca dos reflexos condicionados e Burrhus Frederic Skinner (1904-1990), psicólogo norteamericano foram os que contribuíram para o desenvolvimento e pesquisa dessa teoria. (SCHULTZ e SCHULTZ, 1981, p. 222). Conforme Figueiredo e Santi (2003), outra escola psicológica surgiu no início do século XX com o nome de psicologia da gestalt, cujo método consiste na descrição dos fenômenos da percepção e memória tais como aparecem na consciência antes de serem analisados. De acordo com Shultz e Shultz (1981), os gestaltistas acreditavam que a psicologia deveria abordar a consciência a partir da perspectiva da totalidade. Seus fundadores foram M. Wetheimer (1880-1967), Koffka (1886-1941) e W. Köhler (1887-1967). O conceito de “gestalt” permite unificar todas as ciências físicas, biológicas e da cultura, de forma que a psicologia não precisa repartir-se entre elas para existir. De acordo com Saldanha (1997), a rapidez com que se seguiram os avanços na psicologia fez emergir, através de Sigmund Freud, a segunda grande força no campo dos estudos mentais, a psicanálise.

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Segundo Schultz e Schultz (1981), num curso de tempo mais ou menos paralelo, embora sem analogia quanto ao objeto de estudo, aos métodos ou aos objetivos, a psicanálise decorreu da reflexão filosófica sobre a natureza do inconsciente e das tentativas da psiquiatria no sentido de tratar dos doentes mentais. É importante saber que a psicanálise perpassa por entre as escolas de pensamento estruturalista e funcionalista, ou seja, não havia vínculos de discordância ou concordância entre Freud e essas escolas. Freud cria o conceito de inconsciente para dizer daquilo que é fundamental na subjetividade humana e que não pode ser observado pelos métodos da ciência positivista. Schultz e Schultz (1981) escrevem que, para se viabilizar a psicanálise como ciência nos moldes positivistas, vários conceitos de Freud foram submetidos a testes experimentais que obtiveram resultados questionáveis. Isso ocorreu entre as décadas de 1930 e 1940 e, anos mais tarde, foi realizada uma pesquisa de maior valor, comprovando que nem tudo pesquisado confirma a teoria psicanalítica como ciência positivista. Figueiredo e Santi (2003) confirmam que Freud define o inconsciente como o objeto da psicanálise, o que seria um contra-senso do ponto de vista positivista: o inconsciente por definição não é um fenômeno positivo no sentido de que “dado diretamente à observação”. De acordo com Saldanha (1997), Freud teve inúmeros seguidores, sendo que seus conceitos são amplamente aceitos e dão suporte às outras escolas da psicologia que se desenvolveram a partir da psicanálise. Mas também, ressalta-se que Freud teve dissidentes que procuraram evidenciar outros aspectos da psique. Entre eles, Carl Gustav Jung (1875-1961), que afirmou que além do inconsciente pessoal, havia também o inconsciente coletivo atuando e influenciando na manifestação da personalidade do indivíduo. Jung foi quem resgatou o sentimento do sagrado de um ponto de vista científico, ao formular o conceito de arquétipo central ou self, responsável na mente pela representação da totalidade, tanto através da imagem de Deus, quanto da imagem do Universo da física teórica. (BYINGTON apud COLEÇÃO MEMÓRIA DA PSICANÁLISE, [s/d - ?], p. 8). O conceito de arquétipo de Jung propiciou a abertura dos estudos das culturas antigas da Índia, da China, do Tibete e do Japão para a psicologia do Ocidente. (BYINGTON apud COLEÇÃO MEMÓRIA DA PSICANÁLISE, [s/d - ?], p. 13).

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Sua descoberta reuniu a emoção e a razão na busca da totalidade, característica do fenômeno humano em todas as expressões da cultura. É importante ressaltar que o humanismo junguiano transcende permanentemente a unilateralidade para vivenciar a dualidade na unidade. Jung foi quem levou em conta as questões sociais da “era traumática englobada na modernidade industrial” que trouxeram novas doenças da alma. O indivíduo moderno vivia um fragmento de si mesmo aderido à cultura coletiva, tornando-se frágil e incapaz de pensar por si próprio. (MARONI apud COLEÇÃO MEMÓRIA DA PSICANÁLISE, [s/d- ?], p. 30). Jacob Levy Moreno (1889-1974) foi outro autor a contestar Freud, Saldanha (1997) relata, ao afirmar que Freud cometeu um grande erro ao misturar a idéia da divindade com a imagem do pai na família humana, num referencial antropomórfico de Deus. (MORENO apud SALDANHA, 1997, p. 27). Moreno foi o criador da psicoterapia de grupo, do psicodrama, sociodrama, sociatria, e sociometria usadas nas dinâmicas de grupos. Esse autor veio integrar a filosofia humanista com a arte de corporificar as emoções, onde focalizava o homem como um ser biopsicossocial e cósmico. Ele era contrário às religiões instituídas, mas dizia haver uma natureza religiosa no homem e, desconsiderar a religiosidade natural do ser é tirar-lhe a esperança e a possibilidade de cura. (SALDANHA, 1997, p. 27). De acordo com Maslow [s/d - ?], as duas teorias da natureza que mais influenciaram a psicologia até meados do século XX foram a freudiana e a experimental-positivista-behaviorista. Todas as outras teorias são menos abrangentes e os seus adeptos formaram numerosos grupos dissidentes e minoritários. De acordo com Saldanha (1997), entre os anos 50 e 70, a ciência cognitiva evoluiu e colocou à margem os fatores afetivos e emocionais. Contudo, os humanistas reagiram à essa visão ao considerar a emoção inerente e fundamental no ser humano. Eles se juntaram rapidamente numa terceira, cada vez mais abrangente, teoria da natureza humana, conhecida como “Terceira Força”. Dessa forma, a 3ª Força da Psicologia, Psicologia Humanista, surge de um movimento de várias teorias e autores, como e Carl Rogers (1902-1987) e Abraham Maslow (1908-1970), psicólogos norte-americanos, sendo o primeiro considerado seu representante.

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Maslow e Anthony Sutich (1907-1976) foram os fundadores da Associação de Psicologia Humanista, escola denominada por 3ª Força da Psicologia. (GROF, 1987). Abraham H. Maslow defendia a psicanálise como o melhor sistema de compreensão psicopatológica disponível na época, mas via o sistema psicanalítico bastante limitado para o entendimento total do comportamento e pensamento humanos. (SALDANHA, 1997, p. 29). Maslow declarava, conforme Saldanha (1997), que sem o transcendente o homem adoeceria, violento e niilista, vazio de esperança. (MASLOW apud SALDANHA, p. 29). Carl Rogers, de acordo com Schwartzman (1986), estabelece a marca diferenciadora de sua teoria em oposição à psicanálise. Para a Psicologia Humanista, o foco é o cliente, o objetivo é o estudo do fenômeno psíquico e, o método clínico, a não-diretividade do terapeuta. (SCHWARTZMAN apud JORNAL BRASILEIRO DE PSIQUIATRIA, 1986, vol. 35 nº 3). De acordo com Schwartzman (1986), os conceitos da teoria rogeriana são o de organismo e self. O primeiro representando o conjunto das tendências espontâneas de cada um em direção ao melhor desenvolvimento de suas potencialidades e, o segundo, a compreensão que cada indivíduo tem de si próprio. (Schwartzman apud Jornal Brasileiro de Psiquiatria, 1986, vol. 35, nº 3). O sofrimento emocional, para Rogers, é entendido como decorrente das discrepâncias entre organismo e self. Focalizando as divergências, de acordo com Figueiredo e Santi (2003), em Freud, não há lugar para se pensar num self, num “eu” verdadeiro ou numa natureza íntima. Em elaboração posterior, os primeiros princípios normativos da práxis terapêutica de Rogers sofisticam-se, colocando-se em primeiro plano não mais a questão da diretividade do cliente, mas a centralidade da pessoa do cliente no processo terapêutico. Ele formula seus primeiros postulados em nível da teoria da técnica, em oposição àquilo que seria diretivo na interpretação psicanalítica. Sua abordagem denomina-se terapia centrada no cliente. “Num terceiro momento, faz-se a inserção, no trabalho já então amplamente difundido, dessa teoria da prática clínica, de princípios filosóficos advindos da filosofia existencial e a denominação de psicoterapia existencial passa a predominar” (JORNAL BRASILEIRO DE PSIQUIATRIA, 1986).

Vale ressaltar que Maslow e Anthony Sutich, mesmo tendo sido bem recebidos nos meios intelectuais da psicologia humanista, sentiam a falta do aspecto espiritual entre organismo e self. É importante saber que conforme Capra (1982), em nível existencial, o dualismo entre corpo e mente foi superado, mas dois outros dualismos subsistem: o dualismo sujeito versus

