Responsabilidade para com a Comunidade

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ordem dos enfermeiros | Número 37 | Junho 2011

Número 37 | Junho 2011 | www.ordemenfermeiros.pt | ISSN 1646-2629

XI Seminário de Ética

Responsabilidade para com a Comunidade

2 0 1 0

    a do Secretariado 8.45H | Abertur 9.00H | Mesa de

abertura

cia Inicial: 9.30H | Conferên Humana” “Da Falibilidade Michel Renaud Professor Doutor 10.00H | Intervalo

dos Enfermeiros ções da Ordem s – perspectivas 10.30H | Interven ça nos cuidado para a Seguran o da S.R. Moderador: Conselho Directiv , Presidente do Enf.º Amílcar Carvalho

do Centro

Intervenções: o • Conselho Directiv sidente do CD Oliveira, Vice-pre – Enf.º Jacinto onal • Conselho Jurisdici CJ Presidente do – Enf.ª Lucília Nunes, Enfermagem • Conselho de CE Presidente do is – Enf.º Delfim Oliveira, Directivos Regiona os dos Conselh • Representante do CDR do Sul Abranches, vogal a Regionais Madalen – Enf.ª de Enfermagem dos Conselhos • Representante Centro vogal no CER do – Enf.º Paulo Lopes,

VII

Seminário de

12.30H | Almoço

s de Saúde ça nos Cuidado 14.00H | Seguran Profissionais – Papel das Ordens



9.00H



Ética

lo 11.30H › Interva

recusa(s)» – Vogal donda: «Da(s) Salomé Matos 11.45H › Mesa-re cliente – Enf.ª RA dos Açores • Recusa(s) do Regional da al da Secção Silva – Vogal do CJ Region – Enf.ª Isabel a profissional RA da Madeir • Recusa(s) do Regional da Figueira al da Secção do CJ Region ncia – Enf.ª Fátima o de Consciê al do Sul • O caso da Objecçã Secção Region Regional da CJ do – Vogal Centro Regional do Secção dor: da Modera nte do CJ Gomes – Preside Enf. José Luís 13.00H › Almoço

livre

o» co de trabalh Deodato donda: «Mosai – Enf. Sérgio 14.30H › Mesa-re agir profissional • Critérios do – Vogal do CJ de Posição: Enunciados • Mosaico de consentimento Do sigilo; Do CJ › Da delegação; -presidente do Vice – ão Martins crianças; – Enf. ª Conceiç protecção das s seguros; Da Merícia cuidado Enf.ª – › Dos s para o ensino al da Secção Das recomendaçõe do CJ Region – Presidente Bettencourt a do CJ RA da Madeir Fraga – Vogal Regional da António – Enf. José › Do final de vida e do CJ Moderador: Vice-president Gonçalves – Enf. Rogério eiro» ncia final: lógica do enferm 16.00H › Conferê ade ética e deonto «Responsabilid nte do CJ Nunes – Preside Enf.ª Lucília

Intervenções: rio • Ordem dos Médicos Digníssimo Bastoná – Dr. Pedro Nunes, uticos • Ordem dos Farmacê mo Bastonário da Silva, Digníssi – Dr. J. A. Aranda Dentistas rio • Ordem dos Médicos da Silva, Digníssimo Bastoná o – Dr. Orlando Monteir iros Enferme dos ma Bastonária • Ordem de Sousa, Digníssi – Enf.ª Maria Augusta

Debate

Secretariado

Moderadora: do CJ a Amaral – Vogal Enf.ª Manuel

onal do Conselho Jurisdici Moderador: es, Vice-presidente Enf.º Rogério Gonçalv

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alização o para a Contratu Comentadores: adora da Comissã Escoval, Coorden Prof.ª Dr.ª Ana Saúde Parlamentar da da Saúde te da Comissão Roseira, Presiden Dr.ª Maria de Belém

Abertura do

8.45H

a profissional» Mesa de abertur nsabilidade Honra: «Respo Bastonária Alocução de – Digníssima Augusta Sousa – Enf.ª Maria Enfermeiros da Ordem dos ção» er a autodetermina Cerdeira donda: «Proteg – Enf.ª Ana Berta 10.00H › Mesa-re timento e Consen • Informação (CJ) o Jurisdicional decidir para – Vogal do Conselh ades etências e inabilid CJ • Das incomp r Jurídico do ia – Assesso Alberto Duarte – Dr. Nuno Lampre de idade – Enf. em menores al • Consentimento Secção Region da al do CJ Region – Presidente da RA dos Açores

Segurança nos cuidados

Debate

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11H30

Intervalo da I Profissional Mesa Redon Deontologia Humanos e a «Os Direitos

de Enfermagem» Serrão Doutor Daniel • Professor – Vice-presidente Oliveira Marçal • Enf.ª Teresa dos Enfermeiros Directivo da Ordem Jurisdicional do Conselho do Conselho Cerqueira – Vogal • Enf.º José Enfermeiros da Ordem dos o Jurisdicional Moderadora: Vogal do Conselh Bettencourt – Enf.ª Merícia Enfermeiros da Ordem dos

o 13H00 Almoç

Redonda II 15H00 Mesa Profissional Deontologia «10 Anos de o de Enfermagem» nte do Conselh o ida Vieira – Preside eiros no 1.º Mandat • Enf.ª Margar Ordem dos Enferm o Jurisdicional Jurisdicional da nte do Conselh Nunes – Preside • Enf.ª Lucília 2.º Mandato Enfermeiros no da Ordem dos Jurisdicional Moderador: do Conselho o – Presidente Enf. Sérgio Deodat Enfermeiros da Ordem dos 16H30 17H00

Conclusões ctivando o futuro» o sentido, perspe «Desenhando ramento Mesa de Encer

SEMINÁRIO DE

Programa a do secretariado

09h00 – Abertur

DE ABERTURA ária da Ordem 09h30 – MESA da Digníssima Baston Alocução de Honra dos Enfermeiros a de Sousa Enf.ª Maria August RÊNCIA INICIAL 10h30 – CONFE «Confiança» Apresentação: o Jurisdicional da - Vogal do Conselh Enf.º António Malha eiros Ordem dos Enferm Conferencista: idade Nova de Lisboa Univers Renaud Prof.ª Doutora Isabel o

11h00 – Interval

25

9 Setembro 200 - Porto Seminário de Vilar

13h00 – Almoço REDONDA II 14h30 – MESA em Enfermagem» «Sigilo Profissional

o Jurisdicional Moderador: - Vogal do Conselh Enf.ª Graciete Novais da Ordem dos EnferRegional do Sul Regional da Secção meiros Prelectores: ida Vieira - PresiProf.ª Doutora Margar Perspectiva ética: o Ética e Deontológica ão de Apoio à Reflexã dente da Comiss dos Enfermeiros de Melo (CARED) - Ordem Doutora Helena Pereira Prof.ª : jurídica Perspectiva de Lisboa do Universidade Nova Carneiro - Vogal ógica: Enf.ª Teresa Perspectiva deontol Enfermeiros ional da Ordem dos Conselho Jurisdic

REDONDA I 11h30 – MESA Saúde» «Informação em RÊNCIA FINAL 16h00 – CONFE Saúde» Moderador: Informação em do Conselho Jurisdi«Segurança da ourt - Presidente da Enf.ª Merícia Bettenc ional da R. A. da Madeira Apresentação: Conselho Jurisdic Secção Regional el - Presidente do cional Regional da Enf.ª Elvira Piment dos Açores da Ordem eiros Regional da R. A. Ordem dos Enferm Regional da Secção Prelectores: Carlos Amado Martins dos Enfermeiros Prof. Doutor José ética: tiva Perspec ional Coimbra Conferencista: Conselho Jurisdic Enfermagem de o do o - Presidente do Escola Superior de Nabais - Membr Enf.º Sérgio Deodat onal: Enf.º António de eiros Perspectiva profissi nte da Comissão da Ordem dos Enferm agem e Preside e Conselho de Enferm Saúde Mental Enfermagem de Especialidade de USÕES ação» dos Enfermeiros CONCL inform – Ordem da da nça 16h30 trica Silveira Psiquiá os a segura Lingnau da : Dr. Luís Novais «Garantir aos cidadã ão de Dados Perspectiva jurídica ão Nacional de Protecç do TO Presidente da Comiss Trindade - Vogal DE ENCERRAMEN ógica: Enf.ª Ângela 17h00 – MESA Perspectiva deontol Enfermeiros ional da Ordem dos Conselho Jurisdic

Juris dicio nal pelo Con selho

ÉTICA

Enfe rmei ros da Orde m dos

ADE S A B ILUID A DE R E S PCOON ID N M O C A M Orga niza do

de Abertura 09H30 Mesa ima Bastonária Honra da Digníss Alocução de Enfermeiros da Ordem dos Augusta de Sousa • Enf.ª Maria l rência Inicia 10H30 Confe logia» Deonto e os de «Direitos Human de Brito – Faculda Doutor Silveira esa – Braga • Professor Católica Portugu Universidade de Filosofia da 11H00

dos Enfermeiros

PA R A

PROGRAMA

ETARIADO TURA DO SECR 09H00 – ABER DE ABERTURA ária da Ordem 09H30 – MESA Baston

13H00 – ALMOÇO REDONDA II 15H00 – MESA Comunidade – O Agir Ético na Deodato, Presidente do Conselho

Sérgio Moderador: Enf.º eiros da Ordem dos Enferm nidad e, a par Jurisdicional da lidad e pela comu Prof. • A responsabi pelo mundo – pelo «Outro» e do responsabilidade Silva, Presid ente el Olive ira da ias da Vida Ciênc Douto r Migu as para nal de Ética Conselho Nacio Enf. º João Neves (CNECV) comunidade – na da éticos Saúde • Problemas Ciências da O no Instituto de Porto Amado, docente 11H00 – INTERVAL ca Portuguesa – Universidade Católi dos na comunidade – Enf.º REDONDA I de cuida io da 11H30 – MESA e a Comunidade • A prestação Mesa do Colég da m ente ente mage Presid , Presid – A Enfer rida Vieira nitária da Ordem Carlos Martins, a Doutora Marga Enfermagem Comu Moderador: Prof.ª Ética e Deontológic Especialidade de Apoio à Reflexão na da Comissão de dos Enfermeiros ssionais de saúde dos Enfermeiros dos de e os outros profi ção (CARED) da Ordem cto» dos cuida e – Enf.ª Assun • Os enfermeiros e como «obje lho pela comunidad l s, Vogal do Conse • A comunidad responsabilidade lho Jurisdiciona Ana Paula Gome Conse Enf.ª – do agem ente Enferm Enfermeiros Maga lhães, Presid Regional do Norte e Vogal do da Ordem dos nidade o comu a Secçã de Enfermagem com eiros da Regional dos Enferm saúde relacionadas nte do Conselho icional da Ordem • As políticas de reside Conselho Jurisd Oliveira, Vice-p – Enf.º Jacinto eiros Enferm dos ÕES e Directivo da Ordem eiro para com a comunidad 16H30 – CONCLUS enferm ENTO ente do Conselho • Os deveres do DE ENCERRAM Bettencourt, Presid nal da R. A. da 17H00 – MESA – Enf.ª Merícia nal da Secção Regio l da Ordem Jurisdicional Regio iciona do Conselho Jurisd Madeira e Vogal dos Enfermeiros

da Digníssima Alocução de Honra Augusta Sousa s – Enf.ª Maria dos Enfermeiro

NCIA INICIAL 10H15 – CONFERÊpara com a comunidade

(s) Responsabilidade Zoboli, da Escola de Enfermagem Elma Prof.ª Doutora e de S. Paulo, Brasil da Universidad

2010 Aveiro 29 OUTUBRO de Congressos de Centro Cultural e Mais informações

sobre este evento

em www.ordemen

fermeiros.pt

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vera vidigal

xI seminário de ética Editorial 

XI Seminário de Ética

Reflectir sobre a comunidade para melhor responder às suas necessidades

Cara (o) colega Como temos vindo a realizar anualmente, a presente edição da Revista da Ordem dos Enfermeiros (ROE) visa disponibilizar, a todos os membros da Ordem dos Enfermeiros (OE), o teor das apresentações efectuadas no âmbito do Seminário de Ética que se assume serem para todos os membros um importante material, tanto de reflexão como de suporte ao quotidiano, da nossa intervenção profissional. O XI Seminário de Ética, um encontro organizado pelo Conselho Jurisdicional da OE que decorreu em Outubro de 2010, em Aveiro, foi subordinado ao tema «Responsabilidade para com a Comunidade», temática esta suportada na responsabilidade deontológica que o nosso Código explicita no seu Artigo 80º. E de facto, factores como o envelhecimento demográfico, a desertificação do Interior do País, as novas famílias, o desemprego e a crise económico-financeira têm vindo a transformar a(s) comunidade(s) em que cada um de nós se insere. A decisão de colocar a reflexão ética acerca deste tema mostra-se hoje de pertinência acrescida pela exigência que as decisões de intervenção profissional acarretam. Os enfermeiros, pela natureza dos cuidados de Enfermagem, pelo seu trabalho de proximidade e pelas competências que possuem na abordagem da pessoa, das famílias e das diferentes comunidades, estão numa situação privilegiada para identificar neces­ sidades e identificar as potencialidades de respostas que permitam uma melhor gestão entre os cuidados / serviços prestados e as expectativas dos utentes. Já hoje os enfermeiros fazem isto no seu quotidiano: seja com os grupos mais vulneráveis na comunidade, seja nos locais onde as pessoas trabalham e vivem (nos domicílios, nas escolas, nas empresas, nos hospitais, nos cuidados

continuados). Por isso, podemos afirmar que os enfermeiros têm as condições necessárias para assumirem cada vez mais a responsabilidade de serem os interlocutores de primeira linha junto dos cidadãos – e destes com o sistema de saúde. Porque se antevêem dificuldades acrescidas na disponibilização de meios para a resposta às necessidades, somos convocados a ter uma especial atenção a situações que ponham em causa a equidade no acesso a cuidados de saúde, casos de abandono, desnutrição ou de não cumprimento de regimes terapêuticos devido a dificuldades financeiras, à multiculturalidade, aos novos e variados conceitos de família, ao agravamento de patologias do foro mental e ao aumento da incidência de doenças crónicas. Reforçar a intervenção de cada enfermeiro é assumir a responsabilidade que decorre do mandato social da profissão. E tal como prevê o Código Deontológico do Enfermeiro, o profissional de Enfermagem é responsável pela promoção da saúde da comunidade em que está inserido, zelando pelo bem-estar de todos os elementos que a compõe. É ainda responsável por dar resposta adequada às necessidades em cuidados de Enfermagem diagnosticados nessa mesma comunidade. Estou certa que todos os enfermeiros – em especial aqueles que trabalham em unidades de saúde, que, pela sua natureza, possuem uma maior proximidade com a comunidade – têm presentes os deveres contidos no Art.º 80 do Código Deontológico do Enfermeiro – mencionados por vários prelectores ao longo do XI Seminário de Ética. E é com base neles que actuam, no contacto diário com os cidadãos. Tal como a Enf.ª Elma Zoboli referiu na sua memorável conferência inicial (que os leitores poderão conhecer nas páginas que se

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I NsEmINáRIO t E R V EdE N étIca Ç Ã O xI divulgação Notícias 2 Editorial

seguem), os enfermeiros possuem uma responsabilidade social para com a comunidade decorrente de dois aspectos fundamentais: serem profissionais de saúde e de serem os seguidores do legado de Florence Nightingale, a «mãe» da Enfermagem moderna. E, de facto, os conhecimentos e competências que adquirimos na formação pré, pós-graduada e na vivência enquanto profissionais de saúde, bem como os ensinamentos que Florence Nightingale nos deixou, de tal forma marcantes e intemporais, formam a base estruturante da profissão – e que nos permite desenvolver um compromisso sério e eficaz com a comunidade. Os desafios que se colocam são cada vez maiores e por isso é fundamental que a capacidade dos profissionais de saúde aplicarem em pleno os seus conhecimentos e competências seja aprofundada. Os primeiros passos para essa conquista já estão a ser dados. Contudo, é necessário mudar muitas mentalidades e o próprio

paradigma do sistema de saúde. Há que gerir bem os recursos e há que ter um sistema orientado para a saúde e não para a doença. Só assim se obterão maiores ganhos em saúde, maior sustentabilidade do sistema e maior qualidade de vida. Considerando todos os aspectos já referidos e os que o colega poderá conferir ao longo desta edição da Revista da Ordem dos Enfermeiros, concordará comigo sobre a pertinência da decisão do Conselho Jurisdicional em abordar o tema «Responsabilidade para com a Comunidade». Cabe agora, a cada um de nós, seleccionarmos a informação que considerarmos pertinente para uma reflexão e acção sérias, com vista à melhoria dos cuidados de Enfermagem – no estrito respeito pelos direitos e deveres profissionais. A sua Bastonária Maria Augusta Sousa

Ficha técnica Propriedade: Ordem dos Enfermeiros – Av. Almirante Gago Coutinho, 75 1700-028 Lisboa Tel.: 218 455 230 / Fax: 218 455 259 E-mail: [email protected] www.ordemenfermeiros.pt Director: Maria Augusta Sousa Coordenador: Júlio Branco Conselho editorial: Carminda Morais, Élvio Jesus, Germano Couto, Helena Simões, Jacinto Oliveira, Manuel Oliveira, Margarida Rego Pereira, Rogério Gonçalves, Teresa Oliveira Marçal Edição: Luísa Neves Colaboraram neste número: Ana Paula Gomes, Assunção Magalhães, Carlos Martins, Elma Zoboli, Elvira Pimentel, Jacinto Oliveira, João Neves-Amado, Maria Augusta Sousa, Merícia Bettencourt e Sérgio Deodato. Fotos: J. R. Garcia e Vera Vidigal Secretariado: Av. Almirante Gago Coutinho, 75 – 1700-028 Lisboa Tel.: 218 455 230 / Fax: 218 455 259 E-mail: [email protected] www.ordemenfermeiros.pt ISSN: 1646-2629 Design Gráfico: Pedro Gonçalves Paginação, Pré-impressão, Impressão e Distribuição: DPI Cromotipo, Rua Alexandre Braga, 21 B – 1150-002 Lisboa Periodicidade: Trimestral Tiragem: 62 600 exemplares Distribuição gratuita aos membros da Ordem dos Enfermeiros Depósito legal n.º 153540/00

Ordem dos Enfermeiros – Sede: Av. Almirante Gago Coutinho, 75 – 1700-028 Lisboa – Tel.: 218 455 230 / Fax: 218 455 259 – E-mail: [email protected] | Secção Regional da R. A. dos Açores: R. Dr. Armando Narciso, 2 – 9500-185 Ponta Delgada – Tel.: 296 281 868 / Fax: 296 281 848 – E-mail: [email protected] | Secção Regional do Centro: Av. Bissaya Barreto, 185 – 3000-076 Coimbra – Tel.: 239 487 810 / Fax: 239 487 819 – E-mail: [email protected] | Secção Regional da R. A. da Madeira: R. Visconde Cacongo, n.º 35 – St.ª Maria Maior – 9060-036 Funchal – Tel.: 291 241 765 / Fax: 291 237 212 – E-mail: [email protected] | Secção Regional do Norte: R. Latino Coelho, 352 – 4000-314 Porto

As afirmações e ideias expressas

– Tel.: 225 072 710 / Fax: 225 072 719 – E-mail: [email protected] | Secção Regional do Sul: Rua Castilho, 59, 8.º Esq.

nos textos publicados na ROE são

– 1250-068 Lisboa – Tel.: 213 815 550 / Fax: 213 815 559 – E-mail: [email protected]

da inteira responsabilidade dos autores das mesmas.

