IMPORTÂNCIA DAS APLICAÇÕES DA TRANSDISCIPLINARIDADE NA

26 J Revista Graduando nº1 jul./dez. 2010 pedaço de algo muito mais complexo e completo. Como pode-mos viver em sociedade se não nos...

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Revista Graduando

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I M P O RT Â N C I A D A S A P L I C A Ç Õ E S D A T R A N S D I S C I P L I N A R I D A D E N A E D U CA Ç Ã O H U M A N A C a r ol i n a Ol i v ei r a G u ed e s Graduanda em Licenciatura em Letras com Inglês [email protected]

J u l i e te G o m e s M a c h a d o Graduanda em Licenciatura em Letras com Francês

M a r i a J o s é P e r ei r a d e B r i to Graduanda em Licenciatura em Letras com Francês [email protected]

Su z a n a d e J e s u s B ri to Graduanda em Licenciatura em Letras com Francês s u z a n a .j b c@h o t ma il.co m

V i l m a R a m o s M a c h ad o Graduanda em Licenciatura em Letras com Francês [email protected]

R e s u m o : O tr a b al h o te m c o mo ob j e ti vo e xp lo ra r a s a p l i c a ç õe s e a i m po r tâ n c i a d a tr a n s di s c ip li n a ri d a d e n a ed uc a ç ã o d o s e r hu m a n o , p a r tin do do co n c ei to d e ed u c a ç ão , qu e te m l ig a ç ã o co m a i d e i a de tr an s d i s ci pl i n ar , m a s q u e é e xc l uí d a d a ed u c a ç ã o tr a di c i o n al b a s e ad a n a fr a g m e n ta ç ã o d o c o nh e ci m e n to . M o s tr a a n e c e s s i d a d e d a a bo rd a g e m tr a n sd i s c ip li n a r p a r a u m e s tu do de e x c e l ê n ci a e m e du c a ç ã o . P a l a v r a s - c h a v e : T r an s d i s ci pl i n ar i d ad e , e du c a çã o , i n te rd i s c ip li n a ri d a d e , di s c ip li n a , co n he c i m en to A b s tr a c t: Th i s s tud y h a s a s o b je c ti v e to e xp lo r e the a pp l ic a ti o n s a n d th e i m p or ta n c e of tr a n s di s c ip l in a r i ty in ed u c a ti on of hu m a n b e i ng s , s ta r ti n g w i th th e co n ce p t o f ed u c a tion , w h i c h h a s l in k s w i th th e tr a n s d i s ci pl i n ar y i d e a , b u t i s ex c lu de d f ro m tr a d i ti on a l e d u c a tio n b a s e d on kn o wl e dg e ’ s f r ag m e n tati o n . I t s h o w s th e n e e d f or a p ro p er a pp li c a ti on o f th e tr a n s di s ci p li n a ry m e tho d f or a e x c el l en t a n d d ee p s tud y . K e y w o rd s : T r an s d i s ci pl in a r y , e du c a ti on , i n ter d i s ci pl i n ar y , d i s ci p l in e , kn o w l ed ge