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objeto, ou self

versus “o outro”, e o de vida versus morte. As questões e os problemas

decorrentes desses dualismos são uma importante preocupação das psicologias existenciais . De acordo com Wilber (1977), com o despertar do conhecimento simbólico, parece ter surgido uma cisão no universo entre o conhecedor e o conhecido, o pensador e o pensamento, o sujeito e o objeto; e a consciência mais íntima do ser, conhecedora do mundo externo, escapa do próprio domínio e continua como o desconhecido, o não mostrado e o indominável. A resolução da questão do dualismo sujeito versus objeto requer um estado mental em que os problemas existenciais individuais sejam percebidos em seu contexto cósmico. Tal percepção surge em nível transpessoal da consciência. (CAPRA, 1982, p. 362). Ao tomarem contato com as idéias sobre os aspectos alterados da consciência e estruturas diferentes, como o estado de vigília de Stanislav Grof (1931-), Maslow e Sutich tornam-se dissidentes da escola humanista, juntam-se a este e fundam, em 1967, a Psicologia Transpessoal, chamada por eles de a 4ª Força em Psicologia. Essa nova visão científica começou sua evolução surgindo na década de 60, impulsionada pelos trabalhos de Jung, Maslow, Roberto Assagioli, Antony Sutich, Stanislav Grof, Ken Wilber, Pierre Weil entre outros. Saldanha (1997) afirma que a visão de mundo, na transpessoal, é a de um todo integrado, em harmonia, onde tudo é energia, formando uma rede de inter-relações de todos os sistemas existentes no Universo. Para Capra (1982), o nível transpessoal é o nível do inconsciente coletivo e dos fenômenos que lhe estão associados, tal como são descritos na psicologia junguiana. É uma forma de consciência em que o indivíduo se sente vinculado ao cosmo como um todo e pode, assim, ser identificado com o conceito tradicional de espírito humano. De acordo com Weil (2003), historicamente, diferentes definições vêm sendo dadas à Psicologia Transpessoal. A expressão transpessoal significa “além da pessoa” e, pode-se dizer, genericamente, que ela estuda os estados de consciência, lidando mais especialmente com a “experiência cósmica” ou os estados ditos “superiores” ou “ampliados de consciência”. Segundo Saldanha (1997), essa nova ciência tem um caráter transdisciplinar encontrando ligações com a física quântica e relativista; nas observações de Max Planch, Albert Einstein, Fritjof Capra e David Bohm, com a teoria dos sistemas de informação; com os estudos das

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estruturas dissipativas de Ilya Prigogine, com os campos morfogenéticos do biólogo Rupert Sheldrake e com os estudos em neonatologia, embriologia, genética e psiconeuorimunologia. Sabe-se que no seio da sociedade ocidental, há uma associação direta entre o materialismo e a ciência, e tudo que concerne ao Espírito é atribuído como sendo uma esfera de abordagem da religião. É preciso fazer uma diferenciação entre o espiritual e o religioso, porque a incompatibilidade que se julgou existir entre essas duas ordens de idéias provém de uma observação defeituosa de que a ciência fez uso para fugir da superstição e do poder religioso. De acordo com Rank ((1961), no século XIX, os cientistas quiseram fazer a vida interior do homem uma área sem mistério e sujeita às leis da causalidade. Foram abandonando gradativamente a palavra “alma” e começando a falar do “eu”, a estudar como esse eu se desenvolve no relacionamento inicial da criança com a mãe. (RANK apud BECKER, 218). A Quarta força da Psicologia surge no sentido de apresentar o paradigma holísticotranspessoal, que vai ao encontro do vazio existencial no qual a civilização ocidental encontra-se atualmente, que nasce do distanciamento da própria espiritualidade que foi lançada pelo paradigma materialista. De acordo com Japiassu (1976), toda psicologia que não leve em conta o homem como presença no mundo, como subjetividade, como um existente cujo sentido precisa ser manifestado, só pode ignorar o homem. Conclui-se que haverá tantas psicologias quantas as perspectivas sobre o homem. Como a psicologia está sempre sendo tentada a ir além da experiência imediata, conforme Figueiredo e Santi afirmam (2003), a atualidade pode assistir ao nascimento da Psicologia Integral, criada por Ken Earl Wilber Jr. (31/01/1949), nascido em Oklahoma (EUA). Nesse sentido, conforme Capra (1982), Wilber elabora uma proposta que unifica numerosas abordagens, ocidentais e orientais, num espectro de modelos e teorias psicológicas que reflete o espectro da consciência humana. Para ele, os níveis associados a correspondentes níveis de psicoterapia são: o nível do ego, o biossocial, o existencial e o transpessoal. O nível transpessoal está localizado na extremidade do espectro da consciência onde as faixas transpessoais fundem-se no nível do Espírito. É o nível da consciência cósmica, em que a pessoa se identifica com o universo inteiro.

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Embora as tradições místicas e espirituais estejam cônscias dos outros níveis e os tenham mapeado em grandes detalhes, elas sempre enfatizaram que as identidades associadas a todos os níveis de consciência são ilusórias, exceto quando se trata do nível final do Espírito, onde a pessoa encontra sua identidade suprema. Wilber (1977) assevera que nas faixas transpessoais encontram-se as ocorrências percepção extra-sensorial da clarividência e da clauriaudiência. Nelas pode-se reviver “vidas passadas” ou a mente projetar-se em ocorrências futuras. Acontece que o estudo dessas faixas apavora a maioria das pessoas; a psiquiatria as considera como sinais de uma psique conturbada. É interessante saber que, mesmo sendo considerado um fundador da escola da Psicologia Transpessoal, Wilber se dissociou dela. Em 1998, ele fundou o Integral Institute, organização que reúne os inúmeros pensamentos nas questões sobre a ciência e a sociedade de maneira integral. O jornal alemão Die Welt em 4 de janeiro de 1997, declarou Wilber como "o maior pensador no campo da evolução da consciência". Segundo muitos formadores de opinião em filosofia, psicologia e espiritualidade, Wilber seria o maior filósofo da atualidade, ainda não compreendido em seu tempo, uma vez que desenvolve estruturas e idéias que, quando reconhecidas e aplicadas, tendem a ampliar a futura visão de mundo, ciência e religião em um novo paradigma "integral". (http://pt.wikipedia.org/wiki/Ken_Wilber). De acordo com Schultz e Schultz (1981), a história da psicologia desvela que, quando um movimento se formaliza numa escola, ganha um impulso que só pode ser sustado seu próprio êxito em derrubar a posição estabelecida. Tal fato pôde ser mostrado neste capítulo. Esse é o progresso constante de qualquer ciência, ou seja, uma busca de níveis cada vez mais altos de desenvolvimento em contínuo crescimento. Sendo assim, como Saldanha (2008) assevera, foi necessário um tempo de amadurecimento da própria psicologia a fim de que a Psicologia Transpessoal pudesse manifestar-se, trazendo uma dimensão espiritual como parte inerente ao ser humano. (http://www.alubrat.org. br/artigo_transpessoal.pdf).

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4 A PSICOLOGIA TRANSPESSOAL

Neste início do século XXI, presenciam-se exatamente as inquietações de Abraham Maslow, que teve papel central no surgimento da Psicologia Transpessoal, as quais, no final dos anos quarenta, giravam em torno da questão de como seria o mundo no ano 2000. Garcia e Saldanha (2008) referem-se às previsões assertivas de Maslow sobre uma sociedade altamente tecnológica, industrializada, modernizada e com capacidade bélica de destruição em massa. Maslow afirmava que a destrutividade é uma reação violenta do homem contra a frustração de suas necessidades, emoções e capacidades. Passaram-se quase setenta anos e Leloup (2008), PhD em Psicologia, filósofo e dominicano afirma que não há oposição entre o que é interior e o que é exterior, porque o exterior mostra o interior do indivíduo. Ouve-se o ruído das torres desmoronando, mas não se escuta a consciência que desperta. (LELOUP apud www.alubrat.org.br/artigos.php). Maslow [s/d -?], referiu-se em sua obra Introdução à Psicologia do Ser que estava surgindo uma Psicologia da Saúde que proporcionaria mais possibilidades para controlar e aperfeiçoar a vida e fazer do ser humano uma pessoa melhor. Os pressupostos desta nova psicologia estão baseados no fato de que cada um de nós tem uma natureza interna essencial, biologicamente alicerçada, a qual é, em certa medida, “natural”, intrínseca, dada e, num certo sentido limitado, invariável, ou pelo menos invariante. Essa natureza interna não é forte, preponderante e inconfundível, como os instintos dos animais. É frágil, delicada, sutil e facilmente vencida pelo hábito, pela pressão cultural e pelas atitudes errôneas em relação a ela. [...] Ainda que negada, persiste subjacente e para sempre, pressionando no sentido da individuação. (MASLOW, [s/d, - ?], p. 27). Cabe mencionar que a espiritualidade no sentido transpessoal significa a busca da essência interior, porque de acordo com Maslow (s/d), se esse núcleo essencial da pessoa for negado ou suprimido, ela adoece de maneira óbvia, sutil, às vezes imediatamente ou mais tarde. Como seria de esperar, essa investigação interior constitui uma necessidade de todo ser humano. Esse é o grande papel da psicologia transpessoal, buscar a essência interior. Em virtude de seus estudos e pesquisas, Maslow acreditava que todas as barreiras da comunicação, mesmo em grande escala, tinham sido geradas por falta de comunicação dentro do

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próprio indivíduo. Quando não se propicia uma interlocução para os aspectos mais sombrios e mais elevados do inconsciente, inúmeras barreiras são criadas para o desenvolvimento saudável dentro do próprio indivíduo. (MASLOW apud SALDANHA, 2008, p. 3). Maslow retrata que o ser humano possui uma consciência intrínseca que se baseia na percepção inconsciente da própria natureza humana, do seu destino e das próprias capacidades. Essa consciência intrínseca insiste em que se deve ser fiel à natureza íntima sem renegá-la por qualquer razão. Aquele que não acredita em seu próprio talento percebe que de uma forma profunda fez mal a si próprio e se despreza por isso. No hiato entre o que o homem é e o que gostaria de ser, à primeira vista, pode parecer um problema de identidade. Há situações em que esse hiato pode ser superado como nos testes projetivos e nas várias experiências culminantes em que a pessoa se sente no auge de seus poderes, usando todas suas capacidades e de forma mais completa. Ao se referir às experiências culminantes ou transcendentes, de júbilo ou êxtase, que independem da pessoa estar ou não ligada à religião, Maslow revela que naquele momento testemunhava-se uma expansão da psicologia. Maslow se refere à teoria do instinto ou teoria as necessidades básicas e como o homem é exortado a ser fiel à sua própria natureza, a ser autêntico e a procurar as fontes da sua ação em sua natureza íntima e profunda. (MASLOW, [s/d - ?], p. 194). Ele cria o vocábulo “instintóide” para pontuar a dimensão superior que favorece a emergência de valores positivos sem os quais as pessoas se tornam fechadas a novas possibilidades. (MASLOW apud GARCIA e SALDANHA, 2008, p.3). O fato da pessoa ter passado pelas experiências culminantes faz com que ela mude de valores e se torne mais autêntica, fazendo a ponte entre o interno e o externo, implicando numa autotransformação e, por conseguinte, numa nova relação com as pessoas com quem convive diretamente e com a sociedade em geral. Ela não só se transcende de vários modos como transcende também a sua cultura, resistindo à enculturação. (MASLOW, [s/d - ?], p. 38). Maslow afirma que a normopatia, ou seja, a patologia em que o indivíduo nega a própria essência, passa a ser a norma vigente. Perde-se o sentido do “sagrado” em níveis pessoal e social. (MASLOW apud GARCIA e SALDANHA, 2008, p. 3) A dimensão superior ínsita no ser é sagrada, mas não se restringe à identidade pessoal, vai “além” e “através” dela em suas relações. É a dimensão transpessoal.