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XI Seminário de Ética

Responsabilidade para com a Comunidade

sumário N.º 37 | Junho 2011

4 Palavras de abertura – Enfermeiro Sérgio Deodato 5

Alocução de Honra: A responsabilidade para com a comunidade – Enfermeira Maria Augusta Sousa

7

Conferência Inicial: Responsabilidade para com a comunidade – Professora Doutora Elma Zoboli

18 A Enfermagem e a comunidade: A comunidade como «objecto» dos cuidados de Enfermagem – Enfermeira Ana Paula Gomes

J. r. garCia

20 A Enfermagem e a comunidade: As políticas da saúde relacionadas com a comunidade – Enfermeiro Jacinto Oliveira 22 A Enfermagem e a Comunidade: Os deveres do enfermeiro para com a comunidade – Enfermeira Merícia Bettencourt 27 O Agir Ético na Comunidade: Problemas éticos na comunidade – Enfermeiro João Neves-Amado 31 O Agir Ético na Comunidade: A prestação de cuidados na comunidade – Enfermeiro Carlos Martins 35 O Agir Ético na Comunidade: O enfermeiro e outros profissionais de saúde na responsabilidade pela comunidade – Enfermeira Assunção Magalhães 39 Encerramento: Conclusões do XI Seminário de Ética – Enfermeira Elvira Pimentel

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Enfermeiro Sérgio Deodato

J. r. garCia

Palavras de abertura prestação de cuidados de saúde e de Enfermagem às pessoas.

Presidente do Conselho Jurisdicional da Ordem dos Enfermeiros

Estimados colegas, a presente edição da Revista da Ordem dos Enfermeiros (ROE) destina-se em exclusivo a publicar os textos das comunicações proferidas no XI Seminário de Ética da Ordem dos Enfermeiros (OE), evento organizado pelo Conselho Jurisdicional e que decorreu em Aveiro, a 29 de Outubro de 2010. Conseguimos, deste modo, deixar um registo definitivo da riqueza das reflexões partilhadas no XI Seminário.

Ao mesmo tempo, a comunidade circunscreve-se, ela própria, como um objecto específico da intervenção de Enfermagem. Por um lado, à comunidade é atribuído o direito à protecção da saúde, pelo n.º 1 da Base I da Lei de Bases da Saúde, o que implica uma resposta adequada pelo sistema de saúde, em geral, e pelo Serviço Nacional de Saúde, em particular. Por outro lado, ao enfermeiro compete intervir profissionalmente na comunidade, como determina o n.º 2 do Artigo 4.º do Regulamento do Exercício Profissional dos Enfermeiros (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 161/96 de 4 de Setembro, alterado pelo Decreto-lei n.º 104/98 de 21 de Abril) e o referido Artigo 82.º do Código Deontológico.

O tema escolhido – «Responsabilidade para com a Comunidade» – teve como pano de fundo os deveres relativos à responsabilidade do enfermeiro na comunidade, enunciados no Artigo 80.º do Código Deontológico (incluso na Lei n.º 111/2009 de 16 de Setembro). Quisemos aprofundar a reflexão ética num domínio ainda não muito explorado entre nós, mas que consideramos da maior relevância na actualidade.

J. r. garCia

Com efeito, o tempo actual está a colocar inúmeros desafios aos sistemas de saúde, verificando-se um conjunto vasto de modificações no sistema de saúde português. Nestas mudanças, a comunidade surge como um ambiente privilegiado para a

Deste modo, ao direito da comunidade a receber protecção quanto à saúde das pessoas corresponde um dever do enfermeiro de agir na sua esfera de competências próprias. A par da responsabilidade pelas pessoas, o enfermeiro assume, assim, uma responsabilidade pela comunidade, enquanto objecto próprio de cuidado. Uma acção na comunidade que visa a sua protecção, enquanto ambiente natural de desenvolvimento da vida humana. Uma intervenção profissional que assume como fim último a promoção da saúde e do bem-estar das pessoas. Foi em torno desta temática que a reflexão se desenvolveu num intenso dia de partilha, em que a Enfermagem portuguesa mais uma vez contribuiu para o aprofundamento da reflexão ética que o nosso tempo vai pedindo. São estas reflexões que agora colocamos ao dispor de todos, desejando que contribuam para enriquecer o nosso agir profissional. Desejo-lhes muito boas leituras.

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Alocução de Honra

a responsabilidade para com a comunidade Bastonária da Ordem dos Enfermeiros

Excelentíssimo senhor Presidente e todos os membros que constituem o órgão jurisdicional da nossa Ordem, o meu agradecimento por fazer acontecer mais este momento de partilha e reflexão sobre a nossa responsabilidade deontológica decorrente do exercício profissional. Caros prelectores, manifesto o meu reconhecimento e gratidão pelo facto de, com o vosso saber, generosidade e disponibilidade terem aceitado vir connosco partilhar, e desse modo enriquecer, o nosso património de conhecimento que, seguramente, todos reconhecerão no final deste dia e dele farão uso no seu quotidiano. Excelentíssimos convidados que nos honram com a vossa presença e emprestam a este espaço o reconhecimento da sua importância para a Saúde e para a Enfermagem. Caros participantes no XI Seminário de Ética que aceitaram o desafio de vir, em conjunto, ao longo do dia de hoje dar tempo ao tempo que o desafio da responsabilidade profissional nos coloca no quotidiano do nosso exercício como enfermeiros. Entendo este tempo e espaço, para o qual o Conselho Jurisdicional a todos nos convoca uma vez por ano, como um privilégio para aqueles que nele participam, mas também para a nossa Ordem, pela construção do suporte à consolidação e desenvolvimento do seu desígnio fundamental, estatutariamente consagrado, no que respeita à promoção da qualidade dos cuidados de Enfermagem prestados à população e ao * O Enf.º Jacinto Oliveira, Vice-presidente do Conselho Directivo da Ordem dos Enfermeiros, apresentou a alocução da Sr.ª Bastonária da Ordem dos Enfermeiros que, devido a um compromisso internacional, não pôde estar presente no evento.

desenvolvimento da regulação do exercício profissional, no respeito pela ética e deontologia da profissão.

J. r. garCia

Enfermeira Maria Augusta Sousa*

Sendo sempre importante nas perspectivas que aqui aponto, é necessário reafirmar a pertinência e actualidade que no actual contexto assume a temática que aqui se aprofundará: a «Responsabilidade para com a comunidade». De facto, a humanidade vive hoje desafios que decorrem da globalização desregulada de um mercado selvagem onde a vida de milhões de crianças, homens e mulheres, jovens e menos jovens parece tornar-se um valor transaccionável. Assistimos a desigualdades tão gritantes que conduzem a que as comunidades que suportam essas vidas estejam cada vez mais asfixiadas nas suas potencialidades de desenvolvimento suportado em valores que garantam a necessária harmonia de um mundo onde vale a pena viver e onde os direitos sociais, nos quais o direito à saúde se inclui, são eixos estruturantes. O nosso País não é uma ilha neste contexto global. Bem pelo contrário. O momento que atravessamos não é mais do que o indicador desta evidência, com repercussões que aumentarão o fosso entre as camadas sociais que constituem a nossa comunidade. As restrições económicas que se anunciam não têm reflexos iguais para todos. Pelo contrário, agravarão vulnerabilidades já hoje existentes em grupos e comunidades que colocarão exigências nas respostas organizadas em Saúde a que, como cidadãos e enfermeiros, não podemos ficar alheios ou simplesmente transferir responsabilidades para outros. Não! Temos de ser, em

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J. r. garCia

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Sei que muitos são os enfermeiros que assumem no seu quotidiano este mandato, muitas vezes descurado e desvalorizado por quem decide. Mas temos de continuar e consolidar este caminho para o qual temos de ser capazes de garantir o suporte necessário para ultrapassar os escolhos que nele encontramos, nomeadamente no que respeita aos recursos a disponibilizar para concretizar os objectivos no quadro da nossa responsabilidade para com a comunidade. Mas também temos de desenvolver, por todos os meios ao nosso alcance, a necessária coesão de pensamento e práticas profissionais que suportem o reconhecimento da imprescindibilidade dos enfermeiros e dos cuidados que estes oferecem.

coerência com os fundamentos que decorrem da natureza da nossa profissão e da deontologia que lhe dá sentido, agentes activos e intervenientes.

Temos um desafio interno fundamental para este desiderato – o reforço da auto-regulação onde assume particular importância a implementação do novo Modelo de Desenvolvimento Profissional (MDP).

É da natureza da profissão a proximidade que os cuidados de Enfermagem envolvem.

Todos somos convocados para trilhar este caminho e vencer dificuldades externas e até internas que se levantarão na assunção das responsabilidades que a autonomia profissional nos exige.

Muitas das soluções para garantir os níveis de saúde dos cidadãos passam pelas respostas de proximidade e pelo envolvimento das pessoas e cidadãos, onde assume particular relevância a reorganização dos Cuidados de Saúde Primários (CSP) e o desenvolvimento e consolidação da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI). Estas são duas vertentes do sistema de saúde que, mais do que nunca, maior pressão vai sofrer num quadro de carências acrescidas.

Não podemos admitir que a responsabilidade colectiva que temos para com a comunidade seja beliscada pela instabilidade que políticas de restrições financeiras possam gerar junto dos enfermeiros, diminuindo a capacidade de resposta às necessidades em cuidados de Enfermagem e continuando a alimentar uma concepção de cuidados de saúde igual a cuidados médicos.

É nesta perspectiva que os enfermeiros são pilar essencial neste processo e não podem ser arredados dos patamares que envolvem a construção e realização destes processos, a todos os níveis do sistema de saúde. Contrariar esta tendência e intervir construtivamente significa não abdicar em nenhum patamar do sistema e assumir a responsabilidade que decorre do mandato social da nossa profissão.

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Estou certa de que conseguiremos fazer este caminho juntos, independentemente da área de actividade em que nos encontramos. Tudo isto porque entendemos a nossa responsabilidade essencialmente para com os cidadãos e a comunidade onde se inserem. Estou certa que o dia de hoje será um importante contributo para reforçar esta certeza. oe

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Conferência Inicial

Professora Doutora Elma Zoboli * Professora associada da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (USP), Brasil

No bojo da «responsabilidade para com a comunidade» estão ideias humanistas e valores morais, como a justiça social, os direitos humanos, o engajamento comunitário e a equidade. Na Enfermagem, a «responsabilidade para com a comunidade» remete-nos para questões relativas à responsabilidade social do enfermeiro. Ou seja, a responsabilidade do enfermeiro para com a justiça social, os direitos humanos, o acesso equitativo aos bens e serviços, o envolvimento em projetos comunitários e humanitários. E podemos perguntar: como enfermeiros que somos, o que temos nós a ver com o que se passa na sociedade? Minha responsabilidade é para com o meu paciente. Minha responsabilidade é dar conta dos meus protocolos. Minha responsabilidade é trabalhar bem, com dedicação, competência e afinco. É claro que tudo isso compõe a nossa responsabilidade como enfermeiros. Entretanto, parece que isso não é tudo. Vejamos alguns códigos de ética em Enfermagem. Em Portugal, o Código Deontológico do Enfermeiro, no Artigo 80.º, define que o enfermeiro tem deveres para com a comunidade, sendo responsável, junto com esta, pela promoção da

* Enfermeira. Professora visitante do Programa de Doutoramento em Enfermagem da Universidade Católica Portuguesa. Livre docente em Enfermagem, pela Escola de Enfermagem da USP. Pós-doutorada em Bioética na Universidade Complutense de Madrid. Doutorada em Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Pública da USP. Mestrado em Bioética pela Universidade do Chile. Mestrado em Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Pública da USP. Investigadora dos grupos de investigação: Modelos Tecno-assistenciais e a Promoção da Saúde (USP) e Centro de Investigação Interdisciplinar em Saúde (UCP). Vice -coordenadora do Grupo de Investigação Bioética e Saúde Coletiva.

saúde e a resposta adequada às necessidades em cuidados de Enfermagem. Os deveres para com a comunidade incluem: «Conhecer as necessidades da população e da comunidade em que está inserido»; «Participar na orientação da comunidade na busca de soluções para os problemas de saúde detectados»; «Colaborar com outros profissionais em programas que respondam às necessidades da comunidade». Ou seja, ultrapassando-se os limites da consulta, salienta-se o reconhecimento das necessidades de saúde da comunidade, que devem ser atendidas por meio do engajamento comunitário e na equipe de saúde(1). No Brasil, o Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem toma o compromisso com a comunidade como um dos seus princípios fundamentais: «A enfermagem é uma profissão comprometida com a saúde e a qualidade de vida da pessoa, família e colectividade»(2). Do Código de Ética para Enfermeiros do International Council of Nurses (ICN) destaca-se a corresponsabilidade – enfermeiro e comunidade – no desenvolvimento de acções voltadas para as necesidades da população, especialmente a mais vulnerável: «The nurse shares with society the responsibility for initiating and supporting action to meet the health and social needs of the public, in particular those of vulnerable populations»(3). Introduz-se a noção de justiça social como equidade, com a priorização dos mais necessitados ou vulnerabilizados. Também a Declaração de Política Social da Associação Americana de Enfermeiros (ANA) aborda noções de responsabilidade social. A ANA destaca, como parte das responsabilidades éticas

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Responsabilidade para com a comunidade

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dos enfermeiros, o enfrentamento das barreiras à saúde: a pobreza; as condições de vida inseguras; a violação; a falta de acesso aos cuidados; a violência. Isso reflete a crença da ANA no contrato social estabelecido entre a sociedade e a profissão da Enfermagem. Este contrato inclui direitos e responsabilidades; «confiabilidade» pública (public accountability); corresponsabilização enfermeiro-paciente; respeito pelos valores e crenças do paciente e do enfermeiro. Compreende-se que a política pública e o sistema no qual o referido contrato ocorre influenciam a saúde, o bem-estar da sociedade e a profissão da Enfermagem(4).

Entre 13 e 17 de Agosto de 2007, o Ministério da Saúde da Argentina realizou, em Buenos Aires, a Conferência «De Alma-Ata à Declaração do Milénio – Conferência Internacional de Saúde para o Desenvolvimento: Direitos, Factos e Realidades». O intuito era contribuir para a concretização dos Objetivos de Desenvolvimento do Milénio, propostos para 2015. Assim, os tópicos em discussão incluíram: «Cuidados Primários e sistemas de saúde no actual contexto global»; «Recursos humanos para o novo milénio» e «Equidade na saúde e financiamento». Transversalmente a esses temas, ressaltou-se a importância da força de trabalho em saúde.

É óbvio que há um vínculo «natural» entre profissionalismo e responsabilidade social ou responsabilidade para com a comunidade. Entretanto, em alguns casos esta ligação é mais próxima e assume o papel de construto importante na condução do próprio desenvolvimento da profissão e de seus membros. Esse é o caso da Enfermagem.

A Carta de Buenos Aires, documento final do evento, destacou o desafio que representa a tradução das diretrizes genéricas e totalizadoras das políticas públicas saudáveis, como a universalidade e integralidade, em projectos singulares que construam, realmente, a equidade(5).

De facto, a concepção de responsabilidade social está intimamente vinculada à Enfermagem. Encontra-se envolvida na tessitura da história da profissão, como reconhecem e explicitam os códigos de ética. Mais recentemente, produções na área de Enfermagem têm alertado os enfermeiros para que voltem a investir na justiça social, no activismo social, na sustentabilidade e no empowerment(4). E ainda que não fosse assim na história da Enfermagem, pensemos: somos profissionais da saúde. Como intervir para conseguir a saúde das pessoas sem transformar o que as faz menos saudáveis? A determinação social da saúde está esclarecida, demonstrada. A saúde foi reconhecida como um direito social e constitui-se como um dos elementos da cidadania, com a ideia central de qualidade de vida. Além do acesso aos serviços de assistência médica, a saúde requer relações sociais que possibilitem a boa qualidade de vida no quotidiano das pessoas. A saúde relaciona-se com a vida – e com uma vida bem qualificada, não com a sobrevivência, apenas.