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ISSN 2236-3335

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1 . I N T RO DU ÇÃ O Em n o s s a c u l tu r a oc i de n ta l , e s ta m o s a c o s tu m a d o s a e s tu d a r te r m o s , o b je to s , p e n s a m e n to s , te o ri a s e tu d o m a i s , d e m a n e i r a s eg r eg a d a , c o m o s e tu do f o s s e d e s co n e c ta do e i so l a do d o m e io q ue n o s c er c a . En tr e ta n to , a s s i m com o o c o rp o h u m a n o , e m s u a co m p le x id a d e , po s s u i ó r g ão s q ue , s e i s ol a d o s , tê m s u a f un ç ã o di m in u íd a o u c e s s a d a ; n o e s tudo a c a dê m i c o e no e s c o l a r , c a d a di s c ip l in a , e s tud a d a d e m a n ei ra i s ol a d a te m s eu v a l o r r e du z id o , f e ch a nd o o s o lh o s d a q u el e s qu e a e s tu d a m p a r a s u a a m p l i tud e , e n qu a n to i n s e ri d a no c on ju n to d e d i s ci pl in a s q u e a tr a n s p a s s a m . T r a n s p a s s a r o s l i m i te s c o lo c ad o s en tr e a s d i s ci p l in a s , co n tud o in e xi s te n te s q u an d o e s ta s s ã o a n a li s a d a s a p a r ti r d e u m si s te m a a b e r to d e c o nh e ci m e n to , é o q u e a id é i a d e tr a n s d i s c ip li n a ri d a de s e p ro põ e a f a z e r . Es s a i d e i a v a i a l é m do â m bi to a c a d ê m i co e e s c o l a r , d e v en d o e s ta r p r e s en te ta m b é m n a v id a c o tid i an a , já q u e e m s e u n ão - r e d u ci on i s m o a tr a n s di s c ip l in a r id a d e c on s e gu e en g lo b ar a fi l o s o f i a , a a r te , a tr a di ç ã o e sp i ri tu a l e a c i ên ci a , to d a s in tr i n s e c a m e n te e xi s te n te s no s er h u m a no . O co nj u n to c o m p l ex o qu e f or m a o s s e r e s h u m a n o s é o bj e to d e e s tud o tr a n s d i s c ip li n a r , o m u n do q u e n o s ro d ei a ta m b é m o é , s e n do e l e tã o c o m pl e xo c o m o o s s e r e s v i v en te s ne l e , s en do , po r ta n to, i m p o s s ív e l , ai nd a q u e a té ag or a s e te nh a i n s i s tid o e m e s tu d á - lo s e gr e g ad a m e n te , e n te n d er s u a c o m pl e ta e s s ên c i a po r m é tod o s in c o mp l e to s e s e p a r a ti s ta s . 2 . ED U CA ÇÃ O 2 .1 . O QU E É ED U CAÇ ÃO Ed u c a ç ã o o u e du c a ç õe s ? É o q u e s tio n a m en to f ei to p o r C a r lo s R o dr ig u e s B r a nd ã o e m s eu l i vr o “O Q ue é Ed u c a ç ã o” e é ta m b é m a p e r gu n ta qu e u s a r e m o s p a r a in i ci ar m o s no s s o tr a b a l h o . O c on c ei to d e e du c a ç ã o n ã o é u ni v e r s al, c a d a p o vo , c a d a c u l tu r a te m s eu id e a l d o q u e é e du c a r , de qua i s s ã o o s el e m e n to s n e ce s s á r i o s p ar a u m a bo a e du c a ç ã o . No O c id e n te , a ed u c a ç ã o , c o m o p o pu l ar m e n te e n ten d id a , d e v e n e ce s s a r i a m e n te l e v a r

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o in d iv í du o à p a s s a g e m p e l a e s co l a , p a r a a p r e nd e r a l ín gu a “ n a ti v a ” , m a te m á ti c a , c i ê nc i a s e tc . E p a r a q ue o s p a i s , ta m b é m c o n s id e r ad o s p el o s e n s o co m u m c o m o ed uc a d o r e s , e du qu e m a d e q u ad a m e n te s e u s f il h o s , é m e lh o r qu e ta m b é m te n h a m p a s s a d o pe l o a m b ie n te e s co l a r . N o e n ta n to , ap e n a s di s c ip li n a s e s c ol a r e s n ã o e n si n a r ão a o s e r h u m a no o q ue é a v id a , o m el h or m o do d e vi v ê - l a e p or q u e e s ta ou a qu e l a é a m el ho r m a n ei r a d e se v i v e r . A e du c a ç ã o é m ui to m ai s d o qu e l i vr o s e c on c e i to s pr é - d e te r m in a do s , e n v ol v e mu i to m a i s q u e hi s tó ri a , g eo gr a f i a , m a te m á ti c a e tu d o q u e o s pr o f e s so r e s d a s e s c ol a s o c id e n ta i s s ã o en s in a d o s a e n sinar: A e d u ca ç ã o p o d e e x is t i r l i v r e e , e n t r e t o d o s , p o d e s e r u m a d a s m a n e i r a s q u e a s p es s o a s c r i a m p a r a t o rn a r c o m u m , c o m o s a b e r , c o m o i d é ia , c o m o c r e n ça , a q u i l o q u e é c o m u n i t á r i o c o m o b e m , c o m o t ra b a l h o o u c o m o vida . (BRA NDÃ O , 2007, p.1 0)