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Ao tomarem contato com as idéias sobre os aspectos alterados da consciência e estruturas diferentes, como o estado de vigília de Stanislav Grof (1931-), Maslow e Sutich tornam-se dissidentes da escola humanista, juntam-se a este e fundam, em 1967, a Psicologia Transpessoal, chamada por eles de a 4ª Força em Psicologia. A 4ª força foi lançada oficialmente em 1968 e Maslow, no prefácio da segunda edição de seu livro Introdução à Psicologia do Ser [s/d - ?], assim se expressa: Devo também dizer que considero a psicologia humanista, ou Terceira Força em psicologia, apenas transitória, uma preparação para uma Quarta Psicologia ainda “mais elevada”, transpessoal, transumana, centrada mais no cosmos do que nas necessidades e interesses humanos, indo além do humanismo, da identidade e da individuação. [...]. Necessitamos de algo “maior do que somos (MASLOW, [s/d - ?], p.12 ).

Essa nova visão científica começou sua evolução surgindo na década de 60, impulsionada pelos trabalhos de Jung, Maslow, Roberto Assagioli, Antony Sutich, Stanislav Grof, Ken Wilber, Pierre Weil entre outros. De acordo com Weil (1992), em 1969, surge a primeira revista anunciando ao mesmo tempo o início da revolução transpessoal e a criação da Associação de Psicologia Transpessoal dos Estados Unidos. Inúmeros fatores precederam essa revolução e constituíram sua origem, sendo um deles o progresso dos meios de comunicação que trouxe para o Ocidente o conhecimento dos grandes mestres do Oriente, cujas escolas possuem metodologias de transmissão de experiências que permaneceram intactas. De acordo com Weil (1992), historicamente, diferentes definições vêm sendo dadas à Psicologia Transpessoal. Genericamente ela trata do estudo de um estado de consciência em que se dissolve a aparente fronteira entre o “eu” e o mundo exterior, em que desaparece o que chamamos de pessoa e surge uma vivência que está além. Para Saldanha (1997), a Psicologia Transpessoal é definida como o estudo e a aplicação dos diferentes níveis de consciência em direção à unidade fundamental do Ser. Ela favorece ao indivíduo a vivência da plena luz, de onde emerge o ser integral, vivenciando um estado de mente mais lúcido, desperto.

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A expressão transpessoal significa “além da pessoa” e, pode-se dizer que ela estuda os estados de consciência, lidando mais especialmente com a “experiência cósmica” ou os estados ditos “superiores” ou “ampliados de consciência”. Segundo Saldanha (1997), essa nova ciência tem um caráter transdisciplinar encontrando ligações com a física quântica e relativista; nas observações de Planch, Einstein, Capra e Bohm, com a teoria dos sistemas de informação; com os estudos das estruturas dissipativas de Prigogine, com os campos morfogenéticos do biólogo Sheldrake. Também há ligações da Transpessoal com os estudos em neonatologia, embriologia, genética e psiconeuroimunologia. Conforme Weil (1992), a abertura transpessoal leva fatalmente a uma visão global e integrativa de todas as disciplinas do conhecimento, evidenciando o espírito holístico que domina atualmente o movimento transpessoal, no qual físicos, médicos, psicólogos, mestres de Ioga, filósofos, líderes de escolas místicas, entre outros, trocam suas experiências e aprendem uns com os outros. Saldanha (1997) afirma que a visão de mundo, na transpessoal, é a de um todo integrado, em harmonia, onde tudo é energia, formando uma rede de inter-relações de todos os sistemas existentes no Universo. Weil (1992) distingue quatro principais etapas na história da Psicologia Transpessoal: a fase mística, a fase dos precursores, a fase transpessoal e a fase holística. 1) A fase mística engloba na Índia, os textos sagrados como os dos Vedas, Bhagavad Gita, os Upanischads, os aforismos de Patanjali. Os sutras e textos tântricos hinduístas ou budistas que contêm várias descrições da iluminação e dos caminhos obtidos graças à Ioga. Na civilização judaico-cristã, a Bíblia contém inúmeras descrições de estados místicos. Cristo referiu-se ao reino dos céus, prenunciando a existência de um potencial contido no ser humano e capaz de provocar transformação interior e iluminação. Conhecimentos dos egípcios, sumerianos, helênicos, romanos, e também do Islã que tiveram seus místicos englobam-se nessa fase. A Cabala judaica e os hassidims de onde provêm o Rosa Cruz de diferentes tendências, a Teosofia de Madame Blavatsky e a Antroposofia de Rudolp Steiner incluem-se nessa fase. 2) A fase dos precursores açambarca o estudo comparativo da experiência mística feita por William James a si próprio.

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A R. M. Bucke, psiquiatra canadense, publicou em 1900 um estudo de 43 depoimentos em seu livro Cosmic Consciousness, trazendo à luz traços diferentes desse fenômeno como: a experiência da iluminação dita subjetiva, o êxtase, as revelações, o sentimento de imortalidade, a perda do medo da morte, a perda do sentimento de pecado, o caráter súbito da entrada nessa vivência e alguns dados pessoais, o caráter carismático posterior e a transfiguração. Jung foi o primeiro psiquiatra a realizar um seminário sobre os centros energéticos da Ioga, chamados de chakras. Vale saber que, de acordo com a ciência oriental do Ioga, cada chakra representa um centro de consciência, de certa forma uma especialidade consciencial dominante que, holograficamente, contém todos os demais. De acordo com essa milenar tradição, o Corpo Cósmico, como um organismo vivo universal, possui sete chakras. Do mesmo modo que o ar é soprado através dos sete orifícios de uma flauta para ecoar como melodia, o Sopro ou Espírito Santo manifesta-se através dos sete chakras. ( WEIL, D’AMBROSIO e CREMA, 1993, p. 155). A palavra Ioga significa união de Jivatma e Paramatma, ou seja, união do indivíduo com o cosmo, da parte com o todo. Ela é uma escola de psicoterapia ocidental que se utiliza do conceito dos centros energéticos para explicar o funcionamento energético do ser. Weil (1992) salienta que a Ioga, através dos chakras, demonstra os diferentes níveis em que a energia humana circula normalmente e como ela pode ser bloqueada pelo excesso de perda. Cada chakra corresponde a uma ramificação de canais de natureza energética dos quais se encontra correspondentes na acupuntura. A energia circula nesses canais transformando os programas vitais, psíquicos e mentais. Essa energia inteligente é denominada em sânscrito por kundalini shakti. Partindo desse especial modo de compreensão, os chakras representam uma intrínseca e inata equipe transdisciplinar, em nível intrapessoal e cada um corresponde a uma função psicológica precisa e o que se pode chamar de finalidade intrínseca. (WEIL, 1992, p. 39). Os três primeiros centros são aqueles propícios ao desenvolvimento do comportamento egocêntrico. São eles exacerbados pela sociedade de consumo. Correspondem às escolas de Pavlov-Sknner, Freud e Adler, baseadas em seus conceitos em termos de correspondência de energia.

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O quarto centro é o do amor e da compaixão. É nesse nível que se situa a escola “centrada na pessoa” de Carl Rogers. Erick From e Moreno situam-se com suas teorias nesse aspecto, o primeiro em sua obra Arte de Amar e, o segundo, que dizia que o despertar da espontaneidade no psicodrama leva-nos a ver “pelos olhos dos outros. O quinto centro é aquele do espaço aberto onde vibra o som da voz e de onde surge a criatividade. Jung está associado a esse centro e as escolas ligadas à criatividade. O sexto centro corresponde ao cérebro cujo lado esquerdo corresponde à razão onde se inclui as teorias de Piaget de a sistemologia de Lupasco. O lado direito corresponde à intuição e remete a Bergson. O centro no nível da glândula pineal é conhecido pela “terceira visão” pelos fisiologistas dos batráquios. O sétimo centro que se situa na parte superior da cabeça, dissolve-se a separação espaço/exterior e espaço/interior. É, portanto, o centro transpessoal propriamente dito, próprio das escolas de Maslow, Assagioli, Graf-Durcheim entre outros. (WEIL, 1995, p. 40). São eles de acordo Wel, D’Ambrósio e Crema (1993): o mooladdhara: aspecto primordial da inocência, segurança básica; swadhistan: sensualidade, criatividade, centro gerador; manipur ou nabhi: contentamento, estabilidade, poder; anahata: centro do Si Mesmo, amor, compaixão; vishuddi: inspiração, testemunho, comunicação; ajnya: perdão, auto-esquecimento, visão pura; e sahasrara: integração e realização plena, consciência não dual.