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De Alma-Ata até agora, a equidade continua sendo um desafio para a humanidade. As desigualdades sociais expressam-se em iniquidades na saúde e constituem-se em ataques à nossa cidadania e dignidade humana, como assinala Amartya Sen: «Quando avaliamos, a nível mundial, as desigualdades na capacidade de escapar a doenças evitáveis, da fome que pode ser evitada ou da morte prematura, não estamos examinando apenas as diferenças no bem-estar, mas também nas liberdades básicas que valorizamos e apreciamos. Esse ponto de vista é importante (...) (na) análise da desigualdade»(6; p.118). Pelo seu trabalho, os enfermeiros ficam numa posição de intersecção privilegiada, na qual podem, simultaneamente, prover cuidado aos pacientes e testemunhar as forças sociais mais amplas que impedem ou promovem a saúde dos pacientes. Consequentemente, ao se disporem a dar conta de suas responsabilidades profissionais, os enfermeiros ficam obrigados a lidar com as estruturas sociais que afectam a saúde dos pacientes. Esta obrigação está profundamente encravada na identidade profissional do enfermeiro. Ao orientar-se para o bem-estar social, a Enfermagem torna-se numa profissão socialmente acreditada, confiável e reconhecida(4).

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Herdeiros de uma activista social: Florence Nightingale «Entristece-nos pensar que já na última década do século XIX conseguimos pouco progresso na nossa luta contra a pobreza, ainda que muitos nos tenhamos empenhado nisso com afinco. Algumas vezes, nossas avalições nos fazem descobrir que temos pauperizado ao invés de des-pauperizar»(7). Essa afirmação de Florence Nightingale, além de, infelizmente, se aproximar bastante da assertiva de Amartya Sen, feita séculos mais tarde, também, evidencia seu empenho pioneiro em denunciar as condições sociais desiguais e desfavoráveis à saúde da população. Florence salientava constantemente que era responsabilidade da Enfermagem estar atenta à relação entre pobreza e doença, empenhando-se para melhorar as condições de vida da população. A habilidade de Florence Nightingale para conectar a doença e a morte com as condições sociais – e o seu envolvimento activo em iniciativas para mudanças sociais – estabeleceram o cenário propício para a integração da responsabilidade social na educação e na prática dos enfermeiros(4). Frente à indignação que sentia quando se deparava com condições desfavoráveis à saúde e à vida humana, Florence não se omitia. Da indignação passava à justa ira(8) e buscava influir, despertar a sociedade para a relação entre doença e más condições de trabalho e moradia, engajando-se em iniciativas para melhorar a situação. Foi, assim, também pioneira na intersectorialidade. O exemplo de Florence Nightingale perdura e, ao longo do séc. XX, serviu de inspiração para muitas enfermeiras exercerem papéis de liderança em vários movimentos sociais, como a voz dos «sem voz»(4). Como na época de Florence Nightingale, hoje ainda muitas pessoas vivem abaixo do mínimo compatível com a dignidade humana. Assim, penso que persiste o nosso dever moral, a nossa

responsabilidade social de colocar a realidade em condições favoráveis para que nela possamos, todos, viver como pessoas, isto é, em condições compatíveis com nossa condição de humanos: a dignidade(9). Potência suficiente para uma vida saudável corresponde, em grande medida, a fomentar uma vida compatível com nossa «humanidade». Isto requer esforços de promoção da equidade no acesso aos bens e serviços. E para levar a cabo tais esforços, é preciso solidariedade. Eis aí o grande desafio na reversão das situações de iniquidade: fazer espaço para solidariedade em meio ao individualismo. Cada qual sente-se o centro do universo; seus desejos são os mais importantes; os outros estão ao seu serviço ou ao serviço de seu bem-estar. As nossas sociedades movem-se pelo individualismo hedonista. As pessoas unem-se por laços de uso instrumental a fim de satisfazerem seus desejos individuais(9). Nos cuidados, esta situação vê-se reforçada pelo entendimento da saúde como «estado de bem-estar». Desta visão da saúde decorrem: «quero estar bem» comigo mesmo, com meus sentimentos; «quero bem estar». E consome-se o «bem-estar em pílulas», antidepressivos ou em «soluções hidrantantes», ou em «repositores energéticos» que alardeiam «vida saudável», o «bem-estar revigorante». O sentimento abstrato de solidariedade universal é muito comum actualmente. Entretanto, a construção de lealdades num mundo atomizado é uma empreitada que requer de nós um empenho tenaz. O que temos assistido é ao triunfo do individualismo de seres que se autocompreendem, não como pessoas, como indivíduos em comunidade, mas como átomos separados, isolados, entre os quais convém estabelecer, unicamente, laços instrumentais. Parece que nossas democracias não se conformam por pessoas, e sim por átomos; seres atomizados, convencidos que o importante é extrair da vida o máximo possível de prazer, com o mínimo de dor. Nesta ordem das coisas, é mais fácil provocar, por meio de prédicas, um difuso sentimento de solidariedade universal, uma indignação abstrata diante das

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violações dos direitos humanos em terras distantes, do que gerar lealdades a comunidades e pessoas concretas ou construir responsabilidades com o entorno, com o mais próximo, com o necessitado que tem rosto e que me volta, concreta e diretamente, o olhar a pedir e esperar a minha solidariedade(10). Anteriormente destaquei que Florence Nightingale conclamava os enfermeiros à fidelidade para com sua responsabilidade social no enfrentamento da relação entre más condições de vida e danos à saúde. Essa sua habilidade em evidenciar a determinação social da saúde e da doença e para advogar mudanças no âmbito social estrutural assentou, como dissemos, as bases para a integração da responsabilidade social no âmago da Enfermagem, desde a formação inicial. Poderíamos dizer, guardadas as devidas proporções, que para Florence Nightingale a Enfermagem já se esboçava como uma prática social com valores de justiça, equidade e responsabilidade para com a comunidade. Entretanto, com a hegemonia do modelo biomédico de entendimento da saúde, a visão social de Florence Nightingale foi paulatinamente esquecida. Na Enfermagem, isso refletiu-se na focalização da atenção em questões relativas às práticas avançadas, com empenho crescente na melhoria das técnicas e procedimentos, sem que estes avanços, importantes e necessários à profissão, fossem acompanhados pelo engajamento dos enfermeiros para melhores condições de vida e de trabalho da população. Assim, «cuidados centrados no paciente»; «dedicar-se aos melhores cuidados» foram, miopaticamente, confundidos com «encerrar-se na unidade», «restringir-se à relação paciente-enfermeiro». Concorreram também para este afunilamento do foco no exercício profissional da Enfermagem: questões referentes às relações de género que acabam gerando subalternidade e desconforto com o poder; falta de conhecimentos que ultrapassem a compreensão biologicista da saúde; falta de tempo para o engajamento nas causas sociais devido à tríplice jornada que pesa sobre os ombros das mulheres trabalhadoras (maternidade, afazeres do lar e carreira profissional)(11).

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Porém, ao centrar as teorias e a atenção de Enfermagem, exclusivamente, nos cuidados ao corpo biológico, estamos traindo as origens modernas da Enfermagem, em sua profissionalização. Esta, como vimos, ocorreu no bojo de um forte engajamento social por melhores condições de vida e de trabalho, ancorado numa visão ampliada da saúde e seus determinantes sociais, ambientais e organizacionais. Assim, dedicar atenção ao cuidado biológico, sem olhar a pessoa ou dar atenção às pessoas de maneira isolada, sem compreender ou abranger seu entorno social e comunitário, ou ainda ficar restrito ao cuidado físico, sem visar o transcendente das pessoas, são maneiras inapropriadas de ser enfermeiro, de fazer-se presença no encontro de Enfermagem, que é um encontro de cuidado. Percorrendo alguns dos legados de Florence Nightingale, podemos reconhecer e resgatar a face da responsabilidade social da Enfermagem. Ela colocava toda a Enfermagem ao serviço do paciente. Contudo, não colocava todo o serviço da Enfermagem no paciente. É preciso um olhar mais acurado para o engajamento social, de cidadania e político de Florence Nightingale. Com alegria, considero que o centenário de sua morte, celebrado em 2010, motivou os enfermeiros a fazerem este percurso e a redescobrirem o engajamento comunitário e a responsabilidade social como pilares da profissão. A Iniciativa Nightingale para a Saúde Global1 (The Nightingale Initiative for Global Health – NIGH: Building a Worldwide Movement) é um movimento popular, inspirado na Enfermagem legada por Florence, que visa o aumento da consciência pública mundial quanto à prioridade da saúde e o empowerment dos enfermeiros e cidadãos interessados em lutar por um mundo saudável em todos os lugares. 1

http://www.nightingaledeclaration.net/

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Seguindo os passos de Florence Nightingale, a Iniciativa envolve-se em temas estratégicos para um mundo saudável: saúde pessoal; moradias e ambientes de trabalho saudáveis; convivência e entendimento intercultural; política internacional de saúde; determinantes sociais e ambientais da saúde. Na medida em que se desenvolvem os temas, a Iniciativa reúne interessados em colaborar e trabalhar em parceria para o enfrentamento dos

desafios a um mundo saudável, especialmente tendo em vista a escassez global de profissionais de Enfermagem e o impacto desta realidade sobre a saúde das populações. A fundadora da Enfermagem moderna também foi pioneira nas ciências da saúde, nas estatísticas de saúde, nas reformas sociais, no que actualmente chamamos «prática baseada em evidência», na Enfermagem holística, nas teorias de Enfermagem e na Saúde Pública. Na coleção de trabalhos de Florence Nightingale sobre Saúde Pública(7), o editor destaca a sua visão acerca dos cuidados de saúde como um sistema baseado em medidas positivas de promoção da saúde e prevenção da doença. Compreendia o cuidado de Saúde Pública de maneira sistémica e holística, com prioridade para promoção da saúde e prevenção das doenças. Entretanto, compreendia que mesmo com as melhores condições, alguns ainda ficariam doentes. E para lidar com a doença, J. r. garCia

A Iniciativa reaviva a perspectiva política e social do legado de Florence Nightingale: «NIGH recalls and celebrates the legacy of Florence Nightingale, the “Lady with the Lamp” who began her nursing career during the Crimean War and went on to establish the foundations of modern nursing and nursing education. Nightingale also became an articulate public communicator (...), community and social activist, environmentalist and ardent advocate for human rights and worldwide social reform. She influenced local, national and international leaders and fought to keep the issues related to health in the public eye. She called all of this “nursing”»(3).

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também propunha uma estratégia holística, integral e abrangente, com uma ordem hierárquica e sistémica de organização dos serviços. Primeiro, estava a visita domiciliar pela enfermeira e o médico. O hospital seria o último recurso; deveria ser usado o mínimo possível devido às altas taxas de mortalidade hospitalar. Propunha a integração do hospital geral de cuidados agudos, que estava na cidade, com os hospitais de convalescença, que ficavam fora. Para monitorar o sistema, apostava na estatística como meio de rastrear os resultados dos cuidados, a fim de assegurar que fossem os melhores para os pacientes e a alocação de recursos(7). Defendia a visita domiciliária como o primeiro recurso de cuidado, pois na família a enfermeira encontraria a pessoa em seu próprio ambiente, enquanto que nos hospitais e nas enfermarias, onde se podiam prover condições, era mais fácil estar limpo, arejado e arrumado. Ao encontrar os doentes em seus ambientes, o enfermeiro podia ensiná-los a ficar limpos, confortáveis e saudáveis, mesmo na escassez que enfrentavam em suas casas(7). Afirmava: «o que a Enfermagem tem de fazer é por os pacientes nas melhores condições possíveis para que a natureza actue sobre eles». E alertava: «normalmente, faz-se o contrário». E justificava, dizendo que era comum a compreensão de que o ar fresco, o silêncio e a limpeza eram extravagâncias, perigosas luxúrias que só deveriam ser dadas aos pacientes depois da panaceia da medicina(7; p.156). Florence Nightingale advogava que as pessoas não poderiam ser sadias a não ser que tivessem suas casas, seus locais de trabalho e suas comunidades, também, sadios. Para ela, o sofrimento maior do doente decorria da falta de elementos essenciais para sua recuperação (ar fresco, água limpa, calor, luz, limpeza e alimentação) e não tanto de sua doença. Por isso, defendia que a Enfermagem deveria ampliar-se para além do «administrar medicamentos» e incluir nos cuidados o essencial para a saúde. E, para Florence, os fundamentos da boa saúde da população eram: água e ar limpos; moradias decentes; boa nutrição; parto seguro; bons cuidados à criança.

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À época, muitos morriam das doenças veiculadas por água e ar contaminado. Florence trabalhava com a teoria miasmática de causação das doenças, pois entendia que a teoria biológica, além de ainda não estar demonstrada completamente, acabava por afastar os enfermeiros dos reais motivos do adoecimento da população(7). Moradias decentes eram raridades, mesmo para os ricos. A boa nutrição constituía um problema especialmente para os pobres, ainda que a falta de boas práticas na indústria de alimentos prejudicasse a todos. As taxas de mortalidade por «febre puérperal» eram extremamente elevadas, morrendo muitas mulheres e crianças no parto e pós-parto. Os bons cuidados à criança foi o objecto principal de sua obra Notes on Nursing(12). No livro, combatia abertamente o trabalho infantil, comum na época, defendendo que nenhuma criança deveria ser submetida ao trabalho, ainda que fosse o doméstico. Como disse anteriormente, Florence Nightingale colocava toda a Enfermagem ao serviço do paciente, mas não colocava toda a Enfermagem no serviço ao paciente. Ia além, voltava sua preocupação e acções para os determinantes sociais e ambientais da situação de saúde do paciente e da população. Seu pioneirismo ampliava sua visão não só para além do paciente, mas também a punha à frente de seu tempo. Os fundamentos para a boa saúde que defendia aproximam-se de algumas das Metas do Milénio, que incluem: acabar com a fome e miséria; educação básica de qualidade para todos; igualdade entre os sexos e mais autonomia para as mulheres; redução da mortalidade infantil; melhoria da saúde materna; combate a epidemias e doenças; garantia da sustentabilidade ambiental; estabelecer parcerias mundiais para o desenvolvimento(4). Florence Nightingale era uma «media expert». Exímia nas habilidades de comunicação, escreveu cerca de 14 mil cartas, principalmente após adoecer e ficar restrita aos seus aponsentos. Essa prática teve impacto na opinião pública, lutou por boas condições da Saúde Pública e terminou por mudar a forma como as pessoas entendiam e valorizavam essa questão.

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Correspondia-se com milhares de pessoas e influenciava os líderes políticos: «Let whoever is in charge keep this simple question in her head – (not, how can I always do this right thing myself, but) how can I provide for the right thing to be always done?»(13).

a segurança no trabalho. Destacou as doenças, a morte e a miséria causadas pelas más condições das fábricas, casas e oficinas, que não eram construídas para a finalidade que acabavam tendo. Julgava-as, por isso, mal ventiladas e lotadas(12).

Por certo, nos tempos actuais seria uma «adicta» das redes sociais na internet, pois queria mudar e influir a opinião pública e as lideranças quanto às condições de saúde e seus determinantes. Além da própria Rainha Vitória, influenciou outros tantos líderes, filantropos, cientistas sociais, políticos, militares, educadores e jornalistas, como uma «formadora de opinião».

Florence Nightingale era ambientalista convicta e combativa. Acreditava que bons ambientes determinavam a saúde das pessoas e encorajavam a recuperação do doente. Por exemplo, na zona rural, afirmava que para a limpeza dever-se-ia garantir bons suprimentos de água limpa em toda a extensão das propriedades(7). Assim, buscava influir e intervir nos determinantes ambientais da saúde e doença, por meio de propostas para a reorganização das propriedades rurais e dos processos de trabalho e produção.

Desafiava as enfermeiras e os líderes, em cada continente, a elevarem os padrões da atenção à Saúde Pública por meio de práticas qualificadas e humanistas, fosse na assistência domiciliar, hospitalar ou comunitária. Activista social, Florence engajou-se em campanhas para a melhoria das condições de saúde no trabalho, nas escolas, nas cidades, nas prisões, nos campos de batalha, no campo, nas fábricas, em vários países (China, Índia, Japão, África, Pacífico Sul, mundo árabe, Turquia, caribe, américas). Com isso, provocou melhorias nas condições dos cuidados em saúde e criou um modelo para cuidar dos doentes nos hospitais e domicílios, considerando as estruturas e a organização do sistema de saúde.

Nas cartas que dirigiu às «suas enfermeiras», conclamava-as ao autocuidado. Falava da Healthy Nursing. Acreditava que o autocuidado e a auto -renovação do enfermeiro, por meio de constante actualização pessoal, técnica e científica, eram vitais no sustento de uma Enfermagem efectiva e compassiva, o que Florence chamava: «a enfermagem saudável». Afirmava que se o enfermeiro não pode cuidar de si, não pode cuidar dos outros(14).

Florence Nightingale era bastante preocupada com a informação e a educação em saúde para a população. Em 1893, já afirmava aos enfermeiros: «You must inform public opinion»(14).

Lembremos que sua saúde era frágil. Florence Nightingale vivia em constante luta pela sua própria saúde, debilitada devido às más condições vividas na Guerra da Crimeia. A partir de 1895, ficou cega e retida ao leito. Nos últimos 15 anos de vida precisou de cuidados de Enfermagem constantes.

Acreditava que os pobres estavam mal informados ou muito apáticos para fazerem suas reivindicações chegarem às autoridades e então assumia a sua defesa. Talvez esteja aí uma das raízes da «Enfermagem advocacy».

Com a sua visão da saúde e da Enfermagem, fundou a Enfermagem moderna e criou um modelo de cuidado aos doentes e feridos e uma «escola» para a formação de enfermeiros pelo mundo.