A i nd a s e gu n do a s i d ei a s d e B r an d ão , o q u e a ju d a a “ p e n s a r” o ho m e m , p a s s a n do o s c on c ei to s qu e o l eg i ti m a m e o c o n s ti tu e m é a e du c a ç ã o , in d ep e nd e n te d e c o m o e l a s e j a , ou e m q ue cu l tur a e s te j a in s e r id a . A s oc i ed a d e d e c ad a g r up o cu l tu r a l s er á fo r m a d a a p a r ti r d a ed u c a ç ão d a da a o s s eu s p a r ti ci p a n te s . A e d uc a ç ã o c o mo h oj e s e e n s in a n a e s c ol a s e c on f un d e c o m a d e s tr a m e n to . M i lh õ e s d e c ri a n ç a s e n tr am e m u m a s al a de a u l a , r e c eb e m i n s tr u ç ão e m u i ta s v ez e s , o u n a m a i or i a d a s v e z e s , s ã o co n v en c id a s d e qu e o s en s i n a m e n to s d a do s e m s al a s ã o i nq u e s tio n á v ei s e f ig u r a m c o m o v e rd a d e s a b s o lu ta s . O s en s o c r í tic o , qu e i n cl u s i ve a s e s c ol a s di z e m for m a r e m s e u s a lu n o s , é ve ta d o . Q u a nd o e s te s te n ta m s a i r d a “ c a v e r n a ” , c o m o a d e s c r i ta p or Pl a tã o e m o “ M i to d a C a v e r n a” , s e n te m e x tre m a d i f ic u ld a d e e m ve r o q u e o s c e rc a co m c l ar ez a e e xp o r a lg u m a o p in i ã o pr óp r i a so br e o m e s m o . A té m e s m o a p a l a v r a “ a l un o ” é p r e co n c ei tu o s a e e r rô n e a qu a nd o di r ig id a a o s e r hu m a n o . Eti m o l og i c a m e n te , e s s e te r m o r e m e te a o R e na s c i m e n to C ul tu r a l , q u a nd o s ur gi u o I lu m i ni s m o , p a r a te or i c a m en te d a r a lu z ao s n ã o i l u mi n a do s , a o s se m -lu z qu e é o s i gn i fi c ad o d e " al u no s " .

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O s s e re s h u m a no s n ã o s ã o s a c o s v az io s es p e r a nd o qu e u m d ep ó s i to de co nh e c i m en to s e j a f e i to a o ad e n tr a m o s e m u m a i n s ti tu i ç ão d i ta e du c a c io n a l . C ar r e g a mo s ex p er i ê nc i a s e u m a s é r i e d e co n c ei to s f or m a d o s e m n ó s c o m a ju da d e no s s o s p ai s , d o m e i o e m q ue vi v e m o s , d a m a ne i r a c o mo en x e rg a m o s o m u n d o , de a c or do co m a “( . . . ) l e n te a tr a v é s d a qu a l o ho m e m v ê o m u n do .” ( LA RA I A , 20 0 1, p . 6 9 ) o u s e j a , s u a c u l tu r a . O “ en s i no b a n c á ri o ” ( F R EI R E, 19 9 6 , p . 25 ) p r ec i s a s e r r e cus a d o , e x tir p a do do q u e ch a m a m o s d e e du c a ç ã o , a f in a l e l e “ ( . . .) de f o r m a a n e c e s s á r i a c ri a ti v i d ad e d o ed u c an do e do ed u c a do r (...) ” ( i d e m ) . A p a r tir d e s s a c o n c ep ç ã o d e e n si no , o s e s tu d a n te s a p e n a s c op i a m e m s u a s m e n te s o s c on c e i to s d ad o s , n ão a pr en d e m a a p r en d er , te n d o s u a c ap a c i d ad e d e p en s a r , qu e é il i m i ta d a , r e c lu s a a u m c o n ju n to d e p en s a m e n to s pr é - e s ta b e l e ci do s po r u m s i s te m a q u e p r op o s i ta l m en te o s f a z , a fi m d e f a ci li ta r o se u do m í ni o so b o s q u e f az e m p a r te d a s o ci e d ad e p o r e l e c r i ada o u i m p o s ta . Ed u c a r e x ig e q u e o s p ro f e s s o re s o u e d uc a d or es r e s p e i te m o s s a b e r e s d o s ed u c an d o s “ ( . . . ) c on s tr u íd o s n a p r á ti c a c o mu ni tá r i a ( ...) ” ( F R EI R E, 19 9 6 , p . 3 0 ) e di s c u ta m c o m e l e s s u a r e l a ç ão co m o c o n te úd o en s in a d o e m s a l a d e a u l a , o q ue , i ne v i ta v e l m e n te , l e v a a o e n si n o tr a n s di s c ip li n a r , o q u a l di s c u ti re m o s m a i s à fr e n te . C o n tu d o , a o i n v é s di s s o , o qu e a c on te c e é a s e gr e g a ç ã o d o c on he c i m en to , s e p a r a do e m d i s ci pl in a s e s tu d a d a s s e m q u e s e f a ç a qu a l qu e r co n ex ã o en tr e e l a s o u en tr e o s c on h e ci m e n to s p r é vi o s d e c a d a in di v íd uo . Co n ex õ e s es ta s , q u e e xi s te m , p o r é m s ã o n e g a d a s a f i m de m an te r e s s e sis te m a e d u c a ci on a l tr a d i c io n a l e u l tr ap a s s a d o q u e op r i m e o s p o vos o c id e n ta i s . 2 .2 . A SP EC T O S SEPA RA T I V I STA S DA ED UC AÇÃ O T RA D I C IO NA L O q ue n o s c ar a c te r iz a c o m o s er e s h u m ano s , d i f e re n te s d o s a n i m a i s e m g e r al , é n o s s a c ap a c id a d e e xc l u s i v a de p e n s a r . A p e s a r d e te r m o s , en tr e n ó s , e s s a p a r ti cu l a ri d a d e e p ro pr i ed a d e s b i ol óg i c a s e m co m u m , n ã o s o m o s ig u a i s . T e m o s p en s a m e n to s d i s tin to s , m od o s d e v id a p ró p ri o s , ex pe r iê n c i a s p e s s o a i s e i n tr a n s f er í v ei s . N ã o ex i s te u m a in dú s tr i a p ro du to r a d e s e r e s hu m a n o s , c o m o a d e s c ri ta e m “A d m ir á v e l Mu n do N o vo ” , de Al do u s H u xl e y . F el iz m e n te , a p e s a r d a fo r ç a c r e s c en te d a In dú s tr i a Cu l -