Conforme Ricci (2008), em níveis de compreensão multidimensional do cliente no atendimento psicoterápico há interações de cada nível, quais sejam: o físico, o energético, emocional, mental e espiritual. É utilizado o conhecimento dos chakras para trabalhar o nível energético, no que concerne aos assuntos associados com cada chakra. Para ele, a vivência da realidade é uma função do estado de consciência atuante no momento dado. 3) A fase transpessoal está ligada à evolução da psicologia com suas revoluções behaviorista ou comportalmental, psicanalítica e humanista. A revolução transpessoal também chamada de quarta revolução decorre diretamente do movimento humanista. 4) A fase holística evidencia o espírito holístico que domina atualmente o movimento transpessoal, no qual físicos, médicos, psicólogos, mestres de Ioga, filósofos, líderes de escolas místicas trocam suas experiências, pelo perigo que pode representar um ingresso no domínio transpessoal.

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Weil (1995) ressalta que, do ponto de vista metodológico, a abordagem da Psicologia Transpessoal é holística, porque ela pode ser: a) descritiva, limitando-se a enumerar e classificar os fatos nas diferentes categorias. Experimental: pela verificação das hipóteses elaboradas quanto às variáveis causais ou aos efeitos do estado transpessoal. b) Experencial: quando o pesquisador coloca-se em condições que lhe permitam o acesso ao estado transpessoal em si mesmo. Esse fator é indispensável para todos aqueles que realmente desejam dedicar-se à Psicologia Transpessoal, assim como de um psicanalista é exigido que tenha passado por uma análise pessoal. c) Clínica: pela observação direta, colocando-se em prática todas as variáveis da situação, tal como se apresenta aos sentidos, à razão e à criatividade do observador. Trata-se, por exemplo, do enfoque dos que observam alguém em estado transpessoal. d) Especulativa: que busca refletir nos resultados obtidos, pelos enfoques precedentes, e, em seguida, reunir os dados entre si, gerando novas hipóteses que poderão eventualmente ser verificadas a partir de outros enfoques.

É de alta relevância o fator experencial em que o psicoterapeuta precisa trabalhar sua própria sombra e encontrar a luz, trilhando o caminho de autotransformação, para receber os conteúdos do cliente com certa transcendência dos conceitos de bom ou mau. Em face de seu aspecto metodológico polivalente e caráter interdisciplinar evidente, os resultados obtidos pelo Psicologia Transpessoal passam a ter repercussão imediata em outras disciplinas. Conforme Garcia e Saldanha (2008), atualmente podemos encontrar o enfoque transpessoal em distintas áreas como: a) a Psiquiatria transpessoal, que é a área que se concentra no estudo das experiências e fenômenos transpessoais, enfocando, particularmente, seus aspectos clínicos e biomédicos; b) a Antropologia transpessoal, que é o estudo transcultural dessas experiências e da relação entre a consciência e a cultura; c) a Sociologia transpessoal, que estuda as dimensões, repercussões e expressões sociais dos fenômenos transpessoais, a ecologia transpessoal que aborda suas dimensões, repercussões e aplicações ecológicas; d) a Psicologia Transpessoal, que é o estudo e prática psicológica dessas experiências, incluindo a natureza, as variedades, causas e efeitos das experiências e do desenvolvimento transpessoal, como também as psicologias, filosofias, artes, culturas, educação, estilos de vida, reações e religiões por elas inspiradas ou voltadas à indução, expressão, aplicação ou compreensão. (GARCIA e SALDANHA, 2008, p. 5).

É importante ressaltar que a visão de espiritualidade da Psicologia Transpessoal como dimensão legítima de nossa própria humanidade favorece a transformação da pessoa, o processo de cura e aprendizagem. Ela está contida em seu corpo teórico.

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Sabe-se que no seio da sociedade ocidental, há uma associação direta entre o materialismo e a ciência, e tudo que concerne ao espírito é atribuído como sendo uma esfera de abordagem da religião. É preciso fazer uma diferenciação entre o espiritual e o religioso, porque a incompatibilidade que se julgou existir entre essas duas ordens de idéias provém de uma observação defeituosa de que a ciência fez uso para fugir da superstição e do poder religioso. Rank afirma, conforme Becker (1961) que, no século XIX, os cientistas quiseram fazer a vida interior do homem uma área sem mistério e sujeita às leis da causalidade. Foram abandonando gradativamente a palavra “alma” e começando a falar do “eu” e a estudar como esse eu se desenvolve no relacionamento inicial da criança com a mãe. (RANK apud BECKER, 218). A alma aparece pura e simplesmente como uma atualidade não-física, inexplicavelmente associada à máquina corporal, em contato com a qual ela se desenvolve de acordo com os funcionamentos materiais dessa máquina. (JAPIASSU, 1976, p. 24). A proposta de Maslow (s/d) com a nova psicologia era a da integração da natureza dupla do homem, a inferior e a superior, a sua condição de criatura e a sua essência divina. Ser humano não é corpo sem espírito, ou espírito sem corpo, é corpo e espírito integrados; é este desenvolvimento pleno e inteireza que a Psicologia Transpessoal deve favorecer. (GARCIA e SALDANHA, 2008, p. 5) Para Garcia e Saldanha (2008) , a definição de Psicologia Transpessoal implica em três aspectos básicos que são, em primeiro lugar, a existência de uma dimensão superior de consciência, e segundo, o trabalho vivencial através de diferentes estados de consciência com as polaridades do inconsciente inferior e superior e, em terceiro, a síntese entre níveis experenciais e evolutivos. Este enfoque possibilita a atuação desses três níveis de forma harmoniosa para o indivíduo e o ambiente, ensejando a plena expressão do ser. Para possibilitar que a dimensão sutil e impalpável tivesse uma visibilidade, uma porta de entrada acessível à partir do conceito teórico do que é Psicologia Transpessoal, ela exibe sua metodologia e recursos técnicos, a fim de oferecer de forma clara e coerente com sua teoria a aplicabilidade de seus postulados no enfoque clínico, educacional e nas instituições. (GARCIA e SALDANHA, 2008).

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4.1 SISTEMATIZAÇÃO INTEGRATIVA TRANSPESSOAL

De acordo com Saldanha (1997), a teoria em psicologia transpessoal compõe-se dos aspectos estruturais e dinâmicos. O primeiro, constituído por cinco elementos, que formam o corpo teórico da psicologia transpessoal: conceito de unidade, conceito de vida, conceito de ego, estados de consciência e cartografia da consciência. O segundo aspecto, que é o dinâmico, é formado pelo eixo experencial e o eixo evolutivo. Aliados os elementos dos dois aspectos às técnicas, é formada a linha de base da psicologia transpessoal. Todo processo terapêutico visa resgatar essa unidade fundamental. Cada elemento tem definição própria da teoria ao saber:

4.1.1 ASPECTOS ESTRUTURAIS OU CORPO TEÓRICO DA PSICOLOGIA TRANSPESSOAL

Conceitos de Unidade, de Ego, de Vida, de Consciência e Cartografia da Consciência:

4.1.2 CONCEITO DE UNIDADE FUNDAMENTAL DO SER OU DE NÃOFRAGMENTAÇÃO

Unidade é a propriedade do que não pode ser dividido. A unidade cósmica refere-se ao fim da dualidade, da polaridade, ou/ou. Sujeito e objeto são indissociáveis. Os sentimentos de tensão e de ansiedade gerados pelo desconhecimento da unidade cósmica levam a uma baixa da resistência imunológica, a patologias cardíacas, síndromes mentais desde a depressão a psicose.

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4.1.3 CONCEITO DE VIDA

A característica essencial deste conceito é sua dimensão atemporal. Nascer, morrer e renascer fazem parte de um processo de evolução. Todo e qualquer conteúdo trazido pelo cliente devem ser acolhidos sem preconceitos, mesmo que esses conceitos transcendam a lógica. Em seus aspectos transpessoais, a vida é eterna, ilimitada e sempre existiu, dela desconhece-se sua origem e nem sequer pode-se imaginar seu fim. Em nível psicológico, a vida é morte e renascimento. Há muitas mortes e renascimentos num mesmo dia, mas a essência permanece. O morrer nessa teoria é a transição de uma forma para tomar outra forma, acrescendo elementos de maior alcance na escala universal. Cada morte de uma etapa de vida ocorre uma mudança de valores, atitudes e crenças. Ross assevera, de acordo com Saldanha (1997), que a morte, seja física ou emocional, é vivenciada através de cinco etapas: negação, revolta, barganha, depressão e aceitação. (ROSS apud SALDANHA, 1997). De acordo com Saldanha (1997), para Frankl, um dos fundadores da transpessoal, a religião contribui para a saúde mental, ao oferecer segurança, sentimento de estar ancorado no Absoluto. Percebe-se que no processo de psicoterapia, embora o psicoterapeuta não tente influenciar na vida religiosa de seu paciente, um dos subprodutos de um bom tratamento psicoterapêutico é o restabelecimento no homem de um vínculo com a divindade. (FRANKL apud A PSICOTERAPIA TRANSPESSOAL, 1997).

4.1.4 CONCEITO DE EGO

Na abordagem transpessoal, o ego caracteriza-se como um construto mental, ilusório, que tem a tendência a solidificar a energia mental em uma barreira que separa o espaço em duas partes: eu e o outro. Sua função de operacionalizar a vida instrumenta a realidade da psique.

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O eu é uma consciência em evolução que pode manifestar-se além dos elementos circunstanciais e integra níveis evolutivos superiores. No nível do ego, a pessoa não se identifica com o organismo total, mas apenas com alguma representação mental do organismo, conhecido como auto-imagem ou ego. Pensa-se que esse self desencarnado existe dentro do corpo; assim, as pessoas dizem “Eu tenho um corpo”, em vez de “Eu sou um corpo”. Em certas circunstâncias, tal experiência, fragmentada do próprio self pode ser ainda mais distorcida pela alienação de certa facetas do ego, que podem ser reprimidas ou projetadas em outras pessoas ou no meio ambiente. A dinâmica desses fenômenos é minuciosamente descrita na psicanálise. (CAPRA, 1982, p. 361). A proposta da Psicologia Transpessoal é a de permitir que do homem velho, renasça o homem novo, sábio, que consegue vivenciar a unidade cósmica. É uma ruptura com a dualidade aparente que permite redimensionar o conceito de ego. A auto-imagem é um subprotudo do ego e acredita-se que se é a auto-imagem numa identificação alimentada pelo ego como se fosse o eu verdadeiro. De acordo com Saldanha (1997), a morte e o renascimento do ego servem como oportunidade para o homem voltar-se às experiências interiores, transcendo-o e o aproximando daquilo que realmente é. Será no setting terapêutico que ocorrerá o acesso ao espaço mental da realidade absoluta e as emoções, pensamentos reações emocionais automatizadas serão reconhecidas para possibilitar a morte do ego para que a auto-imagem desapareça. A energia gasta para mantê-la será redirecionada. Através das técnicas transpessoais, haverá a comunicação entre as partes fragmentadas da pessoa e o desapego a essas partes, à autoimagem, para que haja contato com as experiências e reações verdadeiras.