Na edição de 1868 do livro Notes on Nursing & Notes on Nursing for Labouring Classes, destacou a importância da educação popular para baixar os custos com os cuidados à saúde. Nesta obra, deixou clara sua preocupação com a saúde ocupacional e

Era hábil e versada na Matemática e na Estatística. Entre outras coisas, Florence usou o gráfico de sectores (gráfico de «pizza»), que havia sido desenvolvido por William Playfair em 1801, para apresentar a informação de maneira que os factos sal-

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tassem à vista das pessoas. Assim, desenvolveu uma forma do gráfico, actualmente conhecida como diagrama de área polar. Era algo similar ao histograma circular e ilustrava a sazonalidade da mortalidade dos pacientes em hospitais nos campos de batalha. Florence não desenvolveu os gráficos, mas demonstrou como poderiam ser usados para retratar as condições de saúde e dos cuidados, a fim de acompanhar resultados, avaliar e promover mudanças. Com isso, acabou por popularizar seu uso na Saúde(7). Considerando seu pioneirismo na análise estatística e na apresentação gráfica da informação em Saúde, é provável que tenha salvo mais vidas com a Matemática, e seu uso engenhoso e combativo, do que com a lâmpada solitária(7). As conquistas de Florence Nightingale não significaram somente

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feitos inovadores e revolucionários nos campos da Enfermagem, da Matemática e da Saúde. Tudo o que conseguiu representou muito esforço e grande avanço para a realidade das mulheres no século XIX, quando viveu. Feminista, persuadiu o pai a estudar Matemática. Contrariou as expectativas, familiares e sociais, de um bom casamento, a fim de perseguir sua carreira na Enfermagem, profissão tida como não respeitável para as mulheres de então, especialmente, as de famílias abastadas como a de Florence. Em seu livro Suggestions for Thought to Searchers after Religious Truths, de 1859, Nightingale contestou a «sobrefeminização» (over-feminization) da mulher. Afirmava que esse comportamento era devastador, pois colocava as mulheres em situação de «incapazes de ajuda». Arguiu, fortemente, para que se remo-

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vessem as restrições que impediam as mulheres de terem suas carreiras profissionais(15). Acreditava que as enfermeiras deveriam ser educadas num programa formal e não exclusivamente na prática, como era usual na época. Assim, em 1860, fundou a Escola Nightingale (Nightingale School and Home for Nurses), no Saint Thomas’s Hospital, em Londres. Para isso, usou recursos financeiros que ganhou por seu trabalho na Guerra da Crimeia. Antes que abrisse sua escola, as enfermeiras constituíam um pessoal sem capacitação ou treinamento, pois seu trabalho era considerado uma tarefa servil. A Escola Nightingale marcou o começo da educação profissional na Enfermagem. Por meio de seus esforços elevou o nível científico e social da profissão aos melhores padrões de educação, em compatibilidade com as importantes responsabilidades que a Enfermagem tem nos cuidados à saúde, tanto aos pacientes como à Saúde Pública. Além da formação inicial, defendia a educação continuada dos enfermeiros. Afirmava que a Enfermagem só não perderia as conquistas que havia conseguido se os enfermeiros fizessem progressos constantes em sua formação, de maneira a resultar em melhorias das condições de saúde da população, dos ambientes dos lares e trabalho e dos próprios cuidados dispensados(14). Apregoava a segurança no cuidado, dizendo que a apreensão, a incerteza, a espera, as expectativas, o temor pelo inesperado prejudicavam mais o paciente do que qualquer aplicação(14).

que se aceite a autoridade imbuída nos melhores padrões definidos até então. Quem adentra a uma prática social tem de reconhecer o que é devido a quem; tem de estar preparado para assumir os riscos decorrentes da jornada na prática em que vai se iniciar. Assim, toda a prática requer um tipo de relação entre os seus participantes, em todos os tempos, que é mediada por virtudes como a justiça, a coragem, a honestidade e a confiança. Ingressar numa prática é passar a relacionar-se com os demais praticantes contemporâneos, mas também com os predecessores, especialmente aqueles cujas realizações expandiram o seu alcance até o presente. A autoridade decorrente da tradição dos predecessores tem que ser aprendida, com vista a pautar as relações presentes, de forma a transformá-las para o futuro(16). Ou seja, quem adentra a Enfermagem tem que dialogar com a tradição e o legado de Florence Nightingale. E tem de fazê-lo movido pela justiça, coragem, honestidade e confiança. Lembrando que o bem interno, o compromisso da prática de Enfermagem é o cuidado, considerado em sua amplitude individual e colectiva. O engajamento social do enfermeiro para a promoção da saúde tem de enraizar-se numa visão optimista, que acredite na potencialidade de uma sociedade na qual todas as vozes possam ser ouvidas; onde a justiça e a equidade sejam mais consideradas nas tomadas de decisão.

Fidelidade ao legado de uma jovem idealizadora A Enfermagem pode ser tida como uma prática social, no sentido definido por Alasdair MacIntyre(16). Para o filósofo, prática social é toda forma, coerente e complexa, de atividade humana cooperativa, socialmente estabelecida, cujos bens internos inerentes se concretizam em meio às tentativas de realização dos padrões de excelência apropriados à dita actividade. Quando alguém alcança o bem interno, todos envolvidos na prática social ganham. As práticas têm uma história e a iniciação de alguém em qualquer uma delas não pode acontecer sem

Afinal, a autoridade da tradição emana de uma predecessora que foi mulher activista social, política e ecológica; emancipada; mediática; formadora de opinião; autocuidadora; inovadora; feminista; filantropa; empreendedora; cuidadora integral e intersectorial. No coração humano, há vícios incrustados, como a glória, competição e a desconfiança. Vínculos de competição e desconfiança, decorrentes da ânsia pela glória, acabam por gerar ameaça e medo. Vínculos de concorrência entre uns e outros

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levam a relações que se resumem a pactos de manutenção da vida e propriedade(9). Somente vínculos de cooperação e reconhecimento cordial conduzem ao cuidado, bem interno da Enfermagem como prática social. Vínculos de «reconhecimento cordial» resultam em relações de preocupação e comoção pelo outro, pois compreendem e promovem a «comunhão na humanidade». Não estamos falando de se criar vínculos partindo do zero, como se não existisse laço anterior. De facto, o vínculo já existe pela realidade de nossa humanidade. É preciso darmo-nos conta de tal vínculo humano, pois ele está a clamar por seu reconhecimento(9). No reconhecimento cordial, a categoria básica do mundo social deixa de ser o indivíduo, para dar lugar a sujeitos que, reciprocamente, reconhecem-se enquanto tal, justamente por esse reconhecimento básico(9). Para um vínculo de cuidado, é essencial reconhecer: a interconexão e interdependência dos seres viventes; a responsabilidade mútua; a interpenetrabilidade das liberdades individuais. Florence Nightingale alertava suas enfermeiras para a necessidade de reconhecer o vínculo de comunhão humana, ao afirmar que viver isolado significava fazer-se fraco, infeliz, inútil ou egoísta14. O cuidado é construção colectiva; é práxis responsável de cidadãos morais engajados num projeto comum de cuidado. Os enfermeiros deveriam reconhecer-se como comunidade moral que, por sua vez, participa de uma outra comunidade: a sociedade. Isto constitui a cidadania moral. Um cidadão que se vê como agente moral é a pessoa que deseja ser feliz e faz todo possível para sê-lo, mas sabe que essa felicidade deve ser buscada no seio de uma sociedade na qual há-de comportar-se com justiça e compartilhar com os demais cidadãos tanto as cargas quanto os benefícios(10).

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O enfermeiro, fiel ao legado de Florence Nightingale, tem de ser presença no mundo. Presença que reconhece a si mesma como tal; que se renova; que intervém; transforma; fala do que faz e do que sonha. Ao ser presença, constata, compara, avalia, valoriza, decide e rompe para transformar. É no âmbito da decisão, da avaliação, da liberdade, da ruptura, da opção que se instaura a necessidade da ética e se impõe a responsabilidade(8). Mover-se pelo cuidado implica assumir uma atitude, um modo de ser essencial no qual a pessoa faz-se presença responsável e, sem se esquecer de si, sai de si mesma e centra-se no outro com desvelo e solicitude, compreendendo a complexa teia de inter-relações pessoais, sociais e ambientais que dá suporte e sustenta a vida, a fim de potencializar positivamente essas relações, por meio da comunicação inclusiva e da solução não-violenta dos conflitos na defesa e promoção da vida, especialmente dos mais vulneráveis. A Enfermagem precisa de perguntar-se: o que queremos? Manter as desigualdades em saúde ou transformá-las em fidelidade ao legado de Florence Nightingale? Considerando as iniquidades em Saúde, parece pertinente recobrar uma assertiva do educador brasileiro Paulo Freire sobre a moralidade dos sistemas: «É uma imoralidade, para mim, que se sobreponha, como vem se fazendo, aos interesses radicalmente humanos, os do mercado»(8). Isso remete-nos à questão ética, que trata do que deveria ser e não é; do que não é ainda real, mas temos a obrigação de fazê-lo real no menor tempo possível. Quiçá não o consigamos nunca, mas, ainda assim, persiste nossa obrigação(17). A meta da ética não é o correcto, mas sim o bom ou, ainda mais, o melhor, o excelente(18). Escrever a história da humanidade no que diz respeito aos direitos humanos, à justiça e às boas condições de vida e saúde é nossa responsabilidade; é responsabilidade social e ética que está em nossas mãos pelo legado de Florence Nightingale.

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Referências 1.

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A Enfermagem e a comunidade

Enfermeira Ana Paula Gomes Vogal do Conselho de Enfermagem da Ordem dos Enfermeiros

«Os cuidados de Enfermagem tomam por foco de atenção a promoção dos projectos de saúde que cada pessoa vive e persegue. Neste contexto, procura-se, ao longo de todo o ciclo vital, prevenir a doença e promover os processos de readaptação» após a doença. Procura-se, também, «a satisfação das necessidades humanas fundamentais e a máxima independência na realização das actividades da vida» diária. Procura-se, igualmente, «a adaptação funcional aos défices e a adaptação a múltiplos factores – frequentemente através de processos de aprendizagem do cliente»1. De acordo com a Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem – CIPE®, comunidade define-se como «(…) Grupo de seres humanos vistos como uma unidade social ou todo colectivo, composta por membros ligados pela partilha geográfica, condições ou interesses comuns. A unidade social constituída pela comunidade como um todo é vista como algo para além dos indivíduos e da sua relação de proximidade geográfica, partilha de condições ou interesses comuns, que constituem as partes do grupo». A comunidade, quer no sentido mais restrito de família / grupo, quer no seu sentido mais lato, comporta-se como um organismo vivo que nasce, desenvolve-se e morre, num processo dinâmico com ritmos próprios.

pessoas, ela é palco de numerosas e complexas relações e de múltiplos papéis. O enfermeiro, como actor neste palco, vê-se confrontado regularmente com novos desafios, devendo ser capaz de interpretar e acompanhar todos estes processos. Ele é simultaneamente um recurso e um elemento da comunidade, encontrando-se numa situação privilegiada de proximidade, garantindo a continuidade dos cuidados. Trabalha transversalmente com todos os grupos etários, ao longo do ciclo de vida, e o foco de abordagem pode ser o indivíduo, a família, grupos ou a própria comunidade no sentido mais lato. E porque tudo começa com a identificação dos problemas, façamos uma pequena apreciação do que acontece actualmente em Portugal. Ao longo das últimas décadas temos assistido a fluxos migratórios do interior do País para o litoral e das zonas rurais para as zonas urbanas. Surgem assim comunidades urbanas de grande densidade populacional na faixa litoral, constituídas pela maioria da população activa, com a consequente desertificação das comunidades rurais e do interior e com uma menor equidade no acesso aos recursos da comunidade.

É um «espaço elástico» que se retrai ou se expande, em constante mutação e para o qual contribuem factores políticos, sociais, de saúde e pessoais, entre outros. Sendo constituída por

O aumento da esperança média de vida e a diminuição das taxas de natalidade têm-se traduzido num envelhecimento progressivo da população, caminhando a passos largos para a inversão da pirâmide demográfica.

Padrões de Qualidade dos Cuidados de Enfermagem – Enquadramento Conceptual – Enunciados Descritos, Conselho de Enfermagem da Ordem dos Enfermeiros, 2001.

A organização familiar alterou-se, com diminuição das famílias alargadas e crescimento das famílias monoparentais. Esta rea-

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a comunidade como «objecto» dos cuidados de Enfermagem

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A descolonização e as novas leis de mobilidade no espaço europeu contribuíram para a entrada no País de pessoas de outras nacionalidades, constituindo hoje pequenas comunidades com alguma expressão. A multiculturalidade é, assim, um facto e mais um desafio. Por outro lado, o número de pessoas com doença de evolução prolongada aumentou, assim como aumentaram os factores de risco de saúde. Hábitos de vida mais sedentários e uma alimentação desadequada são alguns dos factores que mais têm contribuído para esta realidade. O acréscimo da incidência das doenças crónicas e as altas precoces introduziram um novo paradigma na organização dos cuidados de saúde ao retirarem do hospital a exclusividade dos cuidados de saúde diferenciados. De facto, hoje a pessoa no domicílio pode ser alvo / parceiro de múltiplos e complexos cuidados de saúde. Esta realidade exige do enfermeiro: • Assunção plena da imprescindibilidade dos cuidados de Enfermagem;

• • • • • •

Uma compreensão clara e objectiva dos fenómenos; Adaptação contínua; Aprendizagem constante; Maior mobilização de conhecimentos e saberes; Maior diferenciação de cuidados: Novas metodologias.

Conceitos como «respeito», «responsabilidade», «autonomia», «complementaridade», «negociação», «compromisso» e «parceria» são uma necessidade para o sucesso dos cuidados. A multiplicidade de necessidades em saúde, associadas ou decorrentes do que atrás foi mencionado, impõe uma diversidade de cuidados de Enfermagem na comunidade. É nesse entendimento que defendemos a garantia de cuidados de Enfermagem especializados em todas as áreas de especialidade em Enfermagem, quer as que respondem ao ciclo de vida, quer as que são transversais a todos os grupos. Consideramos que só desta forma podem ficar salvaguardadas as respostas necessárias e adequadas na procura permanente da qualidade dos cuidados. Em jeito de conclusão, podemos afirmar que a comunidade é um espaço privilegiado para o desenvolvimento dos cuidados de Enfermagem, impondo desafios constantes à perícia dos enfermeiros, proporcionando, simultaneamente, partilha e crescimento pessoal e profissional. oe J. r. garCia

lidade coloca maiores dificuldades no apoio da família aos seus elementos mais dependentes, obrigando ao surgimento de outras redes sociais de apoio.

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A Enfermagem e a comunidade

Enfermeiro Jacinto Oliveira Vice-presidente do Conselho Directivo da Ordem dos Enfermeiros

Em primeiro lugar queria prestar um tributo sentido a todos os enfermeiros portugueses que permitiram que estejamos aqui neste patamar. Tive alguma dificuldade em saber o que pretendia dizer perante o tema que me apresentaram. Sou especialista em Saúde Mental e Psiquiátrica e, portanto, a primeira inclinação foi a de falar dos laços e dos afectos, da sua importância na comunidade e de como eles se estão a perder. Temos, hoje, amigos virtuais e aos amigos virtuais não se pousa a mão no ombro. Por isso, desisti dessa abordagem. Apesar de ser um tema «árido» decidi falar de política. Devo dizer que enquanto preparava esta minha reflexão falei com a Senhora Bastonária sobre o que seria útil dizer e ela disse uma frase paradigmática que norteou uma parte considerável desta apresentação, nomeadamente o penúltimo ponto que irei focar e que se refere a «Olhar o futuro com liberdade». Conforme está inscrito no seu Estatuto (n.º 1 do Artigo 3.º), a Ordem dos Enfermeiros (OE) «tem como desígnio fundamental promover a defesa da qualidade dos cuidados de enfermagem prestados à população» e aqui engloba -se a comunidade. Quais são as atribuições da OE? «Contribuir, através da elaboração de estudos e formulação de propostas, para a definição da política de saúde» é uma delas, além das que constam do n.º 2 do Artigo 3.º do Estatuto da Ordem dos Enfermeiros (EOE). No n.º 3 do mesmo articulado incumbe ainda à Ordem representar os enfermeiros junto dos órgãos de soberania», designadamente nas acções tendentes ao acesso dos cidadãos aos cuidados de saúde e aos cuidados de Enfermagem.

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Mas mais: compete ao Conselho directivo «emitir parecer, por sua iniciativa ao pedido das entidades oficiais competentes, sobre as diversas matérias relacionadas com o exercício da enfermagem, designadamente sobre a organização dos serviços que dela se ocupam», leia-se dos serviços a prestar à comunidade. E ainda mais: há que relevar o Artigo 80.º do EOE, relativo ao dever para com a comunidade. «O enfermeiro, sendo responsável para com a comunidade na promoção da saúde e na resposta adequada às necessidades em cuidados de enfermagem, assume o dever de: – Conhecer as necessidades da população e da comunidade em que está inserido; – Participar na orientação da comunidade na busca de soluções para os problemas de saúde detectados; – Colaborar com outros profissionais em programas que respondam às necessidades da comunidade». Chegados aqui subleva desde já uma certeza: qualquer um de nós tem o dever de participar na definição das políticas de saúde relacionadas com a comunidade. Não são só os órgãos estatutários da Ordem. Não são só os enfermeiros dos sindicatos, nem os que ocupam cargos dirigentes. Todos e cada um têm o dever de participar ao seu nível na definição das políticas de saúde que melhor respondam às necessidades da comunidade que servimos. Questão prévia: Pode haver políticas de saúde não relacionadas com a comunidade?

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as políticas da saúde relacionadas com a comunidade

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Resposta pronta: Pode, mas estarão sempre condenadas ao fracasso.

comunidade e que vale a pena conhecer para verificar os ganhos em saúde.

Justificação: A definição das políticas de saúde terá de centrar-se sempre nas necessidades da comunidade, gizando acções que lhe respondam de forma efectiva.

A conjuntura política nacional e internacional tem pressionado cada vez mais no sentido da utilização mais eficaz e eficiente dos recursos disponíveis. E isso só se fará com estruturas de proximidade que coloquem em marcha o paradigma da saúde. Neste contexto, o PNS de 2011-2016 pode fazer a ruptura entre paradigmas, assim os enfermeiros a saibam aproveitar.

E quais são os dois grandes paradigmas que, por via da regra, são a ancoragem de qualquer política de saúde? O paradigma centrado na doença. É o modelo vigente. Cabe aqui uma outra reflexão dirigida a quem tem aproveitado a perpetuação deste modelo. E há um outro paradigma, o paradigma centrado na saúde. Diria eu, o modelo a construir. Este é o modelo que a Ordem perfilha. Já aqui foi aludido o «Atlas da Saúde» que não faz senão a avaliação da execução do Plano Nacional de Saúde (PNS) anterior. Mas é um livro muito interessante de ler.