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tu r a l , a i nd a n ã o c h eg a m o s – e to m a r a q ue n ão c h eg u e mo s – a o p o n to de p r od uz ir s e re s hu m a n o s id ê n tic o s em s e u â m a go . A f i n a l , “ A p ad r on iz a ç ã o do ho m e m co nd uz à m e di o cr id a d e .” ( KR I SH NA M U RT I , 19 9 4 , p . 7 ) . N o e n ta n to , e s ta m o s a c a m i nh o d e u m a p a dr o ni z a ç ã o d e p e n s a m e n to e e s ta m o s b e m a d i an te n e s s a i nf e l iz j or n a d a . C ad a d i a q u e p a s s a , d e s a p re nd e m o s a p e n s a r , ao i n v é s d e p a s s a r m o s p e lo pr o c e s s o e du c a ti v o ta n to n o l a r , c om o n a e s c ol a , s o m o s “ d e s ed u c ad o s ” p e l a s m íd i a s d e m a s s a , c o n tr ol a d a s p o r i n te r e s s e s p ol í ti co s e p or u m s i s te m a e du c a c ion a l d e f a s a d o . A c a b a m o s p or no s p r eo c up a r co m tu do , m a s e s s e “ tu d o” é p ar ti c u l a r i z ad o . D en tr o d e u m to do e xi s te m a s p a r te s , a p r e nd e m o s a p e n s a r ne l a s e e s q ue c e m o s o co n ju n to m a io r do qu a l e l a p ar ti c i p a , ne c e s s i ta e d o qu a l n ã o p od e s e d e s ven c i lh a r . A s d i s c ip li n a s p o s su e m co n ex õe s en tr e s i e ta m b é m co m o m e io qu e n o s c er c a , a f i n al fo r a m f or m a d a s p or s e r e s q u e v i v e m n e s s e m u nd o e qu e a s p en s a r a m a p a r ti r d e ob s e r v a ç õe s e e xp e r iê n ci a s n o m e s m o . Al é m d e s e con e c ta r e m , e l a s s e tr a n s p a s s a m d e i x an do p a r a n ó s u m in f in i to em a r a n h a d o d e c o n h e ci m e n to s . Qu a nd o n eg a m o s a s li g a çõ e s ó b v i a s e n tr e a l gu m a s d e l a s o u d a s m a i s co m p l ex a s , n eg a m o s a c u ri o s id a d e , d i z e m o s i n co n s ci e n te m e n te o c on tr á r io d a fr a s e d e Só cr a te s , " Só s e i qu e n a d a s ei " e n un c a s a b er e m o s tud o , po i s , " ( ...) o c on h e ci m e n to nu n c a e s ta r á co m p le to e a r a c ion a l id a d e te m li m i te s ." ( M O R I N , 20 0 7 , p . 27 ) . Se o c on h ec i m e n to é in f in i to , n o s s a s e d e po r e l e ta m b é m d ev e s e r . O e s tu d o e sp e c i al iz a d o é c ad a ve z m a i s di f un d id o n a s e s c o l a s e n o m e io a c ad ê m i c o . Se r e s p e ci a l i s ta e m p a r te s n ã o é n e c e s s a r i a m e n te r ui m , m a s s ê - l o s e m te r o r e a l co nh e c i m en to d o to do , f az d e s s a e s p e ci a l id a d e a lg o v a zi o . A p r op o s ta d a e d u c a ç ã o de v e ri a s e r “ ( . . ) c o mp r e en d er o s ig nif i c a d o d a v id a co m o u m to d o” ( KR I SH N A MU R TI , 19 9 4 , p . 12) . C o n tu d o a ed u c a ç ão tr a d i c io n a l qu e pr io r iz a a fr a g m e n ta ç ã o d o c on h e ci m e n to , n ão o f a z , d e s s a m a n e ir a e n c ar c e r a mu l he r e s e h om e n s d e n tro d e u m m u n do f i c tí ci o , on d e a p a r ti cu l ar i d ad e d a s di s ci p li n a s f a z s e n tid o . “ ( ...) o tod o n ã o po d e s e r al c a n ç a do p e l a p a rte ( ...) ” ( id e m ) , p o i s a p a r te , c o m o é e xp lí c i ta d a e m s eu s ig ni f i ca d o , é a p en a s u m