4.1.5 ESTADOS DE CONSCIÊNCIA

Estados de consciência, estado de expansão de consciência ou estado alterado de consciência são sinônimos.

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Atualmente os termos utilizados são estados modificados de consciência ou experiências humanas excepcionais, que são os passos que delineiam o processo psicoterapêutico, ampliam e favorecem a percepção dos diferentes níveis de realidade. É o caminho através do qual se dá essa psicoterapia e que a diferencia de outras abordagens. De acordo com Saldanha (1997), estado de consciência é uma alteração qualitativa no padrão comum de atividade da mente em que o experienciador constata que sua consciência está radicalmente diferente do seu funcionamento normal. Os estados de consciências enfocados pela Transpessoal são: a consciência de vigília, o sono, sonho estado de consciência cósmica ou plena consciência. Para o trabalho de orientação transpessoal, os estados de devaneio e de despertar são utilizados como instrumentos de imersão e emergência transpessoal. a) Estado de consciência de vigília: é o mais comum e é aquele estado onde a pessoa está acordada. b) Estado de consciência de devaneio: traz imagens e idéias desconexas e podem surgir idéias criativas. A atenção é difusa, há total receptividade e disponibilidade para o momento presente. Esse estado propicia a associação livre. Tais idéias precisam ser anotadas imediatamente, pois elas tendem a desaparecer. c) Estado de consciência de sonho: na abordagem transpessoal, a visão sobre sonhos é muito ampla e pode-se utilizar a vivência onírica de diversas formas tais como: encomendar sonhos, modificar sonhos, livrar-se de pesadelos, através de técnicas como a de incubação, a do sonho lúcido, reconstrução onírica, grafismo e ampliação de sonhos, também pode-se vivenciar experiências fora do corpo. d) Estado de consciência de sono profundo: as recente pesquisas nesta área sugerem que há um nível de superconsciência durante esse estado. O ego desaparece totalmente, a consciência retorna a ela mesma, à sua fonte, e o indivíduo é revitalizado. e) Estado de consciência de despertar: situa-se entre a consciência individual e a consciência cósmica. É a saída do automatismo. Equivale a despertar um observador de si mesmo. Ocorre a percepção da essência, a desindentificação de partes, emoções, mente, papéis e corpo. Relaxamento, concentração, meditação e os exercícios de orientação transpessoal são as técnicas usadas no processo terapêutico transpessoal.

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f) Estado de consciência cósmica ou plena consciência: samadhi, satori, nirvana, sétimo céu, sétimo paládio (cabala sepher hazolar), sexta morada (Tereza D´Ávila), experiência de cume (Maslow), experiência transcendental, experiência de êxtase, experiência transpessoal. O Estado de consciência cósmica é aquele da vivência da unidade, catologadas por James e Bucke como inefabilidade (palavras ilimitadas para descrição do sentimento), caráter paradoxal, desaparecimento da dimensão espaço-tempo, não projeção da mente sobre os objetos, superação da dualidade, vivência de luz radiante que impregna o espaço, experiência energética de iluminação interior, vivência da vacuidade plena e de amor indescretível, sentimento de viver a realidade como ela é, desaparecimento do medo da morte, vivência da eternidade, descoberta do verdadeiro sentido da vida, sentido do sagrado. Os sistemas destinados a mudar o estado da consciência para acessar uma Ordem Mental Superior, a fim de trabalhar conteúdos traumáticos conflitantes e facilitar-lhes as catarses abreativa e a de integração são diversos. Entre eles destacam-se o isolamento sensorial e sobrecarga sensorial; música e canto; psicodrama; hipsone e auto-hipnose; meditação zen, budista, tibetana, ioga, seminários a romper o transe cultural e a abrir o indivíduo a novas escolas; os sistemas de pensamentos inspirados em Gurdjief; a Psicoterapia Transpessoal; disciplinas como Tai-chi-chuam; I’ai-kido; visualizações. À medida que se esvazia a mente de tudo que é disfuncional, ela se abre ao nível supraconsciente. Muitos autores estabeleceram um mapeamento da consciência, definindo diferentes cartografias para possibilitar o conhecimento do território acessado em terapia.

4.1.6 CARTOGRAFIA DA CONSCIÊNCIA

Segundo Capra (1982), uma das conquistas da psicologia contemporânea é a adaptação da abordagem bootstrap para compreensão da psique. Bootstrap significa que pode não haver uma teoria capaz de explicar o espectro total de fenômenos psicológicos. Assim como são usados mapas para indicar localizações, são usados mapas para se conhecer a consciência na abordagem da Psicologia Transpessoal.

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Conforme Saldanha (1997), o mapeamento das regiões do inconsciente viabiliza uma compreensão maior da sua dinâmica. Cada estado de consciência acessa diferentes conteúdos, viabilizando um entendimento do que acontece nas diferentes dimensões mentais. A partir do mapeamento feito por Kenething Ring, pode-se observar de forma didática a cartografia

da

consciência:

consciência,

pré-consciência,

inconsciente

psicodinâmico,

inconsciente ontogenético, transindividual, filogenético, extraterreno, superconsciente e vácuo. A região do pré-consciente está intimamente ligada à consciência de vigília normal. Como exemplo, a experiência de relembrarmos subitamente o nome de uma pessoa é um contéudo do pré-consciente que passa para a região da consciência comum. A região do inconsciente psicodinâmico refere-se àquilo que é compreendido como o inconsciente freudiano. Para a Psicologia Transpessoal, essa região é fonte de memórias, impulsos e desejos importantes que levam carga emotiva. A região do inconsciente ontogenético compreendida por Otto Rank é a ligação entre os aspectos do estado intra-uterino e processo de nascimento e as experiências adultas posteriores nesta região da mente. Grof (1987) referiu-se a tais fenômenos como sendo perinatais. Essa região lança muita luz a experiências de difícil reconciliação com as descrições ocidentais da mente, mas também porque ele representa uma zona de transição da consciência, entre o pessoal e o transpessoal. Ele faz uso de psicodélicos para aclarar o funcionamento da mente e relata que as experiências que emanam dessa região do inconsciente estão relacionados a problemas ligados à dor física, à agonia, à morte, ao nascimento biológico, à idade, à doença e à decrepitude. De acordo com Grof, uma das razões pelas quais essas experiências são tão dominantes é o fato de se basearem nas condições intensamente afetivas que cercam o parto: memórias ou resíduos psíquicos do estado intra-uterino e do processo de nascimento. (GROF apud WEIL 1995, p. 61). A região do inconsciente transindividual é aquela onde se alcança o primeiro dos domínios transpessoais da consciência. Em nível transindividual, existem vários subtipos diferentes de experiências que têm como elemento comum a transcedência dos limites do ego do próprio indivíduo e a identificação com outras pessoas com tipos universais, ou seja, aquilo que Jung denominou arquétipos.

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Subtipos das experiências transindividuais: experiências ancestrais; experiências de encarnações passadas; experiências coletivas e raciais; experiências arquetípicas (repositório do desenvolvimento histórico e cultural do homem, os arquétipos ou imagens primordiais como a anima, a sombra, o velho sábio, a mãe dual etc.). A região do inconsciente filogenético leva o ser humano a experienciar o próprio desenvolvimento evolutivo e o capacita a delineá-lo até o próprio começo da vida. Há uma recapitulação de toda a seqüência evolutiva da vida: a consciência planetária, que alcançada aos poucos, engloba todos os fenômenos deste planeta, tanto os orgânicos quanto inorgânicos. O inconsciente extraterreno é a região onde ocorre uma variedade de experiências difíceis de serem coordenadas com o plano físico e com as chamadas leis naturais. Os três tipos de fenômenos que aparecem aqui são: 1- experiências de estar fora do corpo, incluindo o encontro com entidades espirituais e guias, e viagens para outros locais do Universo; 2) fenômenos de percepção extra-sensorial, como telepatia e clarividência; 3) fenômenos mediúnicos, como escrita automática e possessão por espírito. O supraconsciente é uma região mais externa do mapa onde se tem pouco a dizer, pois enquanto se encontra o próprio limite da consciência, as experiências tornam-se sempre mais inefáveis. As experiências neste domínio envolve um profundo êxtase espiritual. Esta experiência pode descrita pela forma como o indivíduo sente sua consciência fundida com a Mente Universal. Grof (1987) relata que essa experiência é alcançável unicamente sob o emprego supervisionado do LSD, mesmo assim, sendo muito rara. Ressalte-se que atualmente Grof acumula quase cinco décadas dedicadas ao estudo dos estados alterados de consciência. Embora a natureza dessa experiência seja considerada geralmente sem continuidade com a experiência humana comum que permita qualquer tradução para o modo verbal, Weil (1995), afirma que pôde conhecer relatos sobre ela. Por detrás desse tipo de experiência cósmica há o vácuo, o Universo em sua forma não manifestada. O Vácuo é definido por Grof (1987) pela experiência subjacente a toda a criação: ele está além do tempo e do espaço, além de qualquer mudança, além das polaridades, do bem e do mal, da luz e da sombra, da estabilidade e do movimento, da agonia e do êxtase. É um estado além de qualquer conteúdo.