Por último, há que considerar os desafios futuros para as políticas de saúde. Em primeiro lugar, as políticas de saúde devem centrar-se nos cidadãos e na comunidade, integrando-os, de facto, nos processos de tomada de decisão. Além disso, é necessária a adopção de modelos de proximidade, de cuidados dinâmicos, adaptando-os às necessidades regionais. Por outro lado, há competências de enfermeiros que não estão a ser aproveitadas e que se forem irão contribuir significativamente para aumentar os ganhos em saúde e sem agravamento de custos. Simultaneamente, deve-se apostar no aproveitamento das TIC (Tecnologias de Informação e Comunicação) e das redes sociais como ferramentas amigáveis de promoção da saúde. Por último, as políticas de saúde na comunidade devem promover a equidade no acesso, a proximidade, a integralidade (ou seja, serem integradas e integradoras) e a eficiência / sustentabilidade do sistema. oe J. r. garCia

Cada um de nós, os decisores e os legisladores têm feito sempre isto? Têm tomado sempre em linha de conta as necessidades das comunidades quando definem políticas de saúde? Nem sempre. E portanto, a Prof.ª Elma Zoboli também trouxe cidadania. Cada um de nós, para além de enfermeiro, é cidadão. Não pode deixar de participar – e hoje quase tudo está em discussão pública – em todos os momentos que lhe forem proporcionados, no sentido de melhorar as políticas e a definição das políticas relacionadas com a comunidade. Esse é um desafio. Esse é um desafio que, se aceite, constituirá um salto qualitativo para o desenvolvimento da nossa profissão. Temos que começar a falar de política.

Está cientificamente demonstrado que uma tensão arterial de 140/90 não tem influência na morbilidade e na mortalidade. Contudo, gastam-se milhões em medicamentos para reduzir esses valores. Este é um exemplo do paradigma centrado na doença. Um exemplo do paradigma baseado na saúde é a reforma dos Cuidados de Saúde Primários, mais concretamente as Unidades de Cuidados na Comunidade. Estas são unidades que permitem uma maior afirmação dos cuidados de Enfermagem junto da

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A Enfermagem e a Comunidade

Enfermeira Merícia Bettencourt Presidente do Conselho Jurisdicional Regional da Secção Regional da R. A. da Madeira e Vogal do Conselho Jurisdicional da OE

Falar acerca dos deveres dos enfermeiros para com a comunidade, tendo como ponto de partida o Código Deontológico do Enfermeiro (CDE – Decreto-Lei n.º104/98, de 21 de Abril, alterado pela Lei n.º111/2009, de 16 de Setembro), pressupõe que nos reportemos ao seu Artigo 80.º, o qual normaliza que «o enfermeiro sendo responsável para com a comunidade na promoção da saúde e na resposta às necessidades em cuidados de enfermagem, assume o dever de: a) Conhecer as necessidades da população e da comunidade em que está inserido; b) Participar na orientação da comunidade na busca de soluções para os problemas de saúde detectados; c) Colaborar com outros profissionais em programas que respondam às necessidades da comunidade». A estes deveres específicos acresce um outro dever em geral, o qual, e nos termos da alínea d) do Artigo 79.º do referido Código, preconiza que o enfermeiro assume o dever de «ser solidário com a comunidade, de modo especial em caso de crise ou catástrofe, actuando sempre de acordo com a sua área de competência». Estes deveres, por sua vez, assentam em valores universais a observar na relação profissional e em princípios orientadores da actividade do enfermeiro. Destaco, nos valores e nos termos do n.º 2 do Artigo 78.º do CDE, «a liberdade responsável (…) tendo em conta o bem comum», a justiça, o altruísmo, a solidariedade e a competência profissional. Como princípio saliento – nos termos do n.º 3 do Artigo 78.º – «a responsabilidade inerente ao papel assumido perante a sociedade». Este papel está explicitado no Artigo 4.º do Regulamento do Exercício Profissional dos

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Enfermeiros (REPE), Decreto-lei n.º161/96, de 4 de Setembro. Na conceitualização que apresenta sobre Enfermagem reporta-se à «(…) profissão que, na área da saúde, tem como objectivo prestar cuidados de enfermagem ao ser humano (…) e aos grupos sociais em que está integrado (…)». Por sua vez, quando se refere ao conceito de «enfermeiro» considera-o como «(…) o profissional habilitado (…) para a prestação de cuidados de enfermagem ao indivíduo, família, grupos e comunidade (…)». Com base nestes conceitos surge a operacionalização das intervenções dos enfermeiros (Artigo 9.º do REPE), que, entre outras, inclui a capacidade para os enfermeiros decidirem «(…) sobre técnicas e meios a utilizar na prestação de cuidados de enfermagem, potenciando e rentabilizando os recursos existentes, criando a confiança e a participação activa do indivíduo, família, grupos e comunidade». Assim, o alvo / cliente dos cuidados de Enfermagem inclui não só o indivíduo, como também o grupo família e o grupo comunidade. No entanto, a comunidade como cliente não tem sido de fácil integração na prática dos cuidados de Enfermagem (Stanhope & Lancaster, 2011). Os enfermeiros têm privilegiado os cuidados individuais e familiares na comunidade em detrimento dos cuidados à comunidade como alvo, isto porque o conceito de comunidade, sobretudo como alvo, não tem sido de fácil e cabal entendimento pelos enfermeiros e gestores. Importa aqui diferenciar os deveres e inerente responsabilidade do enfermeiro pelos cuidados que presta na comunidade e os

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Os deveres do enfermeiro para com a comunidade

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deveres e responsabilidade pelos cuidados prestados à comunidade como um alvo / cliente. Se na primeira situação os deveres referem-se aos inerentes aos cuidados aos indivíduos e às famílias, no segundo referem-se aos cuidados à comunidade em si, ao seu colectivo ou ao bem comum. Para Stanhope & Lancaster (1999), comunidade corresponde a um «(…) grupo social determinado por limites geográficos e / ou por valores e interesses comuns. Os seus membros conhecem-se e interagem uns com os outros. Funciona dentro de uma estrutura social particular, exibe e cria normas, valores e instituições sociais». Segundo a linguagem CIPE®, comunidade corresponde a «um grupo de seres humanos vistos como uma unidade social ou um todo colectivo, composta por membros ligados pela partilha geográfica, de condições ou interesses comuns (…)». A comunidade como alvo da prática dos enfermeiros tem sido vista, cada vez mais como tal, desde os anos 70 do século passado. Constituiu um marco importante a conhecida Declaração de Alma-Ata (Setembro de 1978) «Saúde para todos no Ano 2000», através da qual foram preconizadas estratégias amplas de intervenção em vez de estratégias orientadas individualmente no sentido de promover a saúde de todos. Tendo a comunidade como alvo de intervenção do enfermeiro, pressupõe que devamos considerar «saúde comunitária» e «trabalho em parceria» como conceitos-chave. Consideremos, igualmente, a importância do ambiente e da comunidade nos objectivos da saúde no sentido da sua promoção e protecção. Se à promoção da saúde concernem «as escolhas pessoais de saúde dentro de um contexto social» relacionadas com programas educacionais baseados na comunidade que se dirigem aos estilos de vida, a protecção da saúde está associada a «medidas ambientais ou reguladoras que conferem protecção aos grandes grupos populacionais». Neste sentido, temos como exemplo a diminuição das taxas de mortalidade e morbilidade, por exemplo, por infecções intestinais associadas a mudanças nos padrões de vida (individual) e a melhorias nas condições de vida, de sanidade e dos factores ambientais (colectivo).

Mas como cumprir com o dever de «Conhecer as necessidades da população e da comunidade em que está inserido»? A identificação do estado de saúde de uma comunidade deve assentar em dados que habitualmente estão disponíveis (idade, género, estatísticas vitais…), na produção de novos dados (conhecimentos, crenças, valores, sentimentos, necessidades, estruturas de poder, liderança e influência obtidos através de entrevistas e observação…) e na sua interpretação. Desta interpretação resultará a identificação dos reais problemas de saúde, das necessidades de intervenção, assim como dos recursos e capacidades da comunidade, com fundamento no qual se deverá desenvolver a intervenção dos enfermeiros de forma justa. Como agentes executando programas ou como parceiros na mudança, funcionando como seus catalizadores, considerando a adequação das intervenções aos problemas detectados, com mobilização, participação e envolvimento da comunidade, no respeito pela sua cultura e no sentido da sua capacitação para lidar com o autocuidado, com o controlo da sua saúde e do ambiente, o que corresponde ao dever de, nos termos da alínea b) do Artigo 80.º do CDE, «participar na orientação da comunidade e na busca de soluções para os problemas de saúde detectados». Acresce que, segundo concluíram Kennedy & al. (2008), a eficácia dos cuidados de Enfermagem comunitários depende do desenvolvimento de relações de confiança com os clientes de uma população ou comunidade e dos quais os enfermeiros deverão desenvolver um conhecimento profundo, adoptando para tal os métodos de organização do trabalho mais eficientes e eficazes. Se o diagnóstico e a intervenção são essenciais no cumprimento do dever para com a comunidade, a avaliação da intervenção a ela dirigida também o é. Urge questionar que efeitos tiveram as actividades ou os programas desenvolvidos? Os resultados dos cuidados de Enfermagem comunitários não são de fácil mensuração dados os contributos de outras áreas. No entanto, alguns autores como Alexander & Kroposki (1999) identificaram quatro domínios em que se fazem sentir tais resultados: componentes psicossociais (Exs: desenvolvimento

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de estratégias de coping, competências de autocuidado…) e física dos clientes (Exs: o cliente faz controlo sintomático, aumento do intervalo de tempo entre internamentos…), competências dos enfermeiros (Exs: gestão do regime terapêutico, prestação de cuidados centrados na família…) e segurança ambiental / comunitária (Exs: diminuição da exposição dos clientes a tóxicos ambientais domiciliários, diminuição de taxas de morbilidade…). Outros indicadores incluem: níveis de saúde e bem-estar individual e colectivo, diminuição das taxas de maternidade na adolescência ou de gravidez não planeada, de mortalidade infantil, obesidade, maus-tratos a crianças, a pessoas portadoras de deficiência ou idosos. Por outro lado, o incremento das taxas de adesão à imunização, ao aleitamento materno ou a programas de exercício físico constituem outros exemplos de resultados da intervenção comunitária dos enfermeiros. Mas «ser solidário com a comunidade, de modo especial em caso de crise ou catástrofe, actuando sempre de acordo com a sua área de competência» – alínea d), Artigo 79.º, do CDE – é, como inicialmente vimos, um dever do enfermeiro. A solidariedade, enquanto virtude que dispõe as pessoas a proteger e a promover o bem comum, afirma a determinação de se empenhar em benefício comum (Ordem dos Enfermeiros, 2005) e na procura e respeito pela dignidade humana, sem compromisso ou vínculo com o materialismo (Teles, 2008). Foi o que, na minha perspectiva, praticaram muitos enfermeiros aquando da catástrofe que assolou a Ilha de onde provenho – Madeira, a 20 de Fevereiro de 2010, e cujos testemunhos julguei ilustrativos.

Testemunho de um enfermeiro do Serviço de Urgência hospitalar «Estava em casa e uma colega ligou-me a dizer que não podia ir trabalhar pois tinha água até aos joelhos. Achei estranho tanta chuva e resolvi ir à Urgência ver se estava tudo bem. Quando cheguei já tinham entrado oito vítimas. Apesar de não estar de serviço senti que tinha de planear cuidados para ajudar os colegas… não havia comunicações, não se conseguia contactar nin-

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guém. Era necessário preparar os colegas para continuar ao serviço… estivemos sem contacto com a família até às 22H30. Começámos a fazer o que era possível. Entretanto começaram a chegar muitos colegas. Com esta necessidade de colaborar todos puseram a família em segundo lugar. Havia um grande silêncio e pelo silêncio sentia-se que algo de grave se passava… não saber quantas mais pessoas seriam vítimas era uma grande preocupação. Houve um grande empenho de todos os profissionais. Enfermeiros de outros serviços iam lá ter e perguntavam em que podiam ajudar, mas não só enfermeiros: auxiliares, médicos, os das redondezas do Hospital, até tínhamos alunas. Não conseguíamos falar com as famílias. Procurei zelar pela sua segurança, alimentámo-las, ajudaram a dar alimentação aos doentes e a colocar cobertores. Coisas importantes. A preocupação com as vítimas foi escutar, tratar o físico… a vida estava em risco, mas também foi preciso atender ao emocional. Havia um grande silêncio. Foi um dia de choque e de grande tristeza. Fui para casa à 1H00 da manhã e no dia seguinte entrei às 8H00 e saí à meia-noite. Experienciei a solidariedade para com os colegas e como dever profissional, a empatia para com as pessoas que perderam o que era seu, consternação pela perda de tantas vidas humanas e a incerteza. Havia um clima de insegurança devido ao tempo e à possibilidade de mais tragédias…».

Testemunho de uma enfermeira de uma Casa de Saúde que acolheu pessoas desalojadas «Foi um pânico, uma angústia. Não estava habituada a ver semelhantes imagens. Eu disse que estávamos disponíveis para acolher pessoas – nestas circunstâncias ninguém pode fechar as portas. Em tempo de sofrimento não se fecham portas. Sentimos sofrimento, mas também gratidão por podermos ajudar os irmãos mais necessitados. As pessoas chegavam à recepção acompanhadas. Traziam apenas um saco de plástico na mão, fazia impressão vê-los sem

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nada. Deu-me um ataque de choro por constatar aquela tristeza: as pessoas chegavam tristes mas serenas, sem revolta, não exteriorizavam a angústia. Sentiam-se a salvo por ter um tecto e alguém que os acolhia e protegia. Alguns diziam que o importante era ter saúde pois havia outras pessoas que estavam muito pior. Providenciámos espaços de privacidade. Algumas quiseram tomar banho e ficaram muito agradecidas de ter água quente. Procurámos individualizar os cuidados, providenciaram-se colchões e a nossa presença física.

procura de uma criança que tinha desaparecido. Vinha com muita esperança que a tínhamos connosco. Infelizmente não a tínhamos. Foi muito triste. Ninguém pode ficar sem cuidados. O que fizemos foi dar um pequeno contributo da nossa parte para a comunidade… fazer bem o Bem. Tínhamos de o fazer: ajudar quem mais precisa».

Recebemos cerca de 30 pessoas e não as vamos mandar embora, como é óbvio. Uma delas teve de ir identificar familiares. Depois dizia que nunca iria esquecer as imagens que tinha visto: uma irmã, a filha e a neta. Dava a impressão que a avó estava com os braços à volta da neta, a protegê-la. Também fomos ao funeral de familiares de uma irmã. Chorámos muito, sem ter palavras de consolo que se pudessem dizer – nestas horas o que se diz? Fica-se sem palavras.

«Sem perceber o que se estava a passar, vi na portaria pessoas encharcadas, descalças, desnudadas. Foi preciso acolher as pessoas, proporcionar banho, roupa adequada. Havia muita ansiedade pela perda de familiares ou porque não sabiam das famílias. Fizemos uma lista que estava sempre a ser actualizada porque entravam sempre mais pessoas. Os serviços da Câmara ajudaram… as pessoas viram que alguém se preocupava com elas. À tarde tínhamos 48 pessoas. Depois, de um momento para outro eram 116/118. A Cáritas e o RG3 ajudaram-nos muito. O nosso lema era “quem chegar à nossa casa não fica na rua”. Aquilo era uma dor de alma e não dá para grandes discursos: abriram-se as portas e prestaram-se os cuidados com a preocupação de não massificar, de prestar cuidados individualizados. J. r. garCia

Como havia crianças, os enfermeiros passavam várias vezes pelas instalações para ver como estavam os meninos. Gerou-se um clima de grande confiança e solidariedade, conversámos muito com elas. Uns dias depois apareceu-nos um senhor à

Testemunho de um enfermeiro de uma Casa de Saúde que acolheu pessoas desalojadas

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Desenvolveu-se uma ajuda que não imaginávamos. O problema foi quando nos chegaram bebés – não tínhamos com que os alimentar. O que era burocrático foi tudo “furado”. Foi uma lição e experiência que eu não gostava de ver mais, mas não a trocaria por nada. Só “acordei” na 2ª feira e chorei muito e ainda bem, porque se fosse no sábado teria ficado sem condições para cuidar das pessoas. Tivemos que gerir os silêncios e as palavras. Tentámos manter a dignidade das pessoas. Não foi preciso organizar horários – as pessoas disponibilizaram-se para trabalhar em turnos sem qualquer recompensa. Os sentimentos de solidariedade vieram ao de cima. Nas desgraças as pessoas são mais solidárias. Ao jantar uma criancinha disse: “eu quero a minha avó”. Só “anestesiado” é que se consegue lidar com isto. O imprevisível cria um “montão” de energias e a nossa capacidade de resposta é impressionante. Não tínhamos a noção da capacidade que temos. Algumas pessoas já nos vieram visitar…».

Testemunho de um enfermeiro de Serviço de Internamento hospitalar «Os doentes é que nos começaram a alertar – estavam a ouvir as notícias. Começámos a tentar contactar as nossas famílias: uns conseguiram, outros não. Consegui contactar a minha mulher, mas não a minha mãe, que é de Santo António. Os colegas que iriam fazer tarde telefonaram-nos que não podiam passar. Uma colega ainda solicitou um táxi, mas a meio do percurso o taxista disse que não arriscava. Contactámos a Enfermeira Chefe e fizemos uma task-force. A colega mais velha começou a coordenar a distribuição do trabalho a ver quem continuava o turno da tarde e quem iria fazer a noite. Os doentes estavam muito ansiosos: não conseguiam contactar a família. De noite estavam sempre a tocar as campainhas. Dois doentes da RB estavam em pânico, a contra-informação fazia mal. Foi preciso manter a concentração e ter sangue frio para manter a calma.