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p e d a ç o d e a l go m u i to m a i s co m p l ex o e co mp l e to . Co m o po d e m o s v i v e r e m s o c ie d a de s e n ão no s in te g r a rm o s ? Or a , s e n ã o e x i s te in te g r a ç ã o , s ó h á s e r e s s ep a r a do s um d o s ou tr o s , c on tr a r i a n do o q u e c h a m a m o s d e s oc i ed a d e o u gr u po . Es s a s e p a r a ç ã o e m d i s c ip li n a s d e s c on e x a s a c a b a s e n do tã o g r an d e qu e o n ú m er o d e di s c ip l in a s cr e sc e in v a r i a ve l m e n te , f i c a n do i mp o s s í ve l ch e g ar p er to d e c on h e cer o tod o . N ã o c o n h e c en do o tod o – qu e d e pe n de d a s p a r te s e v i ce - v e r s a – n o s a p r ox i m a m o s d a ex ti n ç ão d o r e al co nh e c im e n to , c on f un di nd o “ e d u c a ç ão ” c o m “ l a v a g e m c e r eb r a l” . 3. TRANSDI SCIPLINARIDADE A multidisciplinaridade, que “é a justaposição de várias disciplinas sem nenhuma tentativa de síntese” (WEIL, 1993, p.31) foi o grande estopim para a necessidade de ligar as disciplinas entre si, para que fossem melhor compreendidas. O conhecimento limitado foi perdendo o falso sentido quando a humanidade descobriu que, de fato, ele é infinito, que “a multidisciplinaridade e a pluridisciplinaridade são produtos da fragmentação da men te humana.” ( WEIL , 1993, p .21). Em meio ao caos velado, criado pelo crescente número de disciplinas, forçando a limitação inexistente do conhecimento, emergiu o “grito de socorro” a fim de salvar o mundo do saber, a interdisciplinaridade. Esse foi o primeiro passo para educadores e educandos entenderem as conexões existentes entre as disciplinas. Essa conectividade fez surgir novos estudos, sobretudo em áreas que clamava m por essa ligação. Aconteceu a aparição da Bioquímica, da Neurolinguística, entre outras nas quais a obviedade das conexões fez -se necessária para entender sua complexidade. A idéia interdisciplinar surgiu no período em que o mundo conheceu as redes e a globalidade, todos conectados para um bem comum. Apesar de o mundo conceber essa conectividade, as disciplinas mantinham sua autonomia, dessa forma, os conflitos eram inerentes a esse modelo educacional. O elo era fraco de tal form a que as ligações entre as disciplinas eram facilmente quebradas, fazendo com que esse encadeamento fosse meramente descartá-