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Para Saldanha (1997), esses conceitos cartográficos levam à uma nova visão antropológica e gnosológica na qual a vida revela-se como algo infinito e se mostra através de distintas mortes e renascimentos. A morte biológica ou psicológica em uma mesma existência são retratadas na psicologia transpessoal, resgatando um novo conceito de ego. Um ego bem estruturado, mas flexível, que se expande e sob certas circunstâncias se dissipa é forte o bastante para se permitir “morrer” em legítimas experiências do transpessoal e renascer cada vez mais saudável. Todo esse processo converge naturalmente para a vivência de unidade – o resgate da percepção de que somos partes do todo e simultaneamente o todo está em nós. A Separação só ocorre na dimensão mais concreta dos cinco sentidos. (SALDANHA, 1997, p. 8).

4.2 O ASPECTO DINÂMICO FORMADO PELOS EIXOS EXPERENCIAL E EVOLUTIVO DA PSICOLOGIA TRANSPESSOAL

De acordo com Saldanha e Garcia (2008), esse corpo teórico é representado por uma linha horizontal e outra vertical que se cruzam. O eixo experencial representa a integração da razão, emoção, intuição e sensação. O eixo evolutivo representa a expressão da dimensão superior da consciência, o supraconsciente. A intuição é uma função supra-racional. Em nível terapêutico, é necessário trazer sempre o eixo experencial para que ele favoreça a emergência dos níveis superiores da consciência. O discurso linear racional transformado em experiência se faz através da razão, descrição do fato relatado; da emoção, sentimento que acompanha; intuição, associações livres; e sensação, como o corpo sente o fato, qual o sintoma, ser o sintoma. O eixo evolutivo é denominado por Saldanha (1997) de Ordem Mental Superior. Há um manancial de recursos interiores situado na região do superconsciente, sendo o eu superior da pessoa inerente a essa região, sendo parte do indivíduo em evolução. Essa instância psíquica apreende a realidade de forma lúcida, sabe aquilo que é necessário e melhor para cada um em sua jornada no processo de cura mental e física. A psicoterapia transpessoal funciona como o centro externo unificador da personalidade que ajudará a pessoa a acessar através de recursos ou exercícios esse eu superior. (SALDANHA, 1997, p. 72).

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Conforme Saldanha (1997), o indivíduo percebe a totalidade, desenvolve sua unicidade, sua especificidade: algo que lhe compete e a mais ninguém. É a evolução de sua consciência. Isso lhe dá um profundo sentimento de comunhão com o todo. Os dois elementos experencial e evolutivo resgatam a unidade fundamental do ser, objetivo primordial da Psicologia Transpessoal.

4.3 CLASSIFICAÇÕES DAS TÉCNICAS TRANSPESSOAIS

De acordo com Saldanha (1997), as técnicas em Psicologia Transpessoal classificam-se em cinco grandes níveis de intervenções terapêuticas. As técnicas também podem ser denominadas de Terapia Integrativa Transpessoal. São elas: intervenção verbal, imaginação ativa, reorganização simbólica em nível interativo, exercícios de dinâmica interativa e regressão de memória.

4.3.1 Intervenção verbal

A intervenção verbal representa toda gama de verbalizações que facilitam estabelecer o vínculo terapêutico. O rapport, o contrato terapêutico, anamnese e a entrevista clínica fazem parte desta técnica. As entrevistas têm duração de 50 minutos, embora sessões especiais para um trabalho específico de regressão exijam duas horas seguidas de atendimento. Os pressupostos de acordo com Saldanha (1997) para as intervenções verbais genericamente são: Confiar no cliente, em sua verdade própria, sem interpretações; dar oportunidade para que ele evolua no tempo e na medida dele próprio; encaminhá-lo a especialistas, caso seu problema não se enquadre na tarefa terapêutica, ou caso seja necessária a complementação através de outros profissionais; desenvolver um escutar amplo, mais amplo que ouvir, a arte de saber captar, a escuta terapêutica. (SALDANHA, 1997, P. 105).

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4.3.2 Imaginação ativa

A técnica da imaginação ativa, termo da psicologia analítica, é uma possibilidade do inconsciente desenvolver imagens mentais, aparentemente aleatórias, mas que estão sendo criadas e contornadas pelas motivações mais profundas dos diferentes níveis do próprio indivíduo. Assagioli, conforme Saldanha (1997), foi o criador da psicossíntese, uma psicoterapia de abordagem transpessoal. Esse autor desenvolveu e aprofundou os estudos sobre os exercícios de imaginação ativa, estabelecendo correlações entre os níveis do inconsciente inferior, médio e superior com esses exercícios. (ASSAGIOLI apud SALDANHA, 1997, p. 107).

4.3.3 Reorganização simbólica

Os símbolos da experiência transpessoal são técnicas criadas por Assagioli tidas como exercícios psico-espirituais ou de meditação, obtendo-se resultados extraordinários. Para indicar as experiências da via transpessoal, Assagioli utiliza símbolos, quais sejam: introversão; aprofundamento; elevação; expansão ou ampliação da consciência; símbolos do despertar; fogo; evolução e desenvolvimento; fortalecimento e intensificação; amor; caminho, senda,

peregrinação;

transmutação,

sublimação;

renascimento-regeneração;

libertação;

ressureição e o retorno.

4.3.4 Técnica interativa No nível interativo, há um manejo terapêutico intenso dos exercícios, que articulam diferentes conteúdos do inconsciente nos vários estados de consciência. Há sete etapas para que esse

nível

aconteça:

reconhecimento,

identificação,

desidentificação,

transmutação,

transformação, elaboração e integração. Exercícios da Dinâmica Interativa: transformando imagens internas; diálogo interno.

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Nível auxiliar ou adjunto, chamado assim por ser considerado como recurso de autodesenvolvimento. As técnicas são utilizadas em exercícios anti-estresse, de autoconhecimento ou na própria arte da transcendência. Os exercícios englobam recursos milenares como meditação, concentração, contemplação e as mais recentes como relaxamentos, que favorecem um estado da mente mais sereno. A meditação é um estado de inação. De puro ser, de um saber espontâneo, totalizador, de uma presença plena. Há recursos técnicos para facilitar a entrada e a permanência nesse estado, embora nenhuma delas é a meditação em si. Todas as técnicas favorecem-na.

4.3.5 Regressão de memória O acesso à memória é um processo que se dá sob estados modificados de consciência, de forma espontânea ou induzidos. Num trabalho regressivo, transpessoal, encontram-se em todo o processo os pressupostos básicos e fundamentais, os aspectos estruturais e dinâmicos com seu corpo teórico, bem como os eixos experencial e evolutivo. (SALDANHA, 1997, p. 135). Num enfoque transpessoal, trabalha-se com a origem da rejeição, com o papel da vítima, com as reestimulações da vida atual, gestação, nascimento, infância, adolescência, enfim todos momentos marcantes onde ela possa entender o seu papel ativo em se fazer rejeitada, colaborando para que sua decisão do passado se realize no presente. (SALDANHA, 1997, p. 137).

É importante saber que, no estado modificado de consciência, o indivíduo tem uma percepção simultânea e holográfica da dinâmica complexa que ele próprio aciona, percebendo o que suas experiências têm a lhe ensinar, favorecendo a evolução de sua consciência. O trabalho de regressão de memória tem como base algumas premissas, dentre elas estão o conceito de imortalidade, pautado por várias existências. A regressão é considerada uma abordagem interativa que deverá ter os sete passos dessa modalidade para ser considerada uma psicoterapia de orientação transpessoal. A conceituação de regressão de orientação transpessoal é a de um trabalho terapêutico, realizado em estado modificado de consciência que possibilita a desidentificação e transformação de núcleos de apego ou trauma do passado, emergindo o ser integral. A

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responsabilização de criação do próprio mundo mental e de suas emoções no mundo atual é fator propulsor para transcender suas decisões do passado.

Saldanha (1997) destaca que o homem ainda não alcançou o limiar de sua evolução, e os processos de abordagem transpessoal favorecem a emergência dessa nova consciência, mais ampla, sábia, integrada, plena e desperta. Belo Horizonte, em 1978, foi palco para o Quarto Congresso Internacional de Psicologia Transpessoal. Stanislav Grof, ao presidir o comitê organizador, sugeriu retirar o termo psicologia do título do congresso, por considerar o transpessoal como interdisciplinar. Daí o nome atual da Associação Transpessoal Internacional ter sido consolidada após essa decisão, o que evidencia o espírito holístico que domina atualmente o movimento transpessoal. Atualmente, além de dois semestres dedicados à disciplina Psicologia Transpessoal, a Universidade Federal de Minas Gerais possui nove disciplinas com orientação transpessoal. Conforme Weil, D’Ambrosio e Crema (1993), ninguém pode pretender supremacia no exercício de vivência em redes ou transdisciplinaridade, que parte do reconhecimento da impossibilidade de abranger a realidade a partir de um só domínio, por mais capacitado que possa ser o seu portavoz. É preciso adquirir a ética da diversidade.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Através do estudo da história da ciência como um todo, incluindo a história das ciências humanas e da Psicologia, pôde-se constatar que existe uma única categoria de ciência: a ciência moderna. Mas, a pesquisa demonstrou como o fazer científico moderno é restringido ao método empírico e que não há método que possibilite à totalidade das teorias serem conclusivamente provadas ou não. Para Platão (427-328 a. C.), o método para atingir o conhecimento é a dialética. O processo de conhecimento representa a progressiva passagem das sombras e imagens turvas ao luminoso universo das idéias ou formas. Estas seriam incorpóreas, invisíveis, impossíveis de serem explicadas pela razão. O intelecto pode apreender as idéias, porque é incorpóreo como elas. (PLATÃO, 1996, p. 24). Segundo ele, a alma, antes de se ligar ao corpo através do nascimento, teria contemplado as idéias enquanto seguia o cortejo dos deuses. (PLATÃO, 1996, p. 24). Enquanto encarnada, perde o contato direto com os objetos sensíveis. Conhecer então seria lembrar. A hipótese da reminiscência é que sustenta o mundo das formas, o que implica na pré-existência e na imortalidade da alma que converte-se numa condição para a ciência, para a explicação inteligível do mundo físico. (PLATÃO, 1996, p. 20). O que se pôde observar pela pesquisa foi que, as experiências transpessoais podem oferecer insights sobre a natureza e importância da dimensão espiritual da consciência, sendo que estas envolvem fenômenos difíceis de serem interpretados dentro da estrutura racional e da análise científica. Isso foi exatamente o que Platão afirmou sobre o processo de conhecimento do universo das formas e idéias, que são incorpóreas e invisíveis, impossíveis de serem explicadas pela razão. Para se visualizar como se dá a dialética de Platão sobre a modalidade diversa de conhecimento, a Psicologia Transpessoal apresenta o mundo sensível onde se situa a ciência e o mundo inteligível em que o universo das idéias transforma-se em objeto de crença quando se tem condição de percepção nítida.