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Nós dissemos às colegas que ficassem em casa porque as estradas estão a desabar e nós aguentámos. Criámos as condições para que as AO ficassem. Tivemos que gerir muito bem a alimentação e a roupa. Os funcionários foram ao bar e “limparam” tudo. O pior foi gerir a parte emocional. Uma colega arriscou e foi trabalhar. Atravessou a Fundoa. Tem um carro resistente. Assim uma colega cuja mãe foi evacuada pôde descansar de noite. Tivemos sorte porque tínhamos duas enfermeiras experientes, conseguimos, somos humanos, mas tivemos a capacidade de gerir as coisas para que os doentes beneficiassem dos cuidados com o mínimo de qualidade. E também conseguimos gerir outros grupos profissionais. Um aspecto importante é saber que a família está bem. A colega que não sabia da família só fazia tarefas, não se responsabilizava pelos doentes. Alterámos todo o método de trabalho. Foi uma lição. Pudemos ver a entreajuda das pessoas, todos sem excepção. Os doentes não se sentiram abandonados e reconheceram o facto de termos ficado 24 horas. Disseram-nos isso mesmo». Bem-haja todos os enfermeiros do País e do mundo que, liderando ou em complementaridade com outros profissionais, contribuem para o bem-estar individual e da comunidade onde desenvolvem a sua actividade profissional, no cumprimento dos deveres e desempenho do papel social que deles se espera!

Bibliografia Alexander, J. & Kroposki, M. (May, 1999). Outcomes for Community Health Nursing Practice. Jona, 29 (5), 49-56. Conselho Internacional dos Enfermeiros (2006). Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem (CIPE® / ICNP®) Versão 1. Lisboa: Ordem dos Enfermeiros. Kennedy, C. et al. (Dec 2008). Establishing the contribution of nursing in the community to the helth of the people of Scotland: integrative literature review. Journal of Advanced Nursing, 64 (5), 416-439. Ordem dos Enfermeiros. (2005). Código Deontológico do Enfermeiro: Dos Comentários à análise de Casos. Lisboa. Portugal, Assembleia da República. Lei n.º 111/09 de 16 de Setembro. Portugal, Governo da República. Decreto-Lei n.º 104/98 de 21 de Abril. Portugal, Governo da República. Decreto-Lei n.º 161/96 de 4 de Setembro. Stanhope, M.& Lancester, J. (1999). Enfermagem Comunitária: Promoção da Saúde de Grupos, famílias e Indivíduos. Loures: Lusociência. Stanhope, M.& Lancester, J. (2011). Enfermagem de Saúde Pública: Cuidados de Saúde na Comunidade Centrados na População. Loures: Lusociência. oe

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O Agir Ético na Comunidade

Problemas éticos na comunidade Docente do Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Católica Portuguesa – Porto

Nesta comunicação apresenta-se, de forma sucinta, alguns aspectos focados na literatura acerca da ocorrência de problemas éticos em Cuidados de Saúde Primários (CSP): – que instrumento temos para avaliar esta ocorrência? Que resultados existem neste momento? No que respeita a problemas éticos na área dos CSP, os estudos referem: – «Lidar com problemas éticos na prática avançada deverá ser uma preocupação para a enfermagem» (Laabs, 2007 p. 795); – «Comparando com o dramático, urgente, cenário de vida ou morte que tende a caracterizar a enfermagem hospitalar, os problemas éticos nos cuidados primários estão inclinados para ser subtis, mundanos e difíceis de discernir, sejam comuns ou complexos» (Laabs, 2007 p. 796). Duncan, citado por Oberle (Oberle, et al., 2000 p. 426), identificou e categorizou os seguintes problemas éticos de 30 enfermeiros comunitários a trabalhar em meio rural e urbano da Colúmbia Britânica: direitos dos clientes; interacções enfermeiros com colegas (especialmente com alocação de recursos); actuação de Enfermagem em consonância com valores; a própria área de actuação; a identificação sobre qual deveria ser o foco de atenção: – o indivíduo, a família ou a comunidade. O mesmo autor indica, ainda, a necessidade de identificação da fonte dos problemas éticos e formas de lidar com esses problemas na prática. Reforçando esta ideia, Elma Zoboli (Zoboli, 2003) alerta que a ocorrência de falhas na identificação dos problemas éticos na

«atenção primária» pode colocar em risco a assistência de saúde nos CSP, rompendo o vínculo estabelecido entre os profissionais de saúde e os utentes.

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Enfermeiro João Neves-Amado

Sistematizando, Zoboli divide os possíveis problemas éticos na «atenção primária» / Cuidados de Saúde Primários como: problemas éticos na relação clínica-assistencial; problemas éticos nas relações de trabalho; problemas éticos de outros tipos. Mas sabemos como se identificam estes problemas? Conseguimos fazer os profissionais de saúde reflectir em quantas vezes se confrontam com esses problemas? Servirá simplesmente saber que existem problemas éticos e que estes confrontam constantemente os profissionais de saúde? É pelo repensar no que aconteceu que todos nós vamos criando a capacidade de analisar tudo o que passa, tudo quanto contactamos… É neste analisar que vão surgindo necessidades de procura de conhecimento e de criação de estratégias de resolução dos problemas baseadas em conhecimento científico. Para Sugarman, «por problema ético compreendem-se os aspectos, as questões ou as implicações éticas de ocorrências comuns na prática da atenção à saúde nas unidades básicas, não configurando, necessariamente, um dilema» (Zoboli, 2003). Silva adopta, no seu estudo, a definição de Diego Gracia respeitante a problema ético: «qualquer situação que assim fosse tida por pelo menos um dos entrevistados» (Silva, 2008 p. 22; Gracia, 2001).

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Existem problemas éticos nos CSP? É possível avaliar a sua ocorrência? Como se identificam? Far-se-á os profissionais de saúde pensar em quantas vezes se confrontam com esses problemas? Servirá apenas dizer que existem problemas éticos e que os profissionais de saúde são, por eles, constantemente confrontados?

cuidados de saúde, especialmente nos CSP, surge a necessidade de disponibilizar um instrumento para o efeito.

A literatura alerta-nos que os problemas éticos em Cuidados de Saúde Primários são «subtis, mundanos e difíceis de discernir» (Laabs, 2007 p. 796). Mas se, como estratégia, fizermos recurso a uma escala de avaliação da ocorrência de problemas éticos, fácil de preencher, clara e objectiva, levar-se-á os profissionais de saúde a pensar no seu quotidiano, a identificar as situações comuns e a procurar a resolução dos mesmos para uma melhor prestação de cuidados.

Como resultado da adaptação surgiu o «Inventário de Problemas Éticos – Atenção Primária de Saúde (Portugal)» ou simplesmente IPE – APS (PT) que demonstrou ter subjacente: um cuidado do ponto de vista gramatical e semântico adaptado à língua e cultura portuguesas; ser de fácil aplicação; apresentar uma listagem de 39 problemas éticos.

Da constatação da inexistência em Portugal de instrumentos de medida que avaliem a ocorrência de problemas éticos nos

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Após a identificação da existência, no Brasil, do instrumento pretendido, procedeu-se à adaptação do mesmo para a população portuguesa.

De notar que o instrumento (tanto o original como o adaptado) pode ser dividido em três áreas: problemas éticos nas relações com os clientes e famílias; problemas éticos nas relações entre as equipas e problemas éticos nas relações com o sistema de

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Decorrente deste estudo, como considerações metodológicas, refere-se que: – concluída e disponibilizada que esteve a adaptação do instrumento, procedeu-se à aplicação do mesmo a uma amostra de conveniência a profissionais de saúde, tanto a médicos como a enfermeiros; – a aplicação foi realizada em formato quer de papel, quer digital; – o instrumento apresentado, quanto aos resultados, foi analisado de duas formas: a) se o respondente considera ou não problema ético o enunciado; b) se sim, com que frequência o encontra no seu dia-a-dia. Quanto aos resultados da investigação, obtiveram-se 91 respostas: 17 de médicos (8 do sexo masculino e 9 do feminino) e 74 de enfermeiros (13 do sexo masculino e 61 do feminino).

Nesta comunicação apenas serão explorados os dados relativos às respostas dos enfermeiros, apresentando as percentagens das suas respostas e, quando existente, as categorias com as quais foram identificadas relações estatisticamente significativas. Relativamente à identificação dos enunciados apresentados como sendo problemas éticos passíveis de ocorrerem no âmbito da prática em CSP, os enfermeiros identificam-nos em 84% dos casos. Apresentam-se, no Quadro I, os 10 enunciados mais referidos como sendo problemas éticos. Relativamente à frequência com que os enfermeiros se deparam com os problemas éticos identificados apresentam-se, no Quadro II, os 10 mais assinalados com «ocasionalmente» e «frequentemente». Da análise dos dados ressalta ainda que a área em que mais são identificados os enunciados como problemas éticos diz respeito a «problemas éticos nas relações entre as equipas». Quanto à frequência com que ocorrem, a maioria dos enfermeiros escolhe a opção «Nunca». Poderemos questionar-nos se traduzirá a boa J. r. garCia

saúde. O instrumento faz uso de uma escala de frequência nominal, evitando a associação de pesos ou valores numéricos a cada uma das categorias.

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Quadro I – Os 10 enunciados mais referidos como sendo problemas éticos Enunciado do problema (número do enunciado) Omitir ao utente informações referentes ao seu estado de saúde (9)

% 100

Transmissão de informações sobre a saúde de um dos membros da família aos restantes (12)

100

Omissão de pedido de autorização à família para relatar a história do utente em publicação científica (33)

99

Atitude do médico perante os valores religiosos próprios e dos utentes (29)

99

Falta de respeito no tratamento do utente pelo profissional (3)

97

Discussão, por parte da equipa, das condições de saúde do utente na frente deste e sem que o mesmo participe (32)

97

Pedidos à equipa, por parte de menores de idade, de procedimentos e exames sem a autorização ou o conhecimento dos pais (30)

96

Quebra do sigilo médico por outros membros que não são da equipa, ao publicarem casos (35)

96

Publicação de um caso por um especialista de referência sem a autorização da equipa de prestação de cuidados de saúde à família (36)

96

Prévio ajuizamento dos utentes dos serviços por parte das equipas (2)

95

Relação com Profissão Profissão

Tmp CSP

Profissão, Sexo

Legenda: Tmp CSP – Relação estatisticamente significativa com «Trabalha em Cuidados de Saúde Primários há».

relação existente entre os profissionais da equipa ou se, até ao presente, ainda não surgiram situações de confronto grave. Como conclusão, esta investigação originou a adaptação de um instrumento para a avaliação de problemas éticos e reconheceu a emergente importância que o tema merece para o profissional de CSP. Da mesma, decorre a necessidade de se continuar a investigação nesta área e aprofundar os conhecimentos específicos com novos estudos. Especialmente porque, como também apontou este trabalho, há poucos estudos e publicações sobre a ética nos CSP.

Bibliografia Gracia, Diego. Moral deliberation: The role of methodologies in clinical ethics. Medicine, Health Care and Philosophy; 2001, Vol. 4, pp. 223-232.

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Quadro II – Os 10 problemas éticos mais assinalados como «ocasionalmente» e «frequentemente» encontrados no decorrer da prática Enunciado do problema (número do enunciado)

%

Relação com

Dificuldade em convencer o utente a dar continuidade ao tratamento (8)

91

Tmp Formação, Tmp CSP

Prévio ajuizamento dos utentes dos serviços por parte das equipas (2)

89

Falta de apoio com acções intersectoriais para discutir e resolver os problemas éticos (21)

88

Recusa, por parte dos utentes, para seguir as indicações médicas ou fazer exames (31)

87

Excesso de famílias atribuídas a cada equipa / profissional (23)

87

Utente solicita ao médico e ao enfermeiro os procedimentos que deseja (7)

86

Dificuldades e falta de recurso (no sistema de saúde) para realizar exames complementares (26)

82

Prescrição de medicamentos mais caros mesmo que apresentem eficácia igual à dos mais baratos (6)

79

Idade

Prescrição de medicamentos que o utente não poderá comprar (5)

78

Sexo

Dificuldade na delimitação do papel e das responsabilidades de cada profissional (17)

78

Legenda: Tmp Formação – Relação estatisticamente significativa com «Formado há» | Tmp CSP – Relação estatisticamente significativa com «Trabalha em Cuidados de Saúde Primários há».

Laabs, Carolyn Ann. Primary care nurse practitioners’ integrity when faced with moral conflict. Nursing Ethics; 2007, Vol. 14 (6), pp. 795-806. Neves-Amado, João. Avaliação da Ocorrência de Problemas Éticos em Cuidados de Saúde Primários. Instituto de Ciências da Saúde, Universidade Católica Portuguesa. Porto: Universidade Católica Portuguesa; 2010. Dissertação de Mestrado apresentada para obtenção do grau de Mestre em Enfermagem, na Especialidade de Enfermagem Avançada. Oberle, Kathleen and Tenove, Sandra. Ethical Issues in Public Health Care. Nursing Ethics; 2000, Vol. 7 (5), pp. 425-438. Silva, Luana Torelli. Construção e validação de um instrumento para a avaliação de ocorrência de problemas éticos na atenção básica. Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo. São Paulo: s.n.; 2008. Dissertação para obtenção do título de Mestre em Enfermagem. Zoboli, Elma; Lourdes, Campos Pavone. Bioética e Atenção Básica: um estudo de ética descritiva com enfermeiros e médicos do Programa Saúde da Família. Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo. São Paulo: s.n.; 2003. Tese de doutorado apresentada para obtenção de Grau de Doutor. oe

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O Agir Ético na Comunidade

Enfermeiro Carlos Martins Presidente da Mesa do Colégio da Especialidade de Enfermagem Comunitária da Ordem dos Enfermeiros

Talvez nunca tenha sido tão actual como agora a reflexão proposta neste Seminário, nesta mesa redonda e, em concreto, a que me foi proposta fazer enquanto Presidente da Mesa do Colégio da Especialidade de Enfermagem Comunitária: a responsabilidade do enfermeiro de Enfermagem Comunitária na prestação de cuidados na comunidade. As perspectivas que o futuro próximo nos coloca sugerem-nos as cada vez maiores dificuldades dos cidadãos em garantir o seu bem-estar e a satisfação das suas necessidades básicas. Na profissão de Enfermagem, o «objecto» de atenção é a Pessoa e esta atenção é visível em actos – actos esses em que tornamos explícitos, para nós e para os outros, os nossos valores. E daqui resulta a nossa responsabilidade ou capacidade de: • Responder pelos princípios e valores presentes e definidos nos diferentes documentos que sustentam o nosso sistema de saúde e orientam a nossa acção (Plano Nacional de Saúde, Serviço Nacional de Saúde, reconfiguração dos centros de saúde, Código Deontológico, …); • Responder ao objecto da nossa atenção, ou seja às pessoas utilizadoras dos serviços de saúde, elementos-chave de um sistema de saúde. Nos últimos anos, as mudanças no perfil demográfico, nos indicadores de morbilidade e a emergência das doenças crónicas têm-se traduzido em novas necessidades de saúde, pelo que tem sido reconhecido o papel determinante dos Cuidados de Saúde Primários (CSP), com ênfase na capacidade de resposta na resolução dos problemas colocados pelos cidadãos, no sentido de formar uma sociedade forte e dinâmica. Nesta perspectiva, o

enfermeiro especialista que presta cuidados na comunidade, fruto do seu conhecimento e experiência clínica, assume um entendimento profundo sobre as respostas humanas aos processos de vida e aos problemas de saúde. Possui uma elevada capacidade para responder de forma adequada às necessidades dos diferentes clientes (pessoas, grupos ou comunidade), proporcionando efectivos ganhos em saúde. No seu percurso de formação inicial e especializada, o enfermeiro especialista em Enfermagem Comunitária adquiriu competências que lhe permitem participar na avaliação multicausal e nos processos de tomada de decisão dos principais problemas de Saúde Pública e no desenvolvimento de programas e projectos de intervenção com vista à capacitação e empowerment das comunidades na consecução de projectos de saúde colectiva e ao exercício da cidadania. A definição do perfil de competências do enfermeiro especialista surge como um imperativo não só enquanto enquadramento regulador para a certificação de competências, mas também como forma de comunicar aos cidadãos os padrões de cuidados que podem esperar, sendo assim também uma forma de os tornar mais informados e exigentes quanto aos cuidados a que têm direito. Os enfermeiros intervêm em múltiplos contextos, assegurando o acesso a cuidados de saúde eficazes, integrados, continuados e ajustados, nomeadamente a grupos sociais com necessidades específicas, decorrentes de contextos marcados por condições economicamente desfavoráveis ou por diferenças étnicas, linguísticas e culturais.

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a prestação de cuidados na comunidade

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A recente reforma dos Cuidados de Saúde Primários (Decreto-lei n.º28/2008 de 22 de Fevereiro) propõe uma reorganização dos centros de saúde onde a criação de unidades funcionais tem por missão garantir a prestação de cuidados de saúde primários à população de determinada área geográfica. Das várias unidades propostas, a Unidade de Saúde Familiar (USF) ou a Unidade de Cuidados de Saúde Personalizados (UCSP), a Unidade de Saúde Pública (USP) e a Unidade de Cuidados na Comunidade (UCC) preocupam-se em intervir nos factores que determinam o estado de saúde de uma população. Ao atingir a estabilidade na organização de Cuidados de Saúde Primários, obter-se-á uma gestão mais rigorosa, equilibrada, ciente das necessidades das populações e, acima de tudo, a melhoria no acesso aos cuidados de saúde, centralizados no cidadão / comunidade, para se poderem alcançar maiores ganhos em saúde.

doença e dos seus determinantes ao longo do tempo na área geodemográfica do Agrupamento de Centros de Saúde (ACES) em que se integra, competindo-lhe, designadamente, elaborar informação e planos em domínios da Saúde Pública, proceder à vigilância epidemiológica, gerir programas de intervenção no âmbito da prevenção, promoção e protecção da saúde da população em geral ou de grupos específicos. Resulta deste enunciado a preponderante intervenção do enfermeiro especialista no domínio da Saúde Pública no observatório de saúde da população de uma determinada área geodemográfica e na recolha de indicadores pertinentes à tomada de decisão política e à definição de prioridades em saúde, para além da coordenação e monitorização de diferentes programas que integram o Plano Nacional de Saúde.