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vel em certo ponto dos estudos interdisciplinares, retom ando a particularização do saber em especializações vagas. (... ) en f im , n o es t á g io d as rela çõ es in t erd is cip lin a res , p od em o s es p era r o a p a recim en t o d e u m es t á g io s up erio r q u e s eria a " t ra ns d is cip lin a rid a d e" en t re p es q u isa s esp ecia liz a d a s , ma s s it ua ria ess a s lig a çõ es n o in t erio r d e um s is tem a t o t a l s em f ra tu ra s es tá veis en t re as d is cip lina s (... ) (Nico les cu , a p u d . Weil, 1 9 9 3, p . 30)

A transdisciplinaridade surgiu para acabar com a fraqueza desses elos, veio para acabar com os limites entre as disciplinas, enfim transpassá -las , fazendo com que fossem axiomaticamen te dependentes entres si. M ais do que isso, a educação passa a buscar a compreensão do significado da vida já que, pelo viés transdisciplinar, eliminou as barreiras entre Ciência, Filosofia, Arte e Tradição Espiritual. Defende o não -reducionismo das disciplinas, no qual até então estáva mos imersos. Ainda que essa idéia pareça nos dar a possibilidade do saber total, segundo Edgar Morin, é na realidade "(...) uma a spiração a um saber menos particular." (MORIN, 2007, p .27) A unificação do conhecimento é objetivo do pensamento transdisciplinar, atrav és da compreensão do mundo, através de diversas culturas, formando pontes entre elas e suas educações. Ela não elimina a pesquisa disciplinar e interdisciplinar, procura, na verdade, ultrapassá -la s, expandindo o horizonte das mesma s. "Qualquer tenta tiva de reduzir o ser humano a uma mera definição e de dissolvê -lo nas estruturas formai s, seja m elas quais forem, é incompatível com a visão transdisciplinar" (NICOLESCU, 1994) . Assim, a tran sdisciplinaridade procuraria um sistema de conceitos incontestáveis comuns a toda ciência, filosofia, arte e tradição espiritual, dessa maneira saindo do âmbito escolar e acadêmico. O ser humano e o mundo que o cerca são co -existentes e interdependentes, inclusive as disciplinas organizadas por nós inicialmente de modo fragmentado só poderiam existir a partir do pensamento humano de acordo com suas experiências e inter relações, desde sempre existente s. Me smo antes do aparecimento da língua, a humanidade buscava se relacionar de diversos modos, ainda que as ideias habitassem na obscuridade da mente até en-

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tão desorganizada. A integração é elemento ne cessário para m anter a existência da vida, a falta dela é no mínimo sem sentido. Na reflexão de Severino Antônio (2002), no livro Educação e transdisciplinaridade: a necessidade de uma nova “escuta poética”, a transdisciplinaridade é como um emaranhado de múltiplas interações que sempre está começando e recomeçando, transpondo os limites ante s impostos , chegando verdadeiramente ao que é o conhecimento, um vasto infinito. 3 . 1. C O N T EX T O H I ST Ó R I C O D A TR A N SD I SC I P L I N A R I D A D E Historicamente, a tr ansdisciplinaridade está ligada à revolução epistemológica desencadeada pela física, no co meço do século XX. Este vocábulo transdisciplinaridade foi enunciado pela primeira por Jean Piaget, em um colóquio de 1970, quando deu continuidade ao estudo interdisciplinar a partir de um método mais completo que seria a transdisciplinaridade e foi juntamente com a palavra “holística” que o termo se tornou conhecido. Contudo a transdisciplinaridade não é um visão tão nova quando aparenta: “(...) o desenvolvimento da ciência ocidental, desde o século XVII, não foi somente um desenvolvimento disciplinar, mas também um desenvolvimento transdisciplinar (...)” (WEIL , 19 93, p.32) Recentemente, a transdisciplinaridade foi repensada, ao invés de existir uma única transdisciplinaridade, foi concebida a idéia de transdisciplinaridades ou uma transdisciplinaridade geral. Foi tentando fugir de um novo reducionismo que se buscou essa saída , sugerida por Morin: (... ) u m a n o va t ra ns d is cip lin a rida d e co m u m pa ra d ig m a q u e p erm it a a o m esm o t em po , a d is t in çã o , s ep a ra çã o , o u mes m o a op o s içã o , ist o é, a d is j u n çã o d es s es d o m ín ios cien t íf ico s 'm a s q u e p os s a f a z ê -lo s co mu n ica r s em op era r a red u çã o ' . (M O R IN a p u d . WE IL , 1 9 9 3, p .33)