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Conforme Capra (1982), a ciência moderna é inadequada para compreender a natureza da consciência, sendo que ela é um aspecto central do mundo interior. Da mesma forma que muitos dos ensinamentos de Aristóteles foram elevados a dogmas e paralisaram o estudo da natureza, as idéias positivistas que combateram as concepções espiritualistas da realidade, ditas como metafísicas, igualmente se tornaram dogmáticas, promovendo um atraso do mundo ocidental em relação à ciência oriental que, milenar, está à frente no conhecimento do estudo do homem como um todo integrado. As ciências humanas supõem que é necessário desenvolver métodos especiais para o estudo de seus objetos – o conhecimento organicista e materialista do ser corporal e biológico do homem e um saber espiritualista da vida psíquica, intelectual e moral da “alma” humana –, sendo eles diferentes da natureza dos objetos de estudo das ciências naturais, como se a natureza biológica do homem estivesse apartada de sua natureza espiritual. Foram Prigogine e Stengers (JAPIASSU, 1996, p. 57) que advertiram a comunidade científica que o resultado dessa divisão é a inevitável crise emocional, econômica, política e ecológica da humanidade, quando puseram em circulação, em 1979, em sua obra La nouvelle aliance: métamorphose de la science os elementos de um novo paradigma: desordem organizadora, auto-organização, complexidade e caos. Até mesmo a teoria de Darwin sobre a evolução das espécies biológicas entrou em crise com o paradigma da complexidade, pois não consegue explicar os saltos evolutivos observados nos fósseis. (BARSA, 1997, p. 122). Como a física foi considerada como modelo de ciência, esta evoluiu de tal modo que foi se afastando da subjetividade ao se apoiar unicamente numa realidade objetiva. Atestou-se através desta pesquisa, que a Psicologia não se enquadra no modelo positivista-empírico da ciência moderna, a não ser sua primeira força, o behaviorismo. Para Comte, a psicologia, considerada como metafísica, deve ser eliminada do pensamento humano e a psicologia empírica recambiada para o seio da psicologia animal. (JAPIASSU, 1976, p. 78). Acompanhou-se uma caracterização geral da ciência de Newton a Descartes, de Bacon ao positivismo de Comte, do positivismo lógico ao falsificacionismo popperiano, dos paradigmas de Kuhn aos programas de pesquisas de Lakatos e destas à teoria anarquista do conhecimento de Feyerabend. Nota-se que há controvérsia no modo de pensar a ciência, seus métodos de trabalho

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e seus objetivos, sobretudo após o advento da física quântica, embora todos tenham buscado a Verdade. Como Chalmers (1983) afirmou, concorda-se que se deve combater a ideologia da ciência quando essa envolve o uso do conceito dúbio de ciência e o conceito igualmente dúbio de Verdade, na defesa de posições conservadoras. O cientificismo, como único meio válido de compreensão do universo, vê-se inadequado quando se trata da descrição de fenômenos atômicos, conforme a formulação matemática da teoria quântica. Dessa forma, as forças da Psicologia não deixaram de se afirmar como disciplinas científicas, mesmo não se enquadrando nos moldes da ciência moderna, ocupando respeitosamente seu espaço nos meios acadêmicos. Ressalta-se com o estudo desta pesquisa que a segunda força em Psicologia, a Psicanálise, influenciou de tal forma a Psicologia, inaugurando o paradigma do inconsciente, que mudou a visão científica de mundo no início do século XX. Contudo, Freud precavia-se das questões da metafísica, deixando-a às expensas do Ocultismo. Viu-se com este estudo que, assim como a psicanálise muda radicalmente o paradigma científico positivista, o advento da física quântica desestruturou as bases positivistas da ciência. O que a teoria quântica de Plank descreve sobre o comportamento das partículas subatômicas explica a maioria dos problemas com os quais a física não consegue lidar, ou seja, no domínio das partículas não existe observação propriamente objetiva. E como Chalmers (1983) afirmou: conforme cresce o número de dados estabelecidos pela observação e pelo experimento, e conforme os fatos se tornam mais refinados e esotéricos devido a aperfeiçoamentos em nossas capacidades de observação e experimentação, cada vez mais leis e teorias de maior generalidade e escopo são construídas [...]. Dessa forma, estamos presenciando uma transformação que está acontecendo nos meios acadêmicos que, por muitos anos, tiveram seus currículos apenas conteúdos de produção filosófica ocidental, justificando-se etnocentricamente o pensamento objetivo e mecanicista da ciência que se calcou numa base extremada de empirismo. Essa transformação deve-se à abertura à diversidade de saberes de culturas milenares orientais. Como Zimmers (2005) afirmou, tanto o sistema Vedanta quanto o Budismo, já reconheciam a presença de um passado que se atualiza e recria, formando padrões de perspectiva que interditam a percepção da realidade tal como ela é.

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Através do princípio da incerteza de Heisenberg, sabe-se agora que todo o conhecimento sobre a realidade é fruto de uma percepção limitada e definitiva da realidade. Como, para a Psicologia Transpessoal, a alma aparece pura e simplesmente como uma atualidade não física, inexplicavelmente associada à máquina corporal conforme Japiassu (1976), ou seja, ser humano não é corpo sem espírito, ou espírito sem corpo, é corpo e espírito integrados, a abordagem desta ciência possui suas bases epistemológicas não somente na 3ª força em Psicologia, a humanista, mas também nas tradições científicas orientais. De acordo com Zimmer (2005), a característica mais importante da mentalidade bramânica essencial para a história da civilização indiana foi a descoberta do Eu (atman) como entidade imperecível e independente, alicerce da personalidade consciente e da estrutura corporal. Tudo o que normalmente conhecemos e expressamos de nós mesmos pertence à esfera da impermanência, à esfera do tempo e do espaço, mas esse Eu (atman) é imutável por todo o sempre, além do tempo, além do espaço e da obnubiladora malha da causalidade, além de qualquer medida, além do domínio da visão. Foi Ken Wilber que afirmou que as teorias da física mudam a cada nova descoberta, enquanto a experiência transpessoal é sempre a mesma. O nível da forma física de energia talvez não seja comparável às formas energéticas mais sutis, tratando-se de vivências no nível transpessoal. Este é o ponto de conexão da visão oriental com a Psicologia Transpessoal. Uma das hipóteses apresentadas neste trabalho foi a de que a Psicologia, longe de qualquer viés panfletário de novas teorias, esquiva-se para se proteger de práticas esdrúxulas como a da utilização de drogas psicodélicas ou se acautela por haver poucos pesquisadores nesta nova área. Com certeza, cabe à Academia o reconhecimento da validade das pesquisas com seus métodos ou técnicas não reconhecidas no campo da Psicologia tradicional. Apesar de a Psicologia Transpessoal em seu princípio, através de Grof, ter utilizado drogas psicodélicas para formulação de algumas de suas teorias, ela depois substituiu a técnica por outra chamada respiração holotrópica, cuja prática amplia a consciência e leva a pessoa a uma experiência de transcendência e inteireza. Não podemos considerar que tais técnicas sejam acientíficas. Não há do quê se proteger dessa nova ciência, e dependerá da ampla divulgação por parte da Psicologia para que ela tenha reconhecimento da comunidade científica e não apenas da conclusão das pesquisas.

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Pelo observado na pesquisa, não há por que não se inclua a Psicologia Transpessoal na grade curricular do Curso de Psicologia da Puc Minas, pelo motivo de ela não seguir o paradigma das ciências já reconhecidas. A própria Psicanálise conseguiu sustentar que existe o pensamento consciente e o pensamento inconsciente, instância inteiramente inovadora e transgressora dos padrões normalmente aceitos pela ciência da época, rompendo com o cogito cartesiano que, de acordo com Japiassu ( ), inscreveu-se no inconsciente coletivo da filosofia clássica. Da mesma forma que a Psicanálise possibilitou ao homem saber que “eu existo também onde eu não penso”, marcando a descontinuidade com o que foi dito pela ciência positivista, ela não só afirma que existe a subjetividade como também discorda do próprio Descartes, com o seu anátema “penso, logo existo”. Também a ciência dos estados alterados de consciência, ou estados transpessoais baseada no hinduísmo e no budismo, ressalta que a origem principal do sofrimento é a crença na solidez e na separatividade de um “eu” e de “objetos” exteriores igualmente percebidos como sólidos, desacreditando Descartes. (Weil, p. 45). Não se pode sequer dizer que esse eu dissolveu-se ou que houve a morte do ego. Como se pode falar de dissolução ou morte de algo que jamais existiu senão como conceito, pensamento ou idéia? Dessa idéia ilusória surge o apego e o medo. A raiva e o ódio, o desejo e o ciúme, o orgulho e a competividade, a tristeza e a depressão, todos são aspectos destrutivos de uma única energia, que precisa apenas ser transformada e liberada dos entraves da crença em um “eu”. O estado transpessoal pode surgir de forma fortuita (crise existencial do “ter”; sofrimento da privação, experiência estética, intoxicação, morte clínica, esforços sobre-humanos, no parto, no estado de sonho, no orgasmo sexual) e, uma vez a pessoa tenha sido tocada por esse estado, ela buscará um caminho, um método, um mestre que a ajude a desenvolver-se. Isso é levado aos métodos de acesso ao estado transpessoal. Concorda-se, pelo estudo desta pesquisa, com o relato de Chalmers a respeito de como Thomas Kuhn que se refere à ciência, quando este diz que os valores operativos no processo de uma ciência e que determinam a aceitação ou rejeição de teorias devem ser discernidos pela análise psicológica e sociológica da comunidade científica. Kuhn afirmou que quando isso é tomado conjuntamente com a suposição de que a ciência contemporânea é o epítome do melhor da racionalidade, o que sobra é uma posição conservadora.