As USF / UCSP são peças centrais de um sistema acessível, eficiente e equitativo. Tendo por base o trabalho em equipa, a intervenção dos enfermeiros integra-se na resposta multiprofissional e multidisciplinar que a saúde, enquanto fenómeno multifacetado e de grande complexidade, exige. No atendimento global às necessidades e dinâmicas familiares, os enfermeiros diferenciam-se por uma actuação marcada pela ampliação da sua complexidade e dos métodos de intervenção fundamentada num aporte de competências específicas. Estes enfermeiros reconhecem a família como a mais constante unidade de saúde para os seus membros, ajudando-as a fazer escolhas saudáveis, a enfrentar e a gerir a doença crónica e a deficiência, a controlar o stress e a realizar a promoção integral da saúde dos seus elementos, contribuindo, deste modo, para o fortalecimento de um dos pilares fundamentais da sociedade. Assim, actuam como um recurso e agente facilitador para que os indivíduos e famílias desenvolvam competências para um agir consciente – quer em situações de crise, quer em questões de saúde –, como também a vivenciar os processos de transição e os acontecimentos de vida não normativos.

As UCC são coordenadas por um enfermeiro e têm por missão a prestação de cuidados de saúde e apoio psicológico e social de âmbito domiciliário e comunitário, especialmente às pessoas, famílias e grupos mais vulneráveis, em situação de maior risco ou dependência física e funcional ou doença que requeira acompanhamento próximo, bem como a educação para a saúde. Neste âmbito, os enfermeiros apresentam-se como um recurso qualificado, com competência científica, técnica e humana, indispensável à sua implementação. Contribuem assim para a identificação dos problemas de saúde, vigilância e determinação do perfil epidemiológico de âmbito geodemogáfico, dinamização e coordenação de programas de intervenção no âmbito da prevenção, protecção e promoção da saúde em diferentes settings (jardins-de-infância, escolas, locais de trabalho, universidades, espaços de lazer…). Participam ainda, em projectos de intervenção comunitária em parceria com outras instituições da comunidade (Comissão de Protecção de Crianças e Jovem em Risco, Programa de Intervenção Precoce em Crianças, Programa Nacional de Apoio ao Idoso…) e com a rede social no âmbito da intervenção a pessoas, famílias e grupos com maior vulnerabilidade ou sujeitos a factores de exclusão social, económica, cultural, violência, negligência.

As USP responsabilizam-se pela monitorização do estado de saúde, ou seja, o acompanhamento dos fenómenos de saúde e

Integram ainda a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados, que tem por objectivo a prestação de cuidados de

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saúde e de apoio social de forma continuada e integrada a pessoas que, independentemente da idade, se encontrem em situação de dependência. Os Cuidados Continuados Integrados estão centrados na recuperação global da pessoa, promovendo a sua autonomia e melhorando a sua funcionalidade, no âmbito da situação de dependência em que se encontra. Salientando-se nesta rede as Equipas de Cuidados Continuados Integrados, equipas domiciliárias fortemente constituídas por enfermeiros que prestam cuidados de Enfermagem nos domicílios dos utentes, em complementaridade com os enfermeiros de família. Assim, o enfermeiro na UCC responde às necessidades de saúde dos cidadãos, orientado pela execução dos programas de saúde da Direcção-Geral da Saúde e Plano Nacional de Saúde, assente numa lógica de proximidade que se materializa nos mais diversos contextos. É em todas estas áreas de intervenção que o enfermeiro poderá exercer as suas competências enquanto especialista em Enfermagem Comunitária e de Saúde Pública, a saber: a. Estabelece, com base na metodologia do planeamento em saúde, a avaliação do estado de saúde duma comunidade; b. Contribui para o processo de capacitação de grupos e comunidades;

c. Integra a coordenação dos programas de saúde de âmbito comunitário e na consecução dos objectivos do plano nacional de saúde; d. Realiza e coopera na vigilância epidemiológica de âmbito geodemográfico. Com a nova perspectiva que a reforma dos Cuidados de Saúde Primários trouxe, com a criação dos ACES, tendo um enfermeiro especialista como vogal no Conselho Clínico e também um papel preponderante na USP e especialmente na UCC sob a sua coordenação e responsabilidade, para além da feliz conjugação com a necessidade de implementação do Modelo de Desenvolvimento Profissional, com as necessárias acreditações das unidades / serviços e profissionais, está criado o enquadramento legal que permite valorizar e aproveitar tão distinta oportunidade para os enfermeiros. A Ordem dos Enfermeiros (OE) tem tido um papel preponderante nesta histórica conjuntura que os enfermeiros tão bem têm sabido agarrar através da sua capacidade de organização, realização e objectivação, verificada por exemplo, na apresentação de tão elevado número de candidaturas a UCC. Mas não nos podemos apenas satisfazer com estas conquistas realizadas. Existe um árduo caminho a trilhar na sua operacionalização, estando os enfermeiros com a plena consciência dos obstáculos e dificuldades actuais e dos que se avizinham, até porque os sentem e vivenciam. Também, não menos importante, se verifica a necessidade da adequada articulação e capacidade de referenciação entre os enfermeiros, tendo como base as especificidades das competências comuns e específicas de cada um. Perante tão ampla abrangência torna-se complexa e desafiante a prestação de cuidados na comunidade, por vezes tão distante das mais elevadas tecnologias de ponta de algumas instituições de saúde, mas tão perto do core primordial dos cuidados de Enfermagem: a pessoa na sua mais pura essência e habitat. É, assim, importante na formação dos profissionais de Enfermagem o conhecimento científico, reforçando o domínio cognitivo do saber como cuidar, que serve de alicerce ao domínio psicomo-

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tor do saber-fazer na prestação de cuidados. Torna-se fundamental pensar e educar para os valores do humanismo e da dignidade do ser humano, pois é nesta área do saber-ser que os enfermeiros têm um papel preponderante que os distingue e valoriza como profissão, nesta sua capacidade de estabelecer relação. Também o Plano Nacional de Saúde para 2011-2016, actualmente em preparação, afirma que a universalidade, o acesso a cuidados de qualidade, a equidade e a solidariedade são valores fundamentais nos quais se fundamenta o sistema de saúde. Convoca o cidadão para exercer o seu direito de cidadania em Saúde ou seja, para influenciar de modo informado e responsável o seu estado de saúde e o desenvolvimento dos serviços de saúde. Mas, muitas vezes incapazes de fazer uso dos seus direitos, os cidadãos têm pouca ou nenhuma capacidade de intervenção, pelo que o enfermeiro, ao assumir o papel de advogado do utente, responsabiliza-se pelos seus interesses, salvaguarda-os e protege-os em situações de grande vulnerabilidade social e física, sendo o garante da equidade no acesso aos cuidados de saúde e à qualidade desses mesmos cuidados. O Conselho Internacional de Enfermeiros (ICN), no seu Código de Ética, afirma que o respeito pelos direitos humanos e pela dignidade da pessoa é inerente à Enfermagem e, por consequência, ao agir do enfermeiro. Esta é também uma afirmação presente no Código Deontológico do Enfermeiro, expresso no Estatuto da Ordem dos Enfermeiros. O enfermeiro deve ser proactivo na defesa desses direitos e agir como o garante de cuidados de saúde de alta qualidade, acessíveis, equitativos, eficientes e adequados que afirmem a Saúde como um direito humano básico, motor do desenvolvimento das sociedades. O desafio é lutar por uma mudança que vise a passagem de uma situação onde predomina a pouca informação, a passividade e a dependência dos saberes e acções de outrem para situações de informação e de conhecimento, de proactividade e da máxima autonomia possível no que respeita à saúde individual e

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colectiva, onde se reconhece a responsabilidade de cada um pela sua saúde e, por extensão, pelo estado de saúde da sua comunidade. Enquanto o enfermeiro de Enfermagem Comunitária analisar e identificar as necessidades de saúde e as desigualdades existentes nessa área são não apenas um conhecimento técnico, mas também uma forma de compromisso social. Conhecer o estado de saúde e as condições em que as pessoas vivem determina uma acção efectiva conducente a cuidados de saúde adequados, aceites, passíveis de contribuir para o envolvimento e participação dos cidadãos na sua saúde. Em conclusão, a acção profissional do enfermeiro é muito diversificada, abrangente e rica em experiências, vivências e partilha de saberes, pobre em monotonia devido à multiplicidade do seu objecto de trabalho: a pessoa. Esta pode apresentar-se ao enfermeiro em situação de dependência e debilidade ou de forma saudável, pretendendo a melhoria da sua qualidade de vida. O enfermeiro é um elemento primordial na ajuda da satisfação das suas necessidades básicas e na promoção da sua saúde, ao capacitá-la de meios favoráveis à criação do seu projecto de saúde e de vida, tão equilibrado e harmonioso quanto possível em direcção ao seu bem-estar. Não obstante alguns profissionais expressarem que a profissão de Enfermagem não é adequadamente reconhecida e valorizada pela sociedade, pela minha despretensiosa análise têm-se conseguido significativas conquistas no reconhecimento do enfermeiro e da profissão que ininterruptamente está vigilante e cuida do indivíduo, sua família, grupo e comunidade. Considero, no entanto, imprescindível a implementação do Modelo de Desenvolvimento Profissional e o perfil de competências comuns e especializadas capaz de revelar o cuidar do Ser Holístico e de construir saberes científicos e técnicos, recorrendo à tecnologia como suporte da prática clínica e utilizando uma linguagem científica própria que aperfeiçoe o prestígio social dos enfermeiros, reconheça as suas competências especializadas e promova a dignificação da Enfermagem. oe

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O Agir Ético na Comunidade

Enfermeira Assunção Magalhães Presidente do Conselho Jurisdicional Regional da Secção Regional do Norte e Vogal do Conselho Jurisdicional da Ordem dos Enfermeiros

Partilhar algumas reflexões orientadas para o trabalho de uma equipa multidisciplinar na responsabilidade pela comunidade é um grande desafio. A responsabilidade do enfermeiro perante a comunidade (Artigo 80.º do Código Deontológico do Enfermeiro) surge expressa na «promoção da saúde e na resposta às necessidades em cuidados de enfermagem». O conceito de comunidade como cliente é muito abrangente, sendo que o Conselho Internacional de Enfermeiros (2005, p. 171), na CIPE®, define-a como: «Grupo com características específicas: Um grupo de seres humanos vistos como uma unidade social ou um todo colectivo, composta por membros ligados pela partilha geográfica, de condições, ou interesses comuns». Os membros da comunidade conhecem-se e interagem entre si, funcionando dentro de uma estrutura social particular, criando normas e valores pelos quais se regem. Face ao exposto, o Artigo 80.º do Código Deontológico do Enfermeiro – Do dever para com a comunidade, diz-nos que «o enfermeiro, sendo responsável para com a comunidade na promoção da saúde e na resposta às necessidades em cuidados de enfermagem, assume o dever de: a) Conhecer as necessidades da população e da comunidade onde está inserido; b) Participar na orientação da comunidade e na busca de soluções para os problemas de saúde detectados;

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O enfermeiro e outros profissionais de saúde na responsabilidade pela comunidade c) Colaborar com os outros profissionais em programas que respondam às necessidades da comunidade». Partindo da alínea a), o enfermeiro tem o dever de conhecer as necessidades da comunidade onde está inserido independentemente do contexto de trabalho. Todavia, esta é uma área que tem ainda um longo caminho a percorrer, onde se colocam aos enfermeiros novos e multifacetados desafios para equilibrar ou melhorar a saúde e o bem-estar das comunidades. Os enfermeiros estão preocupados com a comunidade no que diz respeito às diferentes variáveis que a afectam, nomeadamente, como refere Ribeiro (1998), à pressão social relacionada com o estilo de vida, as condições de vida, as redes de apoio sociocultural, entre outras. Esta preocupação tem em linha de conta que a saúde é cada vez mais entendida como um assunto que diz respeito à própria comunidade e, consequentemente, às próprias pessoas que dela fazem parte, a quem são atribuídos direitos, mas também a responsabilidade que lhe é inerente. Sendo assim, e considerando as Metas de Saúde para Todos – que afirmam que é indispensável para a realização de um objectivo comum a participação activa de uma comunidade bem informada e fortemente motivada – então a prestação de cuidados de Enfermagem virados para a comunidade pressupõe, de acordo com a Carta de Ottawa (1986), o desenvolvimento pessoal e social através de actividades. Pressupõe igualmente o reforço de competências que habilitem a comunidade para uma vida saudável e capaz de realizar opções conducentes aos seus projectos de saúde, fo-

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mentando as aptidões para o autocuidado e para o bem-estar social e da saúde. A saúde é criada, construída e vivida nos diferentes contextos, nomeadamente nos locais onde se aprende, se trabalha, se brinca e se ama (Carta de Ottawa, 1986). Daí a necessidade e o dever dos enfermeiros apoiarem as comunidades na satisfação das suas necessidades para uma vida saudável, sendo os cuidados concebidos para o cliente-comunidade, baseado na singularidade da mesma e prestados com sensibilidade para o enquadramento cultural. Face às necessidades da comunidade, os enfermeiros têm-se revelado profissionais dinâmicos que têm elaborado e implementado diversos projectos credíveis para dar resposta às necessidades de saúde e, particularmente, em cuidados de Enfermagem. Atendendo à alínea b) do Artigo 80.º, o enfermeiro deve «participar na orientação da comunidade na busca de soluções para os problemas de saúde detectados». Este dever implica uma acção participativa, com interacção de diversos parceiros na procura das melhores soluções para os problemas diagnosticados na comunidade. Actualmente os enfermeiros nas suas práticas estabelecem estas parcerias, nomeadamente com câmaras municipais, juntas de freguesia, governos civis e outras instituições da sociedade civil, sempre com o objectivo último de dar resposta aos problemas da comunidade e dos cidadãos nela inserida que urge solucionar. Cabe aos profissionais de saúde em geral, e aos enfermeiros em particular, promover a saúde da comunidade. Como refere a Carta de Ottawa (1986), a promoção da saúde pode ser entendida como um «processo de capacitação da comunidade» para decidir e «actuar na melhoria da sua qualidade de vida e saúde», participando activamente no controle deste processo. Refere ainda que, «para atingir um estado de completo bem-estar físico, mental e social, os indivíduos e grupos devem

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saber identificar aspirações, satisfazer necessidades e modificar favoravelmente o meio ambiente». Assim, «a promoção da saúde não é responsabilidade exclusiva do sector da Saúde e vai para além de um estilo de vida saudável, na direcção de um bem-estar global». «A saúde é o maior recurso para o desenvolvimento social, económico e pessoal, assim como uma importante dimensão da qualidade de vida». Acrescenta que só o reforço do poder através da capacitação e empoderamento (empowerment) das comunidades permite tomarem as melhores decisões no que a ela diz respeito. A última alínea do Artigo 80.º dá ênfase ao dever do enfermeiro de «colaborar com outros profissionais em programas que respondam às necessidades da comunidade». Isto implica que todos os profissionais têm que alargar o seu quadro habitual de análise dos problemas em saúde, abandonando a compar-

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timentação. Por outras palavras, as necessidades da comunidade não se fecham ao olhar de um único profissional ou de uma classe. É preciso olhar o problema em diferentes perspectivas: a sua e a dos outros profissionais. Nesta análise exigente e correcta das necessidades da comunidade deve-se ter em linha de conta os factores psicológicos, sociais, económicos, ambientais e culturais que têm influência na saúde. Todavia, só um trabalho de colaboração entre profissionais pode trazer mais-valias a essa comunidade, onde o contributo individual de cada profissional é de crucial importância. É de acrescentar que a análise global da situação de saúde concreta de cada comunidade tem que estar sempre presente. Aos enfermeiros exige-se que sejam motores de mudança na organização dos cuidados na comunidade, integrando aspectos de multiculturalidade. A eles exige-se competências específicas, nomeadamente a compreensão das sociedades multiculturais, das diferentes concepções de vida, crenças e valores. Assim, qualquer que seja o contexto de prestação de cuidados onde o enfermeiro exerce as suas funções, a ele exige-se o desenvolvimento de competências capazes de responder às necessidades da comunidade, desenvolvendo programas que promovam a saúde da comunidade em articulação com outros profissionais da equipa de saúde. Desta forma, relacionamos o Artigo 80.º com o Artigo 91.º do mesmo código, onde «o enfermeiro assume o dever de: a) Actuar responsavelmente na sua área de competência e reconhecer a especificidade das outras profissões de saúde, respeitando os limites impostos pela área de competência de cada uma». Como membro da equipa de saúde, o enfermeiro solicita colaboração, quando necessário, de outros profissionais para garantir o cuidado específico de que precisa aquela comunidade para lidar com os desafios de saúde.

Bertram e Elise Bandman (2002) afirmam que é cada vez mais claro que a prestação de cuidados de saúde globais está aquém da capacidade de uma profissão, daí a necessidade de uma abordagem multidisciplinar e multiprofissional. Cada profissional reúne esforços e embora percorra diferentes caminhos, persegue o mesmo objectivo, orientado para o mesmo fim. Sabemos que o exercício profissional do enfermeiro insere-se num contexto de actuação multiprofissional, desenvolvendo dois tipos de intervenções, de acordo com o definido no Artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 161/96 de 04 de Setembro: – As intervenções autónomas, iniciadas ou prescritas pelo enfermeiro sob sua única responsabilidade (…); – As intervenções interdependentes, iniciadas por outro técnico de saúde e realizado pelo enfermeiro (…). No entanto, os limites das competências dos profissionais são, em determinadas circunstâncias, muito ténues, havendo áreas «cinzentas» que deixam pouco claro a quem compete fazer o quê. A resolução deve passar por uma hierarquia técnica na complementaridade e solidariedade, onde a tomada de decisão se faz no interesse e benefício da pessoa / cliente. É então tomada para quem, no contexto daquele momento, está melhor preparado para intervir. E entramos, desta forma, na alínea b) do Artigo 91.º do Código Deontológico do Enfermeiro: «trabalhar em articulação e complementaridade com os restantes profissionais de saúde», assumindo que todo o profissional é importante e que o seu papel não pode ser negligenciado porque a saúde requer uma intervenção multidisciplinar. Compete a todos e a cada um a definição de padrões de qualidade dos cuidados que permitam caminhar para a obtenção da melhoria contínua da qualidade em Saúde. O trabalho em equipa exige um conjunto de valores e princípios que são reguladores da conduta entre os profissionais envolvidos e destes em relação à comunidade.