Ess a ideia de separação e associação simultâneas exclui a possibilidade de restringir o conhecimento. Em 1987, a UNESCO definiu o que chamamos de “transdisciplinaridade geral” e, em

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1994 , no Primeiro Congresso Mundial de Transdisciplinaridade, os paradigmas para que algo seja transdisciplinar foram enumerados em conjunto com vários precursores da ideia transdisciplinar, afirmando a necessidade de não -reducionismo do saber. 3 . 2. SI ST EM A S A B ER T O S D E C O N H EC I M EN T O Até o surgimento do pensamento transdisciplinar, a educação era restringida a conceitos pré -determinados e incontestáveis . Conceitos esses que não se conectava m, dand o a ilusão de mundo fragmentado. A abertura para novos pensamentos e criações , deu a oportunidade de crescimento intelectual, ético e moral aos educandos e educadores. Esse s novos pensamentos foram instituídos graças a Multi, Inter e Transdisciplinaridade. Para Pierre Weil (1993), se a transdisciplinaridade for desenvolvida unilateralmente, c orre o risco de ficar restrita ao racional, intelectual e mental . As sim como na “Carta da Transdisciplinaridade”, elaborada no Primeiro Congresso Mundial de Transdisciplinaridade, Weil (1993) leva o transdisciplinar para todas as áreas da vida humana, incluindo a parte espiritual, consequentemente chegando à visão holística, que defende a compressão integral dos fenômenos e do ser humano, buscando tudo abranger. A transdisciplinaridade pode ser interpretada como uma postura diante da vida . É a a titude de abertura ao diálogo e ao compartilhamento de idéias, pensa mentos, opiniões, emoções e sen timentos, “ela tem como fundamentos a complexidade, a lógica primária e a multidimensionalidade do mundo” (NICOLESCU apud. ANTÔNIO,2002) . 3 .3 . V I SÕ E S SO B R E A A P L I CA Ç ÃO D A T RA N SD I SC I P L I N A R I D A D E A transdisciplinaridade estabelece um conjunto de práticas e deve-se ter curiosidade para conhecer ideias e propostas novas , fazer de maneira democrática o melhor para determinada situação e, claro, deve -se ser, saber e fazer. Há ressalvas quanto ao pensamento transdisciplinar, pois “(...) há um risco, o risco da tagarelice superficial” (MORIN, 2007, p.28).

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Quando no foco Transdisciplinar excluem -se as partes e concentram- se apenas no estudo de um “todo”, não levando em consideração o fato de que, para que a exis tência desse “todo”, seu s pedaços são igualmente importantes, o discurso é tão superficial quanto a criticada particularização do conhecimento em especialidades vagas. Acontecendo esse tipo de discurso, a transdisciplinaridade acaba por ser um totalitarismo, implicando em uma redução do conhecimento a tudo que é total, porém superficial. É por isso que Morin propôs que, dentro do pensamento transdisciplinar, separar para associar é imprescindível. Se em contrapartida não nos aventurarmos nessa complexidade de pensamento, o risco é de nos fecharmos em um “(...) modo hermético de um saber, que poderia ser útil a todos nós.” (MORIN, 2007 , p. 28) Assim voltamos ao zero na escala da evolução do sistema educacional. Como já dito anteriormente, o estudo das partes não é de todo ruim, é na verdade necessário, afinal, a transdisciplinaridade não faz exclusões da disciplinaridade e da interdisciplinaridade, pelo contrário, elas se completam , o estudo do todo depende das partes e vice -versa . Para ser um bom neurologista, é necessário que se estude o cérebro em particular, mas com a ideia de que ele faz parte de um corpo do qual ele depende e que esse corpo também não funciona na ausência do cérebro, eles estão inter e trans -relacionados. 4 . C O NC LU SÃ O A visão transdisciplinar traz uma nova perspectiva à vida humana, extirpando a farsa da fragmentação do conhecimento e abrangendo tudo o que faz do ser humano um ser inteligente e hábil em suas relações com o mundo. Ser tran sdisciplinar é ultrapassar as barreiras criadas por um sistema que visa coibir o senso crítico de homens e mulheres, vendo o mundo unido em todos os seus aspectos, e m interdependência com tudo que o forma. A partir do momento em que o sistema educacional absorver, de fato, o pensamento transdisciplinar, o aprendizado desde criança será otimizado, pois levará em consideração as diferenças entre cada estudante e cada professor, proporcionando um encontro de conhecimentos diversos que influenciam e são influenci-