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Para Kuhn, para um campo ser ou não ciência, dependerá dele se conformar ou não ao relato da ciência oferecido na Estrutura das Revoluções Científicas. O progresso através de revoluções é a alternativa de Kuhn para o progresso cumulativo característico dos relatos indutivistas da ciência, onde o conhecimento científico cresce continuamente à medida que observações mais numerosas e mais variadas são feitas, possibilitando a formação de novos conceitos, o refinamento de velhos conceitos e a descoberta de novas relações lícitas entre eles. Um paradigma é mais que simplesmente um modelo teórico útil para ciência; sua filosofia configura o mundo através de influência indireta sobre o indivíduo e a sociedade. Pelos estudos de Grof, o paradigma da Psicologia Transpessoal trouxe à luz o modo mais poderoso de ativar experiências oriundas de todos os níveis do inconsciente com o uso das drogas psicodélicas, no princípio de suas pesquisas e, depois através da introdução da energização do organismo através de manipulações físicas, através da música evocativa e do trabalho do corpo num método terapêutico que, em sua visão, representa uma das mais promissoras abordagens para a psicoterapia e a auto-exploração. (Capra, p. 377). Como um novo paradigma, a Psicologia Transpessoal não se enquadra nos modelos positivistas da ciência moderna, mas se enquadra na estrutura das revoluções científicas, pois que estuda as funções intuitivas, a criatividade, os diversos estados alterados de consciência, onde a realidade vivenciada é a do mundo psíquico e esta, ligada com todos os seres viventes intra, extracorpóreos ou extraterrenos, a região onde ocorre uma variedade de experiências difíceis de serem coordenadas com o plano físico e com as chamadas leis naturais e ligada ao Universo. Foi Jung quem resgatou o sentimento do sagrado de um ponto de vista científico, ao formular o conceito de arquétipo coletivo, responsável na mente pela representação da totalidade, tanto através da imagem de Deus, quanto da imagem do Universo da física teórica. (BYINGTON apud COLEÇÃO MEMÓRIA DA PSICANÁLISE, (s/), p. 8). Como Platão deixou sua obra grandiosa atravessar milênios, a abertura transpessoal leva fatalmente a uma visão global e integrativa de todas as disciplinas do conhecimento, inclusive ao pensamento esotérico que tem provas e evidências validadas universalmente. Estudando a cartografia da consciência na Psicologia Transpessoal, percebe-se que é na região do supraconsciente, onde o indivíduo sente sua consciência fundida com a Mente Universal, o ponto de convergência que leva o psicólogo à espiritualização, porque será dentro de

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si próprio que encontrará o divino; onde ele poderá escutar a voz do silêncio interior que manda, consola e extrai do íntimo a graça que excede toda compreensão. (Zimmer, 2005, p. ) A Índia sempre defendeu a idéia de que a sabedoria implica poder se ela transforma e domina a personalidade. Como exemplo, assistimos a Gandhi, em que o Ser espiritual arrebatou e dissolveu nele todos os traços do ego, toda aquelas limitações que deformam a visão do homem acerca dos acontecimentos do mundo, impedindo sua aproximação à verdade divina. (ZIMMER, 2005,p. 59). Brahman, para a filosofia indiana, é a forma cristalizada e congelada da mais alta energia divina, latente no homem, suscetível de ser ativada pela concentração até se converter em vigília criadora, a espontaneidade fundamental de nossa natureza. Transcende ao corpo denso, mas também o mundo interior de formas e experiências. (ZIMMER, 2005, p.66). Como poder que transforma e anima tudo no microcosmo, bem como no mundo exterior, é o hóspede divino do corpo mortal e se identifica com o Eu (atman) o aspecto superior daquilo que no Ocidente chama-se de alma de um lado (a esfera mutável da psique – pensamentos, emoções e elementos similares da consciência do ego) e de outro, o Eu anônimo, o Eu com E maiúsculo, que não é de nenhum modo o ego limitado). Brahman é a essência de tudo “eu somos e sabemos” (è bom colocar entre aspas?). (ZIMMER, 2005, p.66). A experiência transpessoal, descrita pela Psicologia Transpessoal nesta pesquisa, tem como uma das suas manifestações essenciais uma vivência segundo a qual o todo está em todas as partes, o que coaduna com o pensamento de Edgar Morin que, ao anunciar o princípio holográfico, afirma que o mundo está em nosso espírito, e este está em nosso mundo. Como Grof ( ) afirmou, a hipótese holográfica não tem a pretensão de solucionar toda a fisiologia cerebral nem todos os problemas da Psicologia. Os fenômenos transpessoais que podem mais facilmente ser relacionados com a teoria holonômica são aqueles que envolvem elementos da realidade objetiva: identificação com outras pessoas, animais, plantas e realidade inorgânica do passado, presente e futuro. Como espaço e tempo estão contidos no domínio holográfico, haveria compatibilidade com a observação de que experiências transpessoais desse tipo não estão ligadas pelas limitações espaciais ou temporais comuns. Viu-se no transcorrer da pesquisa que o corpo teórico da Psicologia Transpessoal foi construído por psicólogos, psicanalistas, filósofos, psiquiatras e pessoas interessadas

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efetivamente em contribuir para a formação do psicólogo em direção a uma espiritualização, sempre tendo como enfoque as questões científicas e não religiosas, mas que certamente contribuíram para pensar o homem, a sociedade e a ciência. A Psicologia Transpessoal, através do estudo da cartografia da consciência, coaduna seu conhecimento com o pensamento de William James, que definiu a Psicologia como sendo a descrição e explanação sobre os estados da consciência, criando critérios da inefabilidade em que as palavras são limitadas para descrever a dimensão da experiência das ditas experiências místicas. A partir desta pesquisa comprova-se que a Psicologia Transpessoal prima por trabalhar com diferentes níveis de consciência e os concebe como fazendo parte da natureza da mente humana, porque a emergência desses níveis de consciência podem ter fins terapêuticos. Atesta-se que com o estudo da história dessa nova ciência há muitas contribuições com a Psicologia, pelo motivo da Psicologia Transpessoal estar inserida dentro de um contexto de mudanças e ampliações de conceitos da ciência. A partir de todo este estudo, reconhece-se que a ciência clássica, a ciência

do

racionalismo científico, circunscreve-se apenas ao estado da consciência de vigília, aquele em que predomina o raciocínio lógico e das sensações físicas, e também do reducionismo. Como pela pesquisa pôde-se observar que a crise de fragmentação que ameaça a existência do homem no Planeta se encontra na dualidade de base sujeito-objeto, própria do paradigma newtoniano-cartesiano, são citados os principais documentos que encorajaram a desenvolver uma teoria que constitui hoje a base de pesquisa, ensino e ação da Universidade Holística Internacional que são: a Declaração de Veneza da Unesco (1986) que afirmou que a ciência chegou aos confins e recomenda-se o desenvolvimento da transdicisplinaridade; a Declaração de Vancouver da Unesco (1990), que reforça os termos da de Veneza, evidenciando o caráter urgente em relação à sobrevivência da vida na Terra; e a Carta Magna da Universidade Holística Internacional (1986) que anunciou o novo paradigma emergente onde a visão em que o todo e cada uma das sinergias estão ligados. Weil, D’Ambrosio e Crema (1993) relataram que a abordagem holística da realidade é transdisciplinar

e

que,

na

Universidade

Holística

de

Brasília,

foi

definida

como

transdiciplinaridade o encontro de várias áreas do conhecimento entre cientistas e artistas, poetas, filósofos e místicos, todos os “exilados” do império da razão.

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O verdadeiro estado transpessoal é de natureza holística, abrangendo o mundo relativo e dualista pessoal, e o estado absoluto transpessoal, eliminando a última dualidade. Os mundos interior e exterior são vistos ao mesmo tempo como dimensões sagradas da pessoa e que vão além de, através delas em suas relações na dimensão transpessoal. Assim sendo, todos esses princípios expressam a visão holística e levam em conta tanto as hipóteses advindas das descobertas mais recentes da ciência, quanto das descrições da vivência transpessoal por seres privilegiados. Atualmente, além de dois semestres dedicados à disciplina Psicologia Transpessoal, a Universidade Federal de Minas Gerais possui nove disciplinas com orientação transpessoal. Conforme Weil, D’Ambrosio e Crema (1993), ninguém pode pretender supremacia no exercício de vivência em redes ou transdisciplinaridade, que parte do reconhecimento da impossibilidade de abranger a realidade a partir de um só domínio, por mais capacitado que possa ser o seu porta-voz. É preciso adquirir a ética da diversidade. Daí, a importância deste trabalho no sentido de apresentar a Psicologia Transpessoal à comunidade científica da Puc Minas, abrindo espaço para discussão, troca e crescimento. Sugiro, portanto, que a pesquisa possa prosseguir no sentido de se investigar as influências da Psicologia Transpessoal no reconhecimento de teorias e práticas psicoterápicas em processos psicopatológicos.

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