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Também a alínea c) do mesmo artigo refere que o enfermeiro deve «integrar a equipa de saúde, em qualquer serviço em que trabalhe, colaborando, com a responsabilidade que lhe é própria, nas decisões sobre a promoção da saúde, a prevenção da doença, o tratamento e a recuperação, promovendo a qualidade dos serviços». Ao integrar a equipa de saúde, o enfermeiro serve a comunidade e assume um plano de intervenção, co-responsabilizando -se pela sua implementação, tendo em conta a ética nas relações para que a regulação da prática não seja feita só por mecanismos legais mas sobretudo por princípios éticos. Ao respeitarmos a área de competência de cada um, estaremos centrados nos direitos da comunidade e das pessoas que dela fazem parte, respeitando a dignidade do profissional da equipa multiprofissional na assumpção partilhada da responsabilidade e do risco.

Vamos pensar numa perspectiva de cuidados com a comunidade e não sobre a comunidade.

Referências Bibliográficas Bandman, Elise; Bandman, Bertram – Nursing Ethics through life span. NY: Prentice-Hall, 2002. Carta de Ottawa. 1ª Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde. Canadá, 1986. (disponível em www.saudepublica.web.pt/05-PromocaoSaude/Dec_ Ottawa.htm) Declaração de Alma-Ata. Conferência Internacional sobre os Cuidados de Saúde Primários. Cazaquistão, 1978. (disponível em www.saudepublica.web.pt/05-PromocaoSaude/Dec_Alma-Ata.htm ) Ribeiro, José Luís Pais – Psicologia e Saúde. Lisboa: b ISPA,1998. Conselho Internacional de Enfermeiros – CIPE® – Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem. Versão 1. Genebra. Publicado em Portugal pela Ordem dos Enfermeiros, 2005. Estatuto da Ordem dos Enfermeiros, alterado e republicado pela Lei n.º111/2009, de 16 de Setembro, que regulamenta o Código Deontológico nele incluso. Decreto-Lei n.º 161/96 de 4 de Setembro, que decreta sobre o Regulamento do Exercício Profissional dos Enfermeiros. oe J. r. garCia

Em jeito de síntese, diria que é fundamental capacitar as pessoas para aprenderem durante toda a vida, preparando-as para as suas diferentes etapas e para enfrentarem os contínuos desafios que se colocam à comunidade.

Há alguns degraus a vencer. Mas… já percorremos um longo caminho, e nós vamos estar sempre no primeiro nível de contacto com a comunidade, garantindo cuidados de proximidade nos locais onde a comunidade vive e trabalha.

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Encerramento

Enfermeira Elvira Pimentel Presidente do Conselho Jurisdicional Regional da Secção Regional da R. A. dos Açores e Vogal do Conselho Jurisdicional da Ordem dos Enfermeiros

É tempo de encerrarmos o nosso XI Seminário de Ética. Antes e como habitualmente, deixamos este espaço para enumerar as principais ideias de conclusão que pudemos retirar da reflexão feita ao longo deste dia. A «Responsabilidade para com a comunidade» levou-nos a reflectir a comunidade como objecto dos cuidados de Enfermagem e, deste modo, a ponderar o agir do enfermeiro perante a comunidade. Partimos do entendimento de que a comunidade se afigura aos cuidados de Enfermagem como um foco autónomo da intervenção profissional do enfermeiro, a par da pessoa e da família. Sendo um alvo próprio em Enfermagem, importa reflectir o agir ético do enfermeiro na resposta às suas necessidades específicas. Foi o que fizemos durante este dia. Delimitámos o conceito de comunidade do ponto de vista profissional e enquadrámos as políticas actuais neste domínio. E daqui partimos para a interpretação dos deveres próprios do enfermeiro para com a comunidade, a partir do enunciado no Artigo 80º do Código Deontológico do Enfermeiro. Esta reflexão obrigou-nos – ou seja obrigamo-nos, à boa maneira Kantiana – a alargar o campo habitual da nossa reflexão ética que se situa na pessoa, para a comunidade. Às necessidades da pessoa juntámos os problemas da comunidade e foi a partir daqui que ponderámos o agir ético do enfermeiro na actualidade. Do mesmo modo que temos reflectido o papel profissional do enfermeiro – que assume a responsabilidade pelo Outro, identificando os seus problemas e planeando os resultados a atingir e as intervenções que satisfaçam as necessidades identificadas – trouxemos hoje à discussão a responsabilidade do enfermeiro perante a comunidade. Encon-

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conclusões do xI seminário de ética trámos focos de problemas específicos e adiantámos igualmente estratégias de intervenção que consideramos eticamente adequadas. Do mesmo modo, foi possível identificar na deontologia profissional os princípios, os valores e os deveres que densificam este agir ético. Das diversas comunicações realizadas e do debate ocorrido, salientamos algumas ideias principais: Na conferência de abertura, a Enf.ª Elma Zoboli começou por referir duas razões para considerar a responsabilidade social do enfermeiro. Por um lado, o facto de sermos profissionais de saúde e, por outro, por sermos enfermeiros, com o legado profissional de Florence Nightingale, colocando a cidadania em lugar de destaque dos cuidados de Enfermagem. A conferencista refere Paulo Freire, que considera a necessidade de procurar a igualdade dos cidadãos, onde a protecção da saúde se inclui. Desde logo, porque a necessidade de bem-estar é igual em todas as pessoas. A também Prof.ª Elma Zoboli defendeu a tese de que o nosso compromisso de fidelidade às pessoas é um legado de Florence Nightingale, neste particular da responsabilidade para com a comunidade, tendo em conta as suas preocupações com o ambiente, com a saúde ocupacional e, de um modo geral, com a saúde das pessoas inseridas na sua comunidade. O reconhecimento recíproco de sujeitos deve ser um princípio do mundo actual a que a saúde e os cuidados de Enfermagem devem dar especial atenção. O respeito pela pessoa que se integra numa comunidade e com os outros partilha a sua vida. Consideramos

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que, como refere Zoboli, «mover-se pelo cuidado implica assumir uma atitude, um “modo-de-ser”» responsável pelas pessoas e pelas comunidades. Das restantes comunicações, salientamos: O conceito de comunidade foi definido como «grupo de seres humanos vistos como uma unidade social», para considerá-la como um objecto dos cuidados de Enfermagem «porque lá estão pessoas». O enfermeiro, responsável pela comunidade, encontra-se frequentemente inserido, ele próprio, na comunidade onde trabalha, o que lhe confere um papel de grande proximidade. As comunidades estão em contínua mudança, na procura das respostas aos seus próprios problemas, verificando -se hoje desafios próprios do nosso tempo. Temos comunidades urbanas com elevada densidade populacional e temos comunidades rurais com uma crescente desertificação. As diferenças culturais são também um factor a ter em conta quando se considera a comunidade como objecto da responsabilidade do enfermeiro. Estes são alguns dos desafios que a comunidade hoje coloca aos enfermeiros, apelando ao seu papel profissional e ao seu agir ético de cada dia. Perante as diferentes necessidades de cuidados na comunidade, a Enfermagem responde com a oferta de cuidados especializados nas diversas áreas que as pessoas e a comunidade precisa. Tendo em conta a sua atribuição de garantir a qualidade dos cuidados de Enfermagem em Portugal, a Ordem dos Enfermeiros assume o papel de participar na definição das políticas de saúde em geral e da comunidade em particular, nomeadamente através da emissão de pareceres que influenciem os órgãos legislativos e executivos. A par deste papel institucional devemos também, apelando aos nossos deveres para com a comunidade, contribuir individualmente para esta definição. Uma influência necessária e possível é a de contribuir para a mudança do paradigma vigente nas políticas de saúde centradas na doença para uma centralidade na saúde e nas pessoas. ROE N.º 37 – Junho 2011

Mas a Enfermagem tem hoje desafios mais concretos que lhe permitem assumir mais facilmente a responsabilidade pela comunidade. As novas Unidades de Cuidados na Comunidade, dirigidas por enfermeiros, constituem actualmente a possibilidade institucional de aumentar os cuidados de Enfermagem e de saúde na comunidade. A centralidade no cidadão e na comunidade, integrando-os de facto na tomada de decisão de saúde, assim como a proximidade em saúde, serão princípios que devemos propor para as novas políticas de saúde em Portugal. Devemos igualmente apelar a um maior aproveitamento das competências dos enfermeiros, assim como das tecnologias próprias da Enfermagem, como é o caso das tecnologias de informação. O enfermeiro assume deveres específicos para com a comunidade, enunciados no Artigo 80º do Código Deontológico: são os deveres de «conhecer as necessidades da população e da comunidade em que está inserido», de «participar na orientação da comunidade na busca de soluções para os problemas de saúde afectados» e o dever de «colaborar com os outros profissionais em programas que respondam às necessidades da comunidade». São deveres que se fundamentam no princípio de «responsabilidade inerente ao papel assumido perante a sociedade». Para concretização destes deveres, o enfermeiro deve usar os instrumentos científicos adequados para a recolha de informação e para o planeamento dos cuidados necessários. Destacando os valores do altruísmo e da solidariedade, o enfermeiro procura o seu agir no respeito pelos outros e intervindo quando as condições são mais adversas, como é o caso da catástrofe, em que os enfermeiros já deram provas da sua capacidade de aplicar a solidariedade para com a comunidade. Na sua intervenção, o enfermeiro deve procurar o cuidado justo – na linha de pensamento da Prof.ª Margarida Vieira – conseguido através do estabelecimento de pactos de cuidado com as pessoas – como o considera a Prof.ª Lucília Nunes – e com a comunidade, como podemos hoje afirmar nestas conclusões deste XI Seminário. oe

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Seminário de

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Ética

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o» co de trabalh Deodato donda: «Mosai – Enf. Sérgio 14.30H › Mesa-re agir profissional • Critérios do – Vogal do CJ de Posição: Enunciados • Mosaico de consentimento Do sigilo; Do CJ › Da delegação; -presidente do Vice – ão Martins crianças; – Enf. ª Conceiç protecção das s seguros; Da Merícia cuidado Enf.ª – › Dos s para o ensino al da Secção Das recomendaçõe do CJ Region – Presidente Bettencourt a do CJ RA da Madeir Fraga – Vogal Regional da António – Enf. José › Do final de vida e do CJ Moderador: Vice-president Gonçalves – Enf. Rogério eiro» ncia final: lógica do enferm 16.00H › Conferê ade ética e deonto «Responsabilid nte do CJ Nunes – Preside Enf.ª Lucília

Intervenções: rio • Ordem dos Médicos Digníssimo Bastoná – Dr. Pedro Nunes, uticos • Ordem dos Farmacê mo Bastonário da Silva, Digníssi – Dr. J. A. Aranda Dentistas rio • Ordem dos Médicos da Silva, Digníssimo Bastoná o – Dr. Orlando Monteir iros Enferme dos ma Bastonária • Ordem de Sousa, Digníssi – Enf.ª Maria Augusta

Debate

Secretariado

Moderadora: do CJ a Amaral – Vogal Enf.ª Manuel

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de Enfermagem» Serrão Doutor Daniel • Professor – Vice-presidente Oliveira Marçal • Enf.ª Teresa dos Enfermeiros Directivo da Ordem Jurisdicional do Conselho do Conselho Cerqueira – Vogal • Enf.º José Enfermeiros da Ordem dos o Jurisdicional Moderadora: Vogal do Conselh Bettencourt – Enf.ª Merícia Enfermeiros da Ordem dos

o 13H00 Almoç

Redonda II 15H00 Mesa Profissional Deontologia «10 Anos de o de Enfermagem» nte do Conselh o ida Vieira – Preside eiros no 1.º Mandat • Enf.ª Margar Ordem dos Enferm o Jurisdicional Jurisdicional da nte do Conselh Nunes – Preside • Enf.ª Lucília 2.º Mandato Enfermeiros no da Ordem dos Jurisdicional Moderador: do Conselho o – Presidente Enf. Sérgio Deodat Enfermeiros da Ordem dos 16H30 17H00

Conclusões ctivando o futuro» o sentido, perspe «Desenhando ramento Mesa de Encer

SEMINÁRIO DE

Programa a do secretariado

09h00 – Abertur

DE ABERTURA ária da Ordem 09h30 – MESA da Digníssima Baston Alocução de Honra dos Enfermeiros a de Sousa Enf.ª Maria August RÊNCIA INICIAL 10h30 – CONFE «Confiança» Apresentação: o Jurisdicional da - Vogal do Conselh Enf.º António Malha eiros Ordem dos Enferm Conferencista: idade Nova de Lisboa Univers Renaud Prof.ª Doutora Isabel o

11h00 – Interval

25

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13h00 – Almoço REDONDA II 14h30 – MESA em Enfermagem» «Sigilo Profissional

o Jurisdicional Moderador: - Vogal do Conselh Enf.ª Graciete Novais da Ordem dos EnferRegional do Sul Regional da Secção meiros Prelectores: ida Vieira - PresiProf.ª Doutora Margar Perspectiva ética: o Ética e Deontológica ão de Apoio à Reflexã dente da Comiss dos Enfermeiros de Melo (CARED) - Ordem Doutora Helena Pereira Prof.ª : jurídica Perspectiva de Lisboa do Universidade Nova Carneiro - Vogal ógica: Enf.ª Teresa Perspectiva deontol Enfermeiros ional da Ordem dos Conselho Jurisdic

REDONDA I 11h30 – MESA Saúde» «Informação em RÊNCIA FINAL 16h00 – CONFE Saúde» Moderador: Informação em do Conselho Jurisdi«Segurança da ourt - Presidente da Enf.ª Merícia Bettenc ional da R. A. da Madeira Apresentação: Conselho Jurisdic Secção Regional el - Presidente do cional Regional da Enf.ª Elvira Piment dos Açores da Ordem eiros Regional da R. A. Ordem dos Enferm Regional da Secção Prelectores: Carlos Amado Martins dos Enfermeiros Prof. Doutor José ética: tiva Perspec ional Coimbra Conferencista: Conselho Jurisdic Enfermagem de o do o - Presidente do Escola Superior de Nabais - Membr Enf.º Sérgio Deodat onal: Enf.º António de eiros Perspectiva profissi nte da Comissão da Ordem dos Enferm agem e Preside e Conselho de Enferm Saúde Mental Enfermagem de Especialidade de USÕES ação» dos Enfermeiros CONCL inform – Ordem da da nça 16h30 trica Silveira Psiquiá os a segura Lingnau da : Dr. Luís Novais «Garantir aos cidadã ão de Dados Perspectiva jurídica ão Nacional de Protecç do TO Presidente da Comiss Trindade - Vogal DE ENCERRAMEN ógica: Enf.ª Ângela 17h00 – MESA Perspectiva deontol Enfermeiros ional da Ordem dos Conselho Jurisdic

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ÉTICA

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dos Enfermeiros

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PROGRAMA

ETARIADO TURA DO SECR 09H00 – ABER DE ABERTURA ária da Ordem 09H30 – MESA Baston

13H00 – ALMOÇO REDONDA II 15H00 – MESA Comunidade – O Agir Ético na Deodato, Presidente do Conselho

Sérgio Moderador: Enf.º eiros da Ordem dos Enferm nidad e, a par Jurisdicional da lidad e pela comu Prof. • A responsabi pelo mundo – pelo «Outro» e do responsabilidade Silva, Presid ente el Olive ira da ias da Vida Ciênc Douto r Migu as para nal de Ética Conselho Nacio Enf. º João Neves (CNECV) comunidade – na da éticos Saúde • Problemas Ciências da O no Instituto de Porto Amado, docente 11H00 – INTERVAL ca Portuguesa – Universidade Católi dos na comunidade – Enf.º REDONDA I de cuida io da 11H30 – MESA e a Comunidade • A prestação Mesa do Colég da m ente ente mage Presid , Presid – A Enfer rida Vieira nitária da Ordem Carlos Martins, a Doutora Marga Enfermagem Comu Moderador: Prof.ª Ética e Deontológic Especialidade de Apoio à Reflexão na da Comissão de dos Enfermeiros ssionais de saúde dos Enfermeiros dos de e os outros profi ção (CARED) da Ordem cto» dos cuida e – Enf.ª Assun • Os enfermeiros e como «obje lho pela comunidad l s, Vogal do Conse • A comunidad responsabilidade lho Jurisdiciona Ana Paula Gome Conse Enf.ª – do agem ente Enferm Enfermeiros Maga lhães, Presid Regional do Norte e Vogal do da Ordem dos nidade o comu a Secçã de Enfermagem com eiros da Regional dos Enferm saúde relacionadas nte do Conselho icional da Ordem • As políticas de reside Conselho Jurisd Oliveira, Vice-p – Enf.º Jacinto eiros Enferm dos ÕES e Directivo da Ordem eiro para com a comunidad 16H30 – CONCLUS enferm ENTO ente do Conselho • Os deveres do DE ENCERRAM Bettencourt, Presid nal da R. A. da 17H00 – MESA – Enf.ª Merícia nal da Secção Regio l da Ordem Jurisdicional Regio iciona do Conselho Jurisd Madeira e Vogal dos Enfermeiros

da Digníssima Alocução de Honra Augusta Sousa s – Enf.ª Maria dos Enfermeiro

NCIA INICIAL 10H15 – CONFERÊpara com a comunidade

(s) Responsabilidade Zoboli, da Escola de Enfermagem Elma Prof.ª Doutora e de S. Paulo, Brasil da Universidad

2010 Aveiro 29 OUTUBRO de Congressos de Centro Cultural e Mais informações

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ordem dos enfermeiros | Número 37 | Junho 2011

Número 37 | Junho 2011 | www.ordemenfermeiros.pt | ISSN 1646-2629

XI Seminário de Ética

Responsabilidade para com a Comunidade