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ados pelas disciplinas, transpassando as idéias que as formam. O ser humano será tratado como merece, um ser pensante e com experiências próprias que lhes servirão para todos os aspecto s da vida, a qual terá seu significado explorado como a educação deve proporcionar. 5 . R EF ER ÊN C I A S A N T Ô N I O , Se v e r i n o . Ed u c a ç ã o e tr a n s d i s c i p l i n a r i d a d e : a n e c e s s i d a d e d e u m a no v a " e s c u ta p o é ti c a " , Ed i to r a L u c e r n a , R i o d e J a n e i r o – R J , 20 0 2 B R A N D Ã O , C . R . O q u e é e d u c a ç ã o . Ed i to ra B r a s i l i e n s e , S ã o P a u l o - SP , 20 0 7 . ( C o l e ç ã o P r i m e i ro s p a s s o s 20 ) F R EI R E , P a u l o . P e d a g o g i a d a a u to n o m i a : s a b er e s n e c e s s á r i o s à p r á ti c a e d u c a ti v a , p . 2 1 - 4 3 . Ed i to r a P a z e T e r r a , S ã o P a u l o – SP , 19 9 6 ( C o l e ç ã o L e i tu r a ) H U X L EY , A l d o u s . A d m i r á v e l m u n d o n o v o . Ed i to r a G l o b o , Po r to A l e g r e - R S, 19 9 9 . L A R A I A , R . B . A C u l tu r a C o n d i c i on a a V i s ã o d e M u n d o d o H o m e m . I n __ C u l tu r a : u m c o n c e i to a n tr o p o l ó g i c o , p .6 9 . J o r g e Z a h a r Ed i to r , R i o d e J a n e i r o - R J , 20 0 1 M O R I N , Ed g a r . D e s a f i o s d a T r a n s d i s c i p l i n a r i d ad e e d a Co m p l e x i d a d e . I n . A U D Y , J . L . N . ; M O R O SI , M . C . ( o r g .) . I n o v a ç ã o e I n te r d i s c i p l i n a r i d a d e n a U n i v e r s i d a d e . Ed i pu c r s , P o r to A l e g r e - R S, 20 0 7 . p . 22 - 28 . D i s p o n í v e l e m : < h t tp :/ / b o o k s .g o o g l e .c o m .b r / b o o k s ? i d = - O G r 0 0 7 T Q 0 A C >. A c e s s o e m : 24 a b r . 20 1 0 . N I C O L ESC U , B a s a r a d ; e t al . C a r ta d a T r a n sd i s c i p l i n a r i d a d e . I n : P r i m e i r o C o n gr e s s o M u n d i a l d e T r a n s d i s c i p l ina r i d a d e . C o n v e n to d e A r r á b id a , P o r tu g a l , 2 - 6 n o v e m b r o , 19 9 4 . D i s p o n í v e l e m : . A c e s s o e m : 24 a b r . 20 10 .

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N I C O L ESC U , B a s a r a b . O m a n i f e s to d a tr a n s d i s c i p l i n a r i d a d e . Tr i o m , Sã o P a u l o - SP , 20 0 5 . WEI L , P I ER R E; e t al . R u m o à No v a T r a n s d i s c i p l i n a r i d a d e : si s te m a s a b e r to s d e c o n h e c i m e n to . p . 15 – 4 0 . Ed i to r a Su m m u s , S ã o P a u l o – SP , 19 9 3 . ( A c e s s a d o a tr a v é s d o l i n k : h ttp :/ / b o o k s .g o o g l e .c o m .b r / b o o k s ? i d = i P jT w g v V f f 8 C e m 24 d e A br i l d e 20 1 0 ) .